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Quinta-feira, Março 28, 2024

Erada. Como uma freguesia da Beira Interior combate o Covid 19

Isabel Lourenço
Isabel Lourenço
Observadora Internacional e colaboradora de porunsaharalibre.org

A Erada é uma freguesia no sopé da Serra da Estrela, do município da Covilhã. A freguesia composta por duas aldeias, Erada e Trigais, conta com pouco mais de seiscentos habitantes fixos, número que cresce durante o verão com o regresso dos Emigrantes.

Até ao momento não existe nenhum caso de Covid 19, e as medidas tomadas pela Junta de Freguesia e as recomendações tanto da DGS como da OMS foram seguidas exemplarmente pela população que inclui muitos idosos, mas também jovens e crianças e pequeno comércio.

Numa conversa com João Ramos, presidente da Junta de Freguesia, ficamos a saber que o executivo reuniu logo no inicio da pandemia em Portugal e o executivo começou a  tratar de todas as questões de prevenção e emergência.

Uma das nossas primeiras acções foi tentar esclarecer a população, dentro do possível, sobre o Covid. Divulgamos a informação, imprimimos folhetos com as medidas de prevenção e cuidados que se devem ter.”

Os números de telemóvel dos membros do executivo foram afixados e divulgados, estando disponíveis para atender a população a qualquer hora.

João Ramos, Presidente da Junta de Freguesia da Erada, foto de Rui Paulo

Foram distribuídas as primeiras máscaras em colaboração com a Câmara Municipal da Covilhã, também foram distribuídos gel e desinfetante aos estabelecimentos da Freguesia assim como viseiras. As viseiras de fabrico local foram adquiridas aos jovens Pedro Moreira e Marco Carvalho donos do MAP Creative studio, que se dedicaram a fabricar viseiras que venderam a 1 euro (custo de fabrico) quando ainda não havia oferta suficiente no mercado. Segundo os jovens as encomendas são muitas, mas não conseguem adquirir o material necessário (PETG) visto os grandes fabricantes ficarem com todos os stocks disponíveis. Pedro, Eng. Aeronáutico e Marco, bioquímico, não querem sair da Erada mesmo não exercendo as profissões para que estudaram. Têm pena que não possam satisfazer os pedidos que têm porque era uma forma de ajudar. Para o fabrico aproveitaram os equipamentos e maquinas que já tinham no studio.

Viseiras, jovens Pedro Moreira e Marco Carvalho, foto de Cláudia Paulo

Outras máscaras distribuídas pela Junta de Freguesia foram confeccionadas e oferecidas por outra moradora da Erada, Paula Pao Alvo. Paul confeccionou mascaras em TNT que ofereceu não só à Junta de Freguesia como aos Bombeiros e à Protecção Civil entre outros.

No Centro de Saúde da Erada onde há atendimento médico três vezes por semana, foi preparada uma sala para acolher algum caso suspeito, tendo não apenas uma cama e acesso a casa de banho, mas também alimentos. A mesma medida foi tomada na aldeia de Trigais, numa associação local. Os Trigais contam com uma população fixa de cerca de 5 dezenas de pessoas e um pequeno comércio. Durante este período de excepção a Freguesia assegura mediante marcação o transporte da população dos Trigais a consultas médicas ou outras deslocações que não podem ser adiadas. A entrega de medicamentos é assegurada em colaboração com a Mutualista Covilhense.

Assistência ao domicilio, foto de Luísa Duarte

A Dra. Sofia Viana, que está 2ª, 4ª e 6ª-feira no centro de saúde também está disponível telefonicamente nos restantes dias em caso de necessidade durante esta pandemia.

As ruas da Freguesia são desinfectadas dia sim dia não. No Multibanco existe um gel desinfectante. Os correios continuam abertos a meio tempo, sendo que a outra parte do tempo a funcionária trabalha a partir de casa.

O encerramento do Centro de Dia, levou a um reforço da assistência domiciliária com entrega de alimentos, medicamentos e outros serviços necessários.

Estamos também atentos às necessidades da população que está mais vulnerável agora com os processos de lay off”.

Numa Freguesia com muita da população emigrada em França, Suíça e Bélgica colocou-se a questão não só dos emigrantes que ficaram retidos em Portugal como dos emigrantes que regressaram e também de vários população que estavam no estrangeiro.

Desinfecção das ruas, foto de Cláudia Paulo

Correios, foto de Irene Calado

“Quem vem de fora fica numa quarenta de 15 dias, e é obrigado a informar a Freguesia que chegou. Isso aplica-se tanto a residentes como a visitantes ou pessoas que têm casas de fim de semana ou férias. Neste contexto colocaram-se novos desafios à freguesia e à população, felizmente todos colaboram e não houve necessidade de nenhum tipo de intervenção por parte das autoridades”, o presidente da Junta conta-nos ainda como todas as pequenas medidas ajudam numa situação inédita “imprimimos na Junta as fichas e os trabalhos de casa para os alunos que estão em telescola. O infantário está previsto abrir dia 1 de Junho assim como os parques infantis onde haverá gel desinfetante e avisos com a regras de utilização. Todo isto necessita de uma avaliação diária e um acompanhamento, a compreensão e cooperação de todos é determinante”.

