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Sexta-feira, Abril 19, 2024

Está em marcha a avaliação da qualidade do Ensino Superior de Angola

M. Azancot de Menezes
M. Azancot de Menezes
PhD em Educação / Universidade de Lisboa. Timor-Leste

O regime jurídico da avaliação e acreditação da qualidade das instituições de ensino superior, fundamentado em doze princípios gerais, visa estimular a qualidade, incentivar a competitividade e garantir a qualidade do Ensino Superior em Angola.

Angola está a viver no decorrer de 2019 momentos muito marcantes, com grandes avanços para a qualidade do Ensino Superior, devido ao surgimento de legislação adequada e inovadora, acompanhada de uma dinâmica social muito positiva, caracterizada pelo registo acentuado de jornadas científicas, conferências e mesas redondas, um pouco por todo o país, em Instituições de Ensino Superior (IES) públicas, publico-privadas e privadas.

Só no mês de Outubro estive presente em quatro encontros científicos e verifiquei que os participantes, professores, investigadores, gestores e estudantes, cada vez mais, ganham consciência de que a ciência faz parte da nossa herança intelectual, devendo ser transmitida de geração em geração. Portanto, também neste país africano lusófono ganha-se a percepção de que a literacia científica prepara o homem para a sociedade e o mundo do trabalho.

A pertinência do Regime Jurídico da Avaliação e Acreditação do Ensino Superior

No contexto que descrevi, caracterizado pelo incremento de protagonistas do Ensino Superior mais envolvidos e motivados,  não posso deixar de discutir e de mencionar a justa relevância que deve merecer a aprovação do Decreto Presidencial que estabelece o Regime Jurídico da Avaliação e Acreditação da Qualidade das Instituições de Ensino Superior. Porquê? Este normativo visa assegurar o crescimento qualitativo das Instituições de Ensino Superior angolanas e a capacitação institucional permanente para a formação de profissionais competentes.

De forma subjacente, há orientações correctas e fundamentais para que os professores se esforcem no sentido de reflectirem sobre princípios, conceitos e objectivos do currículo formativo e da pedagogia do Ensino Superior.

Naturalmente, penso que também é justo ressaltar, em todo este processo há mérito indiscutível da ministra do Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação (MESCTI), e dos seus secretários de Estado, governantes que demonstram associar ao desempenho político elevada competência científica e académica.

Na verdade, este normativo promulgado em 2018, a meu ver de extrema pertinência e importância, fomenta a discussão em relação ao papel e às funções do professor do Ensino Superior em contexto global e local, numa perspectiva pluridimensional, e reforça a ideia de que os professores devem actuar preocupados com a gestão e a inovação curricular.

Os pilares fundamentais do Decreto Presidencial sobre avaliação institucional

A avaliação e a acreditação da qualidade do Ensino Superior em Angola, conforme consta no Decreto Presidencial, rege-se por doze princípios gerais, pilares fundamentais do documento: Princípio pedagógico; Princípio inclusivo; Princípio da globalidade; Princípio participativo; Princípio da continuidade; Princípio da isenção; Princípio da legitimidade; Princípio da equidade; Princípio do carácter público; Princípio da contextualização nacional; Princípio de adequação aos padrões internacionais e Princípio da autoridade técnica.

Evolução do Ensino Superior em Angola

Segundo dados e informações do Ministério do Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação (MESCTI), nos últimos 20 anos, a população estudantil no Ensino Superior aumentou de 7 845, em 1999, altura em que existia apenas uma instituição de ensino superior, com a Universidade Agostinho Neto, para 261 214, em 2018; destes, 47% são estudantes das instituições de ensino superior públicas.

A procura social para o ingresso no Ensino Superior irá aumentar nas próximas décadas dado que se projecta para 2030 uma população a rondar os 41, 8 milhões de habitantes.

No âmbito desta reflexão penso que vale bem a pena discutir em traços gerais o que significa em termos (mais) concretos cada um desses princípios. Porém, convém esclarecer antes de tudo que a significação do termo «Acreditação», na óptica do governo, é o”acto de certificação das Instituições de Ensino Superior e dos cursos/programas decorrente dos resultados positivos da Avaliação Externa promovida pelo serviço competente do Departamento Ministerial responsável pela Gestão do Subsistema de Ensino Superior».

Sobre a significação de cada um dos princípios gerais

O princípio pedagógico transporta a ideia chave de que a avaliação e acreditação da qualidade no Ensino Superior traduz-se na necessidade de estimular e ajudar a desenvolver, nas IES, a cultura da qualidade. Por outras palavras, o princípio pedagógico rejeita a punição e acções coercivas, para valorizar a vertente pedagógica.

O princípio inclusivo existente na avaliação e acreditação valoriza as idiossincrasias das IES, ou seja, o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) de cada IES onde se enquadra a auto-avaliação é devidamente valorizado. As IES passarão obrigatoriamente a ter que conceber, executar e avaliar o seu PDI de forma participada. Este documento é altamente estratégico e deve reflectir a filosofia psico-pedagógica da instituição no que concerne à visão, missão, valores, objectivos estratégicos, indicadores, metas e acções.

