Desta feita não foram os militares. Foram os grandes capitalistas e terra-tenentes, de mãos dadas com os políticos corruptos que dominam ambas as câmaras do Parlamento Brasileiro, e a cumplicidade dos principais órgãos de comunicação social, controlados por apenas cinco famílias, em todo o território da federação.
“Posso ter cometido erros, mas não cometi crimes”, disse Dilma Rousseff, a presidente que foi alvo de impeachment e tem agora o mandato suspenso.
Após a votação no Senado, em Brasília, a até agora chefe de Estado reagiu publicamente e denunciou que o processo de impeachment é “frágil, juridicamente inconsistente, injusto e desencadeado contra uma pessoa honesta e inocente”.
“O objectivo tem sido impedir-me de governar e, assim, forjar o ambiente propício ao golpe. Quando uma presidente é afastada por um crime que não cometeu, o nome que se dá a isso num ambiente democrático não é impeachment, é golpe. Não cometi crime de responsabilidade, não há razão para um processo de impeachment, não tenho contas no exterior, nunca recebi propina, jamais compactuei com corrupção”, adiantou.
Na sua declaração no Palácio do Planalto, Dilma acrescentou que “está sendo julgada injustamente” por ter feito tudo o que a lei a autorizava a fazer. “O meu governo não concedeu nenhum acto repressivo contra movimentos sociais ou manifestantes de qualquer posição política. O maior risco para o país nesse momento é ser guiado por um governo sem voto”.
“Eu já sofri a dor indizível da tortura, agora sofro novamente a dor inominável da injustiça. O que mais dói é a injustiça”, declarou.
Dilma lembrou ainda que nunca reprimiu opositores, ao alertar para os riscos daquilo que designou por “um governo dos sem-voto”. Argumenta também que houve “uma espécie de eleição indireta” para que o vice-presidente Michel Temer assumisse o poder.
Após o discurso oficial, dentro do Palácio, Dilma deixou o local cercada por seguranças e dezenas de parlamentares e ex-ministros. Perante a multidão que a aguardava, Dilma voltou a discursar ao lado do ex-presidente Lula e descreveu “a hora trágica” em que “a jovem democracia brasileira está sendo alvo de um golpe”. “O golpe está baseado em razões as mais levianas, as mais injustificáveis”, declarou.
Dilma Rousseff destacou ainda “São duas palavras terríveis: traição e injustiça. São talvez, as mais terríveis palavras que recaem sobre uma pessoa. E esta hora, este momento que estamos vivendo, é o momento em que a injustiça e a traição estão soltas por aí. Quero dizer para vocês que eu estou pronta para resistir por todos os meios legais”.
Argentina de braços abertos para Temer
A Argentina foi o primeiro país a acatar a nova situação política no Brasil. «Diante dos factos registados no Brasil, o Governo da Argentina manifesta que respeita o processo institucional em curso e confia em que o desenlace da situação consolide a solidez da democracia brasileira», diz nota oficial da chancelaria argentina, emitida pouco depois de o Senado aprovar a tramitação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, divulgou o jornal El Pais no Brasil.
«O Governo Argentino continuará dialogando com as autoridades constituídas a fim de continuar o processo de integração bilateral e regional» conclui o texto, publicado pela chanceler Susana Malcorra, na sua conta no Twitter.
De destacar que o Governo de Macri sempre se negou a falar em «golpe», ao contrário do que fizeram Evo Morales e outros ícones da esquerda sul-americana.
Com um novo presidente, ideologicamente mais próximo, Macri quis ser o primeiro a deixar claro que Temer pode contar com o apoio argentino enquanto for o presidente constitucional do Brasil.
Muito diferente foi a postura de Maurício Macri em relação à Venezuela que, como o Brasil, integra o Mercosul – bloco económico regional formado também por Argentina, Uruguai e Paraguai. Na primeira entrevista a correspondentes estrangeiros em Buenos Aires, no passado dia 6 de Maio, Macri disse que a Venezuela «não pode continuar» como está, com uma inflação anual de 700%, uma crise energética e de bens de primeira necessidade, fazendo ainda um apelo a Nicolas Maduro, para que negocie com a oposição um «processo de transição», explicou o portal Brasil 247.
Por seu turno, na Venezuela, onde a crise económica e política do país é manchete, o canal de televisão Telesur disse que houve um «golpe contra a democracia» brasileira. Já o jornal chileno El Mercurio também fez manchete do afastamento de Dilma, explicando ainda que «60% dos senadores brasileiros têm causas pendentes na Justiça».