A cerimónia de lançamento da Rede de Sustentabilidade das Instituições de Ensino Superior (IES) nos Países e Regiões de Língua Portuguesa foi um dos pontos altos da 13ª Conferência FORGES que terminou no dia 24 de Novembro de 2023.
A Rede de Sustentabilidade integra Instituições de Ensino Superior de Angola, Brasil, Cabo Verde, Macau, Moçambique, Portugal e Timor-Leste.
Segundo a FORGES passou a haver um “compromisso das Instituições de Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa com a sustentabilidade planetária porque o desenvolvimento sustentável das sociedades actuais é o desafio global mais importante desse século”:
“A tarefa torna-se ainda mais relevante e complexa quando, além do combate à crise climática, da preservação da natureza e do uso racional dos recursos naturais, o conceito de sustentabilidade inclui a erradicação da pobreza e da fome, a superação das desigualdades e a promoção da saúde, qualidade de vida e justiça, desafios sintetizados em 2015 nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) propostos pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas.
Neste contexto, as instituições de ensino superior (IES) assumem uma posição de centralidade, dado seu papel na formação das futuras gerações e sua missão de produzir conhecimento e tecnologias. Palco do debate das grandes questões políticas e científicas, as IES devem ser exemplos de sustentabilidade para a sociedade. Os países e regiões de língua portuguesa apresentam condição ímpar para influenciar a promoção da sustentabilidade em escala global, com base na rede de IES e organizações que promovem o ensino superior no espaço da língua portuguesa na África, na América Latina, na Ásia e na Europa”.
(FORGES, 2023)
Considerando estes pressupostos as Instituições de Ensino Superior que subscreveram a Carta de Compromisso comprometem-se com a construção de sociedades sustentáveis, integrando as suas actividades com os Objectivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Lista das 34 IES que aderiram à Rede de Sustentabilidade
Instituto Superior de Ciências da Educação da Huíla (ANGOLA)
Instituto Superior de Ciências da Educação de Benguela (ANGOLA)
Instituto Superior de Ciências da Educação do Sumbe (ANGOLA)
Instituto Superior de Ciências Policiais e Criminais (ANGOLA)
Universidade de Luanda (ANGOLA)
Universidade Mandume Ya Ndemufayo (ANGOLA)
Universidade de Brasília (BRASIL)
Universidade de Cruz Alta (BRASIL)
Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP (BRASIL)
Universidade de Cabo Verde (CABO VERDE)
Universidade Jean Piaget de Cabo Verde (CABO VERDE)
Instituto Superior de Gestão e Administração Pública Guiné-Bissau (GUINÉ-BISSAU)
Universidade Lusófona da Guiné-Bissau (GUINÉ-BISSAU)
Universidade de São José (MACAU)
Universidade Politécnica de Macau (MACAU)
Universidade Alberto Chipande (MOÇAMBIQUE)
Universidade Joaquim Chissano (MOÇAMBIQUE)
Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (PORTUGAL)
Escola Superior de Enfermagem Porto (PORTUGAL)
Escola Superior de Saúde de Alcoitão (PORTUGAL)
Instituto Politécnico de Lisboa (PORTUGAL)
Instituto Politécnico de Santarém (PORTUGAL)
Instituto Superior de Gestão (PORTUGAL)
Politécnico de Coimbra (PORTUGAL)
Politécnico de Setúbal (PORTUGAL)
Politécnico do Porto (PORTUGAL)
Universidade Aberta (PORTUGAL)
Universidade Católica Portuguesa (PORTUGAL)
Universidade de Aveiro (PORTUGAL)
Universidade de Coimbra (PORTUGAL)
Universidade de Lisboa (PORTUGAL)
Universidade Lusófona (PORTUGAL)
Universidade de Díli (TIMOR-LESTE)
Universidade Nacional Timor Lorosa’e (TIMOR-LESTE)
Em Congresso da ASP-Ação Socialista Portuguesa em 19 de abril de 1973 deliberou se a alteração da sua denominação social para Partido Socialista.
