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Quinta-feira, Abril 25, 2024

A política de baixos salários em Portugal

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

Entre 2004 e 2017, o custo hora do trabalho em Portugal aumentou 2,8€, enquanto a média na União Europeia foi 2,5 vezes superior e, em 2017, o custo hora do trabalho em Portugal correspondia apenas a 46,5% da Zona Euro

Estudo

No estudo anterior analisamos a evolução percentual do custo hora da mão de obra em Portugal e na União Europeia entre o 1º Trim. 2017 e o 1º Trim. 2018, e concluímos que foi apenas em Portugal que se verificou uma variação negativa (-1,5%), enquanto em todos os outros países da U.E. se registou um aumento (em média +2,7%), o que revela o aumento da sobre-exploração do trabalho em Portugal no período considerado. Neste estudo, para completar o anterior, e utilizando também só dados do Eurostat, vamos analisar o custo da mão de obra nos países da União Europeia em euros, para que se possa ficar com uma ideia clara da diferença que separa Portugal dos restantes países, e das consequências do acordo de concertação social assinado entre a UGT/Patrões/ Governo que este tenciona que seja aprovado na Assembleia da República.

Uma política de manutenção de baixos salários em Portugal: UGT/Patrões/Governo

Como referimos no estudo anterior, segundo o Eurostat, o custo hora da mão de obra obtém-se dividindo todos os gastos que o empregador tem com os seus trabalhadores (ordenados, salários, subsídio de refeição e outros, contribuições para a segurança social, etc.) pelas horas trabalhadas. O gráfico 1, do Eurostat, mostra a situação actual de Portugal no contexto da União Europeia.

 

Gráfico 1 – O custo hora do trabalho em Portugal e nos países da União Europeia, em euros em 2017 – nas empresas com 10 e mais trabalhadores – Eurostat

 

Em 2017, o custo hora do trabalho em Portugal era apenas de 14,1€, enquanto a média nos países da União Europeia era de 26,8€, ou seja, 90% mais. Mas o quadro 1, também como dados Eurostat, mostra com maior clareza o que aconteceu entre 2004 e 2017 nesta área.

 

Quadro 1- Variação do custo hora do trabalho em Portugal e nos países da U.E. 2004/2017

 



 

Estudo

O custos hora da mão de obra em Portugal no 1º Trim. 2018 diminuiu 1,5% quando comparado com o do 1º Trim. 2017, enquanto nos países da União Europeia aumentou 2,7%: a sobre-exploração dos trabalhadores em Portugal aumentou em 2018

Numa altura em que a UGT, patrões e governo se uniram na concertação social para impedir qualquer alteração importante do Código de Trabalho que defendesse os trabalhadores, que são a parte mais fraca na relação de trabalho (como a introdução do principio do tratamento mais favorável que até existia antes do 25 de Abril; o fim da caducidade automática dos Contratos Coletivos de Trabalho; a redução da precariedade que cresceu nos últimos anos como mostramos em estudo anterior; o combate à politica de baixos salários praticada pelos patrões, etc.), o gráfico que a seguir se apresenta, sobre a evolução do custo hora da mão de obra nos países da União Europeia entre 2017 e 2018, divulgado pelo Eurostat no seu comunicado nº 98/2018 de 15-6-2018, chama a atenção para uma realidade grave que é sistematicamente omitida pelo governo e pelas associações patronais.

 

Quadro 1- Evolução do custo hora da mão de obra entre o 1º Trim. 2017 e o 1º Trim. 2018 na União Europeia

 

Como mostra o gráfico do Eurostat, Portugal foi o único país da União Europeia (1ª barra negativa, e única negativa, do gráfico a contar da esquerda), onde o custo hora da mão obra diminuiu no 1º Trimestre de 2018 (-1,5%) quando comparado com o custo hora do 1º Trimestre de 2017. É evidente que esta redução do custo trabalho/hora foi conseguida à custa do aumento da exploração dos trabalhadores, pagando salários de miséria. Basta ir ao “site” do Instituto de Emprego, onde se encontram ofertas de emprego para engenheiros em que as empresas pretendem pagar apenas 600€/mês, e o governo nada faz, até promove essas ofertas em “sites” oficiais. E tenha-se presente, como se refere no próprio gráfico, que aquela variação do custo hora foi calculada com base em valores nominais, ou seja, sem deduzir o efeito corrosivo do aumento de preços. Apesar disso, os patrões, a UGT e o governo, assinaram na concertação social um acordo que visa aumentar a exploração e a precariedade (por ex., aumentar o período experimental para a generalidade dos trabalhadores de 90 dias para 180 dias).

Para tornar mais claro o gráfico interessa esclarecer como foram calculados os valores utilizados para construir o gráfico. Segundo o Eurostat, o custo hora de mão obra foi obtido dividindo todos os custos que o empregador tem com a mão de obra (salários e ordenados e custos não salariais) pelo número de horas trabalhadas (os custos salariais – salários e ordenados -incluem as remunerações directas, os prémios e indemnizações em espécie ou em dinheiro pago pelos patrões, assim como as refeições, as bebidas, etc., etc. Os custos não salariais, ou seja, os outros custos incluem os restantes custos suportados pelas entidades empregadoras, como sejam as contribuições sociais a cargo de empregador, etc. etc.).

A realidade que o gráfico 1 do Eurostat mostra é grave e devia merecer uma séria reflexão por parte do governo pois prova que a recuperação económica de que tanto fala o governo está-se a fazer à custa de uma crescente sobre-exploração dos trabalhadores em Portugal de que se aproveitam as entidades patronais, agravando desta forma as enormes desigualdades existentes. A “recuperação” dos rendimentos está a ser feita com base em salários de miséria. É esta realidade revelada também pelo próprio Eurostat.



 

 


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