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Quinta-feira, Março 28, 2024

Um Orçamento de austeridade

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Um Orçamento sem as medidas necessárias para defender as famílias e as empresas dos efeitos dramáticos da crise que foi agravada pela guerra, a principal preocupação  do governo continua a ser reduzir o défice e a divida, como Medina enganou o jornalista, e a ilusão de que as sanções vão estrangular a Rússia e acabar com a guerra e que o mundo voltará a ser o que era antes

Neste estudo analiso alguns dos aspetos mais importante da proposta de OE-2022 apresentada pelo XXIII governo, mostrando que a preocupação principal do governo continua a ser a de reduzir o défice orçamental e a divida pública e não as pessoas, e que as medidas constantes da proposta do OE-2022 para mitigar as consequências já dramáticas para milhões de portugueses da crise económica e social que foi muito agravada pela guerra na Ucrânia (os efeitos de bumerangue – ricochete – das sanções aplicadas à Rússia) são manifestamente insuficientes.

 

Estudo

Um Orçamento sem as medidas necessárias para defender as famílias e as empresas dos efeitos dramáticos da crise que foi agravada pela guerra, a principal preocupação  do governo continua a ser reduzir o défice e a divida, como Medina enganou o jornalista, e a ilusão de que as sanções vão estrangular a Rússia e acabar com a guerra e que o mundo voltará a ser o que era antes

Como já tínhamos concluído da análise do programa deste governo  (estudo 15-2022 de 3/4/2022) que o seu objetivo principal, não seria proteger as famílias e a economia dos efeitos dramáticos causados pela junção de duas crises – a provocada pela pandemia cujas consequências ainda não terminaram e a causada pela guerra na Ucrânia invadida pela Rússia –  nomeadamente os efeitos de bumerangue (ricochete) para os europeus e, em particular, para os portugueses da multiplicação de sanções aplicadas à Rússia, mas sim a redução do défice orçamental e da divida, a proposta de OE-2022 apresentada agora pelo XXIII governo veio confirmar inteiramente essas conclusões. É o que se vai mostrar analisando alguns dos seus pontos mais importantes.

 

O ORÇAMENTO APRESENTADO CONFIRMA QUE A REDUÇÃO, ENTRE 2021 E 2022, DO DÉFICE DE 2,8% PARA 1,9% DO PIB E DA DIVIDA DE 127,4% DO PIB PARA 122,8% DO PIB SÃO OS OBJETIVOS PRIORITÁRIOS DO GOVERNO

 Para o governo parece que mundo continua a ser o mesmo que existia antes da pandemia e, nomeadamente, antes da guerra na Ucrânia, e continua a pensar e a iludir que a atual crise é temporária, e que tudo voltará ao mesmo muito em breve. E, assim, para ele, o melhor é ignorar a gravidade crescente da situação atual, e apresentar um orçamento que, tendo em conta que é num contexto de grave crise, é de verdadeira austeridade.

A cegueira do governo é evidente, que tem consequências graves na vida dos portugueses e na economia. A nível de défice orçamental, na proposta de OE-2022 de out.2021 previa-se a redução para -3,2% do PIB (pág. 68 do Relatório), na versão do OE-2022 de abril de 2022 a redução é já para -1,9% do PIB (pág. 57 do Relatório), aproveitando o facto do défice orçamental de 2021 ter sido inferior ao que previa na altura conseguido através de um artificio orçamental de pagar despesas correntes com aumentos de capital que não são contabilizados para o défice e mais cortes no investimento previsto. Em relação à divida pública sucede o mesmo. Na proposta anterior de OE-2022 previa-se reduzi-la este ano para 122,8% do PIB (pág. 76 do Relatório), na versão de OE-2022 deste ano prevê reduzir para 120,7% do PIB (pág. 66 do Relatório). É este o novo O.E. para 2022 do governo de maioria do PS, o chamado “orçamento de contas certas”, de que se gabam agora Costa e Medina, e antes também Centeno/Leão.

