No ar pairam sinais contraditórios que deixam em aberto todas as possibilidades de desenvolvimentos que constam do cardápio disponibilizado pela História. O resultado das primárias no Partido Republicano, nos Estados Unidos, pode vir a revelar-se decisivo do rumo dos acontecimentos no plano internacional.
É muito provável que os índices de popularidade do pre-candidato que lidera as sondagens, Donald Trump, não encontrem eco na escolha do candidato republicano à Presidência dos Estados Unidos. A estrutura do Partido Republicano, bem como os seus financiadores de maior peso, têm todo o interesse em travar, pelas razões do costume – económicas – o percurso triunfante daquele que promete ser o candidato mais absurdo e grotesco à Presidência da, ainda, mais forte potência militar e económica do planeta. O Tea Party resulta moderado e democrata quando comparado com as declarações de carácter xenófobo, racista e discriminatório em termos religiosos, do bilionário radical, extremista e a roçar o fascismo do candidato do capachinho. O fundamentalismo de Trump colide frontalmente com os interesses económicos, políticos e geopolíticos, da estratégia de médio prazo, quer no âmbito energético quer no âmbito militar e na política de alianças.
Em qualquer dos casos, o resultado das eleições Presidenciais norte-americanas irá ser, sem margem para dúvidas, um elemento decisivo da política externa estadunidense. O triunfo de um Democrata ou de um republicano terá um papel menos importante nas relações internacionais que o nome e perfil do Presidente eleito. Nas próximas eleições norte-americanas estará particularmente em disputa a “guerra surda” entre “falcões” e “pombas”.
A segunda maior potência – a China -, a braços com severos problemas internos de corrupção, de ambiente e das regras que inevitavelmente os países ditos “civilizados” lhe irão impor, quer em termos de condições de produção – como o recurso ao trabalho infantil – quer em termos das condições de trabalho, quer no que concerne à “pegada ambiental” resultante do acelerado crescimento industrial dos últimos anos, limitando pela via normativa as relações comerciais com este gigante da produção industrial, detentor de créditos colossais sobre as maiores economias mundiais, investidor “aditivado” no continente Africano, que tem como foco o crescimento exponencial da sua capacidade militar sem uma plausível razão aparente.
A pose agressiva do líder russo – Putin – e a sua manifesta vontade de reconstruir a “grande Rússia”, não permitem antever nada de bom. Fora de questão não está o regresso à Guerra Fria ou, pior que isso, ao enfrentamento entre superpotências por interpostos países e regiões do Globo. As “regiões” de influência readquirem o protagonismo de tempos passados – como na Síria e no Irão – que, para além da venda de armas, servem como cenário para as grandes potências medirem forças.
A Europa atravessa o seu pior momento de sempre. A coesão, ou a ausência dela, já não é apenas apanágio das relações entre os seus membros: a ascensão dos neoliberais veio destruir um dos pilares do projecto Europeu – a solidariedade entre países ricos e países pobres – mas veio igualmente quebrar o “contrato social” tacitamente estabelecido e aceite em cada um dos países membros. O sector financeiro sequestrou a política e os políticos deixaram a economia à mercê dos especuladores e dos “estados de espírito”, leia-se “estados de venalidade”, de Fundos e Corporações, sem princípios e sem outros valores que não o valor que arrecadam ao fim do dia.
Alargou-se o fosso entre países do Norte e do Sul da Europa; criou-se um abismo entre a remuneração do capital e do trabalho; agigantou-se a cratera entre salários dos quadros superiores e dos restantes trabalhadores nas empresas; os lucros privados reapareceram sob a forma de dívidas públicas através da socialização da falência dos Bancos; desencadeou-se um ataque sem precedentes às classes médias – cimento do Estado Democrático e de Direito – reduzindo-as à condição de “novos pobres”; assaltou-se de forma grosseira a Segurança Social; privatizaram-se sectores estratégicos que pela sua própria natureza pertencem à esfera pública, como a saúde, a educação, os transportes, mas também a energia, a água e as telecomunicações.
Destruídas as industrias, agricultura e pescas – e os sectores produtivos em geral – na Europa do Sul, transformou os países desta região em meros fornecedores de mão-de-obra barata, “achinesando” a divisão do trabalho e o papel económico destes no quadro da União. Sem critério e sem medida. Sem pesar os custos sociais de tais decisões políticas. A moeda-estrela deixou de ser impressa pelos bancos centrais, passando a ser emitida pelos bancos em geral: não é o dólar, nem o Euro. Chama-se Dívida!
Coeva deste processo é a proliferação do desemprego, nomeadamente do desemprego jovem, gerando uma fonte inesgotável de combatentes para a ameaça que promete pôr em causa, além da segurança, os direitos, liberdades e garantias civilizacionais dos próprios cidadãos, resultado de muitos séculos de desenvolvimento social. A radicalização de jovens ocidentais nutre-se do descontentamento, da ausência de soluções e de futuro, percebida pelos “guetizados” à força.
No momento em que escrevo estas linhas, extremistas de vários matizes florescem à sombra da falta de inteligência, de talento, de “estatura” dos actuais líderes europeus e mundiais. Chamem-se “Al Quaeda”, “Estado Islâmico”, “Boko Haran” ou qualquer outro nome, verdade é que actualmente estes grupos marginais controlam territórios que se estendem desde o sul da Rússia, passam pelo Afeganistão e Paquistão, atravessam todo o Médio Oriente e cruzam a África até ao Atlântico. Preparados para “guerra simétrica”, de “guerrilha” e “assimétrica”, ajustando-se ao local e ao inimigo que têm pela frente.
Não, não é um quadro optimista o que vamos enfrentar em 2016. Não obstante, pode ser que magia aconteça e que os dirigentes mundiais ganhem juízo. Se assim não acontecer, como dizia Max Derruau, “a guerra continuará a política, por outros meios”.
Os meus votos são de que tudo se resolva pelo melhor. Mas as dúvidas são muitas!
O melhor ano de 2016 possível, neste quadro
João de Sousa
Director do Jornal Tornado
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