O desenvolvimento do tétum depende da língua portuguesa. Esta foi uma das principais mensagens retiradas da brilhante palestra de Célia Oliveira proferida na semana passada na Universidade de Díli.
Os inimigos da língua portuguesa tentam a todo o custo minimizar a importância desta língua no contexto de Timor-Leste. Alguns cidadãos, por ignorância, desconhecem as vantagens políticas, culturais e socioeconómicas da língua portuguesa. Mas, os tais inimigos da língua oficial da CPLP, fingem não saber que o desenvolvimento do tétum depende da outra língua oficial do País, a língua portuguesa.
Quem teve o privilégio de estar presente na “aula de sapiência” de Célia Oliveira, PhD em Ciências da Cultura na Especialidade em Cultura Portuguesa, ficou absolutamente esclarecido sobre esta matéria, tendo sido demonstrado que a língua tétum é fortemente influenciada pela língua portuguesa na medida em que o tétum vive de empréstimos linguísticos do português.
Numa perspectiva diacrónica, esta linha de raciocínio faz todo o sentido se pensarmos que a colonização portuguesa em Timor-Leste durou 500 anos e, durante esse tempo, a língua utilizada na administração em todo o território nacional foi a língua portuguesa, fazendo com que a língua tétum sofresse múltiplas influências, cujo desenvolvimento depende de empréstimos linguísticos do português.
Os empréstimos linguísticos ocorrem na sequência do contacto que existe entre diferentes povos, que “falam e escrevem de formas diferentes, e começam a fazer uso de palavras e expressões de uma língua ou de outra, seja para nomear coisas, situações, processos ou comportamentos que, no geral, não possuem uma palavra em nossa língua como referência” (Sangina Esteves, 2019).
Daqui se depreende que devido ao facto de ter havido durante cinco séculos contactos entre leste-timorenses e portugueses, com a necessidade da comunicação, até por força da imposição cultural colonial, a língua tétum passou a incluir uma boa dose percentual do léxico português.
Por consequência, facilmente se compreende que o actual tétum (tétum-praça) resulta de uma transformação do tétum-terique (tétum vernáculo que mantém a pureza original), sendo uma mistura de tétum-terique e português.
Português é elemento aglutinador dos povos e países da CPLP
Uma outra mensagem partilhada por Célia Oliveira aos estudantes e docentes do Departamento de Língua Portuguesa e de Culturas da CPLP da UNDIL foi a de que a língua portuguesa deve ser um elemento aglutinador dos povos e países da CPLP.
Segundo a prelectora, a língua portuguesa, por ser transcontinental e transnacional, tem um estatuto especial:
“Este estatuto é atingido graças ao poder político, militar, económico, cultural e científico-tecnológico do povo, do país e do Estado de que ela é língua nacional ou língua oficial..”
E, citando Vítor Aguiar e Silva, Professor Catedrático da Universidade do Minho falecido em 2022, a académica da UNDIL defendeu que a língua portuguesa sempre desempenhou um papel importante, estabelecendo,
“uma primordial marca simbólica, um inestimável instrumento de comunicação, em especial nas práticas administrativas e judiciais”.
Este estatuto é atingido graças ao poder político, militar, económico, cultural e científico-tecnológico do povo, do país e do Estado de que ela é língua nacional ou língua oficial.
Após ter referido que a significação de «lusofonia» é polissémica, tendo sugerido por essa razão que o assunto deve ser debatido, considerou que a lusofonia é a “expressão do diálogo, da convivência e do comungar multissecular de vários povos e várias culturas”, Célia Oliveira referiu-se aos três círculos da lusofonia:
- Instituições (Instituto Internacional da Língua Portuguesa – IILP, Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – CPLP, União das Cidades Capitais Luso-Afro-Américo-Asiáticas – UCCLA, Associação de Universidades de Língua Portuguesa – AULP, Fórum da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa – FORGES, etc.);
- Compõe as línguas e culturas nacionais de cada um dos nove países, e que muito contribuíram para a diversidade e riqueza linguística e cultural que a língua portuguesa encerra em si;
- Todas as instituições, pessoas e grupos alheios à língua portuguesa, mas que mantêm com esta relações de interesses vários, nomeadamente de afecto e de amizade.
Portanto, independentemente do estatuto que o português possua nos países onde é falado, devido ao facto de refletir o génio e a alma de diferentes povos, a língua portuguesa é uma língua de património.

A prelectora, invocando o saudoso político e jornalista brasileiro Barbosa Lima Sobrinho, encerrou a palestra relembrando (interpretação minha) a importância de se retirar a carga paternalista que alguns querem impor e que impulsionou alguns Estados da CPLP a não ratificar o Acordo Ortográfico:
“Há que pensar num idioma que não seja monopólio de portugueses e brasileiros. (…) Nenhuma nação do mundo lusófono pode ter a pretensão pueril de querer ditar normas e usos linguísticos às demais. No caso, o que todas as nações devem fazer é proceder ao conhecimento das diferenças, sempre em busca de uma unidade superior. Até porque a norma culta da língua comum estará sempre onde houver o desenvolvimento de cultura e civilizações como hoje ninguém ignora. Sem outras palavras, todas as nações do mundo lusofónico falam a mesma língua, mas cada um a seu modo”. (Barbosa Lima Sobrinho).
Célia Oliveira, Professora e Investigadora da Universidade de Díli
A Doutora Célia Oliveira é professora da Faculdade de Educação da Universidade de Díli e Coordenadora do Centro de Investigação e Formação Avançada (CIFA) da UNDIL. É licenciada em Línguas e Literaturas Modernas – Variante de Estudos Portugueses e Ingleses, Ramo Educacional, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto; é Mestre em Estudos Ingleses pela Universidade do Minho; é Mestre em Ensino da Língua Portuguesa Língua Segunda e Estrangeira, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa; e é Doutora em Ciências da Cultura, Especialidade em Cultura Portuguesa, pela Universidade do Minho. Recentemente, recebeu os certificados de competência profissional em tradução e em tradução jurídica pela Associação Portuguesa de Tradutores.
Tem experiência de vinte e cinco anos na área da educação em vários países da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, nomeadamente Portugal, Brasil, Angola e, nos últimos oito anos, em Timor-Leste.
Para além de ter trabalhado durante vários anos no ensino regular, possui uma larga experiência, quer como professora / formadora, quer como coordenadora de cursos e de equipas pedagógicas, na área do ensino recorrente e alternativo: no Reconhecimento e Validação e Certificação de Competências, na Educação e Formação de Adultos, no Ensino Recorrente e em Cursos de Educação e Formação.
Os conhecimentos atrás indicados levaram a que várias instituições, nos diferentes países onde trabalhou, a convidassem a desempenhar funções de consultoria, coordenação e assessoria: em Portugal, foi consultora sobre implementação de Cursos de Educação e Formação de Adultos e do processo de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências de jovens e adultos; no Brasil, foi consultora de educação; em Angola, foi Diretora Interina do Departamento de Letras Modernas e docente do Instituto Superior de Ciências da Educação do Uíge (Angola); em Timor-Leste, no Parlamento Nacional, desempenhou funções de docência, bem como de especialista em educação.
A apresentação que preparou, intitulada, “A língua portuguesa como elemento aglutinador da lusofonia”, é o resultado das suas investigações que decorrem desde a realização da sua tese de doutoramento.