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Quinta-feira, Abril 25, 2024

Lucros e preços aumentam e poder de compra diminui

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Lucros e preços não param de aumentar e o poder de compra dos salários dos trabalhadores dos setores privado e publico continua a diminuir, mas “Mário Centeno não quer aumento de salários” (Mário Centeno, como governador do Banco de Portugal, recebe 17470€/mês, quase o dobro do presidente da República que recebe 8902€/mês)

Neste estudo analiso, utilizando dados oficiais, a justificação dada por Mario Centeno, na entrevista à Rádio Nascença, para afirmar que ” NÃO QUER AUMENTO DE SALARIOS”, mostrando que ela não tem qualquer base técnica consistente e que revela uma profunda insensibilidade social e uma falta de respeito pelo agravamento das condições de vida dos trabalhadores e pensionistas. Aquela afirmação também mostra uma grande ignorância e a incapacidade para analisar as verdadeiras causas da atual escalada de preços no nosso país, que continua em 2023, apesar do governo e seus defensores pretenderem convencer a opinião pública do contrário.

 

Estudo

Lucros e preços não param de aumentar e o poder de compra dos salários dos trabalhadores dos setores privado e publico continua a diminuir, mas “Mário Centeno não quer aumento de salários”

Em 21/3/2023, Mário Centeno, governador do Banco de Portugal, deu uma entrevista à Rádio Renascença que este órgão de comunicação social resumiu com o seguinte título “MARIO CENTENO NÃO QUER AUMENTO DE SALÁRIOS”. E o argumento utilizado por Mário Centeno, segundo a Rádio Renascença, foi textualmente o seguinte: “A subida generalizada dos salários só alimenta o aumento de preços, e porquê? Porque se tivermos dinheiro suficiente para continuar a consumir os preços não vão descer. Com menos dinheiro, haverá um corte no consumo, o que pode obrigar a uma redução de preços. É essa a expectativa”. Para Mário Centeno a única forma de reduzir a atual escalada de preços é empobrecer ainda mais os trabalhadores portugueses, agravando ainda mais as suas condições de vida, generalizando a pobreza e a forme, pois assim reduz-se o consumo, e os preços baixam. Mas esquece-se por ignorância ou deliberadamente de analisar as causas da atual escalada de preços que é muito diferente da que ele certamente aprendeu nos livros de economia que leu. E isto porque a redução drástica do poder de compra dos trabalhadores gera o incumprimento (que já está a suceder a nível do crédito à habitação e ao consumo), reduz o consumo interno, diminui as vendas das empresas, gera mais falências e desemprego, e mais crise

 

A ATUAL ESCALADA DE PREÇOS NÃO SE RESOLVE EMPOBRECENDO AINDA MAIS OS PORTUGUESES COMO DEFENDE MÁRIO CENTENO

A atual escalada de preços tem fundamentalmente duas causas. A primeira causa, resulta de tudo aquilo que o país importa (energia, cereais, produtos alimentares) devido à guerra, mas principalmente por causa das sanções que obrigou os países da U.E., e também o nosso país, a proibir as importações de mercados onde os preços são mais baixos, e a recorrer a mercados com preços mais altos, aumentando a procura nesses países o que determinou aumento de preços, empolados por intermediários (corretores) a que se adicionou custos de transporte mais elevados. É evidente que não é reduzindo ainda mais o consumo dos trabalhadores e pensionistas que se resolve este problema. É preciso ter a coragem de dizer que as sanções alimentam a especulação , causam pobreza e agravam a crise económica e social. É preciso falar verdade aos portugueses. A segunda causa é a de ser uma inflação pelos lucros devido à ausência de fiscalização que o governo só recentemente, devido à pressão popular, tomou medidas que não resolvem o problema, já que são limitadas (até out.2023) e recusa controlar as margens de lucro.

 

A ESCALADA DE PREÇOS RESULTA, EM GRANDE PARTE, DA INFLAÇÃO IMPORTADA CAUSADA PELAS SANÇÕES QUE IMPEDEM O NOSSO PAIS DE ACEDER AOS MERCADOS COM PREÇOS MAIS FAVORÁVEIS

A primeira causa da escalada de preços é a inflação importada como prova o quadro 1.

