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João de Sousa

Quinta-feira, Março 28, 2024

Uma pérola no Danúbio

Faça a mala e vá brindar a sua chegada com um trago de pálinka.

«Quando se abriu um buraco nas nuvens, me pareceu que sobrevoávamos Budapeste, cortada por um rio. O Danúbio, pensei, era o Danúbio mas não era azul, era amarelo, a cidade toda era amarela, os telhados, o asfalto, os parques, engraçado isso, uma cidade amarela, eu pensava que Budapeste fosse cinzenta, mas Budapeste era amarela». É assim que José Costa, personagem do romance Budapeste, de Chico Buarque, pinta a cidade que fala húngaro – o idioma que o fascinou, a «única língua que o diabo respeita».

Os lugares são muito o que neles vemos, o jeito como os sentimos, aquilo que neles buscamos. Provavelmente não vai pintar Budapeste de amarelo, mas de vermelho paprika. Ou, pelo contrário, até achará absurdo aplicar cor a um lugar. Bem, o melhor mesmo é ir, e deixar os próprios olhos esclarecerem todas as dúvidas! Mas uma certeza leve na bagagem: se procura uma cidade majestosa e altiva, onde pode ser surpreendido ao virar de cada esquina, esta é a escolha acertada.

Oficialmente unidas desde 1873, Buda e Peste dão corpo e alma à Rainha do Danúbio. Com histórias conturbadas de invasões e lutas, a cidade que se intitula a «Paris do Leste», herdou uma impressionante paisagem urbana, e o seu reconhecimento chegou com a declaração de Património Mundial pela Unesco das margens do Danúbio, da colina de Buda e da avenida Andrássy.

Os Magiares foram os fundadores da nação húngara, e nem os períodos negros da sua história apagaram essas raízes: a invasão turca no século XVI; o domínio dos Habsburgos até 1867; ou a devastação causada pela II Guerra Mundial, após apoio dado à Alemanha. A Hungria viria a tornar-se República em 1989, na sequência do colapso do comunismo, e as primeiras eleições livres chegam depois de as tropas soviéticas se retirarem do terreno, em 1991. Por tudo isto, a cidade é uma mistura imponente de estilos e revivalismos arquitectónicos.

Cinco lugares a não perder

Bairro do Castelo

Percorrer as muralhas do castelo e do bairro de Buda vai levá-lo a apreciar a zona da Cidade Velha e o Palácio Real, reconstruídos depois da guerra. As suas ruas medievais convivem com fachadas barrocas e neoclássicas, numa amálgama de vários estilos que exibem tamanha riqueza arquitectónica. A maior parte das residências respiram histórias de reis, rainhas e nobres de outrora, e como muitas ainda são habitadas, o bairro conserva uma intensa aura romântica. Por aqui, destaca-se a Igreja Mátyàs, a Rua dos Lordes, o miradouro do Bastião dos Pescadores (com vista soberba sobre Budapeste, onde pode arriscar a melhor pose) e o Palácio Real, que alberga a Galeria Nacional, a Biblioteca Nacional e o Museu de História de Budapeste. 

Parque das Estátuas

Logo após a queda do regime comunista na Hungria, muitas das estátuas e monumentos foram imediatamente retirados das praças e avenidas do País. Mas ao contrário do que foi feito noutros Estados, todas estas obras do período soviético estão reunidas num museu a céu aberto, também chamado Memento Park, ou Szoborpark. Entre as obras expostas encontram-se estátuas de Lenine, Karl Marx e Friedrich Engels, assim como os líderes comunistas húngaros Béla Kun e Georgi Dimitrov. O parque fica situado num subúrbio a sul de Buda, e é uma das visitas mais interessantes a fazer.

Parlamento

Um dos monumentos mais sumptuosos de Budapeste pode ser avistado de inúmeros pontos de Buda, no lado oposto do Danúbio. O Parlamento Húngaro impõe-se pelo seu esplendor em estilo gótico, dezenas de torres e pináculos e centenas de salões ornados com estátuas de húngaros célebres. Se tiver paciência para esperar e enfrentar longas filas, vai ver que a visita ao interior do edifício valeu a pena. Bem perto, encontra na Praça Roosevelt, a Academia Húngara das Ciências, a neoclássica Basílica de Santo Estevão (maior igreja da cidade) e o Palácio Gresham. Aproveite o percurso para visitar a Ópera Nacional e assistir a um espectáculo, onde o pode fazer a preços reduzidos, durante o dia e sem traje de gala. Ir à ópera na Hungria é um hábito tão comum como assistir a uma peça de teatro ou ir a uma sessão de cinema.

