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Quinta-feira, Março 28, 2024

A teoria de Costa para recusar a subida de salários

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Os dados de Medina sobre as remunerações do Estado continuam a não bater certo, o disparar das aquisição de serviços privados (o reforço no OE-2022 para aquisições é 4,2 vezes superior ao para despesas de pessoal), o financiamento de prescrições do SNS pela ADSE, a estafada teoria de Costa para recusar a subida de salários, a estratégia de destruição da A.P. e o processo Kafkiano contra mim

Neste estudo, analiso quatro questões que são importantes para os trabalhadores da Função Pública, mas também para os trabalhadores do setor privado, pois a politica de não ajustamento de salários na Função Pública face à escalada de preços, é um forte incentivo para que os patrões privados tentem fazer o mesmo escudando-se na posição deste governo de maioria absoluta que será naturalmente obediente ao que diz e faz António Costa.

 

Estudo

Os dados de Medina sobre as remunerações do Estado continuam a não bater certo, o disparar das aquisições de serviços privados (o reforço no OE-2022 para aquisições é 4,2 vezes superior ao para despesas de pessoal), o financiamento de prescrições do SNS pela ADSE, a estafada teoria de Costa para recusar a subida de salários, a estratégia de destruição da A.P. e o processo Kafkiano contra mim

Neste estudo vamos analisar 4 questões, a saber: (1) Mostrar que os dados utilizados por Fernando Medina nas entrevistas que deu aos media como os que constam no “Relatório- elementos objeto de correção” que enviou à Assembleia da República em 26/4/2022 não batem certo com os dados dos “Mapas Informativos” da Proposta do OE-2022; (2) Um esclarecimento aos beneficiários da ADSE sobre o pagamento pela ADSE de atos constantes de prescrições do SNS que está a causar muitas duvidas; (3) Uma multa que o Tribunal de Contas me aplicou por uma situação que prejudicava os beneficiários da ADSE nas não criada por mim ; (4) A estafada teoria de Costa para não ajustar as remunerações da Função Pública à inflação e a ajuda que dá aos patrões privados para fazerem o mesmo.

 

O AUMENTO DESPESA DE PESSOAL DO ESTADO É APENAS DE 1,3% ENTRE 2021 E 2022, VERIFICANDO-SE UMA REDUÇÃO NAS REMUNERAÇÕES CERTAS E PERMANENTES EM 28,2M€ O QUE CONTRADIZ FERNANDO MEDINA

No “site” da DGO do Ministério das Finanças está disponível não só a nova proposta de OE-2022, mas também os “Mapas Informativos” com a despesa detalhada por classificação económica que utilizamos para construir o quadro 1. Para tornar o quadro publicável, pois ele é extenso, incluímos apenas as principais rúbricas, mas o leitor interessado encontrará o quadro completo no “site” do Ministério das Finanças (www.dgo.pt).

Quadro 1 – Despesas com Pessoal do Estado previstas para 2021 e 2022 – Ministério das Finanças

O Orçamento do Estado abrange a Administração Central que tinha em dez.2021, segundo a DGAEP, 554306 trabalhadores o que correspondendo a 75,6% dos trabalhadores de todas as Administrações Públicas. Contrariamente ao que consta da “Errata” enviada em 26/4/2022 pelo Ministério das Finanças à Assembleia da República onde se diz que em 2022 se verificará “um aumento do salário médio dos trabalhadores em funções públicas superior a 2,5%.», as “Despesas de pessoal “ aumentam apenas 1,3%, registando-se uma redução de 1,8% na “massa salarial” inscrita no OE-2022, ou seja, nas “Remunerações certas e permanentes”, e um corte de 440 milhões € nas remunerações certas e permanentes para o “Pessoal do quadro- Regime da Função Pública”. E o governo diz que pretende contratar mais 8.100 funcionários públicos, introduzir o regime de dedicação plena no SNS e aumentar a percentagem de USF para 80%. Tudo isto envolve mais despesa, mas inscreve menos meios financeiros no OE-2022 do que em 2021.