Em 1974 há em Portugal um golpe de Estado perpetrado por um movimento militar liderado por capitães sob a sigla de MFA Movimento das Forças Armadas que abre caminho para a instalação das liberdades democráticas da sua população permitindo a liberdade de organização politica, sindical e outras.
No contexto internacional esta ocorrência causa perplexidade nos interesses geoestratégicos e geopolíticos internacionais liderados pelos U.S.A. que se apressaram em tentar travar o Processo Revolucionário em Curso (PREC) em Portugal, tendo em conta as implicações politicas na Península Ibérica, o que veio a acontecer com a queda de Franco em Espanha, substituído por uma monarquia, um regime politico bem mais simpático para os interesses em querelas geopolíticas internacionais.
Nesse sentido aconteceram episódios caricatos mas de relevo significante como aconteceu com a substituição do embaixador dos USA por um operacional da CIA, Frank Carlucci.
Desde o inicio que o controlo do Partido Socialista ultrapassou a disputa pela liderança ideológica para se tornar numa guerra de interesses em legislatura entre a esquerda e a direita ideológica nas politicas transversais responsáveis pela organização social e por essa via o acesso ao controlo económico tanto na reprivatização de setores fundamentais da economia nacional a preços de saldo como aconteceu, mas também nos posteriores fluxos financeiros externos oriundos da U.E. como dos excedentes resultantes do apuramento liquido das contas das empresas em sede de despesa e receitas apuradas consoante as
vantagens conseguidas e um IRC que, quando comparado com o IRS sobre a massa salarial, os rácios apurados deixam muito a desejar.
É nesta perspetiva que a distribuição da riqueza produzida tenderá a crescer para quem trabalha por conta de outrem se a esquerda ganhar a contenda e, a diminuir se o resultado tender para a vitoria daqueles que defendem politicas do centro direita saudosista.
Alias, desde o inicio que são conhecidas as ideias politicas dos dois principais contendores: Luís Pedro Nuno dos Santos e, José Luís Carneiro.
Assim como as soluções politicas diversas que preconizam para os Portugueses através de um exercício simples: anunciando os seus aliados preferências.
Mas também a História dos militantes do partido que com antecedentes de luta antifascista em outras organizações politicas fez caminho e influenciou militares que no seio do Conselho da Revolução divergiram no modelo e se organizaram no grupo dos nove liderado por Melo Antunes em rota de colisão com a linha mais sectária seguida pelo MFA, optando por se posicionar próximo dos interesses dos Estados Unidos que por cá colocaram o acima citado agente da CIA como embaixador: Frank Carlucci; que fez o seu trabalho de combate politico no sentido de impedir que a esquerda revolucionária de então, já acima referenciada, abrisse uma brecha na Europa como veio a acontecer com a queda de Franco em Espanha; a fragilidade de Mitterrand em França, a queda de Helmut Schmidt na Alemanha, entre outros.
O centro direita cerra fileiras na Europa travando o avanço dos movimentos sindicais operários e campesinos onde imperava a pobreza e, o Partido Socialista, em Portugal, percebe que contribuiu para isso ao ponto de o seu fundador: Mário Soares, já muito de pois de deixar as lides da disputa política se ter posicionado politicamente na esquerda ideológica defensora da fraternidade e da igualdade de oportunidades: o Socialismo Democrático, rumo a uma nova sociedade de valores e de justiça social.
A que se seguiu, em 2015, uma convergência politica de causas para a composição de uma maioria que trouxe a reconquista de direitos usurpados por Pedro Passos Coelho e a melhoria significativa das condições de vida até… uma certa maioria…
As disputas pelas lideranças partidárias de hoje não são, nem por sombra, idênticas às que conquistaram Abril.
As disputas pelas lideranças partidárias de hoje são personalizadas em torno de grupos de interesses colocando em causa o princípio da ciência politica que versa a organização civilizacional das sociedades modernas.