Praça dos Heróis

O anjo Gabriel petrificado no cimo de uma colunata que mede 36 metros de altura assinala a Praça dos Heróis (Hösök Tere), onde estão representadas as figuras dos reis húngaros e outros vultos famosos das guerras de independência. No centro da praça mais importante do lado Peste, que fica no extremo da avenida Andrássy, ergue-se o Memorial do Milénio e as estátuas dos líderes das sete tribos magiares, que fundaram a Hungria no século IX. A partir daqui entra-se no Parque da Cidade, extensa área ocupada pela ilha do lago de Városliget e pelo Castelo Vajdahunyad, que mais parece um castelo de conto de fadas. No inverno, transforma-se em pista de gelo, no Verão é ladeado por um lago onde gaivotas e barcos a remo podem ser contratados. Também aqui, no parque da cidade, se situa o maior complexo balnear termal da Europa. 

Banhos públicos

Não é de estranhar que os romanos tenham colonizado esta área do Danúbio, onde fontes de águas termais brotam desde os primeiros séculos da humanidade. Entre as colinas de Buda e a planície de Peste, a tradição dos banhos medicinais, que começou no distante século II e ganhou força quando os turcos ocuparam o país (séculos XVI e XVII) atrai visitantes de todos os cantos do mundo com promessa de cura para diversos males.

Há mais de um milhar de termas em todo o País, cerca de cinco dezenas estão em Budapeste. Mesmo em pleno inverno, grandes complexos de sauna a céu aberto proporcionam um espectáculo único, onde o vapor das águas aquecidas a 45 graus contrasta com o cenário de neve exterior.

Sejam como piscinas interiores ou exteriores, os banhos públicos estão espalhados por toda a cidade. Os mais famosos são os banhos de Király, cuja construção começou em 1565, no auge turco; os banhos Rudas; os de Gellért, com as suas águas naturais vindas da montanha com o mesmo nome, ricas em cálcio, sulfato e magnésio; e os de Széchenyi, no parque da cidade. 

O Mercado Central

Como imaginamos, não estará a conduzir, assim, para começar a manhã da melhor forma dê uma saltada ao mercado, perto da ponte da Liberdade, e comece por provar a típica pálinka, a aguardente húngara com alto teor alcoólico, produzida a partir do bagaço fermentado de diversas frutas. Estará depois cheio de energia para entrar num verdadeiro espectáculo de luz e cor, percorrer as bancas caprichosamente ornamentadas de frutas, legumes e, claro, da famosa paprika, em todos os tamanhos e tonalidades. A altura é óptima para comprar a colorida matrioska reproduzida às centenas nas mesinhas do artesanato, ou para experimentar outros petiscos da terra, como o goulash. Entre outros pratos da gastronomia húngara destaca-se a halászlé (sopa de peixe com paprika); o porkolt (estofado de carne variada); ou o ranttott (carne empanada). E não se esqueça: deixe espaço para o delicioso strudel, que é soberbo!

  • Os doces e tortas são tradicionais no país.

A saber

Qualquer altura do ano tem os seus encantos, mas aconselha-se vivamente a Primavera e o Outono, alturas em que Budapeste se mostra mais amena e tranquila. O Verão, quente e repleto de acontecimentos, é sempre muito animado, mas as multidões de turistas podem revelar-se um inconveniente. E o Inverno é muito frio, altura em que também fecham alguns museus e outras atracções turísticas.

Budapeste é muito bem servida de transportes públicos. Além de aquecidos, os autocarros, eléctricos e metro permitem-lhe deslocações por toda a cidade sem longos tempos de espera. Mesmo sem entender a língua não é difícil orientar-se. Procure sempre validar os seus tickets de transporte, se qualquer máquina não funcionar, procure outra. A fiscalização é apertada e não perdoa, nem a «chico-espertice» do portuga.

A melhor forma para observar a cidade de forma confortável, e em versão romântica, é percorrer as águas do Danúbio a bordo das embarcações turísticas que partem dos cais junto à ponte Lánchid. Os passeios têm uma hora de duração. 

Curiosidades

. Desde 1 de Janeiro e até 30 de Junho de 2011, a Hungria assumiu a presidência do Conselho da União Europeia, pela primeira vez desde a sua adesão (Maio de 2004). No entanto, o país ainda não pertence à zona euro devido ao não cumprimento dos critérios de convergência, e continua a utilizar a sua moeda nacional – o florint húngaro.

. Em pleno Danúbio repousa a Ilha Margaret, uma mancha verde de dois quilómetros e meio, assumida como o pulmão da cidade. As atracções do local convidam ao exercício e ao lazer. Desde estádio desportivo, campos de ténis, complexos de piscina, teatro ao ar livre, jardins, o local tem ainda dois hotéis com spa, esplanadas, restaurantes e banhos termais. A ilha é habitada desde o século XII e deve o seu nome ao facto de a princesa Margaret, filha do rei Bela IV, ter aqui vivido num convento, depois da promessa de seu pai que lutava contra os invasores mongóis. 

. Budapeste abrange sete milhas do rio Danúbio, o segundo maior da Europa depois do Volga. Dez pontes ligam Buda e Peste, sendo a mais conhecida a das Correntes (Széchenyi) destruída nas duas guerras mundiais. 

. No Bairro Judeu situa-se a maior Sinagoga da Europa e a segunda maior do mundo (depois da de Nova Iorque).

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