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João de Sousa

Sexta-feira, Junho 27, 2025
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Lei sancionada pela Presidência preconiza qualidade de vida dos profissionais da Educação

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Lei 14.681, sancionada em 18 de setembro de 2023, que cria a política de bem-estar, saúde e qualidade de vida no trabalho e valorização dos profissionais da Educação, dá um alento aos profissionais de todo país, pois os referidos profissionais ainda vêm enfrentando uma insidiosa perseguição, decorrente de uma política de ódio, disseminada nos últimos anos, e que foi a base de pensamento no último governo federal, mas, que ainda reflete em muitos estados e municípios.

Não bastasse essa política difamatória e de violência, os profissionais da Educação, ainda enfrentam falta de políticas de valorização profissional, de investimentos em Educação Pública e cuidados com a saúde laboral, o que agrava a situação dos adoecimentos físicos e mentais, além da total falta de segurança nas escolas.

Muito bem-vinda então essa lei federal que cria uma política de bem-estar, saúde e qualidade de vida no trabalho com valorização dos profissionais da Educação. A lei estabelece o prazo de um ano para a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios elaborem seus planos, em colaboração, e a partir daí, os documentos devem ser atualizados e publicados no prazo de até seis meses após a posse do chefe do Poder Executivo de cada ente da Federação.

Já que a elaboração de planos é obrigatória para todo o sistema público, esses planos devem prever ações de atenção e prevenção à saúde no ambiente educacional, também devem estimular práticas que promovam o bem-estar no trabalho de maneira sustentável, humanizada e duradoura como política de Estado.

Além disso, é obrigatório o acompanhamento dos dados relativos a afastamentos, readaptação funcional e acidentes de trabalho, entre outros indicativos, pois, muitos estados e municípios mantêm políticas de metas abusivas e despropositadas, causando sobrecarga de trabalho e adoecimento entre as trabalhadoras e os trabalhadores, criando um ambiente de trabalho conturbado e contraproducente.

Para isso, é necessário que haja condições saudáveis de trabalho, com democracia e ampla liberdade de ensinar e aprender, com integração entre a comunidade escolar.

Para as professoras e os professores terem saúde física e mental, é necessário que possuam jornadas de trabalho que possibilitem aprimorar seus conhecimentos, planejar as aulas e ter o suporte técnico necessário para a utilização das novas tecnologias, sem atropelamento, sem vigilância, sem perseguição e sem assédio.

Porque para se ter qualidade de vida é necessário que os profissionais sejam respeitados e valorizados no sentido profissional e humano.


Texto em português do Brasil

Pacto de combate às desigualdades

O Pacto Nacional pelo combate às desigualdades foi lançado recentemente e é uma iniciativa fundamental e inovadora. Trata-se de um movimento que reúne organizações da sociedade civil para atuarem de forma cooperada e unidas com o propósito de agregar força política e social para enfrentar e superar as múltiplas formas de desigualdades existentes no Brasil.

Há um fundamento ético que está na origem dessa iniciativa, o inconformismo e a repulsa à produção e reprodução das desigualdades que formam um sistema articulado de injustiças. Por se tratar de uma produção genuinamente humana, a desigualdade e a injustiça requerem para sua superação um posicionamento político ativo e, por isso, essencialmente ético, que resulta em uma atitude coletiva no sentido da busca pela igualdade e da justiça.

O Pacto parte de um acordo maior materializado na Constituição de 1988, que define como atribuição da República Federativa do Brasil, no artigo 3º, “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”.

Para desafiar essa realidade, diversas organizações se juntaram e buscam reunir mais e mais organizações de todos os campos para atuarem, de forma articulada e coordenada, no espaço desse movimento de pactuação ativa de combate às desigualdades (combateasdesigualdades.org). O Pacto articula uma serie de atividades e iniciativas para enfrentar essa grave injustiça.

Para atuar com efetividade e eficácia é necessário conhecer as múltiplas faces do problema. Por isso o Pacto criou uma ferramenta para organizar e divulgar permanentemente o diagnóstico das múltiplas faces da desigualdade no Brasil relativos às áreas de educação, saúde, renda, riqueza e trabalho, segurança alimentar, segurança pública, representação política, clima e meio ambiente, acesso a serviços básicos e desigualdades urbanas.

As desigualdades de raça/cor, gênero, bem como entre regiões brasileiras serão eixos transversais de análise para todos os temas. O primeiro relatório do Observatório destaca 42 indicadores e apresenta um roteiro de problemas a serem enfrentados e superados.

Está disponível em Pacto Nacional pelo combate às desigualdades – Relatório.

No lançamento do Pacto, dia 30 de agosto em Brasília, realizou-se um evento no Congresso Nacional, quando foi criada a Frente Parlamentar de Combate às Desigualdades, um espaço no qual parlamentares irão propor projetos próprios e fiscalizar Projetos de Lei sob a perspectiva do combater às desigualdades. Uma proposta de Projeto de Resolução indica para o Regimento da Câmara dos Deputados a inclusão do combate às desigualdades como critério de análise no exercício das competências das comissões temáticas da Câmara dos Deputados, notadamente na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Outra iniciativa foi o encontro entre as organizações do Pacto e os conselheiros e conselheiras do CDESS – Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável, órgão de assessoramento do Presidente da República. Na oportunidade foi firmado um termo de cooperação para a atuação conjuntas no combate às desigualdades, tendo em vista que essa é uma questão prioritária para a atuação do Conselhão.

Definiu-se que agosto será o mês para, anualmente, ser feito o monitoramento da situação, o balanço das iniciativas e dos resultados alcançados no âmbito do poder público, das organizações da sociedade civil e do setor privado.

Será instituído o Prêmio de Combate às Desigualdades nas Cidades, iniciativa para mobilizar as prefeituras para atuarem e implementarem políticas públicas nesse campo. O primeiro prêmio terá como foco a redução das desigualdades nas áreas de educação, saúde, renda e acesso a serviços básicos.

Foram lançados três Guias de práticas para combater as desigualdades: um para empresas, produzido pelo Instituto Ethos; outro para sindicatos, apresentado pelas Centrais Sindicais; outro para Cidades, produzido Instituto Cidades Sustentáveis, disponíveis em combateasdesigualdades.org. Esse movimento está começando e está aberto a receber adesões. Trata-se de uma luta de longa duração e que ficará mais forte, ganhará efetividade, quanto mais amplo for sua capacidade de agregar força.


Texto em português do Brasil

“Perlas” – San Sebastián exibe filmes premiados em Berlim, Cannes e Veneza

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Alguns dos principais filmes dos outros grandes festivais europeus são a essência de “Perlas” / Pérolas (em basco, Perlak), uma das secções mais procuradas pelo público e pelos participantes no festival que começou no passado dia 22 e que decorre até ao próximo sábado. Os filmes desta área da programação são candidatos ao Prémio do Público atribuído por votação dos espectadores.

 

Vizinhos de Auschwitz na abertura e um bairro operário dos arredores de Paris encerramento

O filme de abertura da secção ‘Perlas’ foi “The Zone of Interest” (A Zona de Interesse), co-produção britânica-polaca realizada pelo londrino Jonathan Glazer. Grande Prémio e Prémio FIPRESCI no Festival de Cannes, “, “The Zone of Interest” é uma adaptação do romance homónimo de Martin Amis e conta como o comandante de Auschwitz Rudolf Höss e sua mulher Hedwig se esforçam a construir uma vida de sonho para a sua família numa casa com jardim, vizinha do campo de concentração. O ‘céu’ e o ‘inferno’ quase com paredes-meias…

“Bâtiment 5 / Les Indésirables” (Os Indesejáveis), foi o filme escolhido para a sessão de encerramento de ‘Perlas’. Realizado pelo parisiense Ladj Ly, estreou no Festival de Toronto e conta a história de um jovem médico que, inesperadamente, tem que que assumir funções como autarca e procura reabilitar um bairro de moradores das classes trabalhadoras.

