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Quinta-feira, Abril 25, 2024

Francisco Pereira de Moura

Helena Pato
Helena Pato
Antifascistas da Resistência

(1925-1998)

Cidadão muito prestigiado quer como economista, quer como professor universitário. Considerado por alguns economistas como fundador da Economia moderna em Portugal e o docente que mudou o ensino da Economia, é ainda merecedor de grande consideração e apreço por parte dos seus alunos e de quem trabalhou ou conviveu com ele. Teve um percurso político invulgar. Depois de ter sido Procurador à Câmara Corporativa, foi como católico, imbuído da doutrina social da Igreja, que participou na «Vigília da Capela do Rato», onde viria a ser preso pela DGS (a polícia política do regime), sendo então demitido do lugar de professor do Instituto Superior de Economia.

Destacando-se na luta política contra o fascismo a partir da década de 60, veio a ser dirigente de primeiro plano da CDE de Lisboa, em finais dessa década. Já em Democracia, foi deputado e ministro pelo MDP/CDE. Foi um cidadão exemplar e um ser humano extraordinário, de grande carácter, com uma admirável humildade, e invulgarmente inteligente e sabedor. A sua vida académica, de professor e cientista, entrelaçou-se sempre com a acção em prol da luta pela Liberdade e pela melhoria da situação dos mais desprotegidos.

Durante a Ditadura

Francisco José da Cruz Pereira de Moura nasceu em Lisboa, em 17 de Abril de 1925, e faleceu a 4 de Abril de 1998.

Foi aluno do Instituto Superior Técnico da Universidade Técnica de Lisboa, de 1942 a 1945. Porém, em 1950, iria terminar a licenciatura em Finanças no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF) da Universidade Técnica de Lisboa e, em 1961, obter o doutoramento em Economia, na mesma Universidade.

Foi professor assistente da cadeira de Economia do Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, (de 1950 a 1957 e de 1961 a 1970). De 1957 a 1968 e de 1973 a 1974, foi docente do Instituto de Serviço Social de Lisboa; de 1962 a 1963 foi docente do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas Ultramarinas. Em 1972 era já Professor Catedrático do ISE quando foi demitido do ensino.

Foi colaborador do Gabinete de Estudos Corporativos (1950–1953). Em 1957 foi secretário-geral e principal organizador do II Congresso da Indústria Portuguesa. De 1958 a 1967 fundou, foi Consultor e Director do Centro de Estudos de Economia Aplicada da Associação Industrial Portuguesa.

Exerceu a função de Procurador à VII Legislatura da Câmara Corporativa, pela Subsecção de Finanças e Economia Geral (1957–1961), bem como à VIII Legislatura (1961-1965) .

Início da a sua intervenção social e cívica

Na década de 50, quando aluno do ISCEF, pertenceu à sua Associação Académica, mas foi como militante da Juventude Universitária Católica (JUC) que iniciou a sua intervenção social e cívica.

  • Em 1968. Ligado aos chamados Católicos Progressistas, aceitou o convite de José Tengarrinha (de quem era amigo pessoal) para colaborar com outros sectores críticos ao regime e integrou a «Comissão Promotora do Voto». Em 1969 foi um dos fundadores da Comissão Democrática Eleitoral (CDE) de Lisboa, que viria a dar origem ao Movimento Democrático Português(MDP/CDE). No mesmo ano, novamente a convite de J. Tengarinha, aceitou ser candidato à Assembleia Nacional pela Comissão Democrática Eleitoral – CDE de Lisboa[2]. A partir daí, foi grande a sua actividade na Oposição Democrática;
  • Em 1969. Publicou os livros “Análise Económica da Conjuntura”, “Por Onde Vai a Economia Portuguesa?”, “Uma Experiência de Colaboração Professores-Alunos” e “ A Política Económica Portuguesa: Diálogo Entre Dois Economistas,”(em co-autoria com Sérgio Ribeiro );
  • Entre 1971 e 1974. Foi membro da Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos e presidente da Mesa da Assembleia Geral da Cooperativa Devir. Era professor auxiliar do ISCEF (1970–1972), quando foi co-autor do Manifesto “A Situação Política Portuguesa e o Fracasso do Reformismo”. Já professor catedrático do ISCEF (1972), publicou o livro “Presos Políticos: Documentos 1970–1971”, em co-autoria com Luís Lindley Cintra;
  • Em 1972. Participa na «Vigília pela Paz», na Capela do Rato, sendo por isso preso pela PIDE, no dia 31 de Dezembro[3];
  • Foi demitido da Função Pública e do Ensino Superior, logo em Janeiro de 1973. O seu afastamento do Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras gerou um movimento de apoio internacional por parte de economistas, que apelaram à sua reintegração na Universidade.
    ;
  • Em Abril de 1973. Pereira de Moura participou no III Congresso da Oposição Democrática (Aveiro), apresentando a tese “Funções de Dependências dos Governadores Civis”. Em Outubro do mesmo ano, foi candidato da CDE às eleições legislativas, na lista do círculo de Lisboa. ;
  • Em 13 de Abril de 1974. Otelo Saraiva de Carvalho informa o General António de Spínola que o Professor Pereira de Moura é um dos nomes indicados para Primeiro – Ministro, por decisão do MFA, mas não foi aceite.


