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Quinta-feira, Março 28, 2024

João Vaz de Amorim

Helena Pato
Helena Pato
Antifascistas da Resistência

(1880 – 1962)

Cidadão republicano e antifascista, um dos raros padres que, corajosamente, se distanciaram da cumplicidade da hierarquia da Igreja Católica com o Estado Novo.

Conhecido como «literato e paladino da Democracia», este sacerdote de origem humilde é recordado por quem o conheceu como «personalidade invulgar», caracterizada pela sua bondade, pela vocação cristã, pelo seu inabalável amor à República e pela erudição no campo das letras e da investigação histórica e arqueológica. Em 1949, foi candidato na lista da Oposição em Vila Real, mas não foi aceite . 


João Vaz de Amorim nasceu em Vilarinho das Paranheiras, no concelho de Chaves, onde também veio a falecer. Fotografia de Vilarinho de Paranheiras (aldeia situada a 2 km de Vidago e a 15 km de Chaves)

João Baptista Vaz de Amorim, celebrizado na literatura com o pseudónimo de João da Ribeira, nasceu em Vilarinho das Paranheiras, aldeia do concelho de Chaves, onde também veio a falecer. Foi uma das principais referências morais e intelectuais do seu tempo em Trás-os-Montes.

No concelho de Valpaços há memória da grandeza do Padre João Baptista Vaz de Amorim, e gratidão pela simpatia que ele manifestou e inspirou por essas terras, como sacerdote e erudito, bem como pela árdua e exemplar luta que travou, enquanto ali viveu, contra o temível regime ditatorial do Estado Novo.

Sacerdote de origem humilde

Quando o seu pai faleceu, João Vaz de Amorim contava apenas dois anos de idade e passou a viver com a mãe e a irmã na residência de seu tio materno, José Caetano de Amorim, em Friões, pároco desta aldeia do concelho de Valpaços. Terá sido junto deste sacerdote que Vaz de Amorim fez a instrução primária.

Tendo sido pároco de Loivos (Chaves), e em Bouçoais (Valpaços) mais tarde regressou à sua terra natal, Vilarinho das Paranheiras, que paroquiou até ao fim da sua vida

Após o exame de admissão ao liceu em Bragança e os primeiros estudos secundários em Valpaços, foi encorajado a prosseguir os estudos secundários no Colégio de S. Joaquim, em Chaves, antes de ingressar no liceu-seminário de Guimarães. Aí fez os 4.º e o 5.º anos de Humanidades e, nos dois anos seguintes, os estudos no ramo das Ciências obtendo também aprovação nesta área. Com 16 anos, concluíra os cursos de Humanidades e de Ciências quando foi convidado a leccionar naquele colégio. Nessa altura havia já tomado a decisão de entrar para o Seminário de Braga onde, em 1901, se ordenou sacerdote com a idade de 21 anos. Coube-lhe então paroquiar uma aldeia do concelho de Valpaços, a aldeia de Padrela. Foi no decurso destas funções que recebeu a boa nova da implantação da República em Portugal, República pela qual revelou desde a sua juventude, em Chaves, uma ardorosa e incessante paixão.

Bondade e vocação cristã

Pouco tempo depois decide emigrar para o Brasil onde exerceu funções junto do arcebispo de S. Paulo. Essa decisão tomada pelo Padre João de Amorim tem sido alvo de controvérsia, havendo quem a interprete como consequência do desencanto do pároco perante os excessos de anticlericalismo cometidos pelos republicanos da 1ª República e que resultaram na prisão dos seus colegas[1]. Mas há também quem julgue que a sua precipitada partida para o Brasil fora motivada «por razões pessoais e nunca porque se desse mal com o regime implantado» . Não tardou, porém, a regressar a Portugal. 

Ermidas, freguesia de Bouçoais, onde Vaz Amorim foi pároco

Tendo sido pároco de Loivos, no concelho de Chaves, durante 23 anos, e em Bouçoais (onde se manteve por mais um longo período, que tem sido considerado como o mais próspero da sua vida nas áreas da investigação histórica e arqueológica e da produção literária), mais tarde regressou à sua terra natal, Vilarinho das Paranheiras, que paroquiou até ao fim da sua vida.