Quadro 1 – Aumentos dos custos das importações de produtos agrícolas, alimentares e da energia entre 2021 e 2022

Embora não estejam disponibilizadas pelo INE as quantidades importadas, é evidente que este aumento medio de 56,3% nos custos das importações destes três grupos produtos, cuja subida de preços é a principal causa do aumento da inflação anual em Portugal, se deve principalmente, não aumento das quantidade importadas, mas sim ao aumento significativo dos preços das importações: Quem conheça esta área, sabe bem que nela dominam os corretores de matérias primas, que aproveitam as dificuldades e obstáculos criados pelas sanções, para maximizar lucros pois, para eles, as sanções é uma coisa dos políticos, o que interessa é aproveitar as dificuldades criadas por elas, para as tornear e inflacionar os preços, arrecadando gigantescos lucros, que acabam por ser pagos pelos consumidores finais. Foi o que aconteceu com as sanções aplicadas ao Iraque de Saddam e mesmo com o “programa petróleo em troca de alimentos”, e certamente está a acontecer com as sanções aplicadas à Rússia que proíbe Portugal de aceder a fornecedores com preços mais baixos. Será que Mário Centeno desconhece esta realidade ou finge desconhecer para assim manipular a opinião publica.

 

A ESCALADA DE PREÇOS NO NOSSO PAÍS É CAUSADA TAMBÉM PELA INFLAÇÃO DE LUCROS (enormes lucros)

Uma segunda causa da escalada de preços que se verifica é chamada “inflação pelos lucros”, ou seja, um aumento de preços determinada por um aumento enorme de lucros, já que os empresários (o Capital) aproveitam a situação internacional, a subida de preços que ela determina, e a ausência de qualquer controlo por parte do governo e das chamadas entidades reguladores que, na prática, não fiscalizam nada, para aumentar enormemente os lucros. No fim de out.2022, o INE publicou “Empresas em Portugal” com dados referentes a 2008/2021. É dessa publicação que se retiraram os dados que constam do quadro 2, que revelam o aumento enorme dos lucros das empresas no período 2019/2021 (2021 é o último ano disponibilizado).

Quadro 2 – Lucros das empresas não financeiras em 2021 já são muito superiores aos de 2019 – INE

Segundo o INE, o aumento dos lucros das empresas não financeiras foi enorme entre 2020 e 2021 – +61,8% no total das empresas e + 96,1% nas grandes empresas – apesar do valor da produção ter crescido, respetivamente, apenas 16,3% e 18,5%. Este aumento de lucros determinou que, em 2021, os lucros das empresas não financeiras já fossem superiores aos de 2019 (+25,2% se considerarmos todas as empresas, e +11,6% nas grandes empresas). Entre 2021 e 2022, os lucros dos cinco principais bancos (CGD, BCP, Novo Banco, Santander-Totta e BPI) aumentaram de 1406 milhões € para 2531 milhões € (+80%); os dos da GALP aumentaram de 457 milhões € para 881 milhões € (+93%); os da Jerónimo Martins subiram de 484 milhões € para 607 milhões € (+25%); os da Sonae aumentaram de 267 milhões para 342 milhões € (+28,1%). Qual é o trabalhador que viu o seu salário aumentar nestas percentagens? E ainda Mário Centeno tem a lata de dizer o que disse! É evidente que este aumento enorme dos lucros contribuiu para a escalada de preços, o que prova que a justificação de Mário Centeno não tem qualquer consistência técnica.

 

A PERDA DE PODER DE COMPRA DOS TRABALHADORES DO SETOR PÚBLICO E DO SETOR PRIVADO

Quadro 3 – O aumento das remunerações dos trabalhadores do setor publico e privado e a perda de poder de compra

Para evitar interpretações incorretas interessa não esquecer que a diferença de remunerações médias entre o setor privado e publico resulta de que no setor publico 55,2% dos trabalhadores têm o ensino superior enquanto no setor privado são apenas 26,9%. Para muitas profissões idênticas a remuneração no setor público é já inferior ao do setor privado, o que impossibilita a contratação de técnicos com qualificações elevadas (médicos, professores, eng. Informáticos, etc.) com consequências graves na qualidade de serviços prestados aos portugueses. Segundo o INE entre 2019/2022 os trabalhadores da Administração Pública perderam entre 5,5% e 5,8% de poder de compra, e os do setor privado perderam entre 2021/2022 uma parcela do aumento do poder de compra que tinham obtido entre 2019/2020 como revelam os dados do quadro o que prova também que Mario Centeno não tem razão.

 

E EM 2023 A INFLAÇÃO ANUAL CONTINUA A AUMENTAR SEGUNDO O INE APESAR DO GOVERNO DIZER O CONTRÁRIO


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