Esse é o papel que cabe aos Partidos Socialistas e que, por isso, devem ter lideranças com identidade e vinculo popular. Até porque, o que faz um politico não é a veste.
Quando começou a polémica originada pela pretensão de incluir no Orçamento do Estado para 2024 um agravamento do IUC para os automóveis na categoria A (matrículas anteriores a 2007)(i) fui de imediato pôr de parte, para releitura um pequeno estudo de 1939 de Marcelo Caetano “O exclusivo da Carris de Ferro de Lisboa e as cooperativas de transportes urbanos” incluído no livro Estudos de Direito Administrativo do autor, organizado em 1974 por André Gonçalves Pereira e Diogo Freitas do Amaral, e para leitura de raiz Finanças e Fiscalidade do Ambiente e da Energia, de Carlos Batista Lobo, manual de apoio ao ensino daquele professor na Faculdade de Direito de Lisboa. Nem um nem outro são responsáveis pelas considerações trazidas para o presente artigo, que se filiam sobretudo nalguma observação empírica.
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Estudos de Direito Administrativo
Finanças e Fiscalidade do Ambiente e da Energia
Numa primeira ordem de considerações importa perceber que, por muito desenvolvido e “lubrificado” que esteja o sistema de transportes colectivos, a possibilidade de dispor de (pelo menos) um automóvel próprio se coloca para cada indivíduo e para cada família. Nem todos são trabalhadores por conta de outrem, com horários regulares, efectuando uma transumância diária entre casa e local de trabalho. Mesmo para os que o são, a possibilidade de trazer automóvel e de o deixar num parque gratuito pode ser atraente(ii). Entretanto, já não se fazem compras na mercearia ou no talho do bairro, fazem-se periodicamente no supermercado ou hipermercado. E há as deslocações em férias que em alguns casos são deslocações à terra de origem. Para tudo isso é preciso, ou mais cómodo, ter um automóvel. E para o efeito pode servir o automóvel já com alguma idade que não tenha problemas de mecânica.
Por muita consciência ecológica que tenham, os jovens que estejam no início da sua actividade profissional sem horários ou com horários atípicos também precisam de ter um automóvel. De diálogos que fui mantendo em três casos nos anos mais recentes(iii), destaco os que, no ano que agora finda, tive com um profissional de saúde ainda jovem (que fez questão em me dizer que só teve automóvel anos depois de ter tirado a carta) trabalhando em vários estabelecimentos julgo que em regime de actividade independente, e que cumprida a sua manhã ou a sua tarde de trabalho, tem gosto em encontrar o seu carro(iv). Não me recordo de ver nos inquéritos às deslocações utilizados na preparação de medidas de política relevados estes aspectos, que contudo não são negligenciáveis.
Numa outra ordem de considerações importaria perceber por que razão em locais em que quase toda a gente tem automóvel mas em que foram recentemente criadas condições razoáveis para a utilização de transportes colectivos, estes continuam a ser pouco utilizados.
Sem que se possa generalizar, venho observando que as carreiras(v) que passam próximo da minha residência na margem sul, e que vêm do concelho de Almada para o do Seixal, num percurso também seguido por muitas viaturas, me aparecem, a diferentes horas, com muitos poucos passageiros e poucos mais vão subindo até à estação ferroviária, aliás as carreiras continuam uma até à Cruz de Pau, outra até Paio Pires. Quando muito ao chegar à paragem, numa zona, que é de moradias, encontro uma vizinha, grisalha como eu, que vem da zona, também de moradias, do outro lado da estrada. Por vezes há anomalias na circulação e a minha vizinha comentou numa ocasião que por isso “as pessoas agarram-se ao carro”. No sentido inverso, mais para o fim da tarde, o número de passageiros apresenta-se mais composto mas geralmente sem excesso de lotação.
Acredito que aqui há hábitos consolidados ao longo de muito tempo, bem como decorrências de estrato social, e que o preço e o grau de disponibilidade dos transportes não são o único factor explicativo da procura.
