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Quinta-feira, Setembro 19, 2024

A adicção ao sexo Não É…

Ana Pinto-Coelho
Ana Pinto-Coelho
Aconselhamento em dependências químicas e comportamentais, Investigadora Adiction Counselling

Ana Pinto CoelhoNa altura em que foi divulgado o último relatório sobre a situação do álcool em Portugal, que nos revela 300 mil portugueses com consumo de alto risco, vale a pena perceber e integrar o alcoolismo naquilo que ele é: uma doença do foro das doenças mentais, já identificada na OMS, que se chama adicção.

Noutra altura falarei mais sobre o alcoolismo, neste enquadramento que é o dele: dependência de uma substância, lado a lado com a medicação e com outras drogas.

Mas o espectro da doença da adicção percorre também a área comportamental. Aqui podemos situar comportamentos adictivos como o jogo compulsivo, o sexo, as compras, a Internet, os smartphones, a comida, etc., todos a atingirem proporções cada vez maiores e mais graves na nossa sociedade. Sendo muito mal tratados – ou até esquecidos – na comunicação que se faz por cá, estes comportamentos deveriam fazer parte de um acompanhamento específico já que é de saúde pública que estamos a falar.

A adicção ao sexo – o chamado sexo compulsivo

Infelizmente, existe imensa informação imprecisa e devido a esta realidade, vejo muitas pessoas a utilizarem o rótulo “vício em sexo” para definir qualquer tipo de comportamento sexual (em si mesmos ou nos outros) que não cumpre a sua visão, seja ela cultural ou religiosa, do que o sexo deve ser.

Por exemplo: “Ele frequenta a Igreja regularmente, sabe que ver pornografia é considerado pecado. Se o faz é porque é adicto ao sexo”. Ou ” Sou casado com uma mulher que amo profundamente. No entanto, tenho tido sexo com homens… devo ser adicto ao sexo!”. Ou ainda ” Ela está a trair o marido! Deve ser adicta ao sexo, certo?” , ” A minha mulher apanhou-me a ter relações com homens, mas eu quero que ela saiba que não sou gay, sou apenas adicto ao sexo”…

Pior, às vezes, pessoas que são apanhadas em flagrante a praticar sexo considerado impróprio, ilegal, ou simplesmente problemático, desculpam-se declarando-se viciados em sexo, tentando usar o vício em sexo como um catch-all, uma desculpa para o seu comportamento, na esperança de que isto possa evitar ou pelo menos minimizar as consequências que teriam de enfrentar.

  • Adicção ao sexo Não É uma desculpa para mau comportamento. O alcoolismo não pode justificar o facto de conduzir embriagado, a toxicodependência não justifica um assalto, etc. Então, porque o vício em sexo justificaria comportamentos sexuais prejudiciais?

Na verdade, muito pelo contrário, em vez de servir como desculpa, a adicção ao sexo cria a obrigação de reconhecer o problema, aceitar as consequências e tentar fazer diferente no futuro.

  • Adicção ao sexo NÃO É uma forma de se desculpar por trair o(a) parceiro(a). Mais uma vez, a adicção não serve como desculpa para um comportamento, nem deve ser tido em conta como uma “absolvição” para não ter que tomar responsabilidade pelos seus actos.
  • Adicção ao sexo NÃO É desculpa para orientações sexuais. Ser gay não faz da pessoa um viciado em sexo, nem mais nem menos que um heterosexual. Noutras palavras, a adicção ao sexo não tem nada a ver com a orientação sexual.

Há casos em que a pessoa procura ajuda para esta sua dependência, esperando que venha a mudar assim a sua orientação sexual: pois, não muda. Não tem nada a ver uma coisa com outra.

  • A adicção ao sexo NÃO É responsável pelo gosto por fetiches ou kinks. Mais uma vez, a adicção ao sexo não pode servir de justificação para aquilo que o(a) excita. É verdade que um adicto pode ter fetiches, mas não são os fetiches que o fazem ser adicto.
  • A adicção ao sexo Não É exclusivamente uma dependência de gays. E também afecta tanto homens como mulheres, embora nas mulheres seja mais difícil identificar já que tendem a incorporar uma conexão emocional (pelo menos aparente), mas isso não quer dizer que não sejam adictas. As adictas ao sexo são mais difíceis de diagnosticar porque tendem a esconder a sua compulsão falando sobre ela como “relações” e não como sexualidade descontrolada.
  • Por último, adicção ao sexo NÃO É a mesma coisa que agressão ou violação. Por definição, a violação é um comportamento sexual ilegal e/ou não consensual. É verdade que alguns viciados em sexo se podem transformar em agressores – geralmente ofensas de nível inferior como voyeurismo, exibicionismo, ver pornografia, etc. No entanto, agressor sexual não é indicativo de vício sexual.

É extremamente importante que os critérios para dependência de sexo sejam rigorosamente aplicados quando se trata de criminosos sexuais, uma vez que estes indivíduos são o grupo com maior probabilidade de se auto-identificarem como viciados em sexo numa tentativa de evitar o julgamento e / ou punição.

 

Ana Pinto-Coelho com consulta da newsletter de Rob Weiss

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