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Quinta-feira, Abril 25, 2024

Reflexões sobre a situação da mulher em Portugal

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

8 de Março, Dia Internacional da Mulher: alguns dados e reflexões sobre a situação da mulher em Portugal

Neste estudo analiso, utilizando apenas dados oficiais do INE e do Ministério do Trabalho, a situação atual da Mulher no nosso país no campo do ensino (a maioria dos inscritos no ensino superior e dos diplomados do ensino superior são Mulheres), no emprego em que representam quase metade da população empregada  e a maioria da população empregada com o ensino superior são Mulheres, e já têm uma posição dominante em profissões vitais para o desenvolvimento com são” Especialistas das atividades intelectuais e cientificas”.

Apesar disso, as Mulheres continuam a sofrer uma forte discriminação salarial no nosso país. E verifica-se até que quanto mais  elevado é o nível de escolaridade e de qualificação das Mulher maior é a diferença de remuneração entre Homens e Mulheres. Através da discriminação salarial os patrões conseguiram desta forma não pagar, só em 2020,  5.517 milhões € de salários às Mulheres.

 


Estudo

8 de Março, Dia Internacional da Mulher: alguns dados e reflexões sobre a situação da mulher em Portugal

Foi na 2ª feira, 8 de Março de 2021, que se comemora o Dia Internacional da Mulher, e é naturalmente a altura adequada para fazer um balanço da situação atual da Mulher no nosso pais, e como ela tem evoluído nos últimos anos na educação, no emprego e remunerações, áreas importantes para avalias as condições de vida das mulheres. Comecemos pela educação que é um fator chave quer para a promoção da mulher quer para o desenvolvimento do país.

 

À medida que aumenta os níveis de ensino a importância das mulheres é cada vez maior

Comecemos então por analisar o número inscritos nos diferentes níveis de ensino e por sexo, no último ano em que foram disponibilizados dados, que é o ano de 2018/2019

 

Quadro 1 – Alunos matriculados/inscritos e repetição por sexo e nível de ensino – Portugal -2018/2019

Dos dados do quadro anterior conclui-se rapidamente que à medida que aumenta o nível de ensino, maior é o peso/importância das mulheres: 48,4% do total de inscritos no Ensino básico, 49,6% no Ensino secundário e 54,1% no ensino superior do total de inscritos neste nível.

O quadro 2, completa e reforça as conclusões que se tiraram dos dados do quadro anterior, e referem-se ao número de alunos que terminaram cada nível de ensino.

 

Quadro 2 – Alunos que concluíram/diplomados, por sexo e nível de ensino – Portugal – 2018/2019

Embora as mulheres sejam minoritárias no total de inscritos no ensino básico e secundário, no entanto quando se analisa as que concluíram os diferentes níveis de ensino elas já são maioritárias não só no ensino superior, mas também no secundário. Em 2018/2019, 53,1% dos alunos que terminaram o secundário são mulheres, e no Ensino superior, embora já sejam maioritárias nos inscritos, elas reforçam o seu peso, medido em percentagem de diplomados (54,1% dos inscritos em 2018/2019, mas 58,1% dos que terminaram o curso). No Ensino básico as mulheres representam 49% dos que o terminaram em 2018/2019. O quadro 3 completa.

 

Quadro 3 – Diplomados do Ensino superior por sexo e áreas – Portugal – 2018/2019

As mulheres no total de diplomados de 2018/2019 em cada área ainda não são maioritárias em apenas 3 áreas: TIC´s, Engenharia e Serviços. Com aumento da procura nomeadamente nas Tecnologias da Informação e Comunicação e o aumento do desemprego nas outras áreas é previsível que esta situação se altere rapidamente.

 

A situação da Mulher no emprego em Portugal: as mulheres são já a maioria da população empregada com o ensino superior (61,3%)

O quadro 4, com dados recentes do INE, permite analisar a situação da Mulher nesta área fundamental para a sua promoção, independência e para o desenvolvimento do país.

 

Quadro 4 – População empregada por sexo e nível de escolaridade completo

A importância da Mulher no emprego e, consequentemente, na criação de riqueza necessária ao desenvolvimento do país tem aumentado de uma forma contínua, crescendo mesmo em 2020, ano de crise. Entre 2016 e 2020, a percentagem de Mulheres no emprego total subiu de 48,7% para 49,3%, correspondendo praticamente a metade da população empregada. Se analisarmos o emprego por níveis de escolaridade dos trabalhadores, conclui-se que à medida que o nível aumenta maior é a participação da Mulher a nível de emprego.

No 4ºT-2020, era 42% nos trabalhadores com o ensino básico ou menos, 47,2% com o ensino secundário; e 61,3% dos trabalhadores com o ensino superior. Entre 2016 e 2020, a população total empregada (H+M) aumentou em 208,9 mil, mas o número de mulheres trabalhadores com o ensino superior cresceu em 169,8, o que corresponde a 81,2% do aumento do emprego verificado neste período.

