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Quinta-feira, Abril 25, 2024

Política. Um balanço crítico da situação na Europa

João de Almeida Santos
João de Almeida Santos
Director da Faculdade de Ciências Sociais, Educação e Administração e do Departamento de Ciência Política, Segurança e Relações Internacionais da ULHT

Eleições na Holanda. Evitou-se um sinal que seria gravíssimo para a União: o de a extrema-direita xenófoba e anti-União ganhar as eleições num país que já foi dos mais avançados, civilizacionalmente, da Europa. Mas é fraca a consolação, porque o problema continua. Na verdade, a pressão dos refugiados constitui um dos mais graves problemas das União. Viu-se aqui e viu-se com o Brexit. Mas hoje Erdogan também se está a tornar um grave problema, agora que fustiga com palavras incendiárias este País e a Alemanha para melhor conseguir a união na Turquia em torno do seu projecto presidencialista. A Holanda é um país politicamente fragmentado e fragilizado pelo fenómeno da imigração. E, também por isso, desta vez o socialismo democrático foi literalmente abalroado por este problema, em particular pelo problema do islamismo, intensamente interpretado pelo centro-direita e pela extrema-direita.

Turquia

Erdogan a todo o gás. Um aspirante a ditador a chamar fascistas e nazis aos outros, aos que vivem em democracias consolidadas. O plebiscito consagrá-lo-á como legítimo ditador de inspiração islâmica. Um ayatollah carismatico que interpretará os desígnios do povo inspirado em Allah! O que se viu neste triste espectáculo foi a desorganização da União em matéria de política externa. Nem é de estranhar, visto que internamente temos um Presidente do Eurogrupo que não se cansa de dizer disparates, continuando no mesmo lugar, apesar de os holandeses já lhe terem traçado o destino com a clamorosa derrota nas recentes eleições. Não será, todavia, só uma questão pessoal, mas também de um sistema que permite que indivíduos como este estejam em lugares de tamanha responsabilidade. E por sistema entendo, neste caso, a social-democracia europeia e os critérios de selecção dos seus quadros dirigentes. Na verdade, o caso da Turquia dá que pensar. O acordo “realista” sobre os refugiados políticos deu no que deu e a pertença deste país à NATO parece nada significar perante a escalada a um poder absoluto que este perigoso Erdogan está a fazer. Ele é a outra das duas faces da mesma moeda que se joga aqui na Europa, o populismo: o dos que não gostam da União, o dos que não gostam de estrangeiros, o dos que consideram uma maçada a presença de mediadores na política e na comunicação, o dos que não suportam o pluralismo e a diferença.

As elites

Claro! O establishment tem-lhes dado todos os pretextos. O realismo imbecil das soluções possíveis levou a que certas elites sem princípios fizessem tudo, o que era e o que não era permitido, com o descrédito total do sistema. É assim em Portugal, é assim em Itália, é assim em França e assim por diante… O que certas elites ainda não compreenderam é que hoje tudo se sabe – às vezes até mais do que aconteceu – e que a cidadania já não suporta a política da mentira e do roubo organizado.

Itália

Em Itália a situação complicou-se. Com a cisão, o Partido Democrático cai nas sondagens e fica atrás do M5S em cerca de 3 pontos. Por outro lado, a direita parece estar a recompor-se, levando o Forza Italia, de Berlusconi, a aliar-se com a Lega Nord, do fascista Matteo Salvini, e com Fratelli d’Italia, o que representará cerca de 30% da massa eleitoral. Ou seja, estão em processo de constituição três frentes eleitoralmente equivalentes que poderão levar a esquerda (uma delas, que governa actualmente) para a oposição. O que se discute actualmente é uma lei eleitoral proporcional com um prémio de maioria (com vista à governabilidade) que seja alcançável com um score eleitoral inferior aos actuais 40%. No interior do Pd, vão ocorrer primárias, sendo quase certo que Matteo Renzi será o grande vencedor. Mas com a cisão de Pier Luigi Bersani inspirada por Massimo D’Alema, o caminho do PD para a oposição parece já estar traçado!