Não rejeito que o encarecimento relativo da utilização do automóvel possa ser um elemento a considerar no sentido de reduzir esta utilização / favorecer a utilização dos transportes colectivos.
Fernando Medina
Nesse contexto pareceu-me justificável a opção dos primeiros governos de António Costa de manter uma carga fiscal elevada sobre produtos petrolíferos para financiar as políticas públicas no seu conjunto.
Mesmo em relação às subidas de preços verificadas durante o processo inflacionista que tem vindo a ter lugar a partir de 2022 considero que, ao contrário do que foi decidido, as reduções da carga fiscal se deveriam ter restringido às viaturas utilizadas na actividade económica com contrapartida num efectivo congelamento dos correspondentes preços.
Agora, o agravamento do IUC não é um incentivo à maior utilização dos transportes colectivos, é um ataque ao direito a ter um automóvel, que atinge por igual quem o utiliza para quase tudo e quem o utiliza somente para alguns casos, mas não o pode dispensar.
É certo que, como dizem Fernando Medina e Duarte Cordeiro, um aumento de dois euros por mês não parece muito elevado(vi).
No entanto, num contexto inflacionista todos os euros contam, particularmente se não se encontra razão para o aumento.
Duarte Cordeiro
E quem tem um automóvel com matrícula antiga mesmo que não utilize muito a viatura já tem encargos anuais garantidos com a Inspecção Periódica Obrigatória.
Acresce que a circunstância de o aumento já não reverter para os municípios e ter aparecido associado à redução das portagens das ex-SCUTs provocou, para além do desagrado dos contribuintes de IUC, o desinteresse dos municípios e a hostilidade dos ambientalistas extremistas.
Num plano mais geral, a crítica dos partidos de direita ao suposto aumento da carga fiscal mesmo que não justificado, mostrou estar a abrir caminho nos espíritos. O Primeiro Ministro reagiu mal às 400 mil assinaturas contra o aumento e terá pensado que tinha uma maioria absoluta e tempo para gerir a implementação. Dias depois já não tinha nem uma nem outro.
No futuro, enquanto nem todos os automóveis forem eléctricos ou movidos a hidrogénio “verde”, pôr-se-ão problemas semelhantes em relação aos automóveis com motores de combustão, cujas emissões se tentará reduzir aceleradamente.
Uma solução poderia ser a cooperação entre vizinhos ultrapassando as preocupações que levaram em 1939 tanto o Supremo Tribunal Administrativo como Marcelo Caetano a rejeitar esquemas engenhosos que punham em causa as concessionárias, mas com a actual organização do sector, o direito de propriedade, os contratos de seguros, a própria pressão das marcas para vender novos automóveis, inviabilizariam quase certamente um esforço significativo, sendo contudo certo que dizendo Churchill em 1942 a propósito da criação dos Portos Mulberry para apoiar o desembarque na Normandia “Don’t argue the matter, the difficulties will argue for themselves”, que chegaram a ser colocados no teatro de operações em 1944 dois destes portos.
No limite poder-se-á encarar a substituição dos automóveis por burros, como aquele que em tempos imemoriais António Costa cavalgou Calçada de Carriche acima numa acção de campanha eleitoral. Mas podemos ter a certeza que se tal substituição for feita, será criada no IUC uma classe para os burros.
(ii) E quando o parque deixa, em benefício da EMEL, de ser gratuito e passa a ser pouco utilizado, como sucedeu com um espaço adjacente à estação ferroviária de Moscavide, do lado de Lisboa, devíamos perguntar-nos para onde foram os automóveis.
(vi) Tenho na garagem um automóvel matriculado em 1999 que funciona bem e de que não me desfaço por razões pessoais e não me passou pela cabeça alinhar nos protestos.
