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Quinta-feira, Março 28, 2024

Geringonça Ibérica

Paulo Casaca, em Bruxelas
Paulo Casaca, em Bruxelas
Foi deputado no Parlamento Europeu de 1999 a 2009, na Assembleia da República em 1992-1993 e na Assembleia Regional dos Açores em 1990-1991. Foi professor convidado no ISEG 1995-1996, bem como no ISCAL. É autor de alguns livros em economia e relações internacionais.

O albergue espanhol será uma nova geringonça?À frente de uma heteróclita coligação que vai de autonomistas e independentistas de todos os cantos do país à extrema-esquerda parlamentar, Pedro Sánchez estendeu a Espanha o modelo de geringonça fornecido por Portugal.

Em baixo nas sondagens, num cenário europeu de colapso dos socialistas, acusado de não ter legitimidade política e de temer as eleições, não faltaram as críticas que vão do moderado “Albergue espanhol” ao extremo “Governo Frankenstein”.

O governo formado pelo novo Primeiro-Ministro de Espanha – que lidera o PSOE há apenas um ano – aparece contudo como o que de melhor e mais sólido se podia esperar dos socialistas espanhóis e parece justificar plenamente a estratégia que seguiu neste ano.

Sánchez deixou passar a crise catalã em “low profile” e sem se distanciar da acção de Rajoy. Olhando retrospectivamente, será que ele poderia ter agido de outro modo? Será que o recém-eleito secretário-geral do PSOE poderia desafiar as palavras do rei, não esquecendo que este foi ainda mais brutal do que Rajoy?

E quanto à corrupção, era por demais óbvio que o PP de Rajoy se tinha afundado num mar de compadrios, conflitos de interesse e financiamentos pessoais e partidários inadmissíveis. A pesada condenação judicial passada contra o partido, deu contudo apenas agora um peso à moção de censura que antes não existia.

E o governo que Sánchez nos apresenta é uma equipa de luxo.

Para os Negócios Estrangeiros, avança o ex-Presidente do Parlamento Europeu, o catalão Josep Borrell. Intelectual de primeira, não seria possível pensar em personalidade com maior capacidade para fazer as pazes com a Catalunha e projectar uma nova política na Europa.

Para a agricultura e pescas, o mais experimentado dos quadros europeus que não se deixou fechar no casulo, o andaluz Luís Planas, convicto militante do desenvolvimento rural, socialista de valores, é a pessoa capaz de liderar um bloco meridional europeu da coesão.

Para a Justiça, uma opositora ao Jihadismo, Dolores Delgado, uma mulher que não se deixou ir na onda do pseudo-feminismo de contemporização com o fascismo islâmico; alguém em ruptura com a cultura de apaziguamento do fascismo que infelizmente grassa entre os socialistas europeus.

Para a economia, Nadia Calviño, uma galega conhecida pela competência com que tratou das questões orçamentais europeias, e para a administração territorial, necessariamente, uma catalã, Meritxell Batet.

Enfim, dos que conheço, creio que era difícil fazer melhor, partir em posição mais favorável para o fim de uma legislatura – que Sánchez diz que poderá mesmo não chegar a 2020 – em que se vai jogar muito do futuro do país.

Com uma maioria frágil e heteróclita, é claro que o Governo de Sánchez não vai resistir ao menor dos abalos, e que só tem uma possibilidade, que é a de conseguir encarar frontalmente os maiores desafios do país.

E o primeiro é o da Catalunha. Depois destes meses de guerra civil, de exílios e prisões, será possível voltar atrás? Será possível encontrar um equilíbrio entre as gerações espanholas estabelecidas no país e a Catalunha profunda? Em que base será possível um compromisso?

E quanto à transparência e serviço público, será possível pôr em marcha em tempo útil as reformas que acabem com o conflito de interesses como norma? E quanto à Espanha dos esquecidos, dos marginalizados, dos desempregados, será possível trazer esperança?

E conseguirá Luís Planas fazer respeitar os imperativos de sustentabilidade ambiental com a pesada máquina produtivista da agricultura e pesca espanholas? E Dolores Delgado conseguirá ela inverter a lógica de apaziguamento do jihadismo que impera no seu país?

Da resposta a estas questões dependerá mais do que o futuro de Sánchez, de Espanha ou dos socialistas europeus, acima de tudo será o teste à capacidade da Europa para ultrapassar a crise em que se encontra.

Foto: Javier Lizon / Pool

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