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João de Sousa

Quinta-feira, Março 28, 2024

Escrever

Vitor Burity da Silva
Vitor Burity da Silva
Professor Doutor Catedrático, Ph.D em Filosofia das Ciências Políticas Pós-Doutorado em Filosofia, Sociologia e Literatura (UR) Pós-Doutorado em Ciências da Educação e Psicologia (PT) Investigador - Universidade de Évora Membro associação portuguesa de Filosofia Membro da associação portuguesa de Escritores

Ao lado obuses. E longe estrondos. Talvez me calce de roupas nuas como a lágrima dos meus últimos sonhos.

Que horas serão?

Sinto apenas na pele esta comichão, um glutão a esfregar-se-me por dentro vaidades de farda enrugada e de sono nada, dizem-me que tiros ali e a cabeça para dentro esfrega escorreitos dizeres numa página mais para uma vida inteira onde me quiserem os demais. Somo uns quantos pontos para que me decifrem aos solavancos, uma ordem chamada a mim como um enfeite em meu nome nestas páginas carregadas de substâncias incolores seguidas de rimas inconsequentes sim, não me sinto nessa obrigação e pronto que me leiam de forma transversal, encontrarão o caminho desenhado assim quando em pequeno me teimava e a minha mãe

– Que sabes tu disso?

e ao lado obuses num colorido acima da cabeça que pena, trouxeram-me à cabeça miolos de fumo como se a vida decorresse apenas nesta impressão feito folha para algo e nada mais a não ser rascunhos de passagens pela garagem do senhor Silveira sentado ao volante do seu Ford agora antigo imagino apenas agora novo na época, cinzento como o breu ao início da noite e a minha mãe repetidamente

– Que sabes tu disso?

enquanto o meu pai sei lá onde ralhava comigo tens é de estudar e eu na mesma que me importava queria ao menos um texto sabia lá disso escrevia com letras de chines um resumo que a professora havia pedido

“a cidade enamorada nasce sobre a tua voz que encanta”

enquanto na época pensava

“quero ser jogador da bola”

com um pé cego sei restava-me continuar o que me indicavam os ímpetos ainda que de nada mais se comentasse e que comentaria nada sabia mas sentia as tuas mãos mãe

– Está na hora, tens de ir para a escola!

na sua voz sempre igual ao que ouvira quando dormia naquele quarto virado para às traseiras da casa e o quintal a incentivar-me

“escreve mesmo que nada saia!

apagava as rasuras e deitava o papel fora e saiu um dia da minha palma de mão assim como entre os dedos pegados à caneta escrevi sozinho como sempre acontece e Ernest naquele casebre de Fidel o velho do rio num navio de fugitivos como em desenhos animados num barco que nunca partiu escrevo tantas coisas ainda aqui na cabeça, já tudo perdi.

Escrever coisas que repito para nunca me cansar, este deleite é meu para mim na minha cama a escola uma redação quando fores grande meu rapaz quero ver que livro escreves-te e hoje coitada foi-se. Até sempre professora do meu bairro popular. Sei que apenas uma coisa fica. Não sei o teu nome naqueles escritos mais antigos que a minha memória calou e hoje aqui.

Sento-me algures na ilha onde o farol acima indica aqui nasci quem sabe e nunca mais, ficou lá o que havia escrito quando quis crescer.


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