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João de Sousa

Quinta-feira, Abril 25, 2024

Empatada

Quando o meu editor propôs que eu escrevesse sobre a experiência de uma mulher de estado civil empatada (separada mas não divorciada), que cria filhos com o rótulo de mãe solteira apesar de carregar nos ombros um sobrenome que a identifica como uma mulher casada… propôs-me que escrevesse as confissões de uma mulher à deriva, mas… à deriva? Fugindo de quê?

Eu sabia que não seria uma missão difícil, tirando a parte onde tinha de me desnudar e mostrar que por detrás desta armadura de dama de ferro existe um ser comum que chora por dentro e por fora a cada por-do-sol. Eu sabia que se me olhasse no espelho e pelo excesso da maquilhagem não reconheceria em mim esta mulher barrada e julgada pela sociedade, esta mulher que é vista como adúltera por tentar ser ela mesma.

Removi a maquilhagem, lavei o rosto e olho no olho, e comecei a desnudar o meu íntimo, tentando justificar para mim mesma o motivo de ter investido naquela relação. Depois o medo invadiu a minha consciência, um medo que sabia a inconformismo e ao fracasso. Decidi esconder-me numa personagem (é o que toda gente faz quando não quer ser apontada), criei uma personagem a quem chamei apenas de “uma amiga minha”.

Decidi não contar a ninguém as “paisagens” das artérias onde vagueio, a procura da sobrevivência, sempre que me sentisse aflita expunha “uma amiga minha”…

Uma amiga minha vive desempregada e faz de tudo para sobreviver, sua única razão são os filhos, já não sabe o que fazer para sobreviver… apaixonou-se pelo vizinho bonitão mas ele não a quer porque ela tem muitos filhos. Ela é muito determinada… Uma amiga minha adora este perfume e detesta ser subestimada… ela é muito persistente.

Às vezes, ela, a minha amiga… enche a cara e dança com os pés descalços, já a vi chorar de alegria, mas na hora da tristeza ela enfrenta os problemas com o sorriso brilhante e lágrimas no canto do olho.

No outro dia contei como “uma amiga minha” venceu a dependência emocional, material e conseguiu se firmar como uma mulher independente.

Ainda tentando descrever como ela, a minha amiga fabulosa, quando ouvi o grito de uma criança… – Mamã, perdi  as minhas bolas… (claro que já devem imaginar que este menino é filho de “uma amiga minha”) por isso calmamente perguntei:

Como assim, perdeste as tuas bolas filho? (da minha amiga)

– Calma mamã ainda estou à procura delas… ufa! encontrei-as, estavam debaixo do colchão, as minhas bolas de berlinde.

Neste momento a minha amiga está a beber uma cerveja gelada e tentando desanuviar a sua mente para o dia de amanhã.

A autora escreve em PT Angola

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