 

AUSTERIDADE PURA E DURA PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E PENSIONISTAS, A RECUSA DO GOVERNO EM FAZER UM AJUSTAMENTO NAS REMUNERAÇÕES E NAS PENSÕES APESAR DA ESCALADA DOS PREÇOS CAUSAR PERDA SIGNI-FICATIVA DE PODER DE COMPRA, E COMO FERNANDO MEDINA ENGANOU O JORNALISTA QUE O ENTREVISTOU/RTP

Contrariamente ao que afirmou Fernando Medina na entrevista que deu na RTP, a previsão do aumento da despesa com Pessoal do Estado, entre 2021 e 2022, não é 3,6%, mas apenas 1,4% como consta do quadro 1 que foi copiado da pág. 91 do Relatório que acompanha a própria proposta de OE-2022 que apresentou este ano.

Quadro 1 – Despesas com pessoal da Administração Central

A nível da Administração Central o aumento na “Massa salarial”, que inclui as remunerações, mas também os subsídios e outros encargos, não é 3,6%, como afirmou Fernando Medina na entrevista que deu na RTP, mas apenas 1,4% como revelam os dados constantes do Relatório que acompanha a proposta de Orçamento do Estado para 2022 do XXIII governo. E como se explica os 3,6% de aumento que o governo tem utilizado na sua propaganda perante a passividade de muitos jornalistas que têm sido enganados, de que é exemplo o que o entrevistou recentemente na RTP? A explicação é a seguinte. Em muitos quadros do Relatório que acompanha a proposta de OE-2022 as comparações não são feitas entre o que se gastou efetivamente em 2021 (execução provisória) e o orçamentado para 2022, mas sim entre o valor constante do Orçamento do Estado inicial para 2021, valor esse que depois teve de ser reforçado devido a ser insuficiente, com o valor constante da proposta de Orçamento do Estado para 2022 agora apresentada. É uma habilidade feita pelos governos de António Costa com claro propósito de enganar os jornalistas e a opinião pública. Mesmo entrando em conta com todas as Administrações Públicas (Central, Local e Regional, mas só a primeira é que é da responsabilidade do governo) o aumento na “Massa salarial”, entre 2021 e 2022, é apenas de 2,4% e não 3,6% como afirmou Medina. Como é que com tais aumentos se poderá reforçar a Administração Pública e atrair competências que esta necessita para responder aos desafios presentes e futuros e para aplicar e controlar com eficácia e eficiência os quase 50.000 milhões € de fundos comunitários do Portugal 2020, do PRR e do Portugal 2030 e garantir a sua execução atempada? É uma questão que parece não preocupar o governo. Também os pensionistas quer da Segurança Social quer da CGA vão sofrer uma significativa perda de poder de compra já que os aumentos nas suas pensões em 2022 foram apenas entre 0,24% e 1% (Portaria 301/2021), e inflação será de 5%. E o chamado aumento extraordinária não compensará pois nos 10€ são deduzidos os 0,24/1%

 

A ESTRANHA E DELIRANTE “TEORIA ECONÓMICA” DE FERNANDO MEDINA DE QUE AJUSTAR AS REMUNERAÇÕES DOS TRABALHADORES DA FUNÇÃO PÚBLICA À INFLAÇÃO DETERMINARIA UMA ESPIRAL DE INFLAÇÃO