As outras ‘pérolas’ presentes em San Sebastián são:

  • “Aku wa sonzai shinai” (O Mal não Existe), vencedor do Grande Prémio do Júri e do Prémio FIPRESCI no muito recente Festival de Veneza. Trata-se de um filme de Ryusuke Hamaguchi, realizador japonês premiado em Locarno, Berlim e Cannes e vencedor do Oscar para o melhor filme internacional com o celebrado “Drive My Car”;
  • “Anatomie d’une chute” (Anatomia de uma Queda), da francesa Justine Triet, Palma de Ouro do Festival de Cannes deste ano;
  • “Bastarden” (A Terra Prometida), do realizador dinamarquês Nickolaj Arcel jé premiado em Berlim e nomeado para os Oscares. “Bastarden” recebeu em Veneza uma menção especial do Pémio Signis / (Associação Internacional Católica para a Comunicação);
  • “Dumb Money” (Golpe em Waaal Street), do australiano Craig Gillespie presente no Festival de Toronto;
  • “Io, Capitano” (Eu, Capitão), do italiano Matteo Garrone. O filme ganhou em Veneza o Leão de Prata para o melhor realizador e o Prémio Marcello Mastroianni para o melhor actor jovem (Seydou Sarr);
  • “Kaibutsu” (Monstro), do japonês Hirokazu Koreeda, Prémio “Donostia” em 2018 e presença habitual em San Sebastián. “Kaibutsu” obteve o prémio para o melhor guião no Festival de Cannes;
  • Kuolleet lehdet” (Folhas Caídas), do finlandês Aki Kaurismaki, Prémio do Júri no Festival de Cannes e Grande Pémio FIPRESCI/2023;
  • “La Memoria Infinita” (A Memória Infinita), da chilena Maite Alberdi, Grande Prémio do Júri do Festival de Sundance;
  • “La Sociedad de la Nieve” (A Sociedade da Neve) do catalão J. A. Bayona, presente extra-concurso na competição de Veneza;
  • “May December” (Segredos de um escândalo) do norte americano Todd Haynes, presidente do júri em San Sebastián em 2013. “May December” participou na competição de Cannes.
  • “Memory” do mexicano Michel Franco que participou no Festival de Veneza;
  • “Past Lives” ( Vidas Passadas) da coreana Celine Song, filme que competiu em Berlim;
  • “Perfect Days”, filme realizado em Tóquio pelo alemão Wim Wenders e que ganhou em Cannes o prémio para a melhor interpretação masculina (Koji Yakusho);
  • “Rosalie” filme da francesa Stéphanie di Giusto que esteve presente na secção “Un Certain Regard” do Festival de Cannes;
  • “Roter Himmel” (O Céu Vermelho), Grande Prémio do Júri do Festival de Berlim, do alemão Christian Petzold, membro do júri oficial; e
  • “The New Boy” do australiano Warwick Thornton , da secção “Un Certain Regard” do Festival de Cannes.

 

‘Zabaltegi / Tabakalera’ uma secção sem limitações

Na mais antiga secção do festival não há limitações de estilo, de género ou de extensão. Este é, tradicionalmente, o espaço mais livre da mostra basca e nele podem ser encontrados documentários e ficções, curtas e longas metragens, instalações videográficas, filmes de escola e trabalhos mais ortodoxos. As obras aqui presentes vêm, na sua maior parte de Berlim, Cannes, Locarno e Veneza, entre outros festivais. Chegam quase todas com prémios de maior ou menor relevância . Secção com carácter competitivo ‘Zabaltegi / Tabakalera’ apresenta nesta edição 25 títulos (15 longas, 8 curtas e 2 médias metragens).

Na sessão de abertura passaram “Subete no Yoru wo Omoidasu” / Remembering Every Night, filme dirigido pela cineasta japonesa Yui Kiyohara que participou no Forum de Berlim e que é um estudo de várias personagens femininas e uma curta-metragem póstuma de Jean-Luc Godard estreada no último Festival de Cannes: “Film annonce du film qui n’existera jamais: ‘Drôles de Guerres’.

No encerramento será exibido um filme estreado na secção Panorama do Festival de Berlim: “El Juício” (O Julgamento) do documentarista argentino Ulises de la Orden uma obra que mostra com detalhe o processo judicial realizado em 1985 contra as juntas militares da ditadura argentina.

Destacamos ainda “Bén Trong Vo Ken Vang” / (Inside the Yellow Cocoon Shell) dirigida pelo vietnamita An Pham Thien, vencedor da Câmara de Ouro do Festival de Cannes, o prémio para a melhor primeira-obra do festival francês.

Em “Zabaltegi/Tabakalera” estão ainda filmes do espanhóis Guillermo García López, Paul B. Preciado, Alberto Martín Menacho, Ion de Sosa e Irati Gorostidi, dos franceses Damien Manivel e Éléonore Saintagnan, do chinês Wu Lang, dos argentinos Eduardo Williams, Rodrigo Moreno e Andres Di Tella, do georgiano Rati Oneli, dos belgas Bas Devos e Delphine Girard, do ucraniano Philip Sotnychenko, da israelita Shaylee Atary, dos japoneses Atsushi Hirai e Kohei Igarashi, da indiana Ashmita Guha Neogi e do russo Ilya Povolotsky.

 

Nota: Este artigo deveria ter sido publicado em 25 de Setembro, não o tendo sido por motivos de ordem técnica

Negócios iranianos

A administração Biden está a processar a transferência de seis mil milhões de dólares norte-americanos para a República Islâmica do Irão, como resgate de reféns americanos, que serão disponibilizados através do Qatar.

Os negócios americanos com o regime clerical iraniano (envolvendo reféns, mas não se limitando a eles) não têm conta, e o seu começo foi simultâneo da revolução islâmica iraniana, não se interrompendo mesmo quando há confrontações e sanções entre os dois Estados.

Na verdade, os negócios não são apenas americanos, são generalizados. O último em perspectiva envolve um funcionário europeu de nacionalidade sueca que o regime iraniano pretende trocar por um dos carrascos pela participação no massacre de dezenas de milhares de oposicionistas iranianos de 1988, preso na Suécia.

Como lembrou um dos reféns agora libertados: ‘Nos últimos 44 anos, o regime iraniano dominou o jogo vicioso de prender americanos e outros cidadãos estrangeiros inocentes para negociar a sua libertação. A prisão de Evin tornou-se uma espécie de ONU distópica de reféns, se mantivermos aberto este abjeto caminho para o lucro, sem riscos ou portagens, este regime venal vai continuar a segui-lo.’

Por outras palavras, o principal incentivo para que o regime iraniano continue a usar reféns para os seus negócios é a forma como o Ocidente tem, de forma de tão repetida que se tornou previsível, pago sempre o que lhe é pedido, sem que o regime sofra consequências pela sua acção.

Isto é de tal forma óbvio que não é possível a ninguém deixar de entender que o Ocidente está a ser cúmplice deste escabroso negócio de reféns e é, portanto, responsável pela sua continuação e repetição.

Há décadas que tenho reflectido sobre a razão pela qual o Ocidente tem feito quase tudo o que o Irão pretende, nomeadamente no que denominei em título de livro, publicado em 2008, a invasão escondida do Iraque, por outras palavras, a forma como o Ocidente se prestou a camuflar a invasão iraniana do Iraque.

Já depois de publicar o livro, novas revelações vieram reforçar o argumento, mostrando um grau de colaboração do Ocidente com os guardas revolucionários islâmicos mais pronunciado ainda do que eu tinha imaginado.

Num relatório que publiquei em 2016, centrado no negócio nuclear desse ano, o foco é feito sobre a ‘Câmara de Eco’ (expressão usada pelo funcionário da Administração Obama que geriu a operação de desinformação para se referir à imprensa), ou seja, como a principal imprensa institucional internacional foi mobilizada para vender uma pseudo limitação das ambições nucleares iranianas.

No livro de que fui o principal editor em 2017, dou uma ênfase especial à psicopatia social vulgarmente designada como de ‘apaziguamento’ e também conhecida como síndroma de Estocolmo.

Os negócios, reais ou presumidos, os interesses políticos imediatos – a equipa de Ronald Reagan foi capaz de negociar a libertação dos reféns da sua Embaixada para o dia da tomada de posse do Presidente – são elementos que tiveram uma grande importância. A invasão do Iraque jogou a fundo no tabuleiro petrolífero, embora não da forma como foi primitivamente imaginado.

No negócio irano-americano que agora se consagra, o Qatar é seguramente o elemento decisivo, mas é provável que existam também negócios mais personalizados.

A recente onda negocial irano-americana teve no acordo irano-belga para a libertação do diplomata-terrorista Assadi, a que me referi no jornal Tornado, o seu prelúdio mais importante. O que me chamou mais a atenção nesta negociação, e que se soube através da penetração pela oposição no site oficial da diplomacia iraniana, foi que as negociações foram dirigidas pelo Ministro da Justiça belga, dias apenas após ter tomado posse, em Outubro de 2020, muito antes de Vandecasteele ter viajado para o Irão e ter sido feito refém.

Ou seja, como disse então, ‘o Tratado não só não foi uma resposta ao rapto do refém belga, mas como pelo contrário, o rapto do refém foi a consequência da vontade expressa pelo governo belga de vir a libertar o terrorista’.

O Ministro mentiu descaradamente, e a opinião pública nunca colocou a questão como deveria ter colocado, responsabilizando o Ministro e o Governo belga não só pela libertação do terrorista, mas também pela tomada do refém pelo Irão.

A cidade de que o Ministro da Justiça é o Presidente da Câmara (essa simultaneidade de funções não é permitida em Portugal mas é assaz frequente na Bélgica) foi de resto a que mais se distinguiu na estridente campanha pela libertação do refém (eufemismo para referir a libertação do terrorista).

O facto de o Ministro da Justiça belga ter feito chegar a Teerão uma proposta de ‘tratado internacional’ para libertar o diplomata/terrorista belga condenado pela justiça belga apenas alguns dias após ter tomado posse faz suspeitar que, para além das coordenações internacionais que certamente foram necessárias para um tal acordo (lembremos que o acto terrorista falhado tinha Paris como alvo e que o seu principal autor foi preso na Alemanha), exista um envolvimento pessoal na negociação.

Lembremos que a libertação do terrorista foi primeiro suspensa pela justiça belga em julho de 2022. Pouco depois, em Setembro, a imprensa dá conta de uma rocambolesca tentativa de rapto do Ministro da Justiça belga que resultou na apreensão de um veículo estacionado junto da sua residência e a prisão de quatro pessoas nos Países Baixos, alegadamente envolvidas em operações relativas a droga.

