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Quinta-feira, Abril 25, 2024

Não deixar apagar a memória

José Carlos S. de Almeida
José Carlos S. de Almeida
Professor de Filosofia do ensino secundário. Licenciado em Filosofia e em Direito.

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…, recontando os momentos cruciais que marcaram a ascensão e queda do III Reich de Adolf Hitler, é cada vez mais importante e fundamental não deixar que a memória desse tempo se confunda ou desapareça.

Nesse sentido, devia ser uma preocupação central assumida pela própria União Europeia, o esforço no sentido de manter bem viva a recordação desses anos de chumbo que constituíram o período da IIª Guerra Mundial e os cenários de horror e destruição que daí resultaram.

Porém, parece evidente que a própria União não consegue já esconder e superar as contradições internas que a impedem de assumir essa agenda.

rapaz-e-o-pombo-2Tudo isto a propósito de O Rapaz e o Pombo, o mais recente romance de Cristina Norton, escritora nascida em Buenos Aires, Argentina, em 1948, mas que já reside em Portugal há mais de 40 anos e onde publicou vários títulos, entre os quais se destaca O Lázaro do Porto, O Afinador de Pianos, O Segredo da Bastarda e O Barco de Chocolate, sendo que este se trata de contos infantis, vencedor em 2002 do Prémio Adolfo Simões Müller, prémio instituído pela Editorial Verbo em 1990 e dedicado à literatura infantil.

Neste O Rapaz e o Pombo, publicado pela Oficina do Livro do Grupo Leya, Cristina Norton, que é casada com José Norton, eonomista de formação, mas também historiador com interessante obra publicada entre nós, apresenta-nos uma história passada entre os anos de 1930 e 1958, que é contada pela voz de um rapaz judeu que, aos 8 anos, subitamente perde todos os amigos e encontra num pombo o interlocutor mais íntimo para lhe transmitir os seus desalentos e esperanças naqueles anos terríveis. Os destinos dos vários protagonistas atravessam vários países: Alemanha, Holanda, Suiça, Espanha, Brasil, Argentina e, também, Portugal. Esta dispersão geográfica é, afinal, a dispersão e errância das várias famílias de judeus que, com a subida de Hitler ao poder, foram obrigadas a fugir. Como aliás aconteceu com a própria família da autora, também ela oriunda de judeus polacos.

A história que Cristina Norton nos conta neste O Rapaz e o Pombo, foi-lhe originalmente contada por uma mulher que esteve num campo de concentração, tal como o rapaz do pombo que esteve com a sua irmã em Auschwitz, cruzando-se com indivíduos que seriam objecto das experiências de Mengele.

Perpassa, pois, neste livro de Cristina Norton, uma grande preocupação informativa, uma constante necessidade de nos contar como tudo aconteceu. Donde se deve ter em conta que, apesar deste universo ficcional, estamos a lidar com vidas efectivamente vividas, com sofrimento que existiu realmente, por mais que tal ofensiva e realidade do mal nos interpele ao ponto de não compreendermos como pode tamanho mal habitar o coração dos homens. Ora, é porque as coisas se passaram exactamente assim, que devemos estar atentos.

Cristina Norton, O Rapaz e o Pombo, Oficina do Livro, 268 pp

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