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Segunda-feira, Março 18, 2024

A incapacidade de utilizar os fundos comunitários

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

O atraso crescente do país, o agravamento das condições de vida dos portugueses, e a incapacidade para utilizar de uma forma eficiente e atempada os fundos comunitários do “Portugal 2020”, “PPR” e “Portugal 2030”. A perda de 1258 milhões € de poder de compra dos fundos comunitários só em 2022 devido aos atrasos e à escalada de preços

Neste estudo com dados oficiais, mostro que se verifica um atraso enorme na execução dos programas comunitários, “PORTUGAL 2020”, “PRR” E “PORTUGAL 2030”, o que está a causar graves prejuízos ao país e aos portugueses, acentuando o atraso de Portugal na U.E. e a baixa das condições de vida dos portugueses, assim como a perda de poder de compra dos fundos comunitários de muitas centenas de milhões € devido à escalada de preços. E apesar do presidente da República só ter acordado agora e chamado a atenção para a gravidade da situação o governo nada mudou. E esclareço que a impugnação das eleições para a ADSE feita pela Lista F, que só teve 1,3% dos votos, afinal não era impugnação, o que queria é que fossem anulados os votos da lista B vencedora com 35,2% dos votos e mais mandatos.

 

Estudo

O atraso crescente do país, o agravamento das condições de vida dos portugueses, e a incapacidade para utilizar de uma forma eficiente e atempada os fundos comunitários do “Portugal 2020”, “PPR” e “Portugal 2030”. A perda de 1258 milhões € de poder de compra dos fundos comunitários só em 2022 devido aos atrasos e à escalada de preços

A quebra no investimento quer total quer publico em Portugal tem contribuído para o atraso do país e para fragilidade enorme da economia portuguesa e para o baixo nível das condições de vida dos portugueses. Os setores que mais se têm desenvolvido são de baixa e media tecnologia, e inovação, e de baixos salários (ex. o turismo). E vai-se provar.

Quadro 1– O investimento (FBCF) total e público médio na União Europeia e em Portugal medido em % do PIB

Excetuando o ano de 2010, em todo o período 2011/2021, o investimento total e público em Portugal, medido em % do PIB, foi muito inferior à média dos países da União Europeia. Em Portugal, tantos os governos de PSD/CDS/Troika como os do PS Costa/Centeno/Leão e agora Costa/Medina têm cortado drasticamente no investimento público para reduzir o défice orçamental (em média entre 19,4% e 33,3%), com consequências dramáticas para o país e para a vida dos portugueses. Esta taxa investimento sempre inferior à média da U.E. teve como consequência que a taxa média de crescimento económico (PIB) no período 2010/2021 (12 anos) foi na U.E. de 1,3%/ano e, em Portugal, de apenas 0,8% (-38,5%) segundo o Eurostat. O atraso do nosso país em relação à média da U.E. aumentou Face a este quadro dramático gerador de atraso e de baixas condições de vida, a insensibilidade e mesmo irresponsabilidade como o governo e empresários encaram os atrasos na utilização/execução atempada e eficiente dos fundos comunitários que têm sido postos à disposição do país para o modernizar e desenvolver é chocante. Há vários anos a esta parte que temos chamado a atenção em vários estudos que publicamos para este facto que tem causado enormes prejuízos ao país, mas pouca atenção tem tido. Só este ano é que o presidente da República “acordou” para este atraso sistemático que tem condenado Portugal ao subdesenvolvimento e a ser ultrapassado por países que antes estavam na cauda da União Europeia. Eliza Ferreira, comissária europeia, já em 14/12/2020 reconheceu que “há coisas que têm de ser corrigidas” e que a aplicação dos fundos europeus “tem de ser radicalmente diferente da reprodução do passado” tendo alertado que Portugal corre o “risco” “a ser ultrapassado por muitos outros”. Mesmo depois do presidente da República ter “acordado” e ter chamado a atenção para este facto, o governo, veio dizer que tudo estava bem, portanto nada ia mudar e os objetivos seriam cumpridos. E os responsáveis pelos respetivos programas comunitários, obedientemente repetiram o mesmo embora um deles (o do PRR) tenha dito que a “máquina do Estado mostra incapacidade”. Mesmo assim tudo continua “alegremente” na mesma sem que se tomem as medidas.