A imprensa relaciona o dito atentado com outros tratados internacionais que o Ministro estaria a negociar relativos a tráfico de droga, tendo também noticiado que o Ministro e a família teriam sido colocados em vigilância policial reforçada e que a Bélgica pediu a extradição dos quatro presos nos Países Baixos, extradição que ainda não se teria materializado.

Curiosamente, ninguém se terá lembrado de relacionar esta operação com o facto de o regime iraniano ter sido inculpado pelas autoridades dos Países Baixos pelo assassínio de dois dissidentes iranianos, assassínios que encomendou às redes criminais do país envolvidas no tráfico de drogas.

Tão pouco, ninguém parece ter ficado surpreendido pela falta de cuidado dos presumíveis raptores ao abandonar um veículo com todas as provas incriminatórias ao pé da residência do Ministro. Mais ainda, é curioso que o veículo policial destinado à segurança reforçada do Ministro permanecesse abandonado junto da sua residência, como se ficou a saber na sequência de um novo escândalo envolvendo o Ministro no passado mês de agosto.

Semanas depois do escândalo, e depois de o Ministro ter prometido a denúncia pública dos seus convidados que teriam urinado em cima do veículo policial abandonado, continua sem se saber quem eles eram ou ainda por que razão se encontrava o dito veículo policial abandonado à porta da sua residência, e por que razão os tais carteis da droga, que procurariam a cabeça do ministro antes da libertação do diplomata terrorista, já não parecerem zangados com ele depois de este ser libertado.

A falta de curiosidade e persistência em esclarecer a verdade e a aparente falta de memória que parece dominar a opinião pública são talvez o mais preocupante dos indicadores da cumplicidade com que conta a actividade criminosa do regime iraniano entre nós.

Certame basco começa hoje tutelado pela figura do ‘ausente’ Javier Bardem

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Tem hoje início em San Sebastián, decorrendo até ao próximo dia 30, a 71ª edição do mais importante festival de cinema da Península Ibérica.

No cartaz oficial Javier Bardem, um dos mais prestigiadores actores espanhóis, com um percurso fortemente marcado pelo certame basco nos últimos trinta anos. Este ano iria receber o “Prémio Donostia”, o galardão de carreira atribuído pelo festival. Só que Bardem está abrangido pelas limitações impostas pela greve convocada pelo Sindicato de Actores dos Estados Unidos e, por esse motivo, só receberá o “Donostia” em 2024.

 

Miyazaki abre a secção oficial e recebe o “Prémio Donostia” de forma virtual

Para a abertura oficial foi selecionado (sendo exibido fora de concurso) um filme de animação: “Kimitachi wa do ikiru ka“ (O rapaz e a garça) do premiadíssimo cineasta japonês Hayao Miyazaki. O autor de “A Princesa Mononoke” (1997) e “A Viagem de Chihiro” (2001) – Urso de Ouro em Berlim e Oscar para o melhor filme de animação – vai juntar ao “Leão de Ouro” de Carreira que recebeu em Veneza em 2005, outro dos prémios “Donostia” de 2023. O galardão vai ser-lhe entregue virtualmente esta noite durante a gala de abertura do festival.

 

Dois filmes com produção portuguesa presentes na competição

Como é habitual a principal secção do certame apresenta vários filmes espanhóis ou de países de língua castelhana, obras de jovens autores em início de carreira e outros de cineastas presentes e/ou premiados em anteriores edições de San Sebastián.

Entre os trabalhos escolhidos para integrarem a principal secção competitiva do festival encontram-se dois filmes com produção portuguesa:

“O Corno”, filme passado na Galiza, realizado pela ‘donostiarra’ Jaione Camborda com fotografia do nosso Rui Poças. Uma co-produção de Espanha/Portugal/Bélgica em que a presença portuguesa foi assumida pela produtora ‘Bando A Parte’ / Rodrigo Areias. O filme estreou há dias no Festival de Toronto;

La Práctica” do argentino Martin Rejtman, uma co-produção Argentina/Chile/Portugal/Alemanha em que participa a ‘Rosa Filmes’ / Joaquim Sapinho e Marta Alves.

A lista dos 21 filmes que integram a secção oficial é a seguinte:

  • “Kimitachi Wa Do Ikiruka” / O Rapaz e a Garça de Hayao Miyazaki (Japão) – filme abertura, extra-concurso
  • “All Dirt Roads Taste of Salt” de Raven Jackson (E.U.A.)
  • “Chun xing” (Uma viagem na Primavera) de Tzu-Hui Peng e Ping-Wen Wang (Taiwan)
  • “El Sueño de la Sultana” de Isabel Herguera (Espanha/Alemanha)
  • “Ex-Husbands” de Noah Pritzker (E.U.A.)
  • “Fingernails” (Isto vai doer) de Christos Nikou (E.U.A.)
  • “Great Absence” de Kei Chika-Ura (Japão)
  • “Kalak” de Isabella Eklöf (Dinamarca/Suécia/Noruega/Finlândia/Groenlândia/Países Baixos)
  • “L’ Ile Rouge” (A Ilha Vermelha) de Robin Campillo (França/Bélgica)
  • “La Práctica” de Martín Rejtman (Argentina/Chile/Portugal/Alemanha)
  • “Le Successeur” (O Sucessor) de Xavier Legrand (França)
  • “MMXX” de Cristi Puiu (Roménia/Rep. da Moldávia/ França)
  • “O Corno” de Jaione Camborda (Espanha/Portugal/Bélgica)
  • “Puan” de María Alché e Benjamín Naishtat (Argentina/Itália/Alemanha/França/Brasil)
  • “The Royal Hotel” de Kitty Green (Austrália)
  • “Un Amor” de Isabel Coixet (Espanha)
  • “Un Silence” de Joachim Lafosse (Bélgica/França/Luxemburgo)
  • “La Mesías” de Javier Calvo e Javier Ambrossi (Espanha), extra-concurso
  • “They Shot the Piano Player” (Dispararam sobre o Pianista) de Fernando Trueba e Javier Mariscal (Espanha), extra-concurso
  • “Un Métier Sérieux” (Os Bons Professores) de Thomas Lilti (França), extra-concurso
  • “Dance First” de James Marsh (Reino Unido/Hungria/Bélgica) – filme encerramento, extra-concurso

 

No encerramento uma abordagem à vida de Samuel Beckett em “Dance First” de James Marsh

O filme da sessão de encerramento, a ter lugar na noite de sábado, 30 de Setembro, será “Dance First” do britânico James Marsh, o autor de “Teoria de Tudo” (Oscar para o melhor actor e mais quatro nomeações).

Em “Dance First”, Gabriel Byrne representa a figura do génio da literatura Samuel Beckett, homem que viveu uma vida com inúmeras facetas: “bon vivant” parisiense, membro da Resistência durante a 2ª Guerra Mundial, dramaturgo vencedor do Prémio Nobel, marido mullherengo, eremita…

 

Claire Denis preside ao júri oficial

A cineasta a escritora francesa Claire Denis, a quem o Batalha – Centro de Cinema dedicou uma retrospectiva no início deste ano, vai ser a presidente do júri que tem por missão avaliar os dezasseis filmes em competição na secção oficial. Em 2018 com ”High Life” ganhou o Prémio FIPRESCI em San Sebastián. Em 2022 recebeu o ‘Grand Prix’ do Festival de Cannes com ”Stars at Noon” e o Urso de Prata para a melhor realização em Berlim com “Avec amour et acharnement”.

Os outros elementos do júri são:

  • a actriz e produtora chinesa Fan Bingbing, vencedora da Concha de Prata para a melhor actriz em San Sebastián/2016;
  • Cristina Gallego, realizadora, produtora e escritora colombiana;
  • a fotógrafa francesa Brigitte Lacombe;
  • a actriz espanhola Vicky Luengo;
  • Robert Lantos, produtor de cinema húngaro-canadiano; e
  • o realizador e argumentista alemão Christian Petzold, premiado em Berlim e San Sebastián, um dos nomes maiores do cinema alemão dos nossos dias.

 

Grande Prémio FIPRESCI para “Folhas Caídas” do finlandês Aki Kaurismaki

A FIPRESCI – Federação Internacional de Críticos de Cinema atribui ao longo do ano os prémios da crítica em muitos festivais espalhados pelo mundo. Todos os anos elege também o melhor filme do ano que é galardoado com o Grande Prémio FIPRESCI que habitualmente é entregue em San Sebastián numa sessão especialmente programada para o efeito e que é um dos pontos altos dos primeiros dias do festival basco.

Em 2023 o Grande Prémio FIPRESCI distinguiu “Kuolleet lehdet” (Folhas Caídas) do finlandês Aki Kaurismaki, cineasta que há 30 anos vive metade do ano em Viana do Castelo.

Prémio do Júri do Festival de Cannes deste ano “Folhas Caídas” chegará às salas portuguesas no próximo mês de Novembro.

