
No aniversário do assassínio de Sheikh Mujibur Rahman
Assinala-se hoje o quadragésimo segundo aniversário do golpe militar que massacrou o então Presidente da República do Bangladesh, Sheikh Mujibur Rahman, e toda a sua família, incluindo mulheres, uma delas grávida, e crianças.
- 15 Agosto, 2017
- Paulo Casaca, em Bruxelas
- Posted in Opinião
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A data é assinalada como dia de luto nacional no Bangladesh e foi também assinalada pela Liga Awami do Bangladesh na Bélgica, que me convidou a falar na ocasião e que me deu assim a oportunidade de reflectir sobre a importância de Mujibur Rahman na afirmação do secularismo no mundo muçulmano.
Como muitos outros muçulmanos da Índia, o jovem bengali muçulmano Mujibur Rahman acreditou na necessidade da partição da Índia na base das suas duas principais identidades religiosas e que essa partição seria possível sem originar brutais limpezas étnicas e sem transformar o Paquistão num estado confessional.
Mujibur Rahman como o líder do Bangala Ocidental
Mujibur Rahman impõe-se ao longo das décadas seguintes como o líder do Bangala Ocidental, entremeando longas estadias nas prisões paquistanesas, com o activismo social e político onde se vai erguendo uma agenda política matizada pelo nacionalismo bengali, pela democracia, pelo secularismo e pelo socialismo. Passa brevemente pela administração do Bengala Oriental na sequência de episódicas eleições regionais, e torna-se no secretário-geral da ‘Awami Muslim League’, mais tarde apenas ‘Awami League’.
Quando, finalmente, se realizam as primeiras eleições nacionais livres paquistanesas, a 7 de Dezembro de 1970, Mujibur Rahman consegue a proeza não só de obter quase todos os lugares em disputa no Bengala Oriental mas de obter uma maioria absoluta parlamentar em todo o Paquistão, em eleições que penalizam fortemente os partidos islamistas.

Independência do Bangladesh
As autoridades paquistanesas apoiadas por milícias formadas por extremistas islâmicos lançam uma campanha de repressão no país tendo por alvo toda a intelectualidade bangladeshi e todos os não muçulmanos, com um número de vítimas que as autoridades
A formação do Paquistão é influenciada pelo afrontamento bipolar mundial, e o país é visto como uma zona tampão que impede a junção entre a União Soviética e a Índia. Nos anos setenta do século passado, esta é também a perspectiva chinesa.
O genocídio do Bangladesh…
No Bangladesh a muralha de silêncio foi muito menos eficaz, tanto porque o Embaixador dos EUA, Archer Blood, se recusou a alinhar na política traçada pela Administração Nixon (o ‘telegrama Blood’ continua a ser uma das principais bases documentais sobre a tragédia) como pela voz livre de alguns jornalistas de origem paquistanesa (Anthony Mascarenhas é o mais conhecido) como ainda, e fundamentalmente, porque algumas personalidades do mundo da cultura se dedicaram
O Bangladesh obtém a independência mas não obtém a paz. Impossibilitado de perseguir em justiça os autores paquistaneses dos crimes, confrontado com um país totalmente saqueado que foi submetido a catástrofes naturais de uma enorme dimensão, contando apenas com a solidariedade da Índia, com os dirigentes islamistas exilados em conspiração, o Bangladesh sobrevive dificilmente entre instabilidade e fome em massa até ao golpe militar de 1975.
Como nos explica em recente artigo do The Asian Age, August 1975: When the lights went out, o articulista Syed Badrul Ahsan, momentos depois do massacre, a rádio oficial noticiava a conversão do Bangladesh em República Islâmica, deixando assim clara a lógica ideológica do golpe.
… como Jihadismo moderno
Como tento explicar no livro de que sou o principal editor saído recentemente (Terrorism revisited) aquilo que o Ocidente vê como uma vaga de terrorismo, é a ponta do iceberg de uma paranoia ideológica colectiva que fez a moderna Jihad que tem muito em comum com as outras duas grandes
Quem quiser compreendê-la vai ter de entender a sua história e o papel principal do ‘Jamaat e Islam’ e do seu fundador, Maulana Maududi. A leitura que faço dessa história é que temos de nos juntar e escutar, aqueles que no mundo muçulmano, por exemplo, no Egipto, no Irão ou no Bangladesh, compreenderam melhor que quem quer que seja no Ocidente, o que temos pela frente e como devemos enfrentar o fanatismo jihadista.
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About author
Foi deputado no Parlamento Europeu de 1999 a 2009, na Assembleia da República em 1992-1993 e na Assembleia Regional dos Açores em 1990-1991. Foi professor convidado no ISEG 1995-1996, bem como no ISCAL. É autor de alguns livros em economia e relações internacionais.