O que faz correr os neoliberais de serviço? Porque mentem tanto e tão despudoradamente, todos os dias, de forma sistemática, com enorme aplicação e “lata”? O discurso, gritantemente concertado no laboratório de uma “agência” de comunicação, serve-se de palavras e expressões criteriosamente escolhidas, arrumadas de forma elaborada, quase “científica”, que reproduz, tristemente, o cardápio salazarista dos anátemas lançados sobre os “papões” que (acreditam) estar associados a “esquerda”, “radical”, comunistas, trotskistas, dietas baseadas em criancinhas e eliminação intravenosa dos mais velhos. É, para ser lisonjeiro, ridículo!
Tal discurso, demagógico, pérfido e algo idiota, parte do princípio de que os destinatários são estúpidos, já que não conta com a “muleta” do obscurantismo, embora seja, em si mesmo, obscurantista. Chega a ser surpreendente a facilidade, frequência e infantilidade das mentiras desta direita radical. Pungente e dolorosamente, numa base diária, são repetidas até à náusea as “ideias”, laboratorialmente concebidas, de que se faz a narrativa dos protagonistas, e respectivos porta-vozes, da direita nacional. Chega a ser embaraçoso para os cidadãos mais atentos, educados e providos de memória.
Confrangedor é curto para adjectivar o estertor discursivo e a pobreza de ideias dos comentários da nulidade que é Passos Coelho e do desconchavo, algo histérico, de Assunção Cristas, adequadamente replicados pelos despudorados líderes dos respectivos grupos parlamentares… e pelo garoto patético, a fazer lembrar um frango a espigar para galo.
Imprensa sem memória nem ousadia
Nada disto teria qualquer importância não fora a cumplicidade da ignorância dos jornalistas ou do alinhamento ideológico destes com o discurso neoliberal. Nos tempos de antanho ser jornalista implicava, de alguma forma, desconfiar do poder, independentemente de quem o ocupava transitoriamente. Nos dias que correm, ser jornalista significa aceitar acriticamente ser correia de transmissão do discurso do poder, por medo ou por identificação com a ordem de valores da classe dominante. O próprio conceito de “classe” foi cozinhado numa Bimby que reduziu a diversidade ideológica a uma espécie de puré chave-na-mão, do tipo “classe média”, algo outrora pejorativo para qualquer profissional da nobre missão de informar.
A “cumplicidade” entre políticos e jornalistas, entre empresários e jornalistas, entre Juízes e Jornalistas, veio transformar de forma decisiva a correlação de forças no “palco” da informação. A “cumplicidade” rapidamente evoluiu para o “concubinato” e quem saiu a perder foi a Cidadania. A, antes solitária, actividade do Jornalista está agora confinada pela promiscuidade com as fontes e pela ditadura das audiências, isto é, as exigências dos empresários de media, sequiosos das receitas que a subserviência e estrito cumprimento dos calendários comerciais dos anunciantes lhes impõem.
Em Portugal, acresce a tudo isto a arreigada tendência nacional para a imitação. Poucos são os que se atrevem a inovar ou a investir em ideias “fora da caixa”. Esta tendência é particularmente evidente nos canais televisivos de notícias e nas grelhas de programação dos canais generalistas e, mais recentemente, na imprensa escrita diária e semanal. A incapacidade de lidar com a mudança como variável constante leva a que a indústria da informação vá buscar os seus gurus à grande Distribuição quando o contrário seria mais natural e produtivo. A ignorância absoluta sobre marketing editorial torna os empresários de media presa fácil dos marketeiros de bens de grande consumo. A confusão entre mercado, produto, distribuição e promoção é evidente. E penosa para as empresas de comunicação.
Tentar levar esta perspectiva a um empresário de media é um trabalho de Hércules. Entre quem procura explicar e quem ouve há um enorme gap de linguagem e de semântica. Na ausência de um tradutor opta-se, invariavelmente, pela solução mais fácil: partilhar audiências dos concorrentes parece mais seguro que procurar, e construir, novos públicos.
Segundo resgate e Sanções
É neste contexto que se alguém decidir introduzir os termos “2º resgate” e “sanções” estes passam a ser ecoados por toda a imprensa, influenciando os “mercados” e fazendo subir as taxas de juro. Desta forma cria-se “um facto económico” e desencadeia-se uma reacção que conduz, inexoravelmente, a um resultado que não existia sequer como hipótese à partida. Este “bruá” provoca aquilo que, na aparência, pretendia evitar. Assim se arruinam empresas, estados, economias.
É uma fórmula de sucesso garantido para os neoliberais e seus acólitos na imprensa ignorante, acrítica, submissa.