 

Nota: Este artigo deveria ter sido publicado em 22 de Setembro, não o tendo sido por motivos de ordem técnica

É preciso investir para revigorar o cinema brasileiro

Não é de hoje que o cinema brasileiro enfrenta dificuldades para se impor ao mercado. Por diversos fatores, a produção nacional tem sido muito relegada. A volta da cota de tela, é urgente.

A fala de Lula que o mundo anotará

Que o discurso de Lula na ONU foi irretocável, preciso e corajoso, todo mundo já disse, inclusive na mídia que vem ensaiando a retomada da implicância. Com a fala que tocou em todos os problemas do mundo, aplaudida cinco vezes por um plenário cheio, Lula concluiu o processo de restauração do respeito da comunidade internacional pelo Brasil, pelo qual vem trabalhando em sua intensa diplomacia presidencial desde a posse. E com ela, também, estabeleceu-se como voz autorizada do Sul Global no esforço para reformar práticas e estruturas.

Do que Lula pregou na ONU, o que pode ter consequências que gerem mudanças no mundo? Não haverá o milagre da grande transformação que ele cobra mas algumas propostas parecem estar encontrando o tempo certo, como é o caso da ampliação do Conselho de Segurança da organização. Voltarei a isso.

Lula falo de tudo o que importa, não fugindo em qualquer momento, por descuido ou impulso, da linha que define sua política externa: novamente ativa e altiva, independente, pragmaticamente pluralista. Em alguns momentos recentes surgiram pontos fora da curva, como as críticas desnecessárias ao Tribunal Penal Internacional, mas são pontos acidentais, não essenciais.

Criticou a “resignação” dos ricos antes a desigualdade, a pobreza e a fome, e a omissão e hipocrisia diante da emergência climática, na medida em que não assumem compromissos efetivos, especialmente os financeiros, em favor das ações que podem mitigar a resposta do planeta às agressões do homem. Criticou a debilitação da ONU, a desmoralização de seu Conselho de Segurança restrito a cinco membros que violam, eles mesmos, a Carta-base do organismo. O protecionismo avança diante de uma OMC inerte e o FMI é descaradamente alinhado aos ricos na fixação de seus créditos.

Na presença de Biden, que falou logo depois, criticou o embargo comercial imposto a Cuba, injustamente incluída na lista de países terroristas, e a prisão de Julian Assange, ao defender a liberdade de imprensa. Rendeu homenagens à democracia brasileira que resistiu e o levou de novo àquela tribuna, sem referir-se diretamente ao antecessor de triste lembrança. Dos escombros do neoliberalismo, afirmou, surge a extrema direita e os postulantes da tirania. Lembrou as minorias, as mulheres, as pessoas com deficiências, e foi comedido ao elencar medidas de seu próprio governo, ambientais ou sociais.

Os encontros de hoje com Biden e Zelenski completarão a passagem por Nova York, calando, aqui no Brasil (pelo menos momentaneamente), críticos que o acusam de servidão à China e à Rússia. Falou da guerra na Ucrânia apontando apenas a incapacidade dos governantes e dos organismos multilaterais em preservar a paz, razão maior da criação da ONU depois da II Guerra. E citando outros conflitos aos quais o mundo não dá bola.

O encontro com Zelenski não deve passar de um gesto mas a conversa com Biden pode render frutos. Houve convergências em alguns pontos nos discursos dos dois. Ambos enfatizaram a questão climática e defenderam a reforma do Conselho de Segurança da ONU. Lançarão hoje iniciativa conjunta contra o trabalho precário e devem explorar possibilidades de cooperação na questão energética e ambiental.

Mas, voltando à pergunta lá de cima, de tudo o que Lula defendeu, um ponto que tem boas chances de prosperar é a ampliação do Conselho de Segurança. Quem ouviu o discurso do secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, que falou antes do presidente brasileiro, notou a referência dele à Cùpula do Milênio, da qual se fala quase nada no Brasil. Ela está em franca preparação nos bastidores da ONU. Guterres quer encerrar seu mandato com uma assembleia geral, no ano que vem, que aprove mudanças importantes na Organização. Ela será a Cúpula do Futuro. Preparando se legado, Guterres tem como um dos objetivos da cúpula a ampliação do número de membros permanentes do Conselho de Segurança. Hoje eles são cinco e será preciso que todos concordem. Biden já aderiu. A China e a Rússia não poderão ser contra. Resta saber o que fariam França e Reino Unido, cujos governantes não foram agora a Nova York.

Essa é uma ideia que, embora debatida há décadas, pode estar encontrando seu momento de tornar-se realidade.

A Cúpula do Futuro trataria de outras reformas da ONU e tentaria por fim a sanções unilaterais impostas por países membros, como é o caso do embargo americano a Cuba. Será preciso criar mecanismos para garantir o cumprimento de objetivos fixados pela organização, como os 17 ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável), a serem cumpridos entre 2020 e 2030. A tal agenda 20-30. Lula lembrou ontem que faltam apenas sete anos e a maioria dos países está longe de cumpri-los. Mas hoje não há punição prevista para quem descumpre estes compromissos.

A ONU não dará jeito da guerra da Ucrânia. Numa reunião paralela agora em Nova York, países do G-7 avaliaram que poderá durar ainda alguns anos. A ON não acabará com desigualdade mas poderá avançar na agenda climática e em sua própria reforma.

O alinhamento de Lula com os planos de Guterres favorece a colheita de algumas das ideias que ele defendeu ontem na tribuna. Ontem, por sinal, os dos tiveram mais um encontro antes de discursarem. Já tiveram outro em maio, durante a reunião do G-7.


Texto original em português do Brasil

Um erro de palmatória

“Esquecendo” idiotices de liderança arcaica desde as cavernas ao seculo IX em que o pensamento fascista dominou como quis a organização social mas também a chefia simples da lei do mais forte, omitindo as oligarquias monárquicas e dinásticas desde os Impérios às autonomias, as invasões, o colonialismo a pretexto de descobertas do que já existia, do tribalismo aos estados com identidade cultural, moeda e fronteira, com as guerras do Líbano, Japão, Vietname, Afeganistão, Irão, Iraque, Síria, Gabão, e muitas outras, sempre com os mesmos interesses por detrás de cada uma delas, com a URSS transformada num aglomerado de Países entregues a criminosos que se apoderaram das suas matérias primas e demais circuitos de extração, transformação, armazenamento e distribuição; de educação; e de formação; dando azo ao renascer po poder das oligarquias emergiram que organizaram monopólios e, implementam um regime politico e social de subserviência ao medo imposto pela força de um conjunto alargado de organizações neofascistas pagas ao abrigo dos pretextos da segurança pública e nacional, eliminando os princípios das Repúblicas e da sua união.

Um dirigente alcoolizado deu lugar a um outro subvertido ao medo do KGB e, o mundo mudou a pretexto de que a rotulada “guerra fria” tinha acabado.

Provavelmente, até pode ter sido assim. O problema é que as contradições de interesses gerados culminou em demasiadas guerras quentes que trazem o mundo no fio da navalha entre o descalabro nuclear e a paz cada vez mais distante, geridos por alguns mentecaptos e outros que olham a politica como sendo um modo de vida bem remunerado por terceiros a quem prestam serviço.

Este episódio da História Universal pretendeu encerrar um ciclo de Uniões de Estados como aconteceu na URSS; Jugoslávia; e outros. Sobraram os Estados Unidos da América a segurar a sua União e o emergir de federações como acontece com a Federação Russa e a União Europeia mantendo a India e a China a sua hegemonia territorial num complexo puzzle de organização social.

Quem conhece a História sabe que as Repúblicas Soviéticas tinham uma cultura transversal versátil desde os Czares.

Assim sendo, o sentimento nacionalista que caiu com Gorbachev, não sumiu da mente das pessoas porque a formação intelectual não se varre só porque se quer, e, a entrada das tropas russas na Crimeia não tiveram impacto cultural nas populações que aceitaram e aplaudiram o acontecimento inclusive as potências económicas e militares qua ajuizaram à luz dos interesses económicos em causa no tempo essa invasão que não foi levada a sério pela UE dependente dos preços das matérias primas transformadas em energias e os Estados Unidos também não levaram essa iniciativa a sério e a China, paulatinamente acompanhou o processo ciente de que os seus interesses económicos e geoestratégicos estavam acautelados por imperativo militar.

Quando a Federação Russa mostrou quais eram as sua efetivas intenções subrepticiamente em Kherson, Zaporizhia, Donetsk e Luhansk, cerca de 15% do território da Ucrânia, tendo começado por tentar ocupar a capital Kiev, o que não conseguiu, a Nato, a UE e os USA, acordaram e foram atrás do prejuízo que leva já centenas de milhares de mortes, cidades reduzidas a pó e a fome a esmagar os povos mais dependentes dos cereais Ucranianos.

Neste contexto o erro de palmatória da nova vaga de políticos iletrado s e incultos pensaram todos de que a a Ucrânia se submeteria e de que a ocupação Russa seria uma questão de dias.

Volvidos quase dois anos já todos admitem de que a guerra será longa salvo se, a Ucrânia ceder o território que a Rússia pretende.

O cansaço e o descontentamento dos povos Europeu e Americano, inclusive o do povo Ucraniano, estão a dar vantagem à Federação Russa com o senão das incongruências dos interesses geopolíticos e geoestratégicos de todos os blocos restantes tão só porque na cartilha da sua formação intelectual a paz e a partilha não estão incluídos nos seus projetos curriculares.