 

ENTRE 2021 E 2022, A DESPESA COM PESSOAL DO ESTADO AUMENTA 234,9 MILHÕES €, MAS A DESPESA COM AQUISIÇÃO DE SERVIÇOS A PRIVADOS SOBE 989,9 MILHÕES, A ESTRATÉGIA DE DESTRUIÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Não há dinheiro para atualizar as remunerações trabalhadores devido à escalada de preços, nem para contratar trabalhadores com as competências necessárias, mas já há para pagar a aquisição desses serviços a privados (q2)

Quadro 2 – Despesas previstas com “Aquisição de serviços a privados ”-Total e principais rúbricas – 2021/2022

Entre 2021 e 2022, as “Despesas com Pessoal” previstas aumentam apenas em 234,9 milhões € (+1,3%), enquanto as despesas com “Aquisições de serviços a privados” crescem em 989,95 milhões €, ou seja, 4,2 vezes mais. É evidente a intenção de destruir os serviços públicos através do estrangulamento financeiro para entregar a sua realização a empresas privadas que obtêm assim elevados lucros à custa do Orçamento do Estado. Estrangula-se e destrói-se os serviços públicas para criar mercado lucrativo para as empresas privadas à custa do Orçamento do Estado. Em áreas em que se exige competências elevadas, como são aquelas que constam do quadro 2 a situação na Administração Pública é dramática. Estão já nas mãos de empresas privadas que cobram o dobro ou o triplo do que se paga aos mesmos técnicos na Administração Pública (por ex. na ADSE os sistemas de informação já estão totalmente dependentes de empresas externas, e mesmo o trabalho delas é difícil fiscalizar e tirar proveito devido à falta de técnicos internos com as competências necessárias). Nas áreas fundamentais para a modernização e digitalização da Administração Pública os aumentos de despesa previstos com “Aquisição de serviços” a empresas privadas atinge em média 35% em 2022.

A estratégia de destruição da Administração Publica para dar espaço aos grupos privados é clara. Degrada-se ao máximo as remunerações dos trabalhadores tornando a Administração Pública não atrativa para os trabalhadores mais qualificados e levando muitos dos que existem a abandoná-la. Criam-se o máximo de dificuldades à contratação de novos trabalhadores através de obstáculos burocráticos (na ADSE está-se há mais de 2 anos a fazer um concurso para a contratação de assistentes técnicos que ainda não terminou, e para suprir a falta de trabalhadores compram-se dezenas de milhares de horas a empresas de trabalho temporário a quem se paga 7€/hora). Aumenta-se as dotações para despesas com pessoal de uma forma irrisória (1,3%), mas as destinadas a aquisição de serviços aos privados crescem de uma forma absurda e inaceitável (em média 35%), quando esses mesmos serviços podiam ser realizados de uma forma muito menos cara se se dotasse os serviços com recursos que eles necessitam. É a privatização encapotada dos serviços públicos pondo estes dependentes e controlados pelos privados e transformando assim a Administração Pública numa fonte de lucro para os privados à custa do OE. É esta a realidade atual da Administração Pública que poucos têm a coragem de denunciar e que o OE-2022 de Fernando Medina e do governo de maioria absoluta do PS vai agravar ainda mais.

 

OS ATOS DAS PRESCRIÇÕES DO SNS A BENEFICIÁRIOS DA ADSE PODEM SER FINANCIADOS PELA ADSE

Uma das matérias que tem levantado mais dúvidas e protestos dos beneficiários da ADSE é saber se a ADSE financia ou não a realização de exames, análises, etc. prescritos pelo SNS (ex.: Centros de Saúde). A resposta a esta questão está a meu ver, como membro do conselho diretivo da ADSE representante dos beneficiários na interpretação correta do que dispõe a lei que vou transcrevê-la para que fique claro para todos os beneficiários.

O nº1 do art.º 182 da proposta atual da lei do OE-2022, que é uma copia dos mesmos artigos publicados em Leis do Orçamento do Estado anteriores, diz textualmente o seguinte: Artigo 182.º Encargos com prestações de saúde no Serviço Nacional de Saúde – “São suportados pelos orçamentos do SNS e do SRS, respetivamente, os encargos com as prestações de saúde realizadas por estabelecimentos e serviços do SNS ou dos SRS da Madeira e dos Açores, ou por prestadores de cuidados de saúde por estes contratados ou convencionados, aos beneficiários: a) Da ADSE, I. P., regulada pelo Decreto-Lei n.º 118/83, na sua redação atual; (b) Da SAD da GNR e da PSP;(c) Da Assistência na Doença aos Militares das Forças Armadas (ADM).

