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João de Sousa

Quinta-feira, Abril 25, 2024

Culto das 19

Várias vezes já a surpreendeu de joelhos no chão orando fervorosamente, cantava louvores como ninguém e nunca reclamava pois entregava tudo nas mãos de Deus… E reprimia toda a força negativa como um “tá amarrado”, expressão que se usa para acorrentar e desmobilizar qualquer acção diabólica. Entregava tudo, até avultados valores, em forma de ofertas e dízimos, era contribuição pela família… pelo trabalho… pela saúde…

Em consequência disto, Divua seu marido vivia radiante, gabando-se das virtudes da mulher que só o enchia de bênçãos, que para além de excelente dona de casa era também uma excelente esposa e mãe.

– Não tem amigas, não bebe, não fuma… sem mácula, sem vícios nem hábitos destruidores. Uma santa, repetia orgulhoso…

E quando o assunto no trabalho era falar mal das mulheres ele sorria ironicamente ressalvando que as duas mulheres da sua vida (Mãe e esposa) eram nota mil.

Às sextas feiras tinha vigília, passava a noite na igreja, ele, cristão não-praticante, levava-a à porta da igreja e despedia-se dela com um beijo; e no dia seguinte vinha em sua busca.

Seu telefone não tinha código e nem precisava, não tinha nada a esconder… Às vezes saía para retiros espirituais lá no monte onde se sentia mais próxima de Deus. Ele mesmo já tinha alcançado várias bênçãos por causa daquela dádiva em forma de esposa.

Ele não ia à igreja, mas ajudava-a em todas as contribuições; chegou até a comprar um fato completo para oferecer ao pastor no dia do seu aniversário, ao servo que ajuda o líder Deus multiplica as suas bênçãos, ressalvava ela com entusiasmo.

E a alegria da casa era o culto das 19. Para ele que não precisava ir logo para casa, aproveitava ir ao ginásio, beber umas cervejas com os amigos ou mesmo visitar umas pecadoras desvirtuadas. E para ela as 19 horas eram a sua hora, a hora em que ela despia todo o fingimento e devotada ao seu antigo amor, entregava o seu corpo ao prazer do adultério.

Uma relação que já durava a vida toda. Tivera que se casar com alguém mais abastado porque amor não rima com pobreza, – dizia ela. E a necessidade que tinha dele não era saciada com tudo que o esposo lhe proporcionava: casamento, reconhecimento, sustento… e outras coisas que ela nem notou porque tinha a cabeça sempre ocupada com novas estratégias de como contornar a situação. Com mentiras e mais mentiras ia contribuindo para que a obra progredisse, o seu amor não podia falir, por isso ia à igreja semanalmente por 10 minutos, justamente no instante em que se faziam os anúncios, assim ficava informada sobre tudo o que se passava… e as vigílias… ai as vigílias… as benditas vigílias… todas as últimas sextas-feiras do mês…

Hoje Divua está muito triste e confuso; disseram-lhe que viram a sua santa esposa entrar em um hotel de luxo acompanhada de um homem. Não negou nada, concordou com cada afirmação.

– Divua, meu bem… tu sabes que eu sou aspirante a obreira… e sabes também que é nosso trabalho libertar almas perdidas das garras de Satanás e por isso fomos aos os hotéis e motéis da cidade para tentar pregar a palavra de Deus aquelas pessoas, sobretudo mulheres, que têm amantes e vivem no mundo do adultério… Tu sabes que eu nunca entendi o porquê e um cristão de verdade deve evangelizar até no inferno…

– Perdoa-me querida… disse ele envergonhado.

– Claro que te perdoo mas lembra-te que o ciúme é do diabo e um homem de Deus não faz ciúmes, nosso amor é blindado, que toda a maldade preparada contra nós caia por terra em nome do Altíssimo.

– Amém!

– Vem meu marido, vem … O teu banho está preparado, vou fazer-te uma bela massagem, hoje o jantar é o teu prato favorito… olha a propósito esta vai ser a minha missão, buscar almas perdidas no adultério em hotéis e locais isolados onde estas almas se perdem.

– Sim meu amor que Deus te abençõe nesta luta e que consigas salvar muitas almas meu bem, e por isso vou oferecer-te um carro novo, a partir de agora vou converter-me e passaremos a enfrentar esta luta juntos.

A autora escreve em PT Angola

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