No mês do lançamento da nova série de TV que aborda, de forma crítica, as incursões dos EUA além fronteiras, o realizador confessou que nem sempre pensou assim. As controvérsias americanas são o forte de Oliver Stone.
O realizador de Holywood dirigiu a sua câmara para o assassinato de John F Kennedy, a guerra do Vietename e os ataques de 11 de Setembro.
Mas, enquanto efectuava uma pesquisa para série de televisão “EUA: a História por contar” foram as incursões americanas no Médio Oriente que prevaleceram na sua memória, afirmou Stone ao MEE.
“Quando estudei a “história por contar” algo que me incomodou fortemente foi a história do nosso envolvimento no Médio Oriente”, disse Stone. “Foi um envolvimento nefasto”
Oliver Stone seguiu o rasto da ingerência de Washington na região até aos anos 1930, mas afirma que o auge foi atingido quando o presidente George H. W. Bush enviou centenas de milhares de tropas para “libertar” o Kuwait após a invasão do Iraque em 1990.
“A União Soviética tinha colapsado recentemente e a região estava escancarada a uma superpotência isolada”, disse.
“Nunca saímos de lá. A partir do momento em que entrámos, ficamos para sempre”, afirmou Stone. “Desestabilizámos toda a região, gerámos caos. E depois culpamos o ISIS pelo caos que nós criámos” acrescentou, referindo-se ao auto proclamado estado islâmico que neste momento ocupa partes do Iraque e da Síria.
Stone pesquisou e escreveu o livro e a série em parceria com Peter Kuznick, um académico da Universidade Americana que se especializou nos ataques nucleares americanos ao Japão que puseram fim à segunda guerra mundial.
“Tem tudo a ver com o petróleo. Lembra-se do autocolante: O que faz o nosso petróleo debaixo das areias deles?” disse Kuznick ao MEE.
“A avidez de Washington por petróleo justifica a sua aliança com a Arábia Saudita, o golpe apoiado pela CIA contra o primeiro ministro iraniano Mohammad Mosaddegh em 1953 e o apoio aos militantes religiosos anti-soviéticos no Afeganistão nos anos 1980”, acrescentou.

“Nós criamos estas confusões, depois temos um grande plano militar para os resolver. E as soluções militares pura e simplesmente não funcionam” disse.
Os pontos de vista de Stone e de Kuznick não suscitam qualquer tipo de surpresa nas ruas de Cairo, Moscovo ou Paris.
Mas nos EUA não são mainstream
Pela forma como Stone os descreve, “os americanos vivem dentro de uma redoma, são alimentados à colher pelo sistema escolar, por políticos e media que retratam os EUA como pilar de estabilidade e uma força do bem no mundo. Um exemplo famoso foi a frase do ex presidente Ronald Reagan que chamou aos EUA uma cidade brilhante no meio de uma colina“.
“É muito reconfortante ser americano”, disse Stone. “Prevalece a noção de que estamos em segurança e somos prósperos de bens materiais, e que temos inimigos em todo o lado – na Rússia, na China, no Irão e na Coreia do Norte. Entramos nesse casulo, onde temos um grande país, dois oceanos, mas estamos sob permanente ameaça”.
Oliver Stone afirma entender tudo isto muito bem pois passou por essa experiência. Foi criado em Nova Iorque, filho de um corrector republicano. Sempre foi criativo – era frequente escrever pequenos contos com os quais entretinha a família – mas “nunca questionou porque razão os seus professores de história insuflavam os EUA”, disse. “Foi-me ministrada apenas parte da história, aquela que enfatizava o excepcionalismo da América”.
Em 1967, Stone ofereceu-se como voluntário no exército e combateu no Vietename. Foi ferido duas vezes e recebeu a medalha Bronze Star por actos de heroísmo e a Purple Heart pelos serviços prestados. “Voltei do Vietename intrigado, completamente confuso sobre o que estava a acontecer por lá,” disse. “Mas fiquei com uma pesada dose de conversa dupla, típica dos militares”
Tempo de questionar
Começou então a fazer perguntas e a ler sobre “história progressiva” ao mesmo tempo que estudava cinema na Universidade de Nova Iorque, com Martin Scorcese e outros professores. Essas ideias alimentaram a sua filmografia politicamente comprometida, na década de 1980.
Salvador (1986) foi baseado em uma guerra na América Central, na década de 1980. Platoon (1986), ponto alto na carreira de realizador de Stone, narra a missão de um jovem soldado no Vietename, protagonisado por Charlie Sheen. Oliver Stone manteve o tema em Nascido a 4 de Julho (1989), com Tom Cruise no protagonista. Em JFK (1991) mostrou a sua teoria da conspiração sobre o assassinato do ex-presidente; filmes como Nixon (1995) e W (2008) melindraram altas patentes.
O lançamento de Snowden (2012) o seu filme sobre Edward Snowden (que estreou em Portugal na passada semana) “foi sendo adiado até 2016”, afirmou.
Oliver Stone entrevistou estadistas estrangeiros que desafiam Washington – desde o revolucionário cubano Fidel Castro até ao deposto Presidente ucraniano Viktor Yanukovich e o presidente russo Vladimir Putin.
A história por contar dos Estados Unidos, uma série de 10 documentários e um livro de 750 páginas, oferece uma perspectiva alternativa da história dos Estados Unidos da América desde a segunda guerra mundial, durante a guerra fria até os dias de hoje.
Stone diz que quer combater o crime “educacional” contra os estudantes americanos.”O excepcionalismo americano tem que ser banido dos nossos currículos,” afirmou.
“Não estamos sob ameaça. Nós somos a ameaça.”