Donald Trump não existe, ele é apenas o lado visível (e risível) de um síndroma de imunodeficiência adquirida pelo Estado a que chegaram as sociedades do Ocidente, depois da crise de 2008.
Trump deve, por isso, ser tomado muito a sério e não com ligeireza como mereceria a coisa apalhaçada que nos aparece nesta campanha eleitoral para a Casa Branca. Donald Trump não é nome de palhaço mas sim o nome de um síndroma que nos pode ser fatal.
Perguntava-me há dias um amigo, que acompanha diariamente o fenómeno, “mas quem é que apoia ainda Trump?”
A resposta surgiu, quase naturalmente, na conversa. Para grande escândalo de Karl Marx e seus epígonos, a base social de apoio a Trump encontra-se, sobretudo, no verdadeiro proletariado (o industrial…) americano.
Vítima de décadas (desde os anos 70… como muito bem demonstrou John Robb e, depois dele, o autor de “O Capital no Século XXI”) da diminuição da sua participação na riqueza gerada (com o aumento real dos salários a ser muito inferior aos ganhos da produtividade) e do consequente aumento das desigualdades, este proletariado perdeu totalmente as esperanças no velho “sonho americano” e sente a imperiosa necessidade de pôr fim a este “sistema” e encontrar um novo “New Deal”.
Acresce a isto que, após a crise de 2008, nos chamados “anos Obama”, a classe política americana (como George Friedman demonstrou logo em 2009/2010) tornou-se um cúmplice activo da elite financista (os famosos “1%”…) responsável pela crise financeira de Setembro 2008 e cujos interesses específicos já tinham entrado em rota de divergência com os “interesses nacionais” americanos.
Esta cumplicidade entre a elite política e a elite financista foi fatal e letal para a reputação e para a credibilidade da elite política americana (e também para as europeias que foram pelo mesmo caminho…). E assim foi alienada a integração de parte substancial da classe média e o seu apoio ao “sistema”.
Aos americanos de rendimentos modestos pouco ou nada importam as estatísticas oficiais e até o preço do crédito (pois eles já faliram no pós-2008, visto que o recurso ao crédito barato tinha substituído o desaparecido poder de compra e estavam, portanto, “excessivamente” endividados). Nada disso lhes importa já, essas pessoas constatam que o seu nível de vida baixa, que os seus rendimentos reais continuam a baixar e, portanto, apoiam Trump porque ele (mesmo que não morda) ladra contra o “sistema”.
A “nobreza de Estado” (em que a classe política se transformou) e a elite financista, respondia-me esse amigo, vivem num túnel totalmente separado da realidade, beneficiando a classe política de um estatuto protector e de regalias pagas pelo Orçamento de Estado e ainda de cumplicidades várias com a elite financista, enquanto os financistas vêem as políticas governamentais protegerem os seus objectivos e interesses financistas, em detrimento da economia real, da justiça social e do interesse nacional.
Assim, mesmo que o Donald seja derrotado nas urnas por H. Clinton, a candidata do “sistema” e da cumplicidade com a elite financista, o “síndroma Trump” (de que Bernie Sanders é apenas uma outra cara…) tem uma bela e longa vida à sua frente… E, atenção, preparemo-nos para o seu desembarque nos Estados da Europa ocidental já em 2017!
Os políticos (tanto americanos como europeus) andam há demasiado tempo a brincar com fósforos… Agora, queixam-se de que há fogo e gritam que é preciso apagar os incêndios que os seus fósforos atearam.
Preparem-se…!