A inflação aumentou 1,3% em 2021 segundo o INE e a Tabela Remuneratória da Função Pública não teve qualquer subida em 2021. Em 2022, a Tabela Remuneratório teve um aumento irrisório de 0,9% e os preços (IPC) já aumentaram, entre março de 2021 e março de 2022, mais 5,3% segundo o INE. Era justo e necessário que o governo fizesse este ano um ajustamento na Tabela remuneratória para que os trabalhadores das Administrações Públicas não sofressem mais uma quebra significativa no seu poder de compra a juntar à quebra média de 17% que já sofreram desde 2010 até 2021. Fernando Medina, que considera mais importante reduzir o défice e a divida, afirmou publicamente que não faria qualquer ajustamento nas remunerações com a justificação absurda de que isso iria causar uma espiral de inflação. Isso é uma pura mentira, há que ter a coragem de o dizer. Em primeiro lugar, porque um ajustamento salarial na Função Pública não determinaria diretamente um aumento de custos para as empresas porque tal ajustamento não entra na formação dos preços das empresas. Em segundo lugar, mesmo que as empresas aumentassem os salários dos seus trabalhadores na proporção da subida dos da Função Pública isso não determinaria uma espiral de inflação, pois os salários apenas representam uma percentagem reduzida da recuperação dos custos através do volume de negócios das empresas. Para que fique claro para os leitores o absurdo da “teoria” de Fernando Medina, vamos fazer uma simulação utilizando dados das empresas em Portugal divulgados pelo INE. Vamos supor que a inflação em Portugal é de 5% em 2022, e os empresários portugueses, “amigos” dos seus trabalhadores, pretendem que eles não percam poder de compra, e decidem aumentar os gastos com pessoal, que incluem os salários e todos os outros encargos pagos pelas empresas, em 5% logo a partir de 1/1/2022 o que não aconteceu. Quanto é que teriam de aumentar os preços, e valor do que vendem (Volume de Negócios), devido àquela subida de salários no caso de pretenderem transferir este aumento de custos para os consumidores? A resposta está no quadro 2.

Quadro 2 – Cálculo do aumento de preços determinado por uma subida de 5% nos gastos com Pessoal

Um aumento de 5% nos gastos com Pessoal, que inclui os salários dos trabalhadores, como eles representam em média entre 13,9% (nas grandes empresas) e 18% (nas PME) exigiria um aumento de preços de apenas entre 0,7% e 0,9% como mostra o quadro 2. Isto no caso de para transferirem a totalidade dessa subida para os consumidores. Se deduzirmos este aumento da “Massa salarial”, no Excedente Bruto de Exploração, que reverte para as empresas, portanto não transferindo para os consumidores, ele diminuiria de 41.333,4 milhões € para 38.093,9 milhões €, o que continua elevado. A resposta de Medina revela ou grande ignorância ou a tentativa de enganar o jornalista que o entrevistou e a opinião pública ocultando a verdadeira razão da recusa do governo, que é a obsessão do défice.

 

COMO A EDUCAÇÃO E O SNS SÃO DESVALORIZADOS NA PROPOSTA DE OE-2022 DO XXIII GOVERNO

Interessa analisar com pormenor a forma como são tratados na proposta de OE-2022 dois setores fundamentais no combate às desigualdades, no bem-estar da população e no desenvolvimento do país, que são a Educação e o SNS.

Na educação (Ensino Básico e Secundário, e Administração Escolar) as Despesas com Pessoal diminuem, entre 2021 e 2022, de 5.302 milhões € para 5.146,8 milhões € (- 155,2 milhões €), embora com a descentralização de competências na área da educação para as Autarquias as transferências passem, entre 2021 e 2022, de 926,5 milhões € para 1367,3 milhões €. No entanto, se deduzirmos à Despesa Corrente (6804,5 milhões € em 2021, e 7162,8 milhões € orçamentadas para 2022), ou seja, aquela que financia as despesas de funcionamento da Educação, as transferências correntes (926,5 milhões € em 2021 e 1.357,3 milhões € em 2022), restam 5.878 milhões € de gastos em 2021 e 5.805,3 milhões € orçamentados para 2022. Isto significa que o valor orçamentado em 2022 para a Educação da responsabilidade direta do Estado é inferior ao gasto em 2021 em 1,2%. (pág. 276 do Relatório). E isto quando a Educação é um setor onde se verifica uma forte degradação devido à falta de professores e de trabalhadores não docentes, que determinou que no início deste ano escolar dezenas de milhares de alunos sem aulas, e em que grande número de escolas aguardam há anos obras de recuperação

