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Sexta-feira, Julho 26, 2024

A situação actual da mulher em Portugal

Eugénio Rosa
Eugénio Rosa
Licenciado em economia e doutorado pelo ISEG

A importância das mulheres na criação de riqueza e no desenvolvimento do país e como continua a ser desvalorizada a sua contribuição.

Neste estudo com o titulo “A importância das mulheres na criação de riqueza e no desenvolvimento do país e como continua a ser desvalorizada a sua contribuição” analiso, utilizando dados do INE e do Ministério do Trabalho, alguns aspectos da situação da mulher em Portugal. Nomeadamente na área do trabalho, e em particular a sua contribuição para a criação da riqueza e para o desenvolvimento no nosso país. Neste estudo mostro também que a desigualdade remuneratória entre Homens e Mulheres, contrariamente ao que muitos pensam ou dizem não tem diminuído, sendo a nível de quadros superiores a remuneração e o ganho médio dos Homens superior ao das Mulheres em 40% no sector privado como os próprios dados divulgados pelo Ministério do Trabalho mostram. Portanto, há ainda muito a fazer neste campo.

Espero que este estudo possa ser um contributo para uma reflexão  séria e fundamentada sobre a situação actual da mulher em Portugal, sobre a sobre-exploração e discriminação a que continua a ser sujeita,  e sobre o que ainda é preciso fazer numa área fundamental para a vida de milhões de portuguesas para que haja maior justiça no nosso país.

Estudo

O dia 8 de Março de 2019, Dia Internacional da Mulher, centrou-se este ano, e bem, na luta contra a violência doméstica a que continuam sujeitas as mulheres e também contra a passividade, para não dizer mesmo conivência, dos órgãos do Estado perante essa violência e contra uma ordem jurídica que continua a proteger o agressor.

Essa luta é vital para defender a dignidade da mulher como ser humano e terá de continuar pois a violência sobre as mulheres não terminará apenas com a luta de um dia contra a violência doméstica, nem com um dia dedicado às vítimas.

A luta pela dignidade dos seres humanos é uma luta permanente e tem de ser uma luta de todos os dias face a desvalorização a que a globalização capitalista o sujeita e, em particular, as mulheres que são sobre explorados e onde os valores humanos são ignorados submetidos à lógica do mercado, pois, para além da violência doméstica, há muitas outras formas de violência.

Neste estudo vou analisar algumas dessas outras formas de violência, muitas vezes normalizadas e esquecidas, utilizando, para isso, a linguagem objectiva dos dados oficiais, nomeadamente o papel fundamental das mulheres na criação da riqueza e no desenvolvimento do nosso país muitas vezes ignorado, assim como a desvalorização (não reconhecimento) dessa contribuição que se continua a verificar em Portugal, fonte de lucros para patrões, que é importante denunciar e combater também, pois é uma forma de violência e de exploração da mulher que se junta à violência doméstica.

A mulher já constitui quase metade da população activa do país

… e muito mais de metade da população activa com o ensino superior

O quadro 1, como dados do INE, mostra, com clareza, que as mulheres constituem a maioria da população ativa com maior escolaridade do país.

Quadro 1 – População activa por níveis de escolaridade e por sexo

FONTE: Estatísticas ao Emprego – 4º Trimestre 2018 – INE

Como mostram os dados do INE, entre 2014 e 2018, a população ativa constituída por mulheres aumentou em 27.500, enquanto a dos homens diminuiu em 20.400 representando as mulheres, em 2018, 49,2% da população activa total do país.

E se a análise for feita por níveis de escolaridade conclui-se que as mulheres com o ensino superior representavam, em 2018, 61,6% da população activa com este nível de escolaridade, enquanto os homens representavam apenas 38,4%. A diferença é já muito grande e não deve ser esquecida no papel fundamental que as mulheres devem ocupar, mas ainda não ocupam, na economia e também na parte de riqueza que deviam ter direito, mas continuam ser discriminadas nas remunerações que auferem.

Apesar das mulheres representarem quase metade da população activa do país, e de serem aquelas que têm maior nível de escolaridade, apesar disso são aquelas que são mais atingidas pelo desemprego e pelo trabalho a tempo parcial forçado, por não encontrarem a tempo completo como mostram os dados do INE do quadro 2.

Quadro 2 – A subutilização do trabalho em Portugal por género – 2014/2018

Como revelam os dados divulgados pelo INE, 56% do trabalho subutilizado em Portugal é o das mulheres, constituindo as mulheres 52,3% dos desempregados, 64,5% dos trabalhadores a tempo parcial forçado e 56,4% dos desempregados que deixaram de procurar emprego por não o encontrarem e, por isso, não constam das estatísticas oficiais de desemprego, mas estão no desemprego sem qualquer subsidio.

As mulheres representam já 48,9% do emprego e 61,5% do emprego com Ensino Superior

Embora a capacidade de trabalho das mulheres continua a ser desvalorizada/subutilizada no nosso país, elas já representam quase metade do emprego total e mais de metade dos trabalhadores empregados com o ensino superior

Quadro 3 – População empregada por nível de escolaridade e género – 2014/2018

FONTE: Estatísticas ao Emprego – 4º Trimestre 2018 – INE

Como revela o INE, em 2018, as mulheres representavam 48,9% da população empregada, 49,4% da população empregada com ensino secundário e 61,5% da população empregada com o ensino superior. Se se tiver presente que cada empregado produziu, em média em 2018, 41.404€ de riqueza, conclui-se que as mulheres empregadas (2,381 milhões) produziram 98,6 mil milhões € de riqueza.

