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João de Sousa

Sexta-feira, Abril 19, 2024

Muros: excluem os de fora ou sequestram os de dentro?

João de Sousa
João de Sousa
Jornalista, Director do Jornal Tornado

muros

 

Historicamente as lições a retirar dos muros não dão margem para grandes debates. Qualquer observador imparcial admitirá sem contestação que o Muro de Berlim foi uma ferramenta do Poder contra os cidadãos da extinta Alemanha Democrática. A lógica de qualquer muro, muito mais que impedir a entrada do Outro, é criar e manter um ecossistema ideológico “puro”, a salvo de mais que prováveis contaminações espúrias provenientes do “mundo exterior”.

“Não saber”, “não conhecer”, são pilares da fórmula testada com êxito de “não desejar”, suprimindo o “contágio” na origem. Ninguém deseja o que não sabe que existe ou que é possível. A isto chama-se obscurantismo e tem servido de alicerce a todos os ditadores e ditaduras. Entre outros, nos nossos dias, o regime da Coreia do Norte é o que melhor ilustra esta ideia.

O mundo já conheceu de perto os efeitos que um muro produz com a existência e queda do Muro de Berlim. É pacífico afirmar que este muro serviu mais para sequestrar aqueles que estavam do lado de dentro, limitando-lhes o acesso à informação e ao conhecimento, que para suster potenciais “invasões” dos que se encontravam no seu exterior. Se alguma questão havia era a de prevenir a entrada de informação muito mais que a de pessoas. Nada como reduzir as opções a uma única para atalhar esse vírus que o conhecimento propaga.

Todos recordamos a alegria e a explosão de emoções construídas, pedra a pedra, com os escombros desse obstáculo que dividia uma nação e um país. Estranho! Aparentemente não aprendemos nada dessa lição de história a fazer-se, a acontecer.

O moribundo projecto de uma Europa Unida em torno de valores como Democracia, solidariedade inter-regional ou exclusão absoluta de projectos limitadores da Liberdade dos Povos, está hoje ligado a um mecanismo de suporte de vida chamado BCE que controla o fluxo da torneira destes valores emitindo, ou não emitindo, moeda, comprando, ou não comprando, dívida soberana nos mercados secundários. Países como a Holanda, o Luxemburgo ou a Irlanda puxaram o autoclismo da entre-ajuda através da prática consistente e reiterada de dumping fiscal. O vizinho deixou de ser um aliado e um parceiro e transformou-se numa potencial fonte de receitas ilegítimas, num alvo a “assaltar” através da transferência de receitas das maiores corporações mediante a oferta de taxas mais baixas sobre os lucros realizados alhures.

A máquina de suporte de vida desta “União” é a burocracia. Os órgãos com os seus membros e secretárias e assessores remunerados de acordo com uma filosofia ad hoc de retribuições desligadas do Rendimento per capita dos seus países de origem. Há uma Europa rica, na Alemanha como nas Instituições da União, que não representa de modo algum os povos e os países que contribuíram para a eleição dos seus representantes. É um Clube, reservado que, como todos os Clubes, age e reage corporativamente de forma a preservar os seus privilégios, benefícios, alcavalas e isenções.

O Criador encontra-se refém da criatura e foi por esse algeroz que os valores fundadores da União se foram escoando. A circunstância de existir uma ditadura fascista na Hungria deixou de ser obstáculo. O governo Polaco, de extrema-direita, tornou-se algo aceitável tal como o Eslovaco. Não é, como tal, de estranhar que prodigalizem muros e leis contra a liberdade de imprensa, de expressão, de manifestação. Por agora a Europa está nas mãos de uma clique neoliberal que com maior ou menor ênfase apoia este tipo de regimes e tudo faz para condicionar os regimes políticos dos países que conservam alguns vestígios de democracia, condicionando-os através do fantasma dos mercados e da realidade das taxas de juro, manipuladas mediante recurso a proclamações cirúrgicas que minam a confiança provocando a subida imediata destas.

Tal manobra não seria possível sem a prestimosa colaboração da Comunicação Social. A guerra pelas audiências, a voracidade dos empresários de media, a par da ignorância e estupidez de muitos jornalistas, amplificados pelo  seu próprio Medo, são os condimentos desta receita totalitária. O medo reproduz o medo e não há travão de veleidades melhor que aquele que os cidadãos se impõem a si próprios.

Duas democracias, velhas de séculos, vão também construir os seus muros – a França e o Reino Unido. Ainda há não muitos anos seria impensável sequer mencionar esta possibilidade. Mas a proliferação de medíocres nos órgãos de decisão leva estes a viverem sob o seu próprio medo de serem expostos. Não nos enganemos: Trump é apenas a face mais evidente dos idiotas repugnantes que o capitalismo pode produzir e vir a entregar o poder. O mesmo se diga do rotativismo presidencial e de governo em vigor na mãe Rússia.

O poder encontra-se nas mãos de verdadeiros imbecis num largo número de estados e se os Povos não deitam mãos à situação devemos temer, esperar e preparamo-nos para o pior dos cenários. Uma nova guerra mundial que de forma inexorável usará argumentos do tipo dos que sustentam os estudos estratégicos de uma guerra nuclear “limitada”.

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