No SNS a situação é ainda mais grave. Como referimos num estudo anterior (14-2022 de 30/3/2022), a “Execução financeira consolidada do SNS em 2021” terminou o ano de 2021, segundo a Direção Geral do Orçamento do Ministério das Finanças, com um saldo negativo de 1.100 milhões €, sendo a divida acumulada pelo SNS a fornecedores privados, em fev.2022, já de 1.888 milhões €, mais 339 milhões € do que a divida em 31/12/2021. Para além disso no Orçamento de 2021 estavam previstos 693,3 milhões € de investimento em 2021 no SNS (pág. 260 do Relatório) mas foram realizados apenas 291,1 milhões € (pág. 301 do Relatório), ou seja, somente 42% do previsto. Mas é assim que o governo de Antonio Costa conseguiu reduzir o défice orçamental, entre 2020 e 2021, de 7,3% para apenas 2,8% do PIB, de que se tanto gaba, e quer reduzir em 2022 para apenas 1,9% do PIB. Na proposta de orçamento do SNS para 2022 apresentada pelo XXIII governo, a despesa corrente prevista para este ano é apenas de 12.608,9 milhões €, ou seja, só mais 0,8% do que a de 2021, e a Despesa de Pessoal orçamentada para 2022 é apenas de 5233,8 milhões €, ou seja, só mais 1% do que gasto em 2021 que foi 5.182,9 milhões € (pág. 301 do Relatório). E isto apesar de no fim do mês de março de 2022 existirem já 1.235.831 utentes do SNS sem médico de família atribuído, por um lado, e, por outro lado, de dezenas de milhares de refugiados que estão a chegar a quem se concedeu o direito imediato de se inscreveram no SNS. A solução “milagrosa” encontrada por este governo para este grave problema é a que consta do nº1 e 2 do art.º 179 da proposta de Lei do OE para 2022, que é aumentar no que for necessário o número de utentes pelos médicos de família existentes e “quando a taxa de cobertura total de utentes com médico de família for igual ou superior a 99%, então é iniciada a revisão da dimensão de utentes inscritos por médico de família”. Mas não se reforça o orçamento do SNS para pagar aos médicos o acréscimo de trabalho que tal medida determinará, nem para contratar mais médicos, incluindo os aposentados como consta da lei do OE, nem para o regime de dedicação plena de que fala o governo. Mais uma vez apenas palavras e promessas para não cumprir.

 

POR QUE RAZÃO PORTUGAL CONTINUA A DIVERGIR DA MÉDIA DA U.E. E A SER ULTRAPASSADO POR PAISES DE LESTE QUE ENTRARAM RECENTEMENTE PARA A UNIÃO EUROPEIA

Esta é uma questão que muitas vezes surge no debate público, nomeadamente na televisão, e que não tem tido qualquer resposta esclarecedora. As que se ouvem são improvisadas na altura, não traduzindo qualquer reflexão séria e fundamentada. Vamos apresentar dados importantes para compreender as causas deste atraso cada vez maior do nosso país em relação à média da U.E. e a países do Leste que entraram recentemente.

Quadro 3 – Taxa de Investimento Público (FBCF) em percentagem do PIB e percentagem que o PIB “per capita” de cada país representa em relação ao PIB médio “per capita” da União Europeia – 2009/2020 – Eurostat