O QUADRO FINANCEIRO PLURIANUAL “PORTUGAL 2020”, CUJOS FUNDOS COMUNITÁRIOS PODIAM E DEVIAM SER UTILIZADOS NO PERIODO DE 2014-2020, EM SET.2022 ESTAVAM POR UTILIZAR 5647 MILHÕES €

De acordo com o Boletim nº 30 de set.2022 da Agência para o Desenvolvimento e Coesão, IP, que é o instituto publico responsável pela monotorização da execução do “Portugal 2020” financiado com 26.546 milhões € de fundos comunitários para serem utilizados no período 2014/2020, o nível de execução é o que consta do quadro seguinte que construímos com os dados divulgados por esta agência do governo que estão disponíveis a todos interessados.

Quadro 2 – Execução do quadro financeiro “PORTUGAL 2020” para executar no período 2014 a 2020

Como revelam os dados oficiais divulgados pela A&D,IP, dos 26546 milhões € de fundos comunitários disponibilizados a Portugal, no período 2014/2020 o nosso país só utilizou 14670 milhões, ou seja, apenas 55,3% do que podia utilizar, ficando por executar 11.876 milhões € de fundos comunitários. Como o nosso país não executou a totalidade dos fundos comunitários no período em que podia fazer (2014/2020) pediu um prolongamento do prazo de execução. Mas em set.2022, quase dois anos após o período em que o PORTUGAL 2020” podia e devia ser utilizado para benefício do desenvolvimento do país e para o melhoramento das condições de vida dos portugueses ainda estavam por executar financeiramente 5647 milhões € (21,3%). Este atraso é dramático para o país, para as empresas e para os portugueses. É investimento que não se fez e podia ter sido feito; é emprego mais qualificado que não se criou levando muitos jovens a abandonar o país à procura de melhores condições de vida; é riqueza (PIB) que não foi criada causando o atraso do país, e a sua ultrapassagem por outros países da U.E. E a juntar a tudo isto uma perda enorme de poder (418 milhões € apenas em 2022) devido à escalada de preços, o que determina que, com o mesmo dinheiro (€),se realize muito menos, ou então que se abandonem os projetos inicialmente aprovados. E multiplicando pelos anos de atraso a perda é enorme.

OS ATRASOS REPETEM-SE E ACUMULAM-SE NO “PRR”, A “FAMOSA “BAZUCA” QUE COSTA TANTO FALAVA NA SUA PROPAGANDA ELEITORAL, MAS QUE AGORA ESTÁ SILENCIOSO

O que está a acontecer com o PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) é a repetição do que aconteceu com o “PORTUGAL 2020”, mostrando que o governo nada aprendeu com a experiência passada

Quadro 3 – Nível de execução do PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) até 30.11.2022

O PRR é para ser executado no período 2021 a 2026, e foi decidido que não haveria prolongamentos dos prazos. Os países que o não executarem totalmente até 2026, a parcela não utilizada será definitivamente perdida.

De acordo com a programação financeira, Portugal teria de utilizar (pág. 318), em 2021, 2.526 milhões €, sendo 1418 milhões € de empréstimos; e, em 2022, 3318 milhões €, sendo apenas 479 milhões € de empréstimos. Em resumo, Portugal, de acordo com a programação financeira constante do próprio PRR , nos anos 2021 e 2022 devia ter executado/utilizado 5.844 milhões €, sendo 3948 milhões € de fundos comunitários e 1896 milhões € de empréstimos. No entanto, até 30 de novembro de 2022, Portugal tinha recebido da U.E. apenas 3.321 milhões €, ou seja, 56,8% do previsto receber nos dois primeiros anos, mas pago apenas 1127 milhões €, ou seja, somente 33,9% do recebido. Em suma, está-se a repetir no PRR o que aconteceu no “Portugal 20202”, mas aqui com diferença de que o não utilizado até 2026 o país perderá definitivamente. Não haverá prolongamento de prazos como aconteceu no “Portugal 2020”. Os atrasos pagam-se caros não só porque o que não for utilizado até 2026 é perdido, mas também porque o utilizado, devido à escalada de preços, para fazer o mesmo tem-se de pagar muito mais. Considerando apenas a perda de poder de compra do não recebido e do recebido mas não pago, a perda de poder de compra já atinge 353 milhões € só em 2022.

