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Sábado, Abril 20, 2024

Quanto custa um livro e que ganha o autor

João Vasco AlmeidaO autor de um livro é um miserável. O contrato que assina com uma editora dá-lhe, se for uma editora engraçada, entre oito e 12 por cento do preço de venda ao público – e só para os que forem vendidos. Isto é, se Arménio escrever um grande romance com o custo de 10 euros ganha, em média, um euro por obra vendida.

O romance, andou Arménio dois anos a pensá-lo e a escrevê-lo. Afundou-se em pesquisas e em ideias, contraiu e expandiu texto. Aqui não foi fácil. A editora, que não é parva, sabe que não se vendem livros no país e fez uma edição de 500 exemplares.

Como são poucos exemplares e o Arménio não é o Lobo Antunes ou o Rodrigues dos Santos, o fado do opúsculo é ficar uma semanita à mostra (com sorte) e passar depois para as prateleiras das livrarias.

Seis meses depois o autor sabe que vendeu 200 livros. Isto é 200*1=200 euros. Mas só os receberá daqui a um ano, que é quando o contrato manda pagar. Além do mais, o IVA vai comer seis por cento a Arménio e, depois, os restantes 188 euros serão submetidos a IRS. Tira 18, ficam €170.00 ganhos, líquidos, pelo livro que o Arménio escreveu. Em dois anos, o ordenado de escritor de Arménio foi de sete euros mensais.

Por isso, vamos lá pensar o que faz um bom ministro da Cultura, outro da Educação e, acima de tudo, o comércio dos livros.

Bem sabemos que a malta não lê e que a maioria dos livros que se vendem são estranhos. Andou uma obra a defender os intestinos uns bons meses no top. Desconfio que quem o comprou nunca o leu todo. Picou aqui e ali uma receita ou um esclarecimento para o “seu segundo cérebro” e pronto.

As editoras sabem que têm de ter respeito pelo autor, mas a colocação de livros nas livrarias é cara. Se o livro custa dez euros, seis são logo para a distribuidora e para a livraria, em partes que depois estes dois logo combinam. Sim: levar o livro e vendê-lo custa seis vezes mais do que se paga ao autor (sem o qual não haveria livro, sequer).

livro-madeiraVamos em 70 por cento. O Estado vai buscar seis por cento da venda e mais uns pós de IRC, o que leva a 79 por cento do preço de capa. Faltam 11 e ainda não pagámos a impressão do livro.

Aqui, na gráfica, vão-se uns sete a nove por cento. Resultado: quando uma editora lança um livro, o milagre está em conseguir uma nesga de lucro na escala de venda. Há entre cinco e dez por cento de possibilidade de lucro – quase tanto como o autor, mas com despesas à cabeça como a paginação, a revisão, a capa…

Sem mercado, sem leitores, sem consciência de que faz falta a leitura, sem qualquer rei nem roque quer nos hábitos quer na regulação de mercado, o livro há muito que deixou de ser nobre para passar a ser uma mercadoria que necessita de ter lucro maximizado.

Para que serve um ministro da Cultura? Para ajudar a pôr ordem na casa. E um da Educação? Para promover hábitos, mas sem imposições. Hábitos saudáveis.

Daqui a 20 anos nem autores nem livros. E não, o digital não é solução, ainda.

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