No quadro 3 encontram-se a maioria dos países do Leste que entraram para União Europeia muito depois de Portugal. E o que se conclui da análise dos dados divulgados pelo Eurostat é que se verifica em todos eles uma convergência do seu PIB “per capita” (por habitante) para o PIB médio “per-capita” da U.E., enquanto em Portugal verificou-se precisamente o contrário. Em 2009, o PIB “per capita” português representava 83% do PIB “per capita “médio da União Europeia, enquanto em 2020 já representava apenas 76%.  Nos países do Leste que se encontram também no quadro 3, a tendência é precisamente contrária. Por ex., a Estónia que, em 2009, o seu PIB “per capita” era apenas 64,2% do PIB “per capita” médio da União Europeia, em 2020 já correspondia a 84,2% do PIB “per capita” médio da União Europeia. E os exemplos multiplicam-se como se constata pelo quadro 3. Se agora se analisar a taxa de investimento público (FBCF) medida em percentagem do PIB de cada país, que também se encontra no quadro 3, rapidamente fica a conhecer uma das razões para a convergência dos países do Leste para a média da União Europeia, e da divergência de Portugal em relação à média da U.E.  Enquanto esses países mantiveram taxas de investimento publico elevadas, em certos casos mais do dobro da registada no nosso país, o governo português, dominado pela obsessão do défice, reduziu acentuadamente o investimento público. Isso é notório com os governos de Costa/Mário Centeno/Leão que descem para 1,5% do PIB e 1,8% do PIB, cerca de metade da média da U.E. (3,3% do PIB em 2020).  Desta forma a política de “contas certas”, de agrado de Costa/Centeno/Leão e agora de Medina, conduziram o país ao atraso e a divergir cada mais da U.E. Esta política de “contas certas”, a que tudo tem-se de submeter, a obsessão de reduzir o défice seja a que preço for, é ainda mais dramática num período de grave crise económica e social

A ILUSÃO DE QUE AS SANÇÕES VÃO POR DE JOELHOS A RÚSSIA E CAUSAR A FALÊNCIA DO ESTADO RUSSO, ACABANDO COM A GUERRA, O AGRAVAMENTO DAS CONDIÇÕES DE VIDA DOS EUROPEUS E DOS PORTUGUESES, AS MEDIDAS ANUNCIADAS PELO GOVERNO SÃO MANIFESTAMENTE INSUFICIENTES PARA MITIGAR OS EFEITOS JÁ DRAMATICOS DA CRISE, E O FUTURO

No início da guerra na Ucrânia, o governo e os comentadores na comunicação social venderam a ideia de que os efeitos das sanções seriam catastróficos para Rússia, que a colocaria rapidamente de joelhos, e os europeus nada sofreriam. E quer Portugal, em que as importações e exportações para a Rússia eram reduzidas, não seria afetado. Esqueceram-se, por ignorância ou deliberadamente, dos efeitos de bumerangue (ricochete) dessas sanções, que causariam uma degradação enorme nas condições de vida dos europeus e, em particular, dos portugueses, como está a acontecer. E estamos no início, pois contrariamente ao que Medina afirmou na RTP, esta situação não será temporária, até porque a guerra vai se prolongar como o governo americano já anunciou. E isto porque os E.U.A. estão interessados nisso já que deixará a Europa debilitada, dependente e submissa aos EUA. Os EUA são os grandes beneficiados pois não têm de suportar os efeitos dramáticos da guerra, e até criam um mercado enorme para as suas empresas de armas (Ucrânia para onde já foram 4.000 milhões de dólares de  armas que venderam,  e Nato para onde irão muitos biliões que irão vender com o aumento dos orçamentos de defesa dos países).