O Grito (1893), de Edvard Munch, volta a nos falar hoje com grande intensidade. Como surgiu essa pintura? Em setembro de 1892, em Kristiana (Oslo), Munch registrou uma experiência angustiante em seu diário:
Certa noite, eu estava caminhando em uma trilha montanhosa perto de Kristiania – com dois camaradas. Era um momento em que a vida havia rasgado minha alma. O sol estava se pondo – tinha mergulhado em chamas abaixo do horizonte. Era como uma espada flamejante de sangue cortando o côncavo do céu. O céu era como sangue – cortado com tiras de fogo – as colinas se tornaram azuis profundas, o fiorde cortado em cores frias de azul, amarelo e vermelho – o vermelho sangrento explodindo – no caminho e no corrimão – meus amigos se tornaram brancos amarelos brilhantes – senti um grande grito – e ouvi, sim, um grande grito – as cores na natureza – quebraram as linhas da natureza – as linhas e as cores vibraram com o movimento – essas oscilações da vida não só fizeram meus olhos oscilarem, mas também meus ouvidos – então eu realmente ouvi um grito – então pintei o quadro Scream.
A pintura mundialmente famosa de Munch é baseada nessa experiência. Sua figura icônica ouve um grito lancinante. Mas por que essa pintura ficou gravada de forma tão indelével na memória coletiva da comunidade humana? Como exatamente o horror é capturado na pintura?
Não está claro se a figura apenas ouve o grito ou se também está gritando em desespero, mas isso parece provável. As mãos cobrem os ouvidos para protegê-los do grito, mas esse gesto também manifesta seu próprio horror. Como afirma o artista, esse grito tem origem na natureza; portanto, é algo profundamente elementar.
A descrição no diário de Munch é vívida e já contém aspectos da pintura. O vermelho e o sangue são mencionados várias vezes – também há referências a chamas, fogo, até mesmo o fiorde e as montanhas são banhados pelo “vermelho sangrento que explode”. O céu, repleto de sangue, fogo e violência, ocupa um terço do quadro e se irradia para as montanhas escuras e para o fiorde, que reflete principalmente a cor amarela do céu em chamas e é emoldurado pelas montanhas e pela cidade de Kristiana em tons de marrom avermelhado e azul. A cidade em si é apenas sugerida.
As linhas curvas e claramente reconhecíveis das pinceladas em óleo e têmpera, bem como os destaques em giz pastel, aplicados diretamente no papelão marrom sem imprimação, capturam o movimento e as ondas sonoras do grito. Esse efeito é reforçado pelos contrastes do amarelo brilhante com o carmesim e o escuro. Esse choque de cores brilhantes e quebradas confere à natureza um caráter simultaneamente horrível e sinistro, impenetrável.
A natureza dolorosa do grito é enfatizada pela colisão de formas: Vibrações, curvas e abismos dominam dois terços da imagem; um terço é preenchido pelas linhas retas mortas da ponte e pelos suportes horizontais da grade. A imagem é, portanto, dividida em dois triângulos grandes e contrastantes: um pertence ao clamor da natureza, que ainda abriga pessoas com suas linhas suaves e fluidas. O triângulo menor à esquerda dos suportes horizontais do corrimão da ponte é caracterizado por diagonais rígidas e esticadas que atravessam a imagem como uma seta. Essa colisão entre as ondas suavemente curvadas e as diagonais rígidas torna quase audíveis as vibrações de que o pintor fala em seu diário.
Uma forma de funil em azul escuro, dentro da natureza, cuja ponta corre em direção à cabeça do personagem que grita, cria a sensação de sucção inevitável, como um buraco negro, do qual apenas a pessoa horrorizada tem conhecimento. O movimento da sucção em direção ao crânio sugere que a catástrofe é percebida apenas por sua consciência, e não pelas outras pessoas na imagem, embora a cidade de Kristiana também esteja envolvida no redemoinho que tudo envolve. A barreira entre a ponte e o abismo é bastante aberta e não oferece proteção contra quedas.
