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Quarta-feira, Março 27, 2024

Para 94% da população nenhuma mulher merece ser estuprada, revela pesquisa

Marcos Aurélio Ruy, em São Paulo
Marcos Aurélio Ruy, em São Paulo
Jornalista, assessor do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo

Ao contrário do que disse o então deputado federal Jair Bolsonaro de que não estupraria a também deputada Maria do Rosário porque ela não merecia, 94% das brasileiras e brasileiros acreditam que nenhuma mulher merece ser estuprada, revela a pesquisa Percepções Sobre Estupro e Aborto Previsto por Lei, feita pelo Instituto Locomotiva em parceria com o Instituto Patrícia Galvão, divulgada nesta terça-feira (10).

Outros dados reveladores mostram que 95% das mulheres têm medo de serem vítimas de estupro, sendo que 78% sentem muito medo. E 99% de todos os entrevistados sentem essa insegurança no quinto país mais violento contra as mulheres no mundo.



“Entender esse levantamento é essencial para as estratégias a serem adotadas pelos movimentos por igualdade de gênero e pelo respeito à vida das mulheres e da população LGBT”, afirma Celina Arêas, secretária da Mulher Trabalhadora da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).

Outro dado a ser destacado é que para 84%, as vítimas de estupro nunca têm culpa pela violência. E 52% dos entrevistados dizem conhecer alguma vítima dessa violência hedionda.

Para Berenice Darc, secretária de Relações de Gênero da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), o presidente da República as instituições não têm dado o devido exemplo necessário para o combate à violência de gênero e à cultura do estupro.

Ela cita como exemplos, a decisão da Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) de manter a absolvição, em primeira instância, por meio de júri popular, “de um homem preso em flagrante por esfaquear a ex-companheira, movido por ciúme, mostra a situação de desamparo vivenciada pelas mulheres no país”.

Mas principalmente, “a violência sofrida por Mari Ferrer em uma audiência de um tribunal de justiça, onde o advogado de defesa do algoz agrediu violentamente a vítima, sem que ninguém interviesse em seu favor e o juiz absolveu o acusado de estupro com o argumento de ‘estupro culposo’”. Isso para Berenice “incita à violência e à misoginia pelo sentimento de impunidade”.

Já o 14º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado recentemente, comprova o levantamento dessa pesquisa sobre a percepção e mostra que uma mulher foi agredida a cada 2 minutos no país, em 2019.

O anuário aponta ainda para o registro de 66.123 estupros em 2019, um a cada 8 minutos, sendo que 57,9% das vítimas foram meninas de no máximo 13 anos e a maioria aconteceu dentro de casa por pessoas conhecidas das vítimas. Além de terem ocorrido 1.326 feminicídios, com 89,9% cometidos por companheiros ou ex-companheiros das vítimas.

O Silêncio das Inocentes (2010), de Ique Gazzola

A pesquisa sobre a percepção da população em relação à violência contra as mulheres aponta que 73% das duas mil entrevistadas e entrevistados, entre 1º e 14 de setembro, a violência doméstica é o principal problema enfrentado pelas mulheres no Brasil.

O assédio sexual aflige 53%, o salário menor que os homens em funções iguais é problema para 43% e o estupro para 42%. Como as estimativas apontam para que cerca de 10% das vítimas denunciam o estupro, a pesquisa aponta a vergonha, o constrangimento e o medo da exposição entre os principais fatores para a não denúncia.

“De uma maneira geral, as mulheres que denunciam o estupro e a violência doméstica sofrem nova violência pelo tratamento machista e preconceituoso que recebem”, afirma Marilene Betros, secretária da Mulher da CTB-BA e de Políticas Educacionais da CTB.

E isso vem acontecendo com mais frequência por causa “do abandono das políticas públicas em favor dos direitos da mulher a uma vida digna e sem medo”, acentua Marilene. Por isso, Celina defende a importância de termos mais mulheres na política, nas instâncias de poder e em cargos de direção no mercado de trabalho.

“O compromisso com a emancipação feminina da mulher trabalhadora é fundamental para avançarmos na política de igualdade de direitos”, reforça. Além de “levarmos o debate sobre as questões de gênero para toda a sociedade com inteligência e transparência”.

Além disso, a pesquisa revela também a percepção de 56% dos entrevistados sobre as mulheres negras serem as principais vítimas de estupro e de violência doméstica no país. Entre os negros essa percepção sobe para 61%.

Já 82% das pessoas pesquisadas concordam com a legislação permitindo o aborto em casos de estupro. Para 88%, a interrupção da gravidez deve ser feita de forma segura e pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Isso porque “a não descriminalização do estupro atinge em cheio as mulheres pobres, que não têm dinheiro para pagar clínicas caríssimas para a realização do aborto e se submetem a fazê-lo em locais sem nenhuma condição”, denuncia Vânia Marques Pinto, secretária de Políticas Sociais da CTB.

“A pesquisa mostra que todo mundo tem a real percepção do problema e de que o poder instituído faz muito pouco para o combate à cultura do estupro”, define Celina. “Não podemos mais viver sob o medo e a vergonha”, reforça.


Texto em português do Brasil


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