O dramático é que apesar dos sacrifícios que se está a pedir a todos os europeus devido aos efeitos de bumerangue das sanções elas não conseguirão pôr de joelhos a Rússia, nem fim à guerra. Essa é uma ilusão que tem sido alimentada pelos governos, responsáveis da U.E. e pelos media, mas que não é verdadeira. Recentemente a presidente da Comissão Europeia, a Sra. Úrsula procurou alimentar a mesma ilusão dizendo que “a falência do Estado russo é uma questão de tempo”. Uma prova de que isso é uma ilusão é que depois de se aplicarem mais sanções são necessárias novas sanções. Para além disso países cuja população é mais de metade da população mundial (China, India, Turquia, etc.) recusaram-se a aplicar sanções à Rússia. O que vai acontecer é que haverá países que comprarão petróleo e gás à Rússia a preços mais baixos dos que vigoram no “mercado mundial reduzido”, e a Europa terá de pagar a energia, de que precisa, a preços mais elevados, com consequências graves na economia e na vida das pessoas. E assistir-se-á a uma situação insólita. Os produtos dos países que têm acesso à energia mais barata serão mais competitivos do que os dos países que são obrigados a comprar a energia mais cara. E a substituição do petróleo e gás por outras fontes demora tempo e são caras. Disso não pode haver ilusões mesmo que os políticos digam o contrário com o objetivo de iludir a opinião publica e justificar as suas decisões. Na economia não há almoços grátis nem milagres. Mesmo países como Portugal que já não importam petróleo e gás da Rússia, que é o maior exportador mundial destes dois produtos, se as sanções à Rússia continuarem os preços da energia subirão ainda mais no “mercado reduzido “onde o nosso país compra petróleo e gás. E depois de uma guerra prolongada na Europa a Ucrânia estará totalmente destruída, milhões de refugiados nos países europeus com custos económicos, sociais e políticos enormes (que sirva de reflexão a enorme subida de Marie Le Pen em França), e a obrigação da U.E., ou seja, dos europeus, com a entrada da Ucrânia, de reconstruir um país totalmente destruído e subdesenvolvido que nem é um Estado de direito como disse até Paulo Portas no seu programa semanal. Os tempos futuros serão difíceis, também para os portugueses, que tem uma economia frágil. E é importante que ninguém se iluda nem procure iludir. É de prever também que a supremacia do dólar diminua (é positivo), que o poder da U.E. se reduza ainda mais, e que o mundo e o mercado mundial esteja mais dividido e dualizado (tem aspetos positivos, mas também negativos) e os confrontos entre novos blocos que se criarão (China/Rússia e EUA/U.E.) serão maiores, sendo o mundo mais inseguro e a vida mais cara para os europeus.

As medidas anunciadas pelo governo, para minorar os efeitos dramáticos da crise que o país já enfrentava (a provocada pela pandemia cujos efeitos ainda não tinham terminado) e agora agravados pela guerra, são manifestamente insuficientes. Elas resumem-se às seguintes (pág. 62 do relatório do OE-2022 do XXIII governo): (1) Redução dos impostos e taxas sobre os combustíveis (688 M€); (2) Apoio aos transportes de passageiros e mercadorias (75M€); (3) Apoio através do AUTOvoucher que vai ser substituído por uma maior redução do ISP (133M€);  (4) Subsidio às empresas pela subida do preço do gás (160M€); (5) Redução das tarifas de eletricidade (150M€); (6) Apoio as famílias carenciadas (apenas 55M€, e mais de 1,8 milhões de portugueses vivem abaixo do limiar da pobreza); (7) Apoio aos refugiados (50M€); (8) Apoio à agricultura e pescas (65M€). Todas as outras já constavam da proposta anterior. A quase totalidade dos apoios são destinados a mitigar a escalada dos preços da energia (combustíveis, gás e eletricidade), e os seus efeitos são duvidosos face à liberdade que continuam a ater as empresas para fixar os preços que quiserem. Os apoios aos mais pobres e mais vulneráveis são ridículos (55M€). Mas mesmo esses apoios para reduzir os preços serão inúteis, se não forem tomadas medidas para controlar os preços da energia (margens de refinação, margens de comercialização, etc.) pois só servirão para manter os lucros especulativos das empresas que aproveitam a guerra para os justificarem.  A prová-lo está o facto que o governo logo que anunciou a descida do ISP, as petrolíferas fizeram logo um aumento de 4 cêntimos no preço do gasóleo o que  corresponde, para elas, a um aumento de receita anual de 200 milhões €. Repito, é preciso não esquecer que as empresas continuam a ter a liberdade de fixar os preços que querem em Portugal, pois o governo e a Autoridade da Concorrência nada fazem para os controlar.


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