Teremos assim um mundo inseguro tanto no plano social; militar; biodiversidade; alterações climáticas; e tudo o mais que exija sensatez e inteligência.

Ou seja: um erro de palmatória!


Por opção do autor, este artigo respeita o AO90

Contingente prioritário para candidatos beneficiários de acção social escolar

Há quase dois anos e meio, mais precisamente no Jornal Tornado de 28 de Maio de 2021, foi aqui publicado um artigo meu sobre “Hostilidade Racial em Portugal” em que contrariava propostas conducentes à criação de “quotas étnico-raciais” de acesso ao ensino superior português em benefício de estudantes “afro-descendentes” a título de reparação do colonialismo português e do seu papel no tráfico de escravos.

Expliquei na altura por que razão não aderia ao raciocínio subjacente àquelas propostas. Basicamente a expansão portuguesa em África terminou com reconhecimentos de independência que deixaram regulados muitos aspectos financeiros e patrimoniais de direito público. Em relação a interesses privados instalados em territórios cuja independência foi reconhecida, foram em muitos casos objecto de declaração de perda de activos por abandono a favor dos novos estados, ou de nacionalização, não se tendo configurado uma situação neo-colonial, ao contrário do que sucedeu com a generalidade das independências reconhecidas na esfera do Reino Unido ou da República Francesa.

Por outro lado, é muito discutível que alguns dos que vêm levantando a questão se possam arvorar em gestores das reparações supostamente devidas pelo tráfico de escravos.

Entretanto, a Constituição da República Portuguesa recusa claramente privilégios com fundamento em considerações de origem étnico – racial.

Por isso escrevi:

 …“aquilo com que a sociedade e o Estado portugueses se devem preocupar é com o apoio aos alunos que tendo capacidade intelectual e hábitos de trabalho para prosseguir estudos após a conclusão do secundário, não o fazem por necessidade de contribuírem para o sustento da família ou de alcançarem um mínimo de estabilidade pessoal, e não com a atribuição de quotas étnico-raciais a título de “reparação” do colonialismo ou de “normalização” das estatísticas.”

Com alguma surpresa, verifiquei que este artigo teve um número elevado de partilhas. A matéria é evidentemente controversa.

Têm sido a este propósito apontadas as experiências dos Estados Unidos da América quanto a exigência de reparações pela escravatura e da Alemanha quanto à compensação das vítimas de massacre feitas pelas suas tropas na sua antiga colónia do então Sudoeste Africano.

Ora nos Estados Unidos da América a situação em nada se assemelha à nossa: os Estados Unidos propriamente ditos assinaram numerosos tratados com tribos índias, que sabiam não estar integradas na sua organização política (e incumpriram muitos deles), mas embora a meio da Guerra da Secessão (em 1863) tenham decidido abolir a escravatura e libertar os escravos, continuaram a ter dificuldade em lidar com os “afro-americanos”.

Ainda antes da Guerra aparecia como viável criar estabelecimentos em África para “repatriar” parte destes afro-americanos o que seu origem por exemplo à criação da Libéria(i) onde durante décadas coexistiram “repatriados”, privilegiados, e naturais, até que os últimos, liderados por um tal sargento Samuel Doe, puseram fim ao domínio dos primeiros. No continente americano a libertação dos escravos fez-se sem refundação da sociedade. Muitos vieram a lutar ao lado do Norte integrados em “exércitos de cor” cujas unidades eram comandadas por oficiais brancos. A rendição do Sul e a “reconstrução” dos antigos estados confederados permitiram que em alguns destes os antigos escravos influenciassem transitoriamente a vida política mas em 1876 o republicano Rutherford Hayes, para conseguir ser declarado eleito presidente, aceitou um compromisso que permitia aos Estados do Sul manter de facto a segregação racial e limitar o direito de voto dos afro-americanos.

Sobretudo a partir de meados do século XX veio a surgir nos Estados Unidos um forte movimento dos Direitos Cívicos cujo desenvolvimento é conhecido. Por existir a consciência de que a discriminação racial não é apenas uma questão de proibições e obrigações foi nesse âmbito implementada a defesa de uma “acção afirmativa” no âmbito do acesso ao ensino superior que envolveu a adesão de múltiplas instituições. O Supremo Tribunal de Justiça dos Estados Unidos considerou recentemente essas políticas inconstitucionais. Com o voto do seu juiz “afro – americano” nomeado por George H. Bush, o conhecido Clarence Thomas.

O ter a Alemanha aceitado recentemente indemnizar uma tribo do ex-Sudoeste Africano (actualmente Namíbia) que massacrou quando há mais de cem anos detinha aquela colónia, a qual depois da I Guerra Mundial ficou a ser gerida pela União Sul Africana (mais tarde República da África do Sul) em regime de mandato da Sociedade das Nações(ii) talvez possa ser explicado por razões de imagem. A Alemanha considera-se por exemplo desligada de responsabilidades perante a Polónia e a Grécia por factos da II Guerra Mundial…

Regressando ao acesso ao ensino superior português terá sido colocada sobre a mesa a proposta de criação de quotas étnico-raciais.

Presidente do CRUP

Veio no entanto a ser avançada uma possibilidade: a criação de uma via especial de acesso para alunos de escolas situadas em Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP), isto é com dificuldades que efectivamente podem estar associadas à composição étnica dos alunos e/ou as condições sócio – económicas das suas famílias. O Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), disse-se, estaria disposto a viabilizar esta hipótese.

No entanto o Ministério da Ciência e do Ensino Superior que tem tido de trabalhar com o Ministério da Educação a problemática do acesso ao ensino superior veio a desenhar corria já o ano de 2023 uma outra solução:

  •  seria instituído um contingente prioritário para alunos beneficiários (no último ano do secundário) do escalão A da Acção Social Escolar;
  • poderiam concorrer a todos os cursos de todas as instituições de ensino superior públicas com vagas no Concurso Nacional de Acesso de 2023, correspondendo as vagas deste contingente prioritário a “2 % das vagas fixadas para a 1.ª fase ou duas vagas”, excepto o Instituto Politécnico de Viana do Castelo, Universidade de Lisboa e Universidade Nova de Lisboa que determinaram vagas ao abrigo do novo contingente apenas para alguns cursos.
Ministra do Ensino Superior

Tratando-se de um contingente prioritário e não de uma “quota”, designação que a Ministra expressamente excluiu, os colocados ao abrigo deste contingente ou de outros contingentes prioritários (anteriormente designados por “especiais”) estes candidatos não irão prejudicar o preenchimento de vagas normais.

As notícias publicadas sobre a 1ª fase de colocações dão conta de que muitos alunos elegíveis pelo critério do escalão da Acção Social Escolar terão entregue a candidatura on line sem assinalar que pretendiam ser abrangidos pelo contingente.

Importará entretanto perceber se todos os interessados terão formalizado a matrícula, uma vez que a concessão de bolsa este ano era imediata.

De modo geral, já que esta política foi enquadrada numa experiência reunindo políticas de vários países europeus, o que lhe garante financiamento e avaliação, podemos contar com que o seu desenho e execução sejam convenientemente escrutinados.

Aos que entraram no ensino superior por esta porta, os meus parabéns e os meus desejos de que tenham o máximo apoio por parte das instituições e dos colegas.

 

Notas

(i) Esta experiência é. referida no final de “A Cabana do Pai Tomás”.

(ii) Sucedida pela Organização das Nações Unidas.

Cinco razões para a greve na Indústria Automobilística dos EUA

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O verão quente do trabalho está se transformando em um outono de trabalho ainda mais quente. O sindicato United Auto Workers (UAW) está atualmente em greve contra as três maiores montadoras dos Estados Unidos.

Ford, General Motors e Stellantis (Chrysler e Jeep) apresentaram suas últimas propostas, incluindo um aumento de 9 ou 10% para a maioria dos trabalhadores, mais tempo pago de folga e benefícios ampliados. O sindicato classificou ambas as ofertas como “insultantes”.

Por que o United Auto Workers está adotando uma postura tão rígida em suas negociações com as três maiores montadoras dos Estados Unidos?

Lucros exorbitantes, salários dos CEOs e exclusão dos sindicalizados

Há cinco grandes razões:

A primeira são os lucros exorbitantes das empresas. As três grandes montadoras lucraram 250 bilhões de dólares na última década, 21 bilhões nos primeiros seis meses de 2023. Isso se deve à alta demanda reprimida por automóveis após a pandemia, juntamente com poupanças do consumidor mais altas do que o normal, resultando em consumidores dispostos a gastar muito dinheiro com carros novos – os preços subiram 30% nos últimos quatro anos sozinhos – enquanto os custos de produção de carros (sendo a maior parte a mão de obra) permaneceram relativamente baixos.

A segunda razão é o salário dos CEOs das três grandes montadoras, que está fora de controle. O CEO da Ford recebeu 21 milhões de dólares no ano passado. O CEO da Stellantis recebeu 24 milhões. Mary Barra, CEO da GM, recebeu incríveis 29 milhões em 2022 (e mais de 200 milhões nos últimos nove anos). No geral, o salário dos CEOs aumentou 40% nos últimos quatro anos. Isso sem contar todos os outros salários executivos abaixo dos CEOs que foram aumentados à medida que os salários dos CEOs dispararam.

