O Orçamento Geral de Estado para 2019, no valor de 2,13 mil milhões de USD, o mais elevado de sempre, poderá ser vetado pelo Presidente da RDTL, Francisco Guterres / Lu´Olo. Se tal acontecer, ainda este ano, poderão realizar-se eleições legislativas antecipadas.
O Presidente da República Democrática de Timor-Leste (RDTL), desde o dia 7 do corrente mês, iniciou uma ronda de consultas junto de vários líderes partidários, representantes de igrejas e de outras forças vivas da sociedade para melhor fundamentar a sua decisão em relação ao gigantesco Orçamento Geral de Estado para 2019 (OGE para 2019).
Polémica em torno do consórcio do Greater Sunrise
A dimensão do valor elevado do OGE para 2019, na ordem dos 2,13 mil milhões de USD, é explicada pela coligação partidária governamental, constituída pelo CNRT, PLP e KHUNTO, como uma necessidade para a compra das acções da Shell, num valor de 300 milhões de USD, e para a participação da Conoco Phillips, no valor de 350 milhões de USD, as duas companhias que integram o consórcio do Greater Sunrise.
Os partidos políticos que não integram a coligação governamental, onde se inclui o maior partido de Timor-Leste, a FRETILIN, questionam os valores financeiros e a transparência de todo o processo do envolvimento da Shell e da Conoco Phillips, nomeadamente porque implica a integração de um valor muito avultado no OGE para 2019.
A sociedade timorense vive, por isso, mais um momento de muita tensão. Se o Presidente da RDTL vetar o orçamento, obrigatoriamente terá que o fazer até 23 de Janeiro, este voltará ao Parlamento Nacional para ser reapreciado. Contudo, como para a sua reaprovação a coligação governamental precisaria de dois terços (43 dos 65 deputados), apesar de não ser impossível, tratando-se de uma meta muito difícil de se concretizar, o Parlamento Nacional, nos termos da Constituição da RDTL, sem Orçamento aprovado, teria que ser dissolvido e convocadas novas eleições.
A confirmar-se este cenário de eleições antecipadas para este ano, o panorama político-partidário mudaria bastante, com o surgimento de novas coligações partidárias e o provável ponto final de algumas das coligações actualmente existentes.
Timor-Leste precisa de novas políticas sobre os recursos petrolíferos e minerais
O Ponto 1 do Artigo 139.º (Recursos naturais) refere que:
Artigo 139.º (Recursos naturais)
Ponto 1
os recursos do solo, do subsolo, das águas territoriais, da plataforma continental e da zona económica exclusiva, que são vitais para a economia, são propriedade do Estado e devem ser utilizados de uma forma justa e igualitária, de acordo com o interesse nacional”.
Constituição da RDTL
As políticas actuais e a legislação em vigor sobre os recursos petrolíferos, concretamente, a Lei do Fundo Petrolífero e a Lei das Actividades Petrolíferas precisam de ser reformadas para que Timor-Leste possa beneficiar dos seus recursos, nos termos constitucionais, nomeadamente a garantia de concretização do Artigo 139.º, para garantir o desenvolvimento nacional.
O benefício dos recursos para Timor-Leste, com novas políticas do Estado e com nova legislação, terá implicações positivas em todos os sectores da sociedade, a atravessar momentos muito complicados, com múltiplos e diversos pontos de constrangimento, que ocasionaram a paralisação quase total do país.
A constatação deste meu triste sentimento é visível nos problemas tremendos existentes, ao nível do desenvolvimento económico e do progresso da educação e da investigação científica, apenas para citar estes dois sectores estratégicos.
Um modelo de desenvolvimento económico com valores timorenses
Sobre o sector económico, tomo a liberdade de partilhar alguns pensamentos de Avelino Coelho da Silva, com quem conversei há dias a propósito da situação política vivida no país. Na opinião deste líder partidário, grande nacionalista leste-timorense, o solo nacional é fértil e a mão de obra é jovem, contudo, por falta de incentivos, muitas zonas férteis estão por cultivar e muita mão de obra jovem prefere emigrar para outros Países em busca de emprego.
O que nós devemos fazer é questionar, será que estamos aptos para abordar uma estratégia que torna a agricultura e a nossa indústria artesanal como base e motores do desenvolvimento sustentável? Será que a nossa legislação para este sector é suficientemente objectiva?
Na opinião de Avelino Coelho, os líderes políticos de Timor-Leste devem sentar-se a uma mesa para debater estas questões e o Estado deve repensar a construção de um Novo Modelo de Desenvolvimento Agrícola do País.
As agências internacionais concebem programas para serem implementados em território nacional, note-se, sem consulta local, deslocados da realidade, programas previamente fabricados pelos “peritos” internacionais, pretensamente para o desenvolvimento de infraestruturas nas áreas rurais, com o envolvimento das comunidades locais (agricultores, pescadores, criadores de gado, etc…), nas obras de construção e reabilitação, tais como estradas e pontes.
Estes projectos e programas, que supostamente deveriam ser medidas correctas para a criação de emprego e combate à pobreza, não resolverão nunca o problema de fundo porque, desde logo, estas medidas são temporárias, não contribuindo eficazmente para a resolução sustentada da situação do desemprego e na redução da pobreza. Uma outra razão adicional é explicável porque o desenvolvimento económico que se propõe não toma em devida consideração os valores timorenses.
Novos paradigmas e acções para o progresso da educação e da investigação em Timor-Leste
Os pontos de constrangimento no sector da educação, e no domínio da investigação, na sua maior parte, já foram identificados por especialistas nacionais. Agora, é preciso vontade política e trabalhar com espírito nacionalista e patriótico para vencer e ultrapassar esses pontos de constrangimento.
No âmbito do ensino, para além da formação contínua, é necessário haver um incremento substancial da formação inicial de professores tendo presente que deve haver outro paradigma de formação, consentâneo com uma sociedade em mudança, em contexto global e local.
O (novo) docente timorense tem que assumir uma postura diferente, reformulando os seus modelos e métodos de ensino, no pressuposto de que o processo de ensino-aprendizagem deverá centrar-se no desenvolvimento de competências do estudante promotoras de pensamento crítico, tal como é mencionado na Lei de Bases da Educação do país.
A aposta na educação, a começar no pré-escolar, está esquecida e marginalizada. Se alguém tiver dúvidas a este respeito, eu pergunto:
Onde estão os educadores de infância, a não ser os portugueses que estão no «Centro de Aprendizagem e Formação Escolar» (CAFE), devidamente habilitados em termos científicos e didáctico-pedagógicos, e em número suficiente para garantir a educação pré-escolar em Timor-Leste?
A educação está tão mal que nem sequer há uma política de manuais escolares com medidas legislativas que garantam a avaliação, certificação e disponibilização de manuais escolares com protecção para as famílias mais vulneráveis que vivem nas zonas rurais e nos pontos mais pobres do país.
Ao nível do Ensino Superior, devido à ausência de políticas bem delineadas ou mesmo inexistentes, não havendo uma perspectiva correcta de se pensar este nível de ensino, a investigação científica é muito reduzida ou praticamente nula, e não se enquadra nos níveis exigidos pela comunidade científica internacional.
Para o desenvolvimento da Ciência e Tecnologia no país, é imprescindível proceder-se a um inventário da actividade de pesquisa realizada e fazer o registo dos estudos científicos nacionais e internacionais da autoria de nacionais ou estrangeiros.
Os decisores políticos terão que ter uma visão estratégica no sentido de compreender e assumir, no espírito e na letra, que a educação e a investigação são o motor de desenvolvimento de qualquer país.