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Sexta-feira, Outubro 4, 2024

O “milagre” de Costa e Medina

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Como é que Medina e Costa consegue o “milagre” de uma redução do défice e da divida pública tão grande, em 2 anos apenas, e suas consequências: a redução do poder de compra dos trabalhadores e dos pensionistas, o aumento da pobreza, o agravamento da situação da escola pública e do SNS, corte drástico no investimento público e o aumento enorme das receitas de impostos.

Neste estudo, utilizando dados oficiais dos Relatórios dos Orçamentos do Estado de 2022 e 2023, procuro tornar claro os meios que o governo de Medina/Costa está a utilizar para reduzir, em apenas 2 anos (2021/2023), de uma forma drástica o défice orçamental (entre 2021 e 2022 de -2,9% PIB para -1,9% do PIB, e em 2023 para apenas -0,9% PIB) e a divida pública (entre 2021 e 2022, de 125,5% PIB para 115% e, em 2023, para 110,8% do PIB) e as suas consequências no aumento da produtividade, no crescimento económico, e nas condições de vida dos portugueses. E tudo isto no contexto de uma grave crise económica e social, causada pela guerra e sanções que estão a ter consequências dramáticas para os portugueses devido à escalada de preços que causa.

Estudo

Como é que Medina e Costa consegue o “milagre” de uma redução do défice e da divida pública tão grande, em 2 anos apenas, e suas consequências: a redução do poder de compra dos trabalhadores e dos pensionistas, o aumento da pobreza, o agravamento da situação da escola pública e do SNS, corte drástico no investimento público e o aumento enorme das receitas de impostos

Um dos aspetos da politica do atual governo que Medina e António Costa, à semelhança do que faziam os governos anteriores de Costa, é o constante autoelogio pela redução drástica do défice orçamental (entre 2021 e 2022 de – 2,9% PIB para -1,9% do PIB, e em 2023 para apenas -0,9% PIB) e também a redução da divida pública (entre 2021 e 2022, de 125,5% PIB para 115% e, em 2023, para 110,8% do PIB), transformando estas reduções em grandes feitos, autênticos “deuses”, a que o país e os portugueses deviam-se render. Querem ser vistos em Bruxelas como os campeões na U.E. da redução do défice e da divida (em 2021, quando o défice era de -2,9% do PIB em Portugal, o défice medio nos países da U.E. era -4,6% do PIB). Interessa, por isso, analisar como essa redução tão elevada em tempo tão curto e em plena crise está a obtida, e as consequências para o país e para os portugueses desses cortes drásticos no défice e na divida, pois, a redução do défice e da divida publica na forma como está a ser feita, tem outra face com efeitos dramáticos para os portugueses na sua vida diária. É o que vamos fazer neste estudo utilizando dados dos Relatórios dos Orçamentos do Estado para 2022 e 2023 disponíveis a todos os interessados.

 

AUMENTO ENORME DOS IMPOSTOS, A REDUÇÃO SIGINFICATIVA DO PODER DE COMPRA DAS REMUNERAÇÕES DOS TRABALHADORES DAS ADMINISTRAÇÕES PÚBLICAS, E DE CORTES DRASTICOS NO INVESTIMENTO PÚBLICO

O quadro seguinte, com os recebimentos e pagamentos de todas as Administrações Públicas (os previstos inicialmente no orçamento aprovado e os depois os da execução) em 2022 mostra o bem a politica do governo.

Quadro 1 – Receitas e despesas das Administrações Central (ESTADO), Local e Regional

Os dados oficiais do quadro são claros. O governo estima já que, em 2022, a receita, que tem como origem os impostos, seja superior em 4.456 milhões € à inicialmente prevista no Orçamento do Estado de 2022.

Apesar da inflação este ano (cerca de 8%) ser o dobro do que aquela que o governo previa no O.E.-2022 inicial (apenas 3,7%), mesmo assim as Despesas com Pessoal praticamente não aumentaram em relação à prevista inicialmente (apenas +0,7%), embora a subida das remunerações que serviu no cálculo da despesa com pessoal em 2022 ter sido apenas +0,9% ( comparando a inflação de 8% com subida das remunerações 0,9%, a perda de poder de compra dos trabalhadores da Função Pública, só em 2022, atinge -6,4%). E no investimento público verifica-se um corte significativo de 25,5% (-2.317 milhões €) em relação ao previsto inicialmente.

Se limitarmos a análise à Administração Central, ou seja, ao Estado, cuja responsabilidade é exclusivamente do governo, conclui-se que é nele que se verificam as suas causas. Como mostra a parte inferior do quadro 1, as despesas de pessoal do Estado, que representam 78% das despesas com pessoal de todas as Administrações Públicas, até serão inferiores em -0,7% às inicialmente previstas e o corte no investimento no Estado atinge 36,7% do inicialmente previsto, ou seja, um corte de 2.128 milhões €, que corresponde a 91,8% do corte do investimento verificado em todas as Administrações Públicas em 2022.

Este corte no investimento publico que está muito abaixo do verificado na U.E. (em 2021, em Portugal: 2,6% do PIB; e, na U.E. em média 3,2% do PIB) determina uma profunda degradação dos equipamentos públicos (escolas, hospitais, transportes, etc.), o que acaba por desincentivar o investimento privado, o que determina que o investimento total em Portugal, em percentagem do PIB , seja também inferior à média União Europeia contribuindo para fragilidade da economia portuguesa, para a baixa produtividade e para o reduzido crescimento económico que se tem verificado no nosso país, atirando Portugal para um crescente atraso.

 

O AUMENTO ENORME DAS RECEITAS DE IMPOSTOS COBRADOS PELO ESTADO EM RELAÇÃO AO INICIALMENTE PREVISTO NO ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2022

O quadro 2, com dados do governo, mostra o elevado peso da carga fiscal em Portugal no ano 2022.

Quadro 2 – Receita fiscal do Estado prevista pelo governo no OE-2022 inicial e aquela que estima que arrecadará este ano

Em 2022, o governo prevê arrecadar receitas, cuja origem são os impostos, 52.828 milhões €, ou seja, mais 4.237 milhões € do que previa no seu Orçamento do Estado inicial de 2022. E é fundamentalmente no IRS (+969 M€), no IRC (+2.280 milhões €) e no IVA (+1.402 milhões €). O IRS e o IVA atingem principalmente os trabalhadores e pensionistas, que constituem a esmagadora maioria da população. O aumento significativo do IRC (+2.280M€), que resulta naturalmente de um crescimento significativo dos lucros de empresas, prova que muitas estão a lucrar com a crise causada pela guerra e pelas sanções.

Se juntarmos a isto a redução do poder de compra dos pensionistas em 2022 (mesmo incluindo a meia pensão recebida em outubro) e a que sofrerão também em 2023, e a que terão todos os trabalhadores da Função Pública em 2023, a juntar à que sofreram nos últimos anos, o corte brutal no investimento público, o financiamento insuficiente do SNS, das universidades, e da escola pública, etc., que trataremos em estudos seguintes, fica-se com uma ideia clara da forma como o governo está a conseguir reduzir o défice e a divida e dos seus custos para o país e para os portugueses. E a pressa como é feita tem consequências mais graves porque é realizada num contexto de grave crise económica e social causada pela guerra e pelas sanções, que estão a ter consequências dramáticas na economia e na vida dos europeus, em que face mais visível é a escalada de preços que vai continuar. Para reduzir o défice e a divida publica da forma como está a fazer, tem de reduzir drasticamente o reforço das outras despesas não compensando nem a inflação. É importante que os portugueses saibam isto.


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