A terceira razão é que os 350.000 trabalhadores sindicalizados da UAW foram em grande parte excluídos dos benefícios dessa prosperidade. Nos últimos quatro anos, seus salários aumentaram apenas 6%.

A quarta razão é o sistema de salários em dois níveis ao qual a maioria dos trabalhadores ainda está sujeita, pagando aos novos contratados substancialmente menos do que aos antigos. Com o tempo, isso significou que o trabalhador típico perdeu terreno. O sistema de dois níveis foi inaugurado após a falência da GM em 2009 e o maciço resgate financiado pelos contribuintes. Supostamente, era para ser temporário, mas se tornou uma característica permanente e um problema persistente para os trabalhadores automotivos.

A quinta razão é o surgimento de outro sistema de salários em dois níveis: as três grandes montadoras têm silenciosamente instalado novas fábricas para fornecer baterias para veículos elétricos em estados sem sindicatos. (A Casa Branca de Biden não ajudou nisso. Ela anunciou recentemente uma garantia de empréstimo de 9,2 bilhões de dólares do Departamento de Energia para a Ford Motor Co. para ajudar a construir uma grande fábrica de baterias no Tennessee, um estado chamado de “direito ao trabalho”. Infelizmente, o empréstimo não inclui nenhuma exigência de que a Ford ou seu parceiro na joint venture, a sul-coreana SK On, uma unidade de uma empresa química sul-coreana, garantam a participação de sindicatos.)

Os funcionários da UAW estão corretos em se preocupar que a Ford, a GM e a Stellantis usem essas fábricas de baterias para contornar o sindicato. Afinal, os fornecedores de peças agora fabricam peças que as empresas costumavam fabricar elas mesmas – mas muitos estão fazendo isso com trabalhadores não sindicalizados.

Trabalhadores de montadoras em greve nos EUA Foto: Twitter da @UAW

UAW quer 46% de aumento salarial

As duas partes estão muito distantes. A UAW deseja um aumento salarial de 46% ao longo de quatro anos (em linha com o aumento nos salários dos CEOs nos últimos quatro anos), uma semana de trabalho de 32 horas pelo pagamento de 40 horas, ajustes de custo de vida, pensões de benefício definido e assistência médica para aposentados para todos, e mais tempo pago de folga.

Até agora, como mencionei, a GM e a Ford ofereceram apenas pequenas frações dessas demandas.

Enormes lucros. Pacotes executivos gigantescos. Anos de baixos salários para trabalhadores por hora. A continuação dos salários em dois níveis. E o surgimento de ainda mais salários em dois níveis: junte tudo isso e o que você obtém? A probabilidade de uma greve longa.

Por quanto tempo? O sindicato tem 825 milhões de dólares em seu fundo de greve e pagará 500 dólares por semana a cada um de seus membros em greve. Se todos os seus 146.000 membros entrarem em greve, o fundo de greve se esgotaria em um pouco menos de três meses. É por isso que a UAW está iniciando greves em algumas fábricas individuais. Isso prejudicaria as montadoras, mas permitiria que a UAW continuasse a greve por mais de três meses, se necessário.

Uma greve longa prejudicará a economia dos EUA? Em certa medida. Uma greve de três meses poderia retirar cerca de 6 bilhões de dólares da economia. Isso prejudicará Biden? (Esta é a primeira pergunta que recebo da mídia.) Duvido. Ele é mais pró-sindicato do que qualquer presidente desde Lyndon Johnson, e sindicatos fortes significam salários mais altos, o que é bom para os trabalhadores e a economia. (Observe que a UAW ainda não endossou Biden.)

Por todas as razões mencionadas acima, eu acredito que uma greve é justificada. E você?


por Robert Reich, Comentarista de política e economia nos EUA | Texto em português do Brasil, com tradução de Luciana Cristina Ruy
Fonte: People´s World

Exclusivo Editorial Rádio Peão Brasil / Tornado

Setembro Amarelo: viver é o maior milagre que se pode conceber

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Em 1994, nos Estados Unidos teve início a campanha Setembro Amarelo sobre a prevenção ao suicídio. Porque essa prática já crescia, principalmente entre a juventude. A situação ganhou tais contornos que em 2003, a Organização Mundial da Saúde (OMS) instituiu o 10 de setembro como o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio para chamar a atenção do mundo sobre esse grave problema.

Atualmente, segundo dados da OMS, uma pessoa tira a própria vida a cada 40 segundos, com cerca de 700 mil suicidas anuais no planeta. Então a campanha Setembro Amarelo vem se intensificando com o lema Se Precisa, Peça Ajuda. Texto de e apresentação da campanha de 2023 afirma que o principal objetivo é “a conscientização sobre a prevenção do suicídio, buscando alertar a população a respeito da realidade da prática no Brasil e em todo o mundo”, diz texto sobre a campanha.

Isso porque entre jovens de 15 a 29 anos, o suicídio é a segunda maior causa de óbito no mundo, e a quarta maior no Brasil. Em nosso país em 2022 foram registrados 16.262 casos de suicídios ou 44 por dia. Número 11,8% superior aos 14.475 suicídios registrados em 2021, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Claramente, o sistema que vivemos com exacerbação do individualismo, a intensa pressão sobre os indivíduos para “se dar bem” a qualquer preço e a degradação das relações de trabalho, as jornadas abusivas, a precarização e a instabilidade levam as pessoas ao desespero para ganhar o pão de cada dia. O que acarreta estresse, depressão, frustrações, cansaço físico e mental.

Os dados demostram a necessidade de termos a compreensão sobre a prevenção ao suicídio como um problema de saúde pública. No caso da Educação a situação ganhou o agravante da perseguição e do descrédito sofrido pelas professoras e professores.

A vigilância e a pressão por metas inconcebíveis têm levado os profissionais à exaustão por sobrecarga de trabalho. Além de governantes levarem mensagens de ódio e violência contra os docentes, o que já era uma situação estressante, ficou agoniante.

Impactos do trabalho remoto

Tanto que a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) aplicou uma pesquisa para conhecer os impactos do trabalho remoto, muito utilizado durante a pandemia e o adoecimento das educadoras e educadores causados pelo assédio moral intenso nas escolas, antes, durante e depois da pandemia.

Foi observado que 49% dos pesquisados precisaram de atestado médico nos últimos seis meses e 50% desse percentual ficou afastado entre uma semana e um mês. Porque a degradação das relações de trabalho com forte pressão aos profissionais por metas extorsivas e a absoluta falta de estrutura de apoio às atividades pedagógicas causam adoecimento.

Pesquisa corroborada pelo levantamento, com base na Lei de Acesso à Informação, feito pelo SPTV1, da TV Globo, em que se constatou que somente no primeiro semestre de 2023, 20.173 profissionais se afastaram do trabalho por problemas mentais no estado de São Paulo, um crescimento de 15% em relação ao mesmo período de 2022.

A situação é tão degradante que as diretoras e diretores de escolas enfrentam o mesmo problema. No primeiro semestre de 2019, foram 146 afastados por transtornos mentais e em 2023, foram 218, praticamente 50% de crescimento.

O que deixa claro que a gestão do Secretário da Educação do estado, Renato Feder e do governador Tarcísio de Freitas é um desastre absoluto, com total degradação das relações de trabalho e humanas. Tanto que a Justiça do Trabalho determinou a criação de uma engenharia de segurança e medicina do trabalho para atender aos profissionais e aos estudantes.

É necessário criar políticas de defesa da saúde mental

Por isso, é essencial a criação de políticas de defesa da saúde mental. As professoras e professores precisam desse atendimento pois já exercem uma função estressante por si só e ainda por cima acumulam salas superlotadas, falta de estrutura das escolas, são constantemente vigiados e cobrados por metas absurdas e não têm a liberdade de ensinar e o aluno o fica sem a liberdade de aprender. Porque as escolas têm sido desestabilizadas como transmissoras de conhecimento.

Isso tudo é importante dizer porque a escola tem um papel fundamental no tratamento às crianças e adolescentes, inclusive na questão do adoecimento mental. É muito comum que a professora ou o professor percebam a automutilação em adolescentes, coisas que nem as famílias haviam percebido. E os psicanalistas afirmam que essa automutilação é um pedido de socorro de uma enfermidade mental que pode levar ao suicídio se não socorrida.

Mas como o profissional da educação pode perceber o adolescente doente se ele próprio adoece num sistema que lhe desprestigia como ser humano e impõe regras e metas impossíveis de serem alcançadas em projetos que visivelmente visam a degradação da educação e da vida.

Outra questão essencial para a prevenção ao adoecimento mental e ao suicídio refere-se à regulação das plataformas digitais. Porque o mundo está conectado demais e se torna necessário conversar mais com os jovens e tirá-los desse ambiente virtual potencialmente tóxico.

Então para levarmos a cabo os objetivos do Setembro Amarelo, precisamos falar mais sobre o que pode levar uma pessoa ao suicídio. E na Educação é fundamental a gestão democrática, onde prevaleça a liberdade de ensinar e aprender e o respeito ao ser humano.