Espanha

Em Espanha ocorre a disputa interna entre Pedro Sánchez e Susana Díaz, havendo quem deseje a candidatura de Patxi López. Mas aqui o mal está feito, com uma composição política do xadrez político espanhol que, com a actual lei eleitoral, promove instabilidade, já que estamos perante uma distribuição fragmentária do peso relativo dos quatro principais partidos de que resultará a formação de governos tendencialmente minoritários. Acresce que um deles, o “PODEMOS”, tem sobre a unidade de Espanha uma posição que é absolutamente rejeitada pelos outros três partidos (Ciudadanos, PP e PSOE).

Reino Unido

Em Inglaterra os trabalhistas estão em letargia, podendo ser assacada a Jeremy Corbyn – pelo seu imobilismo, nesta matéria – uma parte de responsabilidade pela saída do Reino Unido da UE, e sendo certo que não se sabe qual será o futuro do reino Unido, atendendo às posições já declaradas da Escócia e provavelmente da Irlanda do Norte. De resto, a proposta política de Corbyn parecendo responder a uma vontade de viragem à esquerda, oferece, todavia, para esta opção, soluções antiquadas pouco em linha com os tempos que correm.

Alemanha

Se é certo que as sondagens, pela primeira vez, começam a ser favoráveis ao SPD, com a liderança (obtida com uma percentagem búlgara, isto é, com 100% de consensos) de Martins Schulz, também é certo que o movimento de extrema-direita AfD, de Frauke Petry, tem vindo a captar eleitorado com alguma intensidade, dando voz aos timoratos da abertura de fronteiras à imigração e aos refugiados. Nem falo da Hungria e da Polónia, países governados muito à direita e muito pouco em linha com os ideais da União.

A União Europeia

Por outro lado, a União Europeia tem vindo a demonstrar total incapacidade de se reformar, o que acaba de ser confirmado, em questões importantes, embora historicamente menores, pelo relatório do Banco Central Europeu acerca dos países incumpridores das grandes reformas estruturais, entre os quais se inclui Portugal. Mas, mais do que isso, pelo que se pode ler no famoso Livro Branco parece que as actuais lideranças não têm, de facto, uma ideia para o futuro da União!

Que fazer?

A situação não é famosa, sobretudo à esquerda. Com efeito, não existe hoje uma visão estruturada do centro-esquerda sobre o futuro e sobre as transformações que ele próprio tem de fazer no seu interior. A Internacional Socialista anda desaparecida e cada um dos Partidos socialistas e sociais-democratas está entregue à sua própria sorte e a uma inquietante indefinição programática e ideal, não dispondo hoje de âncoras diferenciadoras do centro-direita, para além da conversa sobre valores que são cada vez mais comuns, pelo menos no discurso.

Perante isto, que fazer? Sim, é necessário proceder a um reconhecimento analítico e crítico da situação actual, promover uma cartografia cognitiva do centro-esquerda que seja propulsora de uma nova visão do mundo e, em seguida, reunir forças para fazer o que é preciso. Mas não é isso que as elites dirigentes estão a fazer, prisioneiras que estão de uma visão antiga, ultrapassada e incapaz de responder às profundas mudanças estruturais que se estão a verificar nos tempos que correm.

Que me perdoem, mas exemplos vivos e claríssimos do que digo são o beijoqueiro Juncker, Presidente da Comissão e responsável por um Livro Branco que nada diz, o funcionário desse impoluto banco de investimento chamado Goldman Sachs, Durão Barroso, ex-Presidente da Comissão, e o tonto do Senhor Jeroen Dijsselbloem, ainda Presidente do Eurogrupo, que acha que a malta do sul só pensa em gastar os euros em copos e em mulheres. Chega?

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