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Segunda-feira, Março 18, 2024

Bolsonaro ainda pode vencer Lula?

Numa disputa polarizada, presidente só sobrevive se, além de crescer, conseguir desidratar Lula.

A pré-campanha eleitoral de 2022 alcança uma marca simbólica nesta sexta-feira (24): faltam exatamente cem dias para o primeiro turno da disputa à Presidência da República. A crer nas tendências detectadas pela pesquisa Datafolha que foi divulgada nesta quinta-feira (23), o favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está um pouco mais cristalizado.

Tal como um time de futebol que entra em campo podendo empatar ou até perder de pouco, a campanha do petista chega a esta fase da pré-campanha com uma vantagem sólida. Lula teria hoje, segundo o Datafolha, 53% dos votos válidos já no primeiro turno, contra 32% do presidente Jair Bolsonaro. Na comparação com a pesquisa anterior, de um mês atrás, os números apenas oscilaram dentro da margem de erro.

A estabilização é benéfica a Lula, ainda que a grande mídia tenha dado alarde à suposta “sensação de alívio” que tomou conta do entorno de Bolsonaro após a pesquisa. O “núcleo duro” bolsonarista” temia que o ex-presidente avançasse na preferência do eleitoral, abrindo ainda mais vantagem a ser batida prazo cada vez mais curto.

Tudo por causa do noticiário predominantemente negativo para o governo nas últimas semanas. Da execução do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips no Amazonas à prisão do ex-ministro Milton Ribeiro (MEC) por corrupção, o presidente passou semanas na defensiva, sendo questionado por pautas ruidosas.

Há quem se empenhe em dizer que Lula também teve um momento mais adverso que favorável nesse período. Na Folha de S.Paulo, por exemplo, Igor Gielow insinuou que o petista estava sujeito a desgastes “pela divulgação de um criticado plano de governo e por ter adicionado tropeços junto ao eleitorado conservador”. Na prática, nem o programa de governo teve impactos eleitorais, nem o eleitorado conservador se moveu.

Num cenário ideal, Lula, além de manter o conjunto de seus potenciais eleitores, teria de atrair uma parte dos que preferem hoje Bolsonaro, consolidando a chance de vencer a eleição em um único turno. Não é fácil – mas Lula conta com um trunfo raro em eleição: a capacidade do “lado de lá” de se atrapalhar.

Dois dados do levantamento Datafolha mostram o tamanho do desafio para Bolsonaro. Primeiro, a economia. Daqui até a eleição, indicadores como a inflação e o desemprego devem continuar na casa dos dois dígitos. O governo já apelou a um programa eleitoreiro, o Auxílio Brasil, e a um “pacote de bondades”. Não surtiu efeito: na faixa de brasileiros que ganham até dois salários mínimos – o equivalente a 52% do eleitorado –, Bolsonaro tem 22% das intenções de votos, contra 56% de Lula.

Tentando reverter ao menos parte desse fiasco, o governo corre a fim de viabilizar um novo – e desesperado – pacote para os mais pobres (e mais “lulistas”), com validade até o final do ano. Reajustar o Auxílio Brasil (de R$ 400 para R$ 600), dobrar o valor do vale-gás (R$ 53 para R$ 106) e liberar um voucher para caminhoneiros autônomos (de R$ 1.000) estão ente as medidas em estudo.

É como se o governo admitisse que já perdeu a batalha da inflação e da crise econômica – e agisse não na causa, mas em alguns efeitos, para reduzir danos. Os bolsonaristas sentem saudade do momento em que o auxílio emergencial de R$ 600 foi criado e turbinou a popularidade do presidente no início da pandemia de Covid-19. Só esquecem que a inflação, há dois anos, estava mais controlada e o custo de vida era menor.

Daí a importância do segundo dado da pesquisa que deve incomodar o Planalto, ainda que não seja fato novo: a rejeição ao governo segue elevada e abrange quase metade do eleitorado. Conforme o Datafolha, 47% dos brasileiros reprovam a gestão bolsonarista, 26% a consideram regular e apenas 26% a aprovam.

Decorridos quase três anos e meio de mandato, apenas um a cada quatro eleitor está satisfeito com o que Bolsonaro mostrou no cargo. Ainda segundo o Datafolha, 55% dizem que não votariam no presidente de jeito nenhum. Em pelo menos oito segmentos (católicos, desempregados, estudantes, jovens, mais pobres, mulheres, nordestinos e pretos), essa rejeição está acima de 60%.

A cem dias da eleição, dá para mudar esse quadro? Bolsonaro ainda pode vencer Lula?

O tempo corre contra o presidente – e talvez as saídas paliativas, que levam dinheiro rapidamente para o bolso dos brasileiros, não sejam suficientes. A esta altura, Bolsonaro precisa não apenas melhorar substancialmente a imagem de seu governo junto à população – algo improvável diante de um cenário econômico tão desalentador e dos ecos de seu enfrentamento negligente à pandemia.

Numa disputa polarizada, o presidente só sobrevive se, além de crescer, conseguir desidratar Lula. Não lhe resta alternativa. Mas o peso do antipetismo – e mesmo da antipolítica – não é o mesmo de 2018, haja vista o encolhimento do ex-juiz Sergio Moro, que se viu obrigado a sair de cena sem comover quase ninguém.

O que esperar, então? Mais máquina do governo? Uma campanha “do medo”, recheada de fake news, para desmoralizar Lula? O golpe? Como se trata de Bolsonaro, nada disso pode ser descartado.


por André Cintra, Jornalista | Texto em português do Brasil

Exclusivo Editorial PV / Tornado

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