Texto em português do Brasil

A Censura do Chega

Anunciada e com texto distribuído à imprensa no passado dia 12 – mas não publicitado, aparentemente pela leitura ortodoxa da Constituição e da Lei que dá um máximo de três dias para o seu debate – a moção de censura do Chega deverá ser votada no dia 19.

Mas mesmo antes de o documento ter sido formalmente apresentado, os Estados Maiores das principais forças políticas anunciaram o sentido do voto, sabendo-se que vai ser reprovada, não conseguindo sequer o apoio dos restantes grupos da direita parlamentar.

Segundo o cartaz alusivo publicitado no site do ‘Chega’, a habitação é, ao lado da saúde, o tema maior da sua moção, o que faz sentido por ser esse um dos temas em que mais se faz sentir o descontentamento popular, e por ser esse o principal tema que opõe o Presidente da República ao Governo.

A rejeição parlamentar da moção de censura será naturalmente um factor que fortalece a posição do Governo, e nesta situação em particular, dado que o principal argumento publicamente avançado pelo Presidente da República para o seu veto foi o da ‘falta de consenso partidário’, isso será mais assim ainda.

Posto isto, e como assinala uma recente análise de Ana Sá Lopes, o sistema político português girou sempre à volta da oposição entre Governo e Presidente da República, especialmente no final do segundo mandato deste. Com uma maioria absoluta socialista, é, portanto, necessariamente a oposição do Presidente da República que deve preocupar o Governo, mais do que a que vem do parlamento.

E a questão aqui colocada é a de saber se o Governo está a tomar a melhor opção quando anuncia que vai reapresentar o seu pacote habitacional sem lhe tocar, querendo com isso implicar que o veto político do Presidente da República lhe é totalmente indiferente.

As opções tomadas pelo Governo são por sua natureza discutíveis. Pessoalmente, como de resto o expus várias vezes aqui nas páginas do Tornado, acho que a perseguição às iniciativas do Alojamento Local – embora populares um pouco por toda a Europa – se enganam completamente no alvo, contrariando o principal motor que conseguiu travar a desertificação e a demolição de velhos centros urbanos (e Lisboa é um caso óbvio).

Creio também que a extrema complicação adicional do sistema fiscal proposto para a obtenção de tão magros incentivos (baixa de 28% para 25% nas taxas liberatórias) não é uma aplicação eficaz de recursos. O favorecimento fiscal em matéria locativa parece-me importante, mas só vale a pena pensar nele se diminuir a carga burocrática que lhe é subjacente.

Posto isto, e no que parece ser um dos principais cavalos de batalha, acho que o Governo tem razão em matéria de imposição fiscal adicional sobre edifícios abandonados, embora, prejudique o seu argumento quando dela exclui os edifícios públicos nessas condições.

Neste último domínio, penso que a questão deveria ser tratada de forma descentralizada pelos municípios e que, dentro destes, seria necessário fazer distinções de forma objectiva (uma ruína rural não é a mesma coisa que uma ruína num centro urbano) e deveria permitir mesmo a expropriação pública, ou seja, creio que o Governo poderia e deveria ter ido mais longe do que o que foi.

O que me parece faltar no pacote habitacional são dois pilares essenciais; a promoção da oferta pública, ou estimulada pelo público, nomeadamente em habitação social, e um programa de verdadeira descentralização que desconcentre a carga administrativa de Lisboa.

Em qualquer caso, com esta visão (que é a minha) ou qualquer outra, creio que o Governo em caso algum deveria passar a mensagem de que o veto presidencial lhe é indiferente e que não toca em nada do que propôs.

O Presidente da República é o chefe da oposição, ou é mesmo a oposição, e não é boa ideia fazer de conta que ele não existe.

As raízes sócio-económicas dos desastres naturais

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O sismo que abalou Marrocos e as cheias que se abateram sobre a Líbia, que em conjunto deverão ter ceifado umas duas dezenas de milhares de vidas, são apenas os mais recentes desastres naturais, com a esmagadora maioria das vítimas a registaram-se nos campos e nas montanhas ou entre as populações mais desfavorecidas e esquecidas pelos poderes.

E isso não é acaso nem fatalidade quando se constata que na sua maioria os governos deixam as vítimas entregues à sua própria sorte ou à solidariedade das populações das zonas menos afectadas pelos cataclismos, para lhes fazerem chegar bens essenciais, como alimentos, água e abrigos.

Tal como no terramoto que no início deste ano atingiu a Turquia e a Síria e que ceifou dezenas de milhares de vidas, estas fatalidades não podem continuar a ser vistas como meras catástrofes naturais. Nos tempos actuais e especialmente nos países menos desenvolvidos, em que a política das elites dominantes é maioritariamente determinada pela procura do poder e da riqueza pessoal, as suas consequências desastrosas estão directamente ligadas aos interesses económicos e às condições sociais existentes, num claro desrespeito pela vida das populações. A prová-lo temos a comparação com o terramoto que ocorreu em 2011 na cidade japonesa de Fukushima, que bem mais intenso (grau 9 na escala de Richter) que este agora de Marrocos, registou duas dezenas de milhar de vítimas (entre mortos e feridos graves) maioritariamente devido ao tsunami que se lhe seguiu, o que só pode ser explicado pelos consideráveis investimentos em habitações mais seguras e resistentes.

É absolutamente inaceitável que, quando já existem conhecimento e tecnologia capazes de limitar enormemente o impacto de tais eventos, continuemos a confrontar-nos com resultados desta natureza, enquanto os governos recusam impor normas de construção que aumentam os gastos necessários em habitações e infraestruturas mais seguras. Esse conluio com os interesses de investidores e especuladores imobiliários é especialmente evidente quando 16 das 20 cidades mais propensas a terramotos listada pela Forbes (que albergam milhões de habitantes) se situam em países pobres – as dez primeiras são Kathmandu (Nepal), Istambul (Turquia), Delhi (Índia), Quito (Ecuador), Manila (Filipinas), Islamabad (Paquistão), San Salvador (El Salvador), Cidade do México (México), Izmir (Turquia) e Jacarta (Indonésia), sendo Tóquio (no 11º lugar) a primeira dos países Ocidentais –, enquanto mantêm uma atitude quase fatalista como se nada houvesse a fazer.

Em contrapartida vemos que biliões de dólares foram destinados nos últimos trinta anos a resgates bancários e a guerras como as da Jugoslávia, Afeganistão, Iraque, Síria, Líbia, Mali e agora Ucrânia, enquanto na maioria das zonas de grande intensidade sísmica, milhões de pessoas continuam a viver em habitações inseguras ou próximo de infraestruturas fortemente degradadas por falta de manutenção, que podem condená-las à morte em caso de um grande sismo, de uma forte tempestade ou pelo seu simples e inevitável colapso.

Acompanhando as imagens de desolação e de destruição em Marrocos e na Líbia, constata-se a relativa ausência e o grande silêncio das autoridades (que no caso líbio pode encontrar alguma justificação na caótica situação sociopolítica que resultou da intervenção franco-americana em 2011, mas que no caso marroquino parece pura insensibilidade) que mais que um sinal de debilidade quase parece atitude de desdém.

Outro sinal da pouca consideração pelas populações afectadas foi o anúncio de um auxílio francês de 5 milhões de euros, uma ínfima percentagem dos 200 milhões de euros de ajuda militar francesa à Ucrânia, que nem a pouco diplomática atitude do governo marroquino de apenas considerar as ajudas oferecidas por quatro países (Espanha, Inglaterra, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos) pode explicar. Mas pior ainda foi o anúncio da doação norte-americana de um mísero milhão de dólares uma semana depois de terem anunciado mais mil milhões para a guerra na Ucrânia.

O pouco sentido de responsabilidade dos governantes não pode ser disfarçado pela crónica afirmação da falta de meios financeiros, quando estes prontamente aparecem para outras realidades muito pouco humanitárias; que o digam as populações marroquinas afectadas por este sismo, os habitantes da cidade líbia de Derna varridos pelo colapso de uma barragem ou os milhares de sobreviventes turcos e sírios do terramoto de Fevereiro que vivem em tendas enquanto assistem à frágil reconstrução das suas habitações que voltarão a ruir ao próximo sismo.

Um pouco por todo o lado, quer nos países ocidentais quer no Sul Global, assistimos passivamente à actuação de uma elite irresponsável que desperdiça recursos necessários ao bem-estar e à segurança das populações e que se mostra preocupada apenas com os seus interesses e a sua própria segurança, quando a via correcta seria a de utilizar os recursos essenciais da actividade económica mundial (indústria e comércio) na satisfação das necessidades sociais básicas (saúde, educação e segurança), incluindo a protecção contra eventos naturais extremos.

Timor-Leste tem revista científica em português com cientistas da CPLP

O ministro do ensino superior de Timor-Leste quer português no ensino superior e a Universidade de Díli já criou uma Revista Científica para editar artigos científicos apenas em língua portuguesa e somente com investigadores da CPLP.

Segundo uma nota jornalística de Amélia Babo, publicada no dia 15 deste mês no jornal Timor Post, o Ministério do Ensino Superior, Ciência e Cultura (MESCC) de Timor-Leste, a partir de 2024, terá como prioridade a concessão de bolsas de estudo aos professores universitários para continuarem os estudos de mestrado e de doutoramento.

