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João de Sousa

Quinta-feira, Abril 18, 2024

O virtual desvirtuado

Ela diz que já não se lembra quem foi que fez o pedido de amizade. Mas lembra-se que, depois de alguns gostos e comentários nos posts, adicionando as trocas de algumas mensagens cheias de empatia onde ele se importava com ela e a compreendia contou-lhe que estava separado da esposa por incompatibilidade de personalidades e que agora estava à procura de uma mulher madura e que lhe aturasse o que não era nada díficil, segundo ele, e com ele resgatassem o tempo perdido.

Ela também sem ninguém, contou-lhe que estava decepcionada e nem queria se lembrar da relação passada. E mais alguns plins, trocaram os números telefónicos e uma enxurrada de mensagens românticas e ligações para dizer Bom dia, Boa tarde, perguntar se já e o que almoçou; desejar sonhos lindos e às vezes umas recargas telefónicas direitas. Arrastava todo o seu coração para os pés deste anjo que caira do céu com o pacote completo.

Ele sim, importava-se com ela… Marcaram um encontro para confirmar com os olhos o que cada um já “conhecia” do outro. Ele, não tão lindo, mas tinha um charme próprio, era limpo e perfumado, vinha montado num cavalo, desculpa conduzia um carrão do último grito, – Não sei bem a marca do carro mas era um desses jipes grandes e caríssimos, tinha o anelar esquerdo vazio sem nenhuma marca recente de anel… e num pulso um relógio que parecia caríssimo e no outro uma grossa mascote de ouro… relembrou triste.

Não tinham mais nada para dizer um ao outro, apenas selaram o compromisso: daí para a frente seriam um do outro. Depois de alguns dias de ansiedade decidiram então fundir seus corpos para selar com sémen aquele pacto sagrado.

– Qual foi a última vez que fizeste um teste de HIV? – perguntou-lhe a rapariga.
– Eu??? Eu faço de três em três meses … – respondeu calmamente
– E qual foi o resultado? – insistiu…
– Hehehhe claro que foi negativo!!! Achas que um homem como eu teria Sida?
– Claro que não, meu bem, mas sugiro que fossemos os dois fazer um teste de HIV, enquanto isso usávamos a camisinha…
– Mas camisinha atrapalha, eu não gosto!
– Está bem, mas sem camisinha não posso envolver-me, enquanto não fizermos o teste esperamos!!!
– Eu não estou doente, mas se insistes depois vamos a uma clínica e fazemos o teste e só por hoje usamos a camisinha.
– Ela sorriu, meio confortada e entregou-se aos preliminares; queria que a “primeira vez” fosse inesquecível…

Suas mãos deslizavam pelas suas curvas tentadoras, puxou-a para si e beijou-a com intensidade… senti-o preparado para a conexão dos órgãos… e ela prontamente perguntou pela protecção e ele calmamente disse que a tinha esquecido no carro…

– Se quiseres desce e vai buscá-la; não te esqueças que estamos no oitavo andar e o elevador está avariado, querida …
– Me aguarde que eu vou num instante… e ela voltou ofegante, mas já não o sentiu tão empolgado…
– Olha se estás assim tão em dúvida amanhã encontramo-nos na porta do teu serviço e vamos à clínica fazer o teste.

Deixou-a na esquina, com um beijo desmazelado.

No dia seguinte ela despachou-se cedo no escritório e saiu correndo para o esperar lá no parque, em frente da igreja do bairro Azul. E até hoje ainda espera por ele pois continua muito ocupado com o trabalho e tem feito viagens sucessivas…

A Morte

A morte chegou sorrindo amavelmente
Vestida de esperança,
Carregava nos braços
Enganosos amassos, ternuras intensas, feiticeiros abraços…
E a morte olhou para mim, pedindo,
E eu a seduzi e com meus olhos cintilantes
A abraçei carente e a ela me entreguei
Escalei seu corpo faminta
E minha sede quase matou
Aquela seiva envenenada eu bebi…
Ai como foi prazeroso abraçar aquele corpo quente!
Deleitar-me com beijos suculentos!
Cheguei até a esquecer o rancor, toda dor e entreguei-me
Cavalguei no seu dorso…
E a morte gemia feliz
Enchendo-me de prazer
Ela sorria cantando em silêncio no meu velório
E eu agradecia aquele momento
Cheguei até a canonizá-la,
Chamei-a de santo remédio.
E na esquina, a morte parou,
E com um beijo, se despediu
E ainda sorriu
Olhou para mim, de novo sorriu
E olhou para mim, depois fugiu!

 

A autora escreve em PT Angola

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