A conclusão que, a meu ver, se tira desta disposição legal é que a realização de atos (exames, analises, etc.) constantes de prescrições do SNS são financiados pela ADSE desde que esses atos não sejam realizados em serviços do SNS ou em SRS dos Açores e da Madeira e desde que não sejam também realizados em prestadores privados que tenham convenções ou contratos assinados com o SNS ou os SRS. Se tiverem o prestador não pode recusar a realização dos atos, mas esses atos são pagos pelo SNS ou pelos SRS no caso de ter convenção ou contrato com eles desses atos.

Portanto, o beneficiário com uma prescrição do SNS ou SRS têm a liberdade total de escolher o prestador que quiser, no entanto deve perguntar ao prestador se ele tem convenção ou contrato com o SNS ou SRS. E se o prestador tiver esse ato na convenção ou contrato ele tem de ser suportado pelo SNS ou pelo SRS e não pela ADSE. Se na convenção ou contrato que tiver o prestador com o SNS ou o SRS não constar o ato que o beneficiário pretende realizar, esse ato, mesmo com uma prescrição do SNS, é financiado pela ADSE. O mesmo acontece em relação aos prestadores que não tenham convenção ou contrato com o SNS ou com os SRS. Nestes casos a realização dos atos constantes da prescrição do SNS são financiados sempre pela ADSE. O cuidado que devem ter os beneficiários é perguntar ao prestador se ele tem contrato ou convenção com o SNS ou com SRS no ato que pretende realizar e que consta da prescrição do SNS, e no caso de ele ter o ato ou atos que pretende realizar na convenção ou contrato com o SNS ou com os SRS, esse ato é pago por estas entidades. Se não constarem da convenção ou do contrato com o SNS ou SRS é a ADSE que financia. Em resumo, e repetindo para não haver dúvidas. Em relação aos prestadores que não têm convenção ou contrato com o SNS ou com o SRS os atos realizados neles, mas prescritos pelo SNS ou pelos SRS são financiados pela ADSE nos termos das Tabelas do Regime Livre e do Regime convencionado. O mesmo acontece nos prestadores que tenham convenção ou contrato com o SNS ou com o SRS, mas esses atos não constam da convenção ou contrato assinado com estas entidades. Se constarem elas (SNS e SRS) que têm de pagar, segundo a Lei do Orçamento do Estado. E é importante que tanto os beneficiários como os prestadores estejam atentos e respeitem esta norma legal pois se não for respeitada a ADSE está impedida, por lei, de os pagar E isto porque os beneficiários da ADSE, são cidadãos como os outros, e financiam o SNS com os seus impostos, e têm os mesmos direitos ao SNS como os restantes portugueses. Se naqueles casos os atos fossem pagos pela ADSE estavam a pagar duas vezes: uma com os seus impostos que financiam o SNS e outra com os descontos para a ADSE.

Ao defender os seus direitos como cidadão estão também a contribuir para a sustentabilidade da ADSE pois despesas que, por lei, devem ser financiadas pelo SNS estavam a ser pagas com os seus descontos ficando menos na ADSE para financiar os custos de saúde cada vez maiores à medida que a idade aumenta e os descontos em euros diminuem. E isto porque 3,5% sobre as remunerações no ativo é mais em euros do que 3,5% sobre as pensões, porque estas são inferiores aquelas. Informo também os beneficiários que, por despacho da Ministra da Saúde, os médicos dos do SNS estão proibidos de escrever na prescrição que a entidade financiadora é a ADSE como acontecia.

 

A ESTAFADA “TEORIA” DE COSTA QUE COMPENSAR OS TRABALHADORES DA ESCALADA DE PREÇOS CAUSA INFLAÇÃO

Antes Medina e agora Costa, para recusar um ajustamento das remunerações dos trabalhadores da Função Pública visando evitar uma nova redução do seu poder de compra que já é inferior ao de 2010 em média em -17%, vieram com estafada teoria defendida também pelos patrões de que os aumentos dos salários causam a escalada da inflação.

No nosso estudo de 17/4/2022 provou-se que um aumento de 5% nos gastos de pessoal das empresas portugueses, tendo em conta a sua estrutura de custos, causaria um aumento de preços no máximo de 0,9%. Na Administração Publica causaria um aumento na Despesa Total de 1%. A recusa deste governo em ajustar as remunerações dos seus trabalhadores perante a escalada de preços é um incentivo para os patrões privados fazerem o mesmo. A verificar-se isso, registar-se-á uma quebra nas vendas das empresas, a falência de muitas delas, e uma crise prolongada e grave. Manter o poder de compra interno é fundamental para a sobrevivência dos portugueses e da economia.