Com base no princípio da globalidade, a acção da avaliação e acreditação incide sobre cada um dos dispositivos, processos e intervenientes, sem descurar a visão global.

O princípio participativo, no quadro da avaliação e acreditação da qualidade, remete para a garantia da participação das IES e de outras de natureza social, científica, cultural, política e laboral.

O princípio da continuidade, tal como a expressão sugere, pressupõe que no âmbito da avaliação e acreditação haja um processo contínuo, portanto, mais do que a avaliação e acreditação como fim último pretende-se assegurar, de forma permanente, a qualidade nas IES.

O princípio da isenção, sem retirar o papel do governo enquanto regulador e agente de diálogo, garante que no processo de avaliação e acreditação são garantidas e respeitadas as identidades e diferenças de cada instituição.

O princípio da legitimidade assenta no facto da avaliação e acreditação da qualidade ter por base a legitimidade técnica-científica e ética. Os procedimentos técnicos devem ser transparentes, credíveis e rigorosos no respeito integral da lei e dos interesses dos visados.

O princípio da equidade, como o nome sugere, remete para a defesa de regras e critérios objectivos. No quadro da avaliação e acreditação todas as IES terão o mesmo tratamento.

O princípio do carácter público assenta na importância da responsabilização e prestação de contas. Os resultados das avaliação devem ser públicos e apresentados à comunidade académica e à sociedade em geral.

O princípio da contextualização nacional no âmbito da avaliação e acreditação da qualidade faz com que todo o processo se adapte ao contexto nacional, nos seus objectivos, características e critérios, para assegurar a sua exequibilidade.

O princípio de adequação aos padrões internacionais tem como principal finalidade garantir que o processo de avaliação e acreditação, na sua estruturação e gestão funcional, se harmonizem com padrões regionais e internacionais de qualidade.

Finalmente, o princípio da autoridade técnica prende-se com a importância do processo de avaliação e acreditação da qualidade das IES basear-se em referenciais científicos e metodológicos regulados pelos órgãos competentes do MESCTI.

Direitos e deveres das Instituições de Ensino Superior

Os direitos e deveres das Instituições de Ensino Superior angolanas no âmbito da implementação da avaliação e acreditação da qualidade são diversos e salvaguardados no Decreto Presidencial.

Os direitos, desde logo, decorrem do facto das IES, uma vez acreditadas, beneficiarem dos efeitos da acreditação. A garantia de que o processo é justo, tal como referi ao analisar os princípios gerais, na medida em que as mesmas participam no processo de avaliação e acreditação da qualidade, concretiza-se porque as IES têm acesso às normas, mecanismos e procedimentos de avaliação e acreditação. Um outro aspecto importante a salientar é que as IES são previamente informadas em relação à avaliação e podem reagir aos resultados do processo antes de serem considerados definitivos.

Os deveres das IES implicam garantir a qualidade dos serviços, realizar a auto-avaliação, colaborar com as comissões de avaliação externa, prestar informações fidedignas, etc.

A auto-avaliação, entendida no Decreto-Presidencial como sendo “o processo de auto-análise e auto-conhecimento que se rege por um conjunto de normas, mecanismos e procedimentos promovidos pelas próprias Instituições de Ensino Superior para avaliarem a qualidade do seu desempenho”, por aquilo que conheço da realidade será um processo algo demorado, terá altos e baixos, porque ainda não há uma cultura de auto-avaliação instalada como seria desejável. Mas, estou em crer, o processo de socialização está a decorrer com bastante sucesso, uma constatação animadora.

As novas políticas de ensino superior, em especial o regime jurídico da avaliação e acreditação da qualidade das IES, está a criar (boas) expectativas junto de docentes, gestores e outros actores do Ensino Superior angolano. No quadro da nova dinâmica que se está imprimir em todo o território nacional, tudo indica, a avaliar pelos normativos inovadores, parece haver vontade política de se conferir credibilidade ao subsistema de Ensino Superior. Aguardemos os desenvolvimentos.

 

Doutora Maria do Rosário Bragança Sambo

Maria do Rosário Teixeira de Alva Sequeira Bragança Sambo, nascida em Benguela, Angola, aos 28 de Maio de 1959.

Ministra do Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação de Angola

Doutora em Medicina, Especialidade Genética, Especialista em Neurologia é Professora Catedrática da Universidade Agostinho Neto

Decana da Faculdade de Medicina da Universidade Katyavala Bwila de Janeiro de 2011 a Julho de 2015 data a partir da qual exerceu o cargo de Reitora da Universidade Agostinho Neto até 2017.

QUALIFICAÇÕES ACADÉMICAS E PROFISSIONAIS

Doutora em Medicina, Especialidade Genética, com o tema “Susceptibilidade genética à malária cerebral em crianças angolanas”, pela Universidade de Lisboa, Faculdade de Medicina e Instituto de Ciências Gulbenkian (Oeiras – Portugal).

