Andrei Tarkovsky | Retrospectiva integral
Andrei Tarkovsky é um dos cineastas russos mais importantes de sempre, ainda que o nome de Eisenstein costume igualmente disputar essa distinção. Autor de uma obra ímpar que pode agora ser desfrutada de forma integral no ciclo promovido pela Leopardo e Medeia Filmes, com agenda em Lisboa, mais concretamente no Espaço Nimas, e no Porto, no Teatro Municipal Campo Alegre (ver programação), embora estejam ainda previstas extensões a outras cidades. Seja como for, esta será apenas uma parte da retrospectiva do cinema russo prevista para este ano, que contará ainda, como informa a Medeia/Leopardo, com ciclos dedicados aos grandes filmes de outros cineastas soviéticos incontornáveis, de que serão exibidas cópias restauradas, como Sergei Eisenstein, Dziga Vertov, Aleksandr Dovjenko, Mikhail Romm, Marlen Khutsiev, Larissa Shepitko, Elem Klimov, entre outros, como por exemplo, Aleksandr Sokurov, para a estreia do documentário Francofonia.
Oportunidade então para se conhecer e rever alguns dos filmes mais conhecidos do mestre Trakovsky, como Andrei Roublev (1966), Solaris (1972), Stalker (1979) ou O Sacrifício (1986), o seu opus, mas também as suas primeiras obras, O Rolo Compressor e o Violino (1961) e A Infância de Ivan (1962), para além de O Espelho (1975) ou Nostalgia (1983).
De referir que esta retrospectiva será complementada por vários documentários dedicados à obra do cineasta e ainda por uma exposição de fotografias inéditas de rodagem e desenhos fac-símile do guarda-roupa, durante a década de 70, relativos a Solaris, O Espelho e Stalker.
O Rolo Compressor e o Violino (1961) – filme de curso
É um filme relativamente desconhecido de Tarkovsky, na verdade, uma curta com apenas 45 minutos, realizado enquanto era ainda estudante na VGIC, a escola de cinema russa, em Moscovo, uma das mais antigas do mundo. Esta é uma história singela, mas que contorna os lugares comuns, sobre a amizade que nasce entre um garoto estudante de música e um operário que o impede de ser humilhado.
A Infância de Ivan (1962)
O filme de estreia de Trakovsky revela a maturidade e pureza do realizador, num poema realista de uma criança do meio da guerra. No caso, o irrequieto e determinado Ivan, de 12 anos, que se distingue como batedor da frente de combate das linhas alemãs. Apesar da família ter desaparecido no conflito, Ivan não aceita ser arredado da acção e enviado para uma escola militar. Um trabalho a gritar maturidade, devidamente captado por uma fotografia contrastada. Venceria em Veneza Leão de Ouro pelo Melhor Filme.
Andrei Roublev (1966)
Uma das obras-primas máximas de Tarkovsky, embora alvo de sucessivos cortes pela censura soviética, evoca de forma ficcional a vida e a obra de Andrei Roublev, um pintor iconográfico do início do século XV. O realizador eleva-o a uma sumidade crística para simbolizar a divisão do território russo, entretanto invadido pelos tártaros. Uma obra majestosa e exigente, dividida em partes e captado num magnífico preto e branco, mas que se guarda para um esplendor final pleno de cor ao revelar a obra de Roublev.
Solaris (1972)
Por muitos encarado como uma resposta do Bloco de Leste a 2001, Odisseia no Espaço, de Kubrick, aqui numa adaptação da novela de culto de Stanislaw Lem, narrando as peripécias de um cosmonauta psicólogo e as suas visões durante uma viagem a uma estação espacial. Oportunidade para Tarkovsky aflorar questões existenciais ligadas à memória.
O Espelho (1975)
Possivelmente, o seu filme mais ambicioso, conjugando aspectos autobiográficos com a evolução da sociedade russa. Visualmente, arrebatador, ainda que irremediavelmente ambíguo, sem nunca se desviar da poesia do cinema atravessando três gerações, incluindo mesmo a participação do pai, a recitar poesia, e até a própria mãe. Seria, ainda assim, um filme pouco compreendido e acusado de algum formalismo.
Stalker (1979)
O derradeiro filme feito dentro da União Soviética tem uma dimensão épica e uma procura de liberdade e crença numa sociedade totalitária. Stalker (Nikolai Grinko) aceita guiar um escritor (Aleksandr Kaidanovsky) e um cientista (Anatoli Solonitsyn) até um ligar onde todos os desejos serão concedidos. Acaba por ser um filme de proximidade temática com Solaris.
Nostalgia (1983)
Tarkovsky procura em Itália os vestígios do poeta russo do século XVIII Andrei Gorchakov, na companhia de um guia e uma tradutora. Acaba por cruzar-se num antigo spa com Domenico, um excêntrico que aprisionara a família durante vários anos para os proteger da maldade do mundo. O realizador encontra aqui um certo paralelismo entre a nostalgia que sente da sua terra e da sua mulher.
O Sacrifício (1986)
A derradeira obra de Tarkovsky, que celebra também os seus 75 anos, é dominada pelo vazio da vida material e tocada pela proximidade da aniquilação total e por uma profunda abordagem filosófica. No centro está o professor e actor Alexander (Erland Josephson) vivenciando os seus 50 anos, algures entre o desespero intelectual e o niilismo.
[…] Source: Viva o cinema russo! – Jornal Tornado […]