Também, segundo a mesma fonte, o ministro José Honório Pereira Jerónimo quer “formação de português para professores para que possam melhorar o seu domínio nessa língua a fim de poderem usá-la para ensinar” (Amélia Babo, 2023).

Num artigo publicado pelo Jornal Tornado intitulado “Em que língua se ensina nas universidades de Timor-Leste”, o académico Azancot de Menezes já tinha alertado para o facto de em Timor-Leste não se ensinar em língua portuguesa nas universidades e afirmou que um estudo de caso da sua autoria mostrou que “96% de estudantes do ensino superior” querem aulas em português.

 

Revista científica editada em português e com investigadores da lusofonia

A Revista Científica da Universidade de Díli é supervisionada pelo Centro de Investigação e Formação Avançada da UNDIL, criado ao abrigo do Despacho nº 3/Reitor-UNDIL/IX/2023, e “constitui uma aposta estratégica para a promoção e divulgação do conhecimento no espaço da CPLP e no resto do mundo (Reitor da UNDIL, 2023).

Trata-se de uma publicação trienal da Universidade de Díli, supervisionada pelo Centro de Investigação e Formação Avançada (CIFA) da UNDIL, com o apoio e contributos dos membros que integram o Conselho Científico da Revista Científica da UNDIL.

O Conselho Científico da Revista Científica da UNDIL é constituído por reputados professores e investigadores de universidades, centros de investigação e institutos superiores da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Os membros do Conselho Científico da UNDIL, em conformidade com o Regulamento do CIFA, são Investigadores Convidados do Centro de Investigação e Formação Avançada (CIFA) da UNDIL.

Também, nos termos do Regulamento do Centro de Investigação e Formação Avançada (CIFA), todos os Investigadores e Professores/Investigadores da CPLP que acolheram o convite para integrar o Conselho Científico da Universidade de Díli, têm conhecimento de que a Universidade de Díli, no domínio da Investigação Científica, é signatária da Iniciativa de Budapeste sobre Acesso Aberto (BAOI) e da Declaração de São Francisco sobre Avaliação da Investigação, e é membro da Coalition for Advancing Research Assessment (CoARA).

(Fonte: Universidade de Díli /UNDIL)

A Revista Científica da UNDIL é editada exclusivamente em língua portuguesa, “no sistema de Acesso Aberto (Open Access), em respeito pela Declaração de Budapeste sobre Acesso Aberto, e tem como principal finalidade promover e divulgar a produção científica da UNDIL e das instituições de ensino superior e de investigação da CPLP em todas as áreas do conhecimento.

Todos os artigos científicos e produção de ciência são avaliados no sistema de revisão por pares conforme defende a Declaração de São Francisco sobre Avaliação da Investigação (DORA) e a publicação e submissão de artigos científicos não implica custos para o investigador.

 

Equipa editorial da Revista Científica da UNDIL

Director

  • José Agostinho da Costa Belo Pereira

 

Sub-Director

  • Manuel Azancot de Menezes

 

Secretário-Geral

  • Tomás Augusto Correia

 

Secretariado

  • António Maher Lopes
  • Leocádia Leong Sarmento
  • Wilson da Conceição Fernando

 

Designer e Informática

  • Januario Freitas Araujo Bernardo

 

Conselho Editorial

  • Manuel Azancot de Menezes
  • Alfredo dos Santos
  • Avelino Coelho da Silva
  • Cosme Alberto da Costa Freitas
  • Francisco Martins da Silva
  • Gilberto Ximenes
  • Hugo Lourenço da Costa
  • Dulce dos Reis
  • Adriana Fonseca da Silva

 

Conselho Científico

  • Alfredo Buza (Universidade de Luanda |Angola)
  • Carla Queiroz (Instituto Superior de Administração de Finanças | Angola)
  • Carlos Alberto Pinto de Sousa (Universidade Agostinho Neto | Angola)
  • Euclides Sacomboio (Universidade Agostinho Neto | Angola)
  • Isaac Paxe (Instituto Superior de Ciências da Educação de Luanda | Angola)
  • Silvana Rocha da Silveira (Universidade Privada de Angola | Angola
  • Wilson Tavares (Instituto Superior Militar | Angola)
  • Yamila Planas Batista (Universidade Privada de Angola | Angola)
  • João Ferreira de Oliveira (Universidade Federal de Goiás | Brasil)
  • José Francisco dos Santos (Universidade Federal do Oeste da Bahia |Brasil)
  • Marcelo Bizerril (Universidade de Brasília Campus Planaltina |Brasil)
  • Arnaldo de Brito (Universidade de Cabo Verde | Cabo Verde)
  • Cremildo Abreu Coutinho (Universidade Púnguè |Moçambique)
  • Dílson Arlindo Mutote (Universidade Joaquim Chissano |Moçambique)
  • Belmiro Cabrito (Universidade de Lisboa | Portugal)
  • Cláudia Vaz (Universidade de Lisboa | Portugal)
  • Dora Fonseca (Universidade de Aveiro | Portugal)
  • Estela Costa (Universidade de Lisboa |Portugal)
  • João Pedro da Ponte (Universidade de Lisboa | Portugal)
  • José Carlos Gomes (Escola Superior de Saúde de Leiria | Portugal)
  • Luísa Machado Cerdeira (Universidade de Lisboa |Portugal)
  • Luís Miguel Carvalho (Universidade de Lisboa | Portugal)
  • Luís Tinoca (Universidade de Lisboa | Portugal)
  • Mónica Baptista (Universidade de Lisboa |Portugal)
  • Susana Paixão (Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra | Portugal)
  • Avelino Coelho da Silva (Universidade de Díli | Timor-Leste)
  • Deonízio Fraga ((Universidade de Díli | Timor-Leste)
  • Alfredo dos Santos (Universidade de Díli | Timor-Leste)
  • Manuel Azancot de Menezes (Universidade de Díli | Timor-Leste)
  • Sequito Monteiro (Universidade de Díli | Timor-Leste)

De acordo com informações obtidas no Centro de Investigação e Formação Avançada (CIFA) da UNDIL, o primeiro número da Revista Científica será lançado no início de 2024.

Caboucos do presente

Os caboucos proliferam por aí.

Cada um tem a sua função especifica ou, se quisermos, configuração de defesa, distanciamento, e outros.

Mas também há os caboucos interpretativos, de discernimento, de escrita e por aí adiante.

No burgo os caboucos são de dimensão considerável consoante o extrato social, a profissão ou atividade, mas também na interação social seja ela qual for.

Esta ressalva reporta ao comportamento das pessoas perante preconceitos que não conseguem ultrapassar por manifesta má formação intelectual separando o que não devem e misturando o que menos devem.

Separam a sua identidade daquilo que é o principio da essência onde a politica tem papel fundamental na sua vida e na sua formação intelectual tornando os em elos dessa corrente politico social para a levar por diante, transformando os preconceitos transitados em autênticos flops como se a circunstância e o meio sejam de somenos importância no dia a dia de cada um que, não sendo igual, interage e comunica. A influência social no quadro da atividade dos partidos políticos considerando que tudo o que fazem é mau e por interesses individuais, ignora que são os que lhes controlam a barriga com salários baixos a estabelecer as regras de coexistência na pobreza considerando os como como sendo os bons porque lhes dão emprego.

Os caboucos no conhecimento são demasiado fundos e por isso, não conseguem discernir que sem as pessoas não há economia e que sem economia não pode haver civilizações organizadas.

Os caboucos são o que são. Mais ou menos profundos e mais ou menos largos.

As estruturas que sobre eles se constroem terão a robustez que interessar ao poder económico que controla o poder politico.

No entanto, os temas de noticia ou de mesa de café, acabam sempre em discussões estéreis sobre corrupção dos agentes políticos; económicos; e, futebol em geral; pouco preocupados com a defesa dos seu direitos e deveres.

Discutem milhões que nunca ganharão e gabam essa promiscuidade que lhes tira da boca aquilo que dá em excesso a alguns.

Eu não sei se considerar os povos estúpidos é um cabouco intelectual ou a constatação de uma realidade.

Mas sei, que a distribuição da riqueza produzida pelo Homem e as tecnologias que criou está muito mal que criou está muito mal distribuída.

Falam por ai em gerações com um nível de formação superior.

No entanto, assiste me o direito, de questionar o que será um nível de formação superior num tempo em que não há produção de qualidade suficiente e que, mesmo assim, o desperdício é manifesto e, a baixa qualidade de vida associada à fome uma evidência no mundo.

Assisto também a um descalabro civilizacional onde a mediocridade ascende ao poder e a capacidade e competência são relegados para plano inferior.

Por fim há os caboucos que separam os interesses e implementam guerras fratricidas com milhares de mortos; cidades em escombros; gerações martirizadas que retrocederão no tempo; povos dizimados; e, um futuro demasiado sombrio…

Mas, também há os caboucos regionais e entre religiões onde a verdade de uns não é o caminho de outros porque a sua verdade é ú nica e inquestionável para a eternidade.

Os caboucos Humanos podem ser confusos mas serão sempre os da sobrevivência tenham a forma de organização civilizacional que tiverem.


Por opção do autor, este artigo respeita o AO90