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Sábado, Abril 27, 2024

Sondagens: condicionam os eleitores na altura de votar?

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Comentadores e jornalistas por ignorância, ou deliberadamente, têm apresentado os resultados de sondagens baseados em amostras diminutas como cientificamente rigorosos, o que não é verdade, e como os 10 milhões de eleitores portugueses irão votar condicionando desta forma a opinião pública

Neste estudo analiso a avalanche de sondagens eleitorais cujos resultados são apresentados e comentados quase diariamente sem fim em todos jornais e televisões e mostro e explico a sua reduzida credibilidade técnica e cientifica. Para tornar isso mais claro para o leitor mostro como o INE, uma entidade oficial credível, faz os seus inquéritos à população, e qual a dimensão minima da amostra que utiliza para que os os resultados sejam cientificamente credíveis e possam ser divulgados e não sejam enganadores. Tais cuidados de natureza cientifica não são respeitados nas sondagens eleitorais, não havendo quaisquer alertas sobre as suas limitações. O que se procura, objetivamente, é condicionar o voto popular.

 

Estudo

Comentadores e jornalistas por ignorância, ou deliberadamente, têm apresentado os resultados de sondagens baseados em amostras diminutas como cientificamente rigorosos, o que não é verdade, e como os 10 milhões de eleitores portugueses irão votar  condicionando desta forma a opinião pública

Nestas últimas semanas tem-se multiplicado as sondagens dando a maioria delas a vitória à direita, algumas delas feitas por entidades sem qualquer credibilidade técnica (nem estão inscritas na CNE) prevendo que o PS obtenha uma votação inferior à AD (PSD+CDS+PPM) e que alguns partidos da esquerda caminham para a quase extinção. Segundo elas a maioria de direita é quase uma certeza. A falta de credibilidade científica e técnica dessas sondagens “low cost”é evidente para quem as analise com cuidado, como vamos provar neste estudo.

Infelizmente, nesta campanha de desinformação, a maioria dos comentadores que dominam os media e muitos jornalistas participam nesse engano pois ignoram, ocultando mesmo, as limitações e deficiências dessas sondagens cujos resultados utilizam como fossem verdadeiros e rigorosas. E isto com o objetivo de condicionar o voto dos portugueses levando-os a aceitar a vitória de direita como inevitável e procurando ou os desmobilizar ou incentivar a votar naqueles que dizem que serão os “vencedores”. Ignoram ou não divulgam a “ficha técnica“ onde constam o baixo número de inquiridos e a baixa taxa de respostas dessas sondagens, e se as divulgam colocam numa letra miúda e na TV durante poucos segundos para que ninguém as possa ler. O fracasso das sondagens em eleições anteriores devia levar comentadores e jornalistas a terem mais cuidado nas suas afirmações, mas, infelizmente, a ética e a responsabilidade estão cada vez mais ausentes.

 

POR QUE RAZÃO AS SONDAGENS MENTEM, EM MUITOS CASOS FALHAM E OS SEUS RESULTADOS SÃO ENGANADORES?

As sondagens eleitorais são feitas com base num inquérito habitualmente a um número diminuto de portugueses que têm telefone ou internet (os que não têm são logo excluídos)sendo essa amostra constituída em média por 800 inquiridos ou mesmo menos. E isto porque são assim de “low cost” e rápidas. E com base nas respostas deste número diminuto de eventuais eleitores que, em média, só metade dos da amostra (800) respondem extrapola-se para todos os eleitores – 10 milhões – como estes milhões eleitores fossem, por milagre, votar da mesma forma como os que responderam à pequena amostra selecionada pelas empresas de sondagem.

Para que o leitor possa avaliar a consistência (ou a falda dela) científica das sondagens cujos resultados são utilizados pela comunicação social como fossem rigorosos manipulando, assim, a opinião pública, interessa comparar a dimensão das amostras (nº de inquiridos) que estas empresas utilizam com as amostras dos inquéritos feitos pelo INE que têm credibilidade técnica e científica elevada. Para isso vamos utilizar o inquérito feito trimestralmente pelo INE ao emprego/desemprego. Ele é também realizado com base num inquérito, mas utilizando uma amostra com uma dimensão totalmente diferente. O quadro 1, mostra a dimensão e o aumento da amostra do INE ao longo dos anos para aumentar a sua consistência técnica que se utiliza para calcular trimestralmente o emprego e o desemprego em Portugal (atualmente a amostra tem a dimensão de 30096, e não tem parado de crescer para aumentar a precisão como mostra o quadro, e é refrescada trimestralmente com a saída e entrada de vários milhares de inquiridos).

Quadro 1 – Dimensão da amostra utilizada pelo INE nos inquéritos trimestrais ao emprego/desemprego

30096 o INE e apenas 800 os inquéritos das sondagens eleitorais. É uma diferença abissal com consequências dramáticas na consistência científica dos resultados obtidos como é evidente. E mesmo assim o INE tem muito cuidado na divulgação dos resultados obtidos como mostra o quadro 2, que consta na pág. 24 do Documento Metodológico de INE de 2021, precauções que não existem na divulgação dos resultados das sondagens eleitorais

Quadro 2 – A forma como o INE os resultados do Inquérito ao emprego/desemprego calculados com base numa amostra

Portanto, só se o número de respostas válidas for igual ou superior a 11.100 é que o resultado é divulgado sem restrições e o INE considera que tem validade científica. Se o número de respostas válidas for inferior a 11.100 e superior a 4300 a estimativa é divulgada, mas com a indicação que tem menor precisão. Se o número de respostas válidas é inferior a 4300, os resultados não são divulgados porque o INE considera que não têm credibilidade técnica e científica, portanto são enganadores. Comparem com as sondagens eleitorais que estão a ser divulgadas.