As missas que irão iniciar nesta segunda fase de desconfinamento são outro desafio. A freguesia irá disponibilizar os meios de desinfecção, mas dentro da Igreja será o Padre a assegurar o distanciamento necessário.

Segundo o presidente da Junta “Estamos perante algo que desconhecemos e que todos os dias nos traz novas descobertas, temos que estar atentos e adaptar-nos.” Em relação aos equipamentos mais utilizados na época do verão informa:

Iremos abrir o court de ténis com uma lotação máxima de 2 pessoas, mas a piscina irá estar encerrada. Para colmatar esta falta de um local que é muito frequentado aqui no verão, iremos limpar ribeiros e melhorar acessos a zonas que possam ser utilizadas como praias fluviais, barragem e poços, para além das já existentes. Tentamos dar o maior número de opções às pessoas de forma a permitir o distanciamento social necessário. Ainda estamos muito longe de uma solução final e os nossos esforços têm que continuar. À pandemia junta-se agora o perigo de incêndios que tem assolado a região nos últimos anos, um esforço adicional para a administração e instituições públicas numa época conturbada.”

A freguesia tem um dinamismo e atividades todo o ano, a Filarmónica Eradense, o Clube de Desporto da Filarmónica, o Rancho Folclórico, o Grupo de Bombos, a associação Águias dos Trigais, os dois grupos corais, o Grupo de Petanca “Os Serranos” e múltiplas atividades como Zumba, Hidroginástica, aulas de Fotografia, de informática, de inglês. Todas estas actividades foram suspensas durante os últimos meses.

O curso de fotografia continua com apoio via Whatsapp e este artigo é ilustrado com fotografias dos alunos que vão dos 14 ao 73 anos.

Falamos com Cristina Carvalho, moradora da Erada que tem um pequeno comércio de brindes publicitários a “ideias solt

as”, a maioria das encomendas são para casamentos, baptizados, aniversários e eventos.

Tinha acabado de investir em vários equipamentos de impressão e outros quando todos os pedidos foram cancelados. Nem casamentos, nem festas, nem eventos, foi um desespero.”

Mascaras da Ideias Soltas

Mascaras da Ideias Soltas

Cristina não quis render-se ao desespero e de imediato começou o trabalho de voluntariado fazendo mascaras e perneiras para o Hospital da Covilhã. Após a normalização de abastecimento de equipamento de protecção ao Hospital, Cristina começou a receber encomendas de máscaras para o comércio local, lares, infantários e pessoas a nível individual.

Tem sido uma grande ajuda, trabalho cerca de 12 horas por dia, tenho a ajuda das minhas filhas e do meu marido, cada um faz o que pode”.

As máscaras que ficam a 3 euros cada são personalizadas, em tecido de algodão, duplas e com filtro TNT.

Silvie Castanheira, de um dos minimercados da Erada, começou a fazer entregas em casa, não apenas aos que estavam em quarentena porque acabavam de regressar, mas também a outras pessoas que necessitassem. Hoje como todos os outros comércios cumpre rigorosamente as regras de distanciamento e desinfeção.

O Carlos Ferreira, da Hecarmi – Electro Canalizações, instalou uma barreira de acrílico no balcão e não é admitida mais que uma pessoa à vez na loja. “Veja, estes 5 litros de desinfectante chegaram a custar 80 euros, hoje custam pouco mais de 5 euros” referindo-se ao aproveitamento que infelizmente muitas empresas fizeram no inicio da pandemia.

Cruzando as ruas desta freguesia da Beira Interior deixa-nos com esperança, apesar da conjuntura actual que nos apresenta um futuro de muita incerteza a nível global. Vemos como pequenos gestos e a cooperação e boa vontade ajudam a ultrapassar dificuldades. Por outro lado o dinamismo e envolvimento social da camada mais jovem da Freguesia contradiz o estereótipo tantas vezes apresentado das aldeias abandonadas e ou envelhecidas. Numa freguesia onde não existe oferta hoteleira nem tecido industrial os jovens procuram novas formas de autoemprego sempre que possível. As actividades culturais e desportivas multiplicam-se, sempre com o envolvimento de todas as camadas etárias da freguesia.

A Erada é um dos exemplos da boa vontade, da solidariedade e competência dos portugueses num país, que como o mundo inteiro, se vê hoje confrontado com uma crise económica e social de uma gravidade sem precedentes. Essa crise traduz-se, para muitos, em desemprego, perda total ou muito substancial de rendimentos e privação da satisfação de necessidades básicas, como a alimentação.

As desigualdades que já anteriormente marcavam a nossa sociedade tendem a agravar-se, pois, como revelam vários estudos, são os mais pobres quem, de um modo geral, mais sofre com esta crise.

A coesão social e ultrapassar as diferenças que muitas vezes nos separam no dia a dia são a nossa mais valia.

 

 


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