Com a crise, o emprego registou uma forte redução entre 2019 e 2020. As mulheres com o ensino básico ou menos e com ensino secundário foram fortemente atingidas pelo desemprego. Segundo o INE, no emprego de trabalhadores com o ensino básico ou menos a destruição líquida de postos de trabalho ocupados por Mulheres foi de 67.000 ( a dos Homens 103.500), e com secundário a destruição líquida atingiu 32.000 postos de trabalho ocupados por Mulheres ( os ocupados por Homens até aumentou em 27.700). Mas no emprego de trabalhadores com o ensino superior, o número de Mulheres aumentou no ano em 64200 enquanto o dos Homens subiu apenas em 11.700.

 

Quadro 5 – Variação do emprego por sexo e por níveis de escolaridade entre o 1º Trim.2020 e o 4º Trim.2020

Entre o 1ºT-2020 e 4ºT-2020, período de crise intensa causada pela pandemia, as Mulheres com o ensino básico e secundário foram fortemente atingidas por despedimentos (63.000, e – 22100), enquanto o emprego de Mulheres com Ensino superior aumentou em 92.600.

O quadro 6 , com dados do INE, mostra a variação do emprego por profissões e, dentro destas, poe sexo, após o início da crise causada pelo COVID 19 (1ºT2020 a 4ºT-2020).

 

Quadro 6 – População empregada por profissão principal e por sexo – 1ºT2020 / 4ºT2020

O emprego das Mulheres diminuiu em 5 profissões e aumentou também em 5 profissões durante a crise. A profissão que registou maior aumento foi a de especialistas (+85.300).

 

A Mulher continua no nosso país a sofrer um forte discriminação a nível de remunerações

Tomando como base os dados referentes a 2019 publicados no Boletim Estatístico do GEP Ministério do Trabalho de Fevereiro de 2021, estima-se que, em 2020, a remuneração base média dos Homens tenha sido superior às Mulheres em 17,8% e o Ganho Médio superior em 22,9%. No entanto, os valores escondem desigualdades muito grandes.

Como revelam os últimos dados disponibilizados pelo Ministério do Trabalho dos Quadro de Pessoal das empresas privadas, que são de 2018 (mas a situação atual não deve ser diferente), quanto mais elevada é a escolaridade e a qualificação das trabalhadoras maior é desigualdade de remunerações entre Homens e Mulheres como mostram os quadros seguintes com esses dados.

Comecemos pelo nível de escolaridade. Os dados dos Quadros de Pessoal, embora de 2018 (são os últimos divulgados pelo Ministério do Trabalho) constam do quadro 7.

 

Quadro 7 – Desigualdades de remunerações e ganhos médios entre Homens e Mulheres nas
empresas privadas em Portugal segundo o nível de escolaridade dos trabalhadores

Os dados dos Quadros de Pessoal das empresas privadas enviados para o Ministério do Trabalho revelam um facto chocante: Quanto mais elevada é a escolaridade da trabalhadora maior é desigualdade de remunerações entre Homens e Mulheres.

Assim, em relação à Remuneração base se a trabalhadora tiver o ensino básico ou menos recebe, em média, menos 17% (-130€) de que o Homem como mesmo nível de escolaridade. Mas se tiver o ensino superior a sua remuneração base é, em média, inferior ao do Homem em 27,6% (-505,5€). Relativamente ao Ganho médio, que inclui para além da Remuneração base todos os subsídios, o Ganho medio, se a trabalhadora tiver apenas o ensino básico ou menos, é inferior ao do Homem em 21,8% (-206,8€), mas se tiver o Ensino superior o seu Ganho é já, em média, inferior ao do Homem em 28,4% (-616,8€).

Situação mais grave se verifica em relação às qualificações, onde a desigualdades remuneratória entre Homens e Mulheres são ainda maiores, como revelam os dados do quadro 8 que têm a mesma fonte (Quadros de Pessoal das empresas privadas enviados ao Ministério do Trabalho). Para isso, observem-se os dados do quadro 8.

 

Quadro 8 – Remunerações e ganhos médios de acordo com o nível de qualificação

A nível de estagiários e praticantes a remuneração base da Mulher é, em média, inferior à do Homem em apenas 1,4% (-9€), mas se for um quadro superior a remuneração base já é, em média, inferior à do Homem em 36,8% (-1233€) com idêntico nível de qualificação. Em relação ao ganho médio, a diferença remuneratória em euros é ainda maior. Se a trabalhadora for uma estagiária ou uma praticante o seu ganho médio é, em média, inferior ao do Homem em 3,2% (-23€), mas se for um quadro superior o seu ganho é já inferior ao Homem em 36,8% (-1437€) com o mesmo nível de qualificação.