UM PROCESSO KAFKIANO: o Tribunal de Contas aplicou-me uma multa e obrigou a repor dinheiro que não tinha  recebido, superior remuneração mensal líquida devido à utilização de uma viatura que nunca a utilizei nem entrei nela

Para que esta situação insólita possa ser compreendida é necessário contar a história desde o princípio. Quando entrei para o conselho diretivo da ADSE foi-me perguntado se estava interessado em que me fosse distribuído uma viatura da ADSE. Eu recusei respondendo que sempre tinha andado de metro e de autocarro e que não ia mudar de hábitos, até para que não houvesse confusão e promiscuidade entre o que era pessoal e o que era profissional. E foi sempre o que aconteceu desde que estou no conselho diretivo da ADSE eleito pelos representantes dos beneficiários No entanto a anterior presidente do conselho diretivo da ADSE, já substituída, tinha um carro da ADSE distribuído que utilizava todos os dias para todas as deslocações, incluindo da ADSE/casa e casa/ADSE. Como vivia na Ericeira aparecia todos os meses uma despesa da via verde tendo de ser assinada a autorização por todos os membros do conselho diretivo porque na ADSE não há delegação de competências já que nunca houve consenso nesta matéria.

Eu sempre pensei que ela utilizasse a viatura de acordo com o disposto na lei. Nunca pensei que competia a um membro do conselho diretivo fiscalizar (ser polícia) da forma como a presidente do conselho diretivo utilizava a viatura que lhe tinha sido atribuída. No entanto, com andar do tempo constatei que apareciam para autorizar faturas da via verde com idas e vindas da Ericeira onde ela vivia com frequência elevada e, então, para tornar clara a minha posição comecei a pôr em relação a elas o seguinte despacho “AUTORIZO SE FOR EM SERVIÇO”. Apesar do Tribunal de Contas ter feito auditorias periódicas a ADSE só a partir do meu despacho é que ele decidiu fazer uma auditoria a que chamaram de conformidade. E aplicaram-me uma multa e a obrigação de repor as importâncias das despesas com a viatura utilizada pela ex-presidente da ADSE (o mesmo aconteceu com outros membros do conselho diretivo). E tive de pagar uma multa de 2550€ mais a reposição de uma parte da despesa da viatura da ADSE utilizada pela anterior presidente que consideraram um benefício pessoal para ela, o que somado foi superior à minha remuneração mensal. E eu, que não tive qualquer benefício ou vantagem, pois nunca utilizei nem entrei na dita viatura, acabei por ser penalizado. Eis o que acontece também na Administração Pública a quem defende a utilização correta dos descontos dos beneficiários.

Divulgo este facto não é só pela injustiça que tal multa e reposição encerram, pois sem o meu despacho o Tribunal de Contas nunca teria “descoberto” tal situação, mas para que os beneficiários saibam os riscos que se correm por defender os seus interesses na ADSE. Apesar de tudo, e do prejuízo que me acarretou, valeu a pena pois acabou com a prática que existia na ADSE de distribuir viaturas a membros do conselho diretivo que as utilizavam como queriam, e cujos custos eram suportados com os descontos dos beneficiários. Mas isso pode levar muitos a não tomarem qualquer atitude para pôr fim a situações incorretas e que causem mesmo prejuízos aos beneficiários para que não tenham de suportar processos, multas e repor valores que não receberam. Não deixa de ser um incentivo ao silêncio.

As elevadas dividas que o Estado deve à ADSE – cerca de 142 milhões € – e o que a ADSE pagou a mais aos prestadores privados de acordo com as regras da Tabela do Regime convencionado da ADSE (as “regularizações” que somam já dezenas de milhões de euros) continuam por receber. E o que era importante é que o Tribunal de Contas se empenhasse para que o Estado pagasse o que deve a ADSE, pois esta sozinha dificilmente o conseguirá (já tentou, mas sem qualquer êxito), o que contribuiria para aumentar a sustentabilidade da ADSE, e para que os beneficiários, agora contribuintes líquidos, quando se aposentassem, que passam a ser beneficiários líquidos, poderem contar com a ADSE com o paradigma que atualmente tem.


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