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Domingo, Setembro 15, 2024

Há anos no subúrbio, Marta desiste

João Vasco AlmeidaO metro na Reboleira faz de Marta uma mulher feliz, subúrbio perto, agora sim, menos de dez minutos ao Colombo, roupa da Primark para a Catarina, gasta-se muito, os sapatos então, é o que dá os miúdos.

Antes, pior: a camioneta levava quase duas horas do Vale Abraão até ao Marquês, Marta ainda na Autónoma, à noite regressava e fazia com a mão os contornos dos candeeiros, como se desenhasse uma linha de luz que ia fazendo ondas na janela.

Marta melhor, agora, ela e Catarina a dez minutos do Colombo, Catarina na escola, ela com avental de uma padaria portuguesa. Leva a filha ao pai aos fins de semana descasados, mas o Carlos pede sempre para a receber sábado depois de almoço e que a vá buscar domingo antes das três, que tem futebóis com a malta e Marta vai e Marta cumpre e Marta outro dia espantou-se com um rapaz no balcão da padaria, que nem lhe deu um piropo estúpido nem a cortejou à velho, foi só “olá”.

A estação da Reboleira e o “Olá”, já não se fazem ondas no metro, a Catarina daqui nada no sétimo, ela a ver as madeixas a esbranquiçar mas contente com isso, um dia, um dia, eles dizem que vai tudo melhorar, o Carlos nem sabe o que perdeu quando disse, ela grávida de quatro meses, “vou-me embora, não te suporto mais e não estou preparado para ser pai” e no dia seguinte o Sócrates anunciava a bancarrota, com a Samanta ao lado, ou quem era, Marta sabe lá.

tango, dança

 

“Olá”, bastou, e quando voltou a pedir o croissant misto ela imaginava-o a beber café, mas foi tília, ela abriu muito os olhos e nessa noite viveu num castelo, foi buscar os álbuns do Hopper e do Klimt e imaginou-se em Edimburgo pelas fotos, a Catarina a dormir numa nuvem, a seguir à Reboleira a estação era uma arcada e lojas da Via Veneto.

Há duas semanas telefonou ao Carlos a dizer que se ia mudar com o António para uma casa que estão a recuperar ao pé de Santiago. De Compostela. Se ele quiser ver a Catarina que se mexa. António já planta as tílias e a menina entra no ano que vem em Salamanca (já viu o sapo na cabeça da caveira).

Marta leva um tailleur quando conduz os peregrinos. Mas em casa tem uns calções bestiais, com um padrão que é a linha de metro. António adora-os.

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