Mas a desigualdade de remunerações entre Homem e Mulher ainda se pode observar de outros pontos de vista (óticas). Segundo o Boletim Estatístico do GEP do Ministério do Trabalho de Fevereiro de 2021, quanto maior são as remunerações do Homens e das Mulheres , maior é a desigualdade entre Homens e Mulheres como mostra o quadro 9 copiado dessa publicação oficial.

 

Quadro 9 – Remunerações médias das mulheres face à dos homens (homens=100)

Assim, em 2018, por ex., no grupo de 10% das Mulheres e dos Homens com remunerações mais elevadas, as remunerações das Mulheres representavam, em média, apenas 74,1% da dos Homens. Se fosse no grupo de 5% com remunerações mais elevadas, a remuneração média da Mulher já representava, em média, apenas 70,4% da recebida pelos Homens. E se fosse no grupo mais restrito de 1% de remunerações ainda mais elevadas, a da Mulher correspondia, em média, apenas a 59,1% da do Homem. Isto de acordo com Quadros de Pessoal das empresas privadas recebidos pelo Ministério do Trabalho.

 

Em 2019, a percentagem de Mulheres a receber o Salário Mínimo Nacional era 48% superior à percentagem dos Homens que também o recebiam, atualmente deve ser maior porque o salário mínimo, entre 2019 e 2021, subiu de 600€ para 660€

Segundo o Boletim Estatístico do GEP do Ministério do Trabalho, em 2019, 21% dos Homens recebiam apenas o salário mínimo nacional, enquanto, no mesmo ano, a percentagem de mulheres que recebia o salário mínimo nacional atingia já 31%. E entre 2018 e 2019 aumentou de 26,8% para 31%. E isto quando salário mínimo aumentou de 580€ para 600€, ou seja, 20€. Em 2020, o salário mínimo aumentou 35€ e, em 2021, 30€, portanto é previsível que a percentagem de Mulheres atualmente a receber apenas o salário mínimo nacional seja ainda mais elevada.

É uma outra forma de sobre-exploração das Mulheres pelos patrões privados, pagando a uma percentagem cada vez maior de Mulheres apenas o salário mínimo nacional como está-se a verificar perante passividade das autoridades e nomeadamente do Ministério do Trabalho que apesar de ter uma Secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade se mantém calada e paralisada, certamente para não criar incómodos às entidades patronais. E como tudo isto já fosse suficiente o governo já anunciou que vai subsidiar os patrões que pagam o salário ou com o dinheiro dos contribuintes ou com dinheiro dos descontos dos trabalhadores para a Segurança Social.

 

A sobre-exploração a que continuam sujeitas as Mulheres em Portugal: a desigualdade salarial como instrumento para aumentar os lucros. Se em 2020, as Mulheres, com a mesma escolaridade e qualificação dos Homens, recebessem o mesmo que estes, elas teriam recebido mais 5.517 milhões €

Estudos da OCDE mostram que quanto maior é a escolaridade do trabalhador, maior é o seu rendimento, o que está associado a maior produtividade. No nosso país, um trabalhador com ensino secundário produz em média mais 30% do que um com o ensino básico, e a produtividade de um com o ensino superior é o dobro dado trabalhador com apenas o ensino básico.

Como vimos os Homens são maioritários nos níveis de escolaridade mais baixa – ensino básico e secundário – com 58,5% e 52,8% do emprego respetivamente, enquanto as Mulheres são maioritárias no emprego com o ensino superior (Mulheres 86,2%; Homens 38,8%).

Apesar da contribuição importante das Mulheres para a criação anual da riqueza produzida no país, pois são elas que têm maior nível de escolaridade, continuam a serem discriminadas, mas remunerações que lhe são pagas pelo trabalho que realizam, pois continuam a receber muito menos do que os Homens com o mesmo nível de escolaridade e de qualificação. Os dados divulgados pelo Ministério do Trabalho que analisamos neste estudo mostraram já isso de uma forma clara.

Se em Portugal existisse igualdade salarial, e se as mulheres ganhassem o mesmo que os homens com idêntico nível de escolaridade e de qualificação, elas teriam recebido em 2020 mais 5517 milhões € de salários do que receberam. Foi este valor que os patrões privados se apropriaram através da sobre-exploração a que sujeitam as Mulheres, perante a passividade do governo e da Autoridade para as Condições de Trabalho que deviam defender os interesses e os direitos das trabalhadoras portuguesas, mas que o não fazem, pois o silencio e passividade perante a discriminação tem sido enorme. É importante denunciar que a DISCRIMINAÇÃO SALARIAL continua a existir em Portugal e com mais força neste Dia Internacional da Mulher e nesta altura em que, com a justificação da crise causada pelo COVID, os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras estão a ser silenciosamente destruídos.



 


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