O QUADRO FINANCEIRO PLURIANUAL “PORTUGAL 2030” QUE DEVIA SE TER INICIADO EM 2021, AINDA NÃO COMECOU A SER EXECUTADO EFETIVAMENTE

O chamado “PORTUGAL 2030” é o Quadro Financeiro Plurianual para o período 2021/2027 financiado pela União Europeia. Como se pode ler no respetivo portal, “O Portugal 2030 materializa o Acordo de Parceria a estabelecer  entre Portugal e a Comissão Europeia, fixando os grandes objetivos estratégicos para aplicação, entre 2021 e 2027, do montante global de 22955 milhões € de fundos comunitários, a que se juntam obrigatoriamente 8493,5 milhões € de fundos nacionais, num total de 31488,5 milhões €”. Dividindo apenas a parcela de fundos da U.E. (22955 milhões €) pelos 7 anos em que podia e devia ser utilizado/executado (2021/2027), dá uma média 3285 milhões € por ano. Considerando 2021 e 2022, obtém-se 6083,3 milhões € que deviam ser utilizados mas não foram, pois a pergunta que imediatamente se levanta é naturalmente a seguinte: O que foi já realizado/utilizado do “PORTUGAL 2030” nestes dois anos (2021 e 2022) que já praticamente passaram? Como consta do respetivo portal (https://eurocid.mne.gov.pt/portugal-2030 ) “ Os primeiros avisos de concurso estão previstos para o final do ano, início de 2023”. Portanto NADA. E a perda de poder dos 6083,3 milhões € apenas em 2022 atinge 486,7 milhões €. Por inercia ou incapacidade e falta de responsabilidade o país vai assim perdendo fundos comunitários.

AS TRANSFERÊNCIAS DE FUNDOS DA UNIÃO EUROPEIA PARA PORTUGAL TÊM UM ELEVADO CUSTO PARA PAÍS

Muitos talvez pensem que as transferências de fundos da U.E. para Portugal são de “borla” e o nosso país não tem de pagar nada por isso. Mas a realidade é muito diferente. Portugal também transfere muito dinheiro para o orçamento da União Europeia que tem como origem os impostos pagos pelos portugueses.

Quadro 4 – Transferências de Portugal para a U.E., e da U.E. para Portugal – 2015/2022 – Milhões €

Em oito anos (2015/2022), as transferências de fundos feitas por Portugal para o orçamento da U.E. – 16298 milhões € – representaram 44,9% do que recebeu da União Europeia no mesmo período (36271,7 milhões €). Mas custos para o nosso país não são apenas estes. É a Comissão Europeia que no fundo decide aquilo em que o nosso país pode gastar/fazer com o que recebe da U.E. Para além disso, impões limites regidos quanto ao défice orçamental e à divida publica e se Portugal não respeitar pode ser severamente punido. A U.E. decidiu desencadear uma guerra económica contra a Rússia, por esta ter invadido a Ucrânia, que está a destruir mais a U.E. do que Rússia, pois está a determinar uma escalada dos preços e taxas juros, devido à multiplicação de sanções e à retaliação da Rússia, com consequências dramáticas para os portugueses, nomeadamente para as classes medias e de baixos rendimentos, e a ruina da economia nacional (muitas empresas portuguesas estão a desaparecer devido ao aumento de custos e a redução drástica das vendas causada pela quebra dramática no poder de compra da população), e o governo cumpre obedientemente as ordens de Bruxelas. E agora a C.E. aprovou ainda mais sanções, como as anteriores já não fossem suficientes, proibindo a compra de petróleo russo a um preço superior a 60€/barril, e a Rússia já anunciou que o não venderia aos países que não aceitassem o preço de mercado, e também a importação de gasóleo da Rússia, apesar da capacidade de refinação existente na U.E. não ser suficiente para satisfazer o seu consumo, o que causará que a escalada de preços vai continuar.

E como a guerra vai continuar e a Ucrânia a ser destruída, será a U.E. que terá de a reconstruir com dinheiro dos contribuintes europeus incluindo portugueses. A C.E. pretende já em 2023 financiar a Ucrânia com 18000 milhões €, e serão os países da U.E., incluindo Portugal, que terão de pagar. E quando a Ucrânia ingressar na U.E. uma parte dos fundos que vêm agora para Portugal irão para a Ucrânia por ser um país ainda muito menos desenvolvido do que Portugal. Eis a realidade e a verdade que ninguém quer dizer aos portugueses.


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