Inabalável amor à República

Assumiu sempre publicamente as suas convicções políticas de democrata e republicano. A coragem com que o Padre João Baptista Vaz de Amorim se bateu em defesa da Democracia e contra a ditadura do Estado Novo, é frequentemente evocada pelos seus biógrafos e referida em trabalhos científicos na área da história política em Portugal deste modo:

João Baptista Vaz de Amorim foi um dos pioneiros dessa mole de transmontanos valpacenses que, destemidamente, tomou a dianteira no alinhamento pela oposição ao regime ditatorial instituído»

Em 1958, já com 78 anos, coerente com a sua ideia política de sempre, presidiu em Chaves ao jantar de homenagem ao General Humberto Delgado. Quiseram então um grupo de amigos festejar os seus 80 anos, colocando junto à velha casa de Vilarinho das Paranheiras onde havia nascido, uma lápide de homenagem, penhor de amizade e adoração dos seus conterrâneos e que testemunhasse aos futuros o valor e dignidade daquele homem. Não o consentiu o Governador Civil da época e nada mais foi possível que uma modesta visita de poucos, dos muitos que gostariam de demonstrar-lhe quanto sentiam e admiravam a sua magnífica lição. Dois anos depois, em 1962, o Padre João Vaz de Amorim faleceu.

Sessão de campanha eleitoral de Humberto Delgado, no Cine-Teatro de Chaves, a 22 de Maio de 1958

Com a casa de espectáculos completamente esgotada, e decorada com as cores da bandeira nacional, a multidão não se cansou de aclamar o General, e de dar vivas a Portugal, à Republica e à Liberdade. A mesa, presidida pelo General, Delgado, tinha a ladeá-lo o Padre João Vaz Amorim, entre outros velhos republicanos

Foram muitas as dificuldades com que depararam os seus amigos quando se propuseram homenageá-lo, ainda em vida, pelos «serviços prestados na propagação dos valores cristãos, da cultura e da democracia» na própria aldeia onde ele havia nascido[2]

Só em 1974, livres de quaisquer peias, foi possível, finalmente, colocar essa lápide adiada a realçar publicamente a esplêndida lição desse homem, exemplo de uma vida nobilíssima como sacerdote e erudito, nunca esquecida dos ideais da República. A assinalar a sua grandeza humana existe actualmente uma lápide e uma rua como seu nome na sua terra natal e uma outra em Chaves[3].

Erudição no campo das letras e da investigação

João Vaz de Amorim

Dedicado à investigação e à publicação de importantes apontamentos históricos, arqueológicos e políticos, o Padre Amorim, em virtude da sua paixão pela Arqueologia, a História e Heráldica, é considerado como «figura tão rara e sábia como seu Mestre» (assim ele se referia ao Abade de Baçal).

Deixou um vasto legado de trabalhos repartidos em diversas publicações, quer durante a sua estada no Brasil, quer posteriormente em Portugal. Ali, movido pelo seu amor à Pátria e leal como sempre ao ideário republicado democrático, publicou a “Voz de Portugal” e a “Pátria”; em Portugal, na imprensa regional transmontana, e com o pseudónimo de “João da Ribeira” divulgou apontamentos. No “Comércio de Chaves” – entre 1939 e 1947, os vários artigos que compõem a sua obra “Por Montes e Vales… Terras de Monforte e Montenegro” – no “Almanaque de Lembranças de Chaves”, no “Mensageiro de Bragança” e no “Vilarrialense”. Publicou alguns livros, entre os quais, “Pelos Montados da Serra”, e trabalhos sobre Arqueologia, nomeadamente ”Na Citânia de Briteiros: uma pedra enigmática?” (1952).

[1]

Dera-se, entretanto, a implantação da República e ele não tolera a prisão de padres, seus colegas. Por causa dessa sua postura emigra para o Brasil, assumindo funções junto do Bispo de S. Paulo. Mas a pedido da mãe regressa a Portugal e é colocado em Loivos, onde esteve 23 anos, como Pároco. Depois a seu pedido foi colocado na freguesia de Bouçoais e aqui se dedica à investigação histórico arqueológica, publicando artigos sobre diversas matérias, nos jornais e revistas da época, quase sempre assinados com o pseudónimo de João da Ribeira.»

In 1 volume do Dicionário dos mais ilustres Trasmontanos e Alto Durienses, Editora Cidade Berço.

[2] Em 1960, por interferência da PIDE, foi anulada a preparação de uma homenagem dos «transmontanos liberais ao padre João Baptista Vaz de Amorim».

[3] Referência a JVA na introdução a uma edição (em sua memória) da Revista “Aquae Flaviae”.


Dados biográficos


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