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Quarta-feira, Março 27, 2024

Dos financiamentos

Alexandre Honrado
Alexandre Honrado
Historiador, Professor Universitário e investigador da área de Ciência das Religiões

Já está dobrada no fundo da arca a toalha que a avó bordou. Sai uma vez por ano para evocar memórias. Ou talvez essa toalha seja pura imaginação e só os ricos tenham a pretensão das toalhas bordadas e nesse caso dificilmente os bordados serão de avós ricas. As avós ricas pagavam e pagam às bordadeiras.A festa do comércio relança a economia. Sempre é melhor comprar o bolo no comércio local do que dar com ele abandonado, em pilha, num caixote de lixo dos desprezos. Por dar com ele, dei com aquele político português, procurado no Brasil por suspeita de assassinato, a passear comodamente num pequeno centro comercial, comprando jornais. Um desses jornais, arrepia-me. Um dia destes será o único tribunal arbitral dos povos cá do sítio, fará justiça de acordo com as instruções dos seus acionistas e assumirá que é o porta-voz das avós que pagam às bordadeiras do destino. Até lá, faz o que pode. E pode cada vez mais.

Provavelmente, as suas últimas notícias serão as de que a população faz esperas pelas esquinas e opera por suas próprias mãos, o que julga ser coisa de justiceiro, desopilando as suas frustrações e recalques que, até então, tinham à solta e apenas no Facebook de onde poderiam sair impunes, mesmo destruindo reputações, caluniando, inventando a seu belo prazer, que isto de ser triste e solitário precisa sempre de algum escape, nem que seja vilipendiar o próximo e lavar daí as mãozinhas sujas.

Esse jornal sabe, há muito, que são as imagens simplistas que engrandecem os simples. E já há poucos os que se dedicam à desconstrução da mentira como efeito especial da opinião publicada. E isto, já se sabe, é como na história do Pedro e o Lobo: tantas vezes o rapazinho disse ter visto a fera que quando a viu já ninguém lhe deu crédito. Ficará impune, portanto, mais uns tempos. E as tvês, que descobriram o filão do escândalo, que sobe audiências e traz investimento – tanto anúncio nos intervalos das desgraças! – lá estarão como o predador à procura da próxima vítima. Ao lado, o estado de direito está na manicura, pois precisa de mãos bonitas nas alturas em que é instado a acenar.

Seja como for, há pobres a mais. E demasiados cornos para tão poucas renas.

Quem viu a História, lá atrás, percebeu que o caos trouxe sempre as ditaduras. Os povos reclamavam lei e ordem e deram-nas aos extremistas e aos loucos, juntamente com chicotes, garrotes, armas, munições e chaves de prisão. Veio então Oliveira Salazar, Francisco Franco, Amilcare Mussolini, Adolf Hitler, José Estaline, Nicolae Ceauşescu, Enver Hoxha, Miklós Horthy, Wojciech Jaruzelski, Klement Gottwald… E outros mentecaptos da sua laia. Imagino que alguns dos nossos dirigentes partidários tiveram – ou têm ? – cartazes com os seus rostos na parede dos quartos.

Acordo, a seguir ao natal, com um amargo de boca. Não é resquício de bolo-rei ou dessas doçuras da quadra que, confesso, não aprecio particularmente. É um amargo que provém da hipocrisia, das notícias mais recentes, do estado do mundo.

Falei há dias, nestas páginas ou noutras onde me partilho, da Democracia e do que dela devemos exigir – e usufruir. Vemos agora esta coisa disforme da nova lei de financiamento dos partidos, onde a virgenzinha do costume finge que nada tem a ver com o caso e todos os outros partidos se acotovelam para caberem na jangada das benesses.

O Bloco de Esquerda afirma que a nova lei de financiamento dos partidos inclui recomendações do Tribunal Constitucional, mas “deve e pode melhorar”, e que não colaborará “em qualquer estratégia dilatória que possa redundar na incapacidade de fiscalização da atividade e das contas partidárias”. Os novos candidatos à liderança do que são hoje os restos mortais do PSD, fingem-se chocados com a ainda liderança do que são hoje os restos mortais do PSD, velha liderança que embarcou na Lei, de sorriso aberto. Os outros roem as unhas.

E a virgenzinha – que só o é porque remendou o hímen várias vezes, até porque conhece os melhores cirurgiões plásticos -, vem esganiçar-se indignada (sabemos que sempre teve formas muito originais de autofinanciar-se e que na sombra há quem lidere a sua liderança).

É um raio de uma Democracia, esta, dizem alguns. É o que temos, dizem outras. É o que permitimos.

Há quem lance SOS ao presidente dos afetos. Marcelo corre por ele, por isso terá uma palavra afetiva certamente.

Não creio que o ano de 2018 nos reserve mais do que as ignomínias do costume. Ficar alerta já não é suficiente. E as toalhas guardadas nos baús tendem a amarelecer ou, pior, a sair às descaradas para se estenderem às claras, em festas para as quais foram convidadas.

Por opção do autor, este artigo respeita o AO90

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