Este artigo é o número 200 dos que venho publicando como colunista do Jornal Tornado, em colaboração iniciada em 29 de Janeiro de 2018 com “Haverá lugar para os think tanks na política portuguesa?”. Agradeço ao Director, João de Sousa, o convite e a forma como tem mantido o título a funcionar e a Rute Henriques a forma como tem ilustrado os artigos ou mesmo assegurado a introdução de vídeos, como no caso de “Activistas climáticos”. Devo igualmente a esta última a paciente introdução de rectificações que vou pedindo quando me apercebo de deficiências nos originais que submeto.
Tenho tido muita honra em publicar ao lado de Arnaldo Xarim e Eugénio Rosa, para apenas citar os artigos produzidos mais recentemente, e dos colunistas do Brasil e de Timor-Leste, em especial de M. Azancot de Menezes, cuja discussão sobre a eventual suspensão da abertura de cursos superiores em Timor-Leste, recentemente publicada, tenho por modelar.
Quando fui convidado o Director João de Sousa atribuiu-me um espaço de 45 palavras para apresentação. Ficou assim:
Economista, Mestre em Administração e Políticas Públicas, Doutor em Sociologia Política. Exerceu actividade em Gestão Pública, Recuperação de Empresas, Auditoria e Fiscalização e foi docente no ISE e no ISG. Investiga em História Contemporânea.
Mas justificam-se algumas explicações adicionais.
Economista
Os leitores do Jornal Tornado conhecem o meu cepticismo quanto à delimitação desta profissão (Os Economistas e as eleições na sua Ordem). Nos meus primeiros dez anos após a licenciatura exerci funções no Departamento Central de Planeamento, sucessor do Secretariado Técnico da Presidência do Conselho, num período em que foram dirigentes diversos juristas e sobretudo engenheiros. Investi aí e também no então Instituto Superior de Economia, no qual que leccionava a tempo parcial, na área de Finanças Públicas, e no Departamento, no domínio da orçamentação plurianual. Pressenti que a adesão à ainda Comunidade Económica Europeia iria contribuir para diluir a capacidade criada no domínio do planeamento, inclusive na construção de modelos (julgo que João Cravinho terá em tempos escrito um artigo sobre esta evolução) aliás o entretanto redenominado Departamento de Prospectiva e Planeamento acabou a sua vida como organismo do Ministério do Ambiente (!!!) em cujas instalações da Rua do Século pude consultar muito mais tarde parte dos seus arquivos.
Alguns dos meus antigos colegas ressentem a perda das capacidades desse tempo. Não tenho escrito muito no Jornal Tornado sobre isto, mas uma vez ou outra chamei a atenção para a dificuldade de concretizar um PRR quando se não dispõe de um modelo que incorpore as restrições da capacidade da indústria de construção e obras públicas, se insiste em disparar ”bazucas” com uma economia sobreaquecida por tensões inflaccionistas e em vez de modular o esforço de investimento com vista à “reindustrialização” se opta por acelerá-lo à custa de um empolamento dos custos.
Exerceu actividade em Gestão Pública… Mestre em Administração e Políticas Públicas. Doutor em Sociologia, especialidade de Sociologia Política
Depois de dez anos num Departamento Central que tendia a ver-se como o “centro” do mundo, ou pelo menos da Administração, procurei conscientemente oportunidades de exercer funções na “periferia”, tendo passado por vários Ministérios. Trouxe várias vezes ao espaço do Jornal Tornado relatos de algumas destas experiências, explicando num caso ou noutro em que qualidade as enfrentei. Para mim não fazem sentido as sínteses curriculares em que alguém declara que “é” “ex-isto ou aquilo“.
A “volta à Administração” acabou para mim com o exercício de funções nos serviços de apoio ao Tribunal de Contas, onde já me encontrava quando frequentei no ISCTE o Mestrado em Administração e Políticas Públicas, e no ISCTE-IUL o doutoramento em Sociologia, especialidade em Sociologia Política, sendo que aquela instituição reorganizou há anos as suas áreas curriculares. A minha tese de doutoramento O Progresso da Ideia de “Gestão Empresarial” na Administração Pública Portuguesa, a que me referi várias vezes no Jornal Tornado, teve upload em Academia.Edu e deixo aqui link para o Repositório da instituição, alertando para que não se trata de uma tese mainstream:

A frequência de formação conducente a graus académicos no ISCTE foi totalmente independente da minha lecionação de Gestão do Sector Público a finalistas no Instituto Superior de Gestão. A minha ligação contratual com esta instituição privada, neste momento integrada no Grupo Lusófona, cessou em 2011.
Exerceu actividade… em recuperação de empresas
Faltará explicar que me envolvi com a problemática da recuperação de empresas quando entre 1995 e 1999 desempenhei funções no GACRE e na AUDITRE em ligação com a qualidade de membro dos Gabinetes, primeiro do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Carlos dos Santos, e depois do Ministro das Finanças, António de Sousa Franco, qualidade que adquiri por confiança pessoal e não por confiança política. Mais uma vez reitero que os membros dos gabinetes não são membros do Governo.