O quadro 3 mostra a dimensão habitual da amostra (em média apenas 803 inquiridos) e uma taxa de resposta muito variável que reduz ainda mais a precisão e a consistência dos resultados que depois são apesentados como certezas nos media numa clara e evidente manipulação da opinião pública. Infelizmente jornalistas e comentadores prestam-se a isso não alertando os leitores e ouvintes para as limitações dos resultados. Os dados do quadro 3 são de Fichas técnicas que, à semelhança dos contratos de seguros, são apresentadas (quando o são) em letra muito pequena (o TV de uma forma muito rápida) que dificulta qualquer leitura e análise o que parece até propositado.

Quadro 3 – Sondagens eleições de 2024- Entidades, dimensão da amostra utilizada e respostas completas obtidas

Comparem a dimensão da amostra utilizada por estas empresas de sondagem (em média 800 entrevistas), com a dimensão da amostra utilizada pelo INE (30096) , e recorde-se os cuidados a ter na sua divulgação segundo o INE referidos anteriormente. Uma amostra com esta dimensão de 800 não tem qualquer precisão segundo o INE, que é um organismo oficial. Ele recusar-se-ia a publicar os seus resultados por falta de credibilidade.

Mas ainda existe um outro aspeto que enviesa a amostra que as empresas de sondagem utilizam e que reduz ainda mais a precisão dos resultados. Esse aspeto é a elevada percentagem dos que se recusam a responder (entre 23,4% e 74,7%). E isto distorce ainda mais os resultados, reduzindo muito mais a sua precisão, porque aqueles que se recusaram podem, na sua maioria, pertencer a um ou vários partidos, o que determina que aqueles que respondem e que pertencem aos outros partidos acabando por empolar os resultados atribuídos a estes partidos dando resultados que, depois, são utilizados pelos media, como verdadeiros e totais condicionando a população, mas que não correspondem à realidade eleitoral do país. E o absurdo atinge o limite impensável quando estas empresas de sondagem repartem os indecisos de acordo com as percentagens obtidas desta forma por cada um dos partidos e calculam desta forma os deputados que seriam eleitos. E depois apresentam tudo isto, calculada desta forma, como fosse o pensar e sentir de todos os portugueses. É desta forma que se procura agora condicionar o voto através de comentadores e jornalistas que matraqueiam até ao infinito os resultados que nada tem a ver com o saber científico.

 

O FRACASSO REPETIDO DAS SONDAGENS “LOW COST” ANTERIORES É IGNORADO PARA FACILITAR A MANIPULAÇÃO

O quadro 1, é apenas um reduzido número de exemplos que mostram o falhanço das sondagens eleitorais que têm enxameado os períodos anteriores a todas eleições com o objetivo de condicionar a votação, mas que depois os resultados finais das eleições revelam diferença grande entre o verificado e o previsto por estas sondagens pagas.

Quadro 4 – Resultados finais das eleições de 2022 e resultados das sondagens feitas para estas eleições

Como se conclui da observação do quadro 4 os resultados das sondagens feitas antes das eleições passadas são muito diferentes dos resultados finais. Quem ingenuamente acreditou nas sondagens certamente sentiu-se enganado. Muitos ainda se recordam da intensa campanha desenvolvida nos media de que Rui Rio iria ganhar as eleições. E o resultado foi que Costa ganhou as eleições com maioria absoluta. O mesmo com Fernando Medina/Carlos Moeda. A vitória de Medina era quase certa para muitos. Se se derem ao trabalho de estudar o passado concluirão que os fracassos das sondagens são numerosos. E não só em Portugal, também nos EUA (ex.Hillary Clint/Trump). Se existisse sentido de responsabilidade nos comentadores e jornalistas, a sua conduta seria outra.

 

É NECESSÁRIO UM GOVERNO DE ESQUERDA, COM TODOS OS PARTIDOS DE ESQUERDA PARA SE OPOR À DIREITA

Hoje o que está em jogo em Portugal, num contexto interno e externo muito inseguro e difícil (guerras, sanções, declínio da Europa, crescimento económico medíocre na U.E. e em Portugal, aumento das desigualdades e pobreza, etc.) é a ascensão da direita ao poder apoiada pela extrema-direita e pelos saudosos do fascismo, e o inevitável agravamento das condições de vida dos portugueses por mais cantos de sereia que ouçamos. O país necessita é de um governo firme na defesa dos interesses dos portugueses, não submetido ao “deus de contas certas” e que não seja submisso a uma C.E. incapaz, incompetente e desprestigiada na Europa e no mundo. E isso só é possível com um governo de esquerda forte, mas para isso é necessário que os partidos de esquerda sejam reforçados pelo voto popular nas eleições. A experiência já mostrou que o domínio total de só um partido de esquerda não é solução para o país pois ele revelou-se incapaz e fraco para se opor à chantagem interna e externa da direita cedendo continuamente a ela nos últimos 2 anos.


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