A população empregada em Portugal por profissões e por género

Os dados do INE do quadro 4 mostram que profissões as mulheres ocupam.

Quadro 4 – População empregada por profissões e por sexo – 2014/2018

Fonte: INE, Inquérito ao Emprego – 2018

Como revela o INE, as profissões em que as mulheres têm uma posição dominante são a dos “Especialistas das atividades intelectuais e científicas” (60% do total dos trabalhadores desta profissão), de “Pessoal administrativo” (64,7%), de “Trabalhadores de serviços, segurança e vendedores” (64,9%) e “Trabalhadores não qualificados“ (68,8%), apesar de terem escolaridade média superior ao dos homens.

O número de mulheres a ocupar cargos de baixas qualificações é muito superior ao dos homens

… embora tenham maior escolaridade

O quadro 5, com dados dos quadros de pessoal, publicados pelo Ministério do Trabalho, mostra, com clareza, a discriminação no trabalho tendo como base o sexo.

Quadro 5 – Trabalhadores do setor privado por níveis de qualificação e género- 2017

FONTE : Quadros de Pessoal – Sector Privado – GEE – Ministério do Trabalho , da Solidariedade e Segurança Social

A percentagem de homens nas categorias “Profissionais semi-qualificados”, “Não qualificados” e “Estagiários, praticantes e aprendizes” (as de mais baixas qualificações) corresponde a 29,7% (426.316) do total de trabalhadores-homens, enquanto a percentagem de mulheres nessas 3 categorias é já 39,2% (520.889) do total de mulheres, e a percentagem de trabalhadores destas 3 categorias com a Licenciatura, Mestrado e Doutoramento, a nível de homens era 8,8%, e de mulheres 16,7%, o dobro, que ganhavam por mês, os homens entre 690€ e 750€ e as mulheres entre 667€ e 699 (quadro 6).

Sem dúvida remunerações “atractivas” para regressar ao país para quem tem uma licenciatura ou um doutoramento, como pede o governo e o Primeiro Ministro.

A remuneração base e o ganho da mulher

… chega a ser inferior em 40% à do homem para o mesmo nível de qualificação e é fonte de lucro extra dos patrões

Uma outra faceta de discriminação com base no género, e da sobre-exploração da mulher que continua a existir no nosso país, perante a passividade do governo e da Autoridade para as Condições de Trabalho, que se junta à referida anteriormente, é a grande diferença de Remuneração base e de Ganho (que inclui a remuneração base e os subsídios), entre Homens e Mulheres com os mesmos níveis de qualificação, como provam os dados publicados pelo Ministério do Trabalho constantes do quadro 6.

Quadro 6 – Remuneração base e Ganho dos Homens e Mulheres segundo níveis de qualificação – 2017

FONTE- Quadros de Pessoal – Sector privado- GEE – Ministério do Trabalho

A diferença na Remuneração base e no Ganho entre Homens e Mulheres varia em média entre 25% e 26% a menos para as mulheres, mas para determinados níveis de qualificação é muito mais elevada. Por ex., nos “Quadros superiores” a remuneração base e o ganho médio das mulheres é inferior ao dos Homens em média em 40% como provam os dados divulgados pelo próprio Ministério do Trabalho.

Quanto mais elevada é a qualificação maior é a discriminação. O mesmo sucede em relação aos níveis de escolaridade, em que a desigualdade de remuneração e de ganho é tanto maior quanto mais elevado é o nível de escolaridade, mas cujos dados o Ministério do Trabalho deixou de publicar para ocultar esse escândalo sendo conivente com ele. A sobre-exploração das mulheres é fonte de sobre lucros-extra para os patrões estimados em 5.800 milhões € só em 2017, pois este valor é que elas deviam ter recebido a mais se existisse igualdade de ganhos entre homens e mulheres.

Para terminar um quadro com dados divulgados também pelo Ministério do Trabalho que mostra a sobre-exploração a que estão sujeitos os trabalhadores a tempo parcial, com remunerações horárias ainda inferiores aos a tempo completo sendo, por isso, as mulheres as mais afectadas, pois são elas que estão mais sujeitas a tempo de parcial.

Quadro 7 – Remuneração horária a tempo completo e a tempo parcial por género – 2017

FONTE: Quadros de Pessoal – Sector Privado – GEP – Ministério do Trabalho

Como mostram os dados do Ministério do Trabalho referentes às empresas do sector privado:

  • a remuneração base média a tempo parcial é entre 15,5% (H) e 16,6% (M) inferior à remuneração base horária media a tempo completo;
  • e a remuneração base horária das mulheres a tempo parcial é inferior em 14,9% à remuneração base horária dos homens a tempo parcial.

Para além da sobre-exploração a que estão sujeitos os trabalhadores a tempo parcial verifica-se, mesmo dentro deste, uma discriminação remuneratória entre homens e mulheres lesando as mulheres.

E em 2018, 112.000 mulheres e 61.000 homens tinham emprego a tempo parcial forçado porque não encontraram emprego a tempo completo.

É por isso que há ainda muito a fazer.




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