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Quinta-feira, Abril 25, 2024

Crónica da Argélia em véspera de eleições

Beatriz Lamas Oliveira
Beatriz Lamas Oliveira
Médica Especialista em Saúde Publica e Medicina Tropical. Editora na "Escrivaninha". Autora e ilustradora.

Da Independência às eleições marcadas para 12 de Dezembro

A Argélia tem uma história de longa luta revolucionária. No século vinte temos a luta contra o poder colonial francês e o ganho da independência em 1963.

Nos nossos dias a luta pela representação da voz popular. Eleições controversas estão marcadas para dia 12 de Dezembro.

Hirak6 (ou o Movimento) é o nome genérico dado a manifestações esporádicas que ocorrem na Argélia desde Fevereiro de 2019 para protestar primeiro, contra a recandidatura de Abdelaziz Bouteflika, física e mentalmente incapaz para um seco e recesso quinto mandato presidencial.

O Presidente Abdelaziz Bouteflika é o simbolo contra quem foi desencadeado o movimento Hirak 6

Abdelaziz Bouteflika nasceu em 2 de março de 1937 em Oujda, uma cidade no leste de Marrocos para onde seus pais, argelinos de origem, haviam emigrado.

Está há 20 anos no poder. Tem 82 anos.

Lutou na Guerra de Libertação da Argélia, fez parte do Exército de Libertação Nacional (NLA). Durante a luta anti colonial era próximo de Houari Boumediene, e progrediu no aparelho administrativo do “Exército das fronteiras”.

Quem é Houari Boumédiène

Nascido em 1932 e falecido em 1978.

Soldado de carreira, Chefe do Estado Maior do Exército de Libertação Nacional de 1959 a 1962, foi Ministro da Defesa sob o comando de Ben Bella e vice-presidente do Conselho durante a presidência de Ahmed Ben Bella, de maio de 1963 a junho de 1965.

Após um golpe de estado descrito como “reajuste revolucionário”, Houari Boumédiène tornou-se, em 20 de junho de 1965, presidente do Conselho Revolucionário que funcionou até dezembro de 1976, quando foi eleito Presidente da República até à sua morte em 27 de dezembro de 1978.

Quem é Ben-Bella

Ahmed Ben Bella, nascido no dia de Natal de 1916 e falecido em 1963 é um herói argelino, soldado socialista e revolucionário e o primeiro Presidente da Argélia entre 1963 e 1965.

A revolta armada contra a potência colonial

Em 8 de maio de 1945, enquanto a França celebrava a vitória sobre a Alemanha, grandes protestos começaram a ocorrer na cidade argelina de Setif. A crueldade do colonialismo foi piorando durante o período da guerra, levando mais e mais argelinos a se oporem aos franceses. Esses primeiros protestos foram cinco dias de violência, mais de 100 europeus mortos e cerca de 1.500 argelinos.

O Todos-os-Santos vermelho ou sangrento, é o nome pelo qual na França se refere o 1º de novembro de 1954, quando a Frente de Libertação Nacional (FLN) argelina manifesta pela primeira vez a sua existência ao cometer uma série de ataques/atentados contra o poder colonial francês. É o início da Guerra da Argélia (1954-1962), que durou oito anos.

Um diretório de seis membros, Mohamed Boudiaf, Larbi Ben M’hidi (chefe de Oran), Mostefa Ben Boulaid (Aurès), Rabah Bitat (Argel), Mourad Didouche (Constantinois) e Belkacem Krim (Kabylie) é o núcleo duro e inicial da resistência armada contra a França pela Frente de Libertação Nacional (FLN). Estes são os seis chefes históricos da revolução. Sonharam-na e realizaram-na.

Voltamos ao momento presente

Desde fevereiro último a população nas ruas está contra o projeto do idoso e incapaz Presidente Abdelaziz Bouteflika, também contestado por militares, que queria eternizar-se no poder após o fim de seu quarto mandato, com a dúbia promessa de uma transição e a implementação de reformas.

Em seguida, o povo exige uma Segunda República e a saída das velhas vacas sagradas do regime, sobretudo porque estes se ensaiavam para organizar a próxima eleição com os mesmos homens afetos ao poder.

Estas demonstrações de desagrado da população e desconfiança no poder de Bouteflika fizeram com que, a contra gosto, ele se demitisse no principio de Abril 2019. Esta demissão foi acelerada pela oposição do Exército Popular Nacional, que também desconfiava das prometidas reformas do presidente numa hipotética fase de transição. Bouteflika foi substituído por Abdelkader Bensalah.

Os manifestantes, no entanto, continuam a mobilizar-se para garantir a transição e a nomeação de um presidente e um governo de consenso, o que os militares não apoiam, argumentando que essa proposta seria inconstitucional e uma fonte de instabilidade.

O exército também rejeita qualquer transição, seja convocado por uma Constituinte, ou por eleições antecipadas, ou qualquer saída da equipe executiva.

Entretanto várias pessoas importantes do regime, incluindo Saïd Bouteflika, e muitos ministros, incluindo os ex-líderes do governo são presos. A repressão torna-se dura e o regime ameaça punir as pessoas que defendem uma transição e depois prende os manifestantes, sobretudo os que empunham a bandeira berbere.

Bensalah finalmente retém o poder após o final de seu período intermediário de três meses, o que os observadores consideram inconstitucional. Ele próprio tomará decisões feridas por inconstitucionalidade.

Durante o verão de 2019, a mobilização esmorece e o regime tenta organizar uma presidência até o final do ano, depois de ter apelado a um diálogo duvidoso e contestado e de ter criado um corpo para a organização de eleições.

A mobilização recomeçou no fim do verão e a população nega a validade do processo liderado por forças que considera caducas, bem como as candidaturas de personalidades do regime. Estas personalidades eram exatamente aquelas que na sombra, aproveitando da incapacidade física e mental do Presidente, tinham tomado as rédeas do poder. A repressão aumenta, são presas diversas individualidades, jornalistas e ativistas do Hirak 6.

O exército tenta mesmo impedir as entradas na capital e penalizar o movimento, para impedir os cidadãos de outras regiões virem manifestar-se. Jornais online são censuradas. Os cinco candidatos selecionados em novembro de 2019 são os “caciques” do regime.

Eleições na Argélia 2019

A eleição presidencial argelina está marcada a partir de 12 de dezembro de 2019. As cinquenta candidaturas apresentada em novembro de 2019 são todas de personalidades do regime. O povo nas ruas continua a não acreditar que este processo eleitoral mude seja o que for.

Estranho, não é?

Nenhuma das grandes organizações que suportaram o Hirak 6 apoia qualquer dos candidatos.

Aproxima-se uma tragédia?


Por opção do autor, este artigo respeita o AO90


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