Durante a Democracia

Em 26 de Abril de 1974, é em nome da Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos que Francisco Pereira de Moura reúne com o delegado da Junta de Salvação Nacional, Coronel Abrantes da Silva, com vista à libertação dos presos políticos da cadeia de Caxias. No dia 4 de Maio de 1974, Pereira de Moura com José Tengarrinha e outros companheiros, em representação do MDP/CDE, têm a primeira reunião com a Comissão Política do MFA.

 

Participação em vários Governos

Francisco Pereira de Moura representou o Movimento Democrático Português (MDP/CDE) em vários governos. Foi ministro sem pasta do I Governo Provisório e encarregado de coadjuvar o ministro do Trabalho nos assuntos da respectiva competência.

Tomada de posse do 1º Governo Provisório (Pereira de Moura é o único sem gravata…)

No 10 de Junho de 1974, presidiu à cerimónia do Dia de Portugal realizada em Bragança – onde faz um discurso memorável para a história da Revolução. Foi consultor do II Governo Provisório (de Julho a Setembro de 1974) e ministro sem pasta do IV Governo Provisório (de Março a Agosto de 1975).

Em nome do MDP/CDE assinou a Plataforma de Acordo Constitucional, o chamado Pacto MFA-Partidos (Abril de 1975). Foi eleito deputado à Assembleia Constituinte pelo MDP/CDE (25 de Abril de 1975), mas não tomou posse por exercer funções governativas como ministro dos Assuntos Sociais do V Governo Provisório (Agosto a Setembro de 1975).

Esteve presente na reunião, que teve lugar em Bruxelas, do Conselho Mundial da Paz (Outubro de 1975). Em 1976 Pereira de Moura sai do MDP[4].

Francisco Pereira de Moura foi membro da Comissão Nacional de Apoio à Candidatura de Otelo Saraiva de Carvalho à Presidência da República (1976).

.

Retirou-se da vida política

Em finais da década de 70 retirou-se da vida política e regressou em pleno ao ensino superior no ISEG, deixando vasta obra na área da Economia. Foi consultor económico em matéria de planeamento, economista, académico, cientista da teoria económica e pedagogo.

Foi Professor visitante da Universidade Estadual de S. Paulo – Brasil (1964) e da Universidade Eduardo Mondlane – Moçambique (1977).

Depois, Director do Departamento de Economia do Instituto Superior de Economia e Gestão – ISEG (1979 –1980); Presidente do Conselho Directivo do ISEG (1979–1980); Presidente do Conselho Científico do ISEG (1984–1986). E, finalmente, Presidente do Conselho Científico do ISEG (1989–1990).

 

Jornal Diário de Lisboa, de 12 de Julho de 1974, com artigo onde Francisco Pereira de Moura fala sobre banca e sector privado português


Publicações

Publicou dezenas de obras[5], entre as quais se destacam:

  • Estagnação ou Crescimento da Economia Portuguesa;
  • Estudo sobre a Indústria Portuguesa (orientação e colaboração);
  • Localização das Indústrias e Desenvolvimento Económico;
  • Problemas Fundamentais da Economia”, obra traduzida em França;
  • Lições de Economia;
  • Planeamento Industrial e Desenvolvimento Regional;
  • Análise Económica da Conjuntura;
  • A Inflação e os Trabalhadores.

E ainda os ensaios:

  • Ciclos Políticos e Modelos Político-Econométricos (1981);
  • O Ensino da Teoria Geral de Keynes no ISCEF/ISE (Lisboa, 1986);
  • Problemas do Ensino da Economia no Primeiro Ano da Universidade (Lisboa, 1989);
  • Voltando a Ler a Linha de Rumo (1991).

Oficial da Ordem da Instrução Pública

Já Professor jubilado (1995), foi agraciado com o grau de Oficial da Ordem da Instrução Pública (1995).

Faleceu em Lisboa, a dias de completar 73 anos de idade, em 4 de Abril de 1998. Foi casado com Eugénia Pereira de Moura (também ela já falecida), uma cidadã antifascista, militante contra a Ditadura, e uma mulher de grande carácter e generosidade. Tiveram cinco filhas.

[1] No termo desta, escreveu aos membros do colégio eleitoral para a eleição indirecta do Presidente da República (do qual era membro nato enquanto procurador), a anunciar que não votaria no (re) candidato Américo Tomás. Já em 1961, incluíra na carta a Salazar, em que aceitava a sua designação para novo mandato, uma critica à deficiente representação dos trabalhadores na Câmara.

[2] Em Outubro encabeça os protestos junto do Presidente do Conselho contra a agressão a candidatos da oposição e assalto à sede da CDE.

[3] A guerra nas colónias cria um crescente mal-estar entre os católicos. A partir de 1969 aumenta a contestação que culmina, em finais de 1972, com a prisão pela PIDE de vários “católicos progressistas” na capela do Rato, onde decorria um protesto. A vigília na capela do Rato foi um momento marcante da contestação ao regime do Estado Novo. Começou a 30 de Dezembro de 1972 e deveria ter-se prolongado por tempo indeterminado, mas a 31 a polícia de choque invadiu o edifício e prendeu cerca de meia centena de pessoas que estavam no interior.

[4] Em Fevereiro de 76, o MDP/CDE anuncia que não se apresenta sozinho às eleições legislativas, para “não dividir votos e conseguir uma concentrada e útil votação na esquerda” e alia-se ao PCP para formar a APU.

[5] Entre essas obras estão as suas “Lições de Economia”, que conheceram sucessivas edições desde o início dos anos 1960, e cujos prefácios evidenciam, desde logo, as preocupações pedagógicas do autor.

Dados biográficos:

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