Tenho publicado no Jornal Tornado diversos artigos sobre a matéria, dos quais o mais “noticioso” será Insolvência e Recuperação: campo para juristas ou para economistas? mas fará sentido dar aos leitores acesso à dissertação de Mestrado em Administração e Políticas Públicas Apoios públicos à transferência de titularidade de empresas em situação difícil. O contributo da alienação de créditos, que redigida dois anos depois do termo desta experiência (por forma a salvaguardar um período de nojo mínimo), incidiu não sobre Administração Pública mas sobre uma política pública.
Investiga em História Contemporânea
Esta referência era indispensável na apresentação, há 7 anos, do novo colunista, para se compreenderem os interesses actuais do autor, que, logo após a conclusão do doutoramento em Sociologia se inscreveu, após algumas trocas de impressões, em outro doutoramento do ISCTE – IUL, mais precisamente no de História Moderna e Contemporânea – Especialidade em Política, Cultura e Cidadania.
Porquê? Porque o doutoramento precedente me mostrara a existência de grandes lacunas em termos de identificação de documentação pertinente para o estudo da Administração Pública e das “políticas de administração pública”, designadamente durante o Estado Novo, e sobre os mecanismos de influência da cooperação internacional na formulação dessas políticas. E porque, se uma preocupação saudável na preparação de “projectos de tese” na área de História Moderna e Contemporânea determina que os candidatos a doutoramento se assegurem primeiro da existência e acessibilidade de núcleos documentais que suportem o estudo dos temas que seleccionaram, no meu caso pessoal o imperativo foi o de, ao estudar os mecanismos que me propus tratar, identificar o máximo possível de documentos e salvaguardar, inclusive por transcrição, a informação e opinião neles contida. Que credenciais tinha para o fazer? a posse de um doutoramento, ainda que noutra área, mostra pelo menos que o titular está apto para realizar investigação autonomamente, a aprovação na parte escolar (exigente) deu-me um Diploma de Estudos Avançados (3º Ciclo) na área de História Moderna e Contemporânea, o órgão competente da instituição aprovou o projecto de tese(i). Que recursos? Bem, a minha “bolsa” tem sido a pensão de aposentação fixada em 2014, mais tarde majorada como pensão unificada, que suportou inclusive algumas deslocações a Bruxelas – à sede do Instituto Internacional de Ciências Administrativas e à Biblioteca Real da Bélgica, e a Paris – à sede da OCDE.
Publiquei em 2019 o primeiro dos três estudos que previa viessem a ser reunidos em nova tese em O Sítio do Livro, com a denominação As Secções Nacionais Portuguesas do Instituto Internacional de Ciências Administrativas (1908-2012) e, com o acordo da editora, em Academia.Edu. Está há algum tempo também disponível no site do Jornal Tornado
É um trabalho feito, posso asseverá-lo, com a preocupação de preservar o maior rigor na utilização das fontes, o que implicou o frequente recurso a transcrições de textos em português e em francês na forma ortográfica original. E que me tem permitido outras pequenas pesquisas que têm propiciado a redacção de artigos que têm sido de igual modo publicados no Jornal Tornado e até a publicação em 2022 de um novo estudo, cujo título os leitores reconhecerão: A Intendência-Geral do Orçamento – História de um Organismo que Nunca Existiu (1929-1996), que pode continuar a ser pedido a O Sítio do Livro.
Anote-se que tenho procurado chamar a atenção para os opúsculos do Gabinete de Estudos António José Malheiro, felizmente quase todos acessíveis na biblioteca digital do Ministério das Finanças e para a Revista de Contabilidade Pública, infelizmente ainda não acessível.
Também já expliquei o porquê de não terem avançado outros trabalhos (Inacessibilidades).
Recentemente, a utilização das fontes com que o leitor está familiarizado permitiu-me escrever, a propósito da realização no Porto de um Congresso Internacional de História da Contabilidade promovido pela Ordem dos Contabilistas Certificados, um texto que, com o título “Por que razão falhou a introdução da contabilidade digráfica na Administração Pública do Estado Novo“, também ficou acessível no site do Jornal Tornado.
Como garantia da preocupação de rigor na difusão destas despretensiosas Incursões em História Contemporânea, consulte-se o blog, organizado à margem do blog onde fui publicando artigos de opinião.
Na altura em que escrevo este artigo, existe necessidade de um momento de reflexão sobre a importância e a viabilidade de continuar.
Na colaboração mantida até agora, julgo ter conseguido diversificar temas embora talvez sem conseguir manter sempre o interesse dos leitores. Os artigos mais penosos para mim foram contudo os que me vi forçado a escrever evocando os falecidos António Carlos Santos e André Freire. Aqui deixo mais uma vez a minha homenagem e reparo, agora, em relação a ambos assinalei uma vivência sindical (no ensino superior) comum: com o António Carlos, no SPGL, e com o André, no SNESup. Alguma coisa ficaria por dizer, mesmo neste talvez último artigo.
Nota
(i) Que, confirmei-o à data em que concluo este artigo, consta do RENATES – Registo Nacional de Teses e Dissertações, como tese de doutoramento em curso através do ISCTE-IUL.