Em 1997 – Especialista em Neurologia – Hospital Egas Moniz, Lisboa – Portugal

Em 1983 exerceu Medicina na Faculdade de Medicina da Universidade Agostinho Neto – Angola e obteve equivalência da licenciatura em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa – Portugal (1996)

ARTIGOS CIENTÍFICOS PUBLICADOS

Tem uma obra científica de relevo publicada, onde se destacam os seus trabalhos sobre:

  1. Serum pantetheinase/vanin levels regulate erythrocyte homeostasis and severity of malaria. Rommelaere S, Millet V, Rihet P, Atwell S, Helfer E, Chasson L, Beaumont C, Chimini G, Sambo Mdo R, Viallat A, Penha-Gonçalves C, Galland F, Naquet P. Am J Pathol. 2015 Nov;185(11):3039-52.
  2. Quantitative trait locus analysis of parasite density reveals that HbS gene carriage protects severe malaria patients against Plasmodium falciparum hyperparasitaemia. do Sambo MR, Penha-Gonçalves, Trovoada MJ, Costa J, Lardoeyt R, Coutinho A. Malar J. 2015 Oct 7;14:393.
  3. The rise of medical training in Portuguese speaking African countries. Fronteira I, Sidat M, Fresta M, Sambo Mdo R, Belo C, Kahuli C, Rodrigues MA, Ferrinho P. Hum Resour Health. 2014 Nov 3;12:63.
  4. Impact of a training course on the quality of malaria diagnosis by microscopy in Angola. Moura S, Fançony C, Mirante C, Neves M, Bernardino L, Fortes F, Sambo Mdo R, Brito M. Malar J. 2014 Nov 18;13:437.
  5. Current status on health sciences research productivity pertaining to Angola up to 2014. Sambo Mdo R, Ferreira AV. Health Res Policy Syst. 2015 Jul 1;13:32.
  6. Ferreira AV, Fresta M, Simões C, Sambo MR. Desafios da educação médica e da investigação em saúde no contexto de Angola. Revista Brasileira de Educação Médica. 2014, 38 (1): 133-141.
  7. NOS2 Variants Reveal a Dual Genetic Control of Nitric Oxide Levels, Susceptibility to Plasmodium Infection, and Cerebral Malaria. Trovoada Mde J, Martins M, Ben Mansour R, Sambo Mdo R, Fernandes AB, Antunes Gonçalves L, Borja A, Moya R, Almeida P, Costa J, Marques I, Macedo MP, Coutinho A, Narum DL, Penha-Gonçalves C. Infect Immun. 2014 Mar;82(3):1287-95.
  8. IFNAR1 controls progression to cerebral malaria in children and CD8+ T cell brain pathology in Plasmodium berghei-infected mice. Ball EA, Sambo MR, Martins M, Trovoada MJ, Benchimol C, Costa J, Antunes Gonçalves L, Coutinho A, Penha-Gonçalves C. J Immunol. 2013 May 15;190(10):5118-27.
  9. Transforming growth factor beta 2 and heme oxygenase 1 genes are risk factors for the cerebral malaria syndrome in Angolan children. Sambo MR, Trovoada MJ, Benchimol C, Quinhentos V, Gonçalves L, Velosa R, Marques MI, Sepúlveda N, Clark TG, Mustafa S, Wagner O, Coutinho A, Penha-Gonçalves C. PLoS One. 2010 Jun 16;5 (6): e11141.
  10. Malária cerebral e síndroma neurológica pós-malária. Sambo MR, Borges MA, Borges FC. Revista SPMI, 2000. 7(3): 170-175.
  11. Intramedullary tuberculoma in a patient with HIV infection and disseminated multidrug-resistant tuberculosis; case report. Borges MA, Carmo MI, Sambo MR, Borges FC, Araújo CM, Campos MJ, Jacinto AM, Mansinho K, Leitão OC. Int J Infect Dis, 1998. 2(3): 164-167.

OUTRAS ACTIVIDADES

É Membro da Plasmodium Diversity Network Africa – 2014-2017, da Sociedade Africana de Genética Humana, desde 2011 e da Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa, desde 2011.

PRÉMIOS

Foi galardoada com as seguintes distinções:

  • Prémio Pfizer de Investigação Clínica 2010 – Prémio outorgado em 11 de novembro de 2010 em Lisboa pela Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa. “”Genetics of Cerebral Malaria in Angolan Children: Transforming Growth Factor Beta 2 and Heme Oxygenase 1 Genes control susceptibility to Cerebral Malaria Syndrome”.
  • Prémio de Investigação Biomédica 2010 da Ordem dos Médicos de Angola – 1º Prémio atribuído em 26 de novembro de 2011 em Luanda: “Os genes do factor transformador de crescimento beta 2 e da heme oxigenase 1 controlam a susceptibilidade à síndrome da malária cerebral em crianças angolanas”.

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