O Grito.”Skrik”‘ de Edward Munch
A cabeça do esqueleto está no centro da imagem. Munch quase não usa cores para criar esse rosto, deixando grande parte dele simplesmente sobre o fundo marrom sem pintura. A boca, escancarada de horror, domina o rosto, o nariz e os olhos são apenas indicados, traços de giz pastel branco traçam os contornos do crânio, as órbitas oculares, as mandíbulas e aprofundam a impressão de um esqueleto; as mãos também lembram ossos.
O resto do corpo é esboçado – a jaqueta da figura reflete as cores do funil devorador e se torna disforme, sem corpo do peito para baixo. O crânio parece um pouco grande demais para o corpo, quase pesado demais. Enquanto a cabeça se projeta no triângulo escuro acima do corrimão, o corpo está localizado sob o corrimão da ponte com suas linhas retas no terço superior da borda esquerda da imagem. Os suportes triplos do corrimão, portanto, conectam a figura em primeiro plano diretamente com as duas figuras escuras caminhando a uma curta distância. As cartolas apontam para dois homens sem rosto, vestidos de maneira convencional. Não está claro se eles estão se afastando dos espectadores ou se um deles está vindo em sua direção. Esses dois homens, para os quais a diagonal está apontando, recebem um impulso para ajudar a pessoa martirizada e, portanto, são incluídos na ação. Eles, no entanto, não ouvem o grito – nem o desespero da natureza nem o grito de seu semelhante. Não há ajuda ou empatia.
Outra duplicação, que contrasta com o indivíduo que grita, são os dois barcos vistos no fiorde: aparentemente desfrutando da noite em paz, talvez pescando até tarde. A natureza não está deserta, mas inclui a atividade humana. Somente a pessoa que grita em profunda angústia sente o apocalipse iminente. Assim, enquanto os outros seres humanos são bastante imunes ao céu encharcado de sangue, para a criatura atormentada o mundo está em chamas. O horror reina sob a superfície de um mundo pacífico. Não se pode mais confiar em sinais familiares: o vermelho, a cor do amor e do calor, agora transporta fogo e sangue. O céu não é uma visão reconfortante, mas profundamente ameaçadora. Mas somente o artista percebe isso. Munch escreveu a lápis em uma faixa vermelha no céu: “kan kun være malet af en gal mand” (“só pode ter sido pintado por um louco”). Durante toda a sua vida, o pintor se preocupou com a possibilidade de perder a cabeça e também passou algum tempo em tratamento psiquiátrico. Mas o horror ao qual ele sensibiliza os olhos e os ouvidos do espectador com esse quadro reflete os medos do indivíduo e, ao mesmo tempo, capta a loucura de uma época que estava caminhando para o abismo.
Em seu diário, Edvard Munch registra uma experiência pessoal que o perturbou profundamente. Desde então, a pintura tem atraído os espectadores também nesse nível particular. No entanto, a partir de nosso ponto de vista histórico, surge uma outra dimensão que Munch e seus contemporâneos certamente não perceberam e só puderam supor. O Grito foi criado no início da era imperialista, com as profundas mudanças sociais e políticas que a acompanharam. Esse é outro motivo pelo qual essa obra de arte nos toca com tanta pungência hoje em dia.
No final do século XIX, surgiu um novo estágio do capitalismo, mais internacional e mais agressivo. O mundo estava sendo redividido, com o rápido crescimento do progresso tecnológico e, simultaneamente, com o aumento do empobrecimento urbano. Munch viveu em Berlim entre 1892 e 1894. É possível que sua estadia nessa metrópole, pouco tempo depois da formação do Reich sob o comando de Bismarck, quando o imperialismo alemão também estava ganhando força rapidamente, tenha intensificado a percepção do pintor de uma época inquietante. Tudo parecia estar fora de controle. O niilismo, que também afetou Munch, ganhou novo terreno fértil com sua ideia anti-humanista da falta de sentido da vida. Para a classe dominante da época, o fato de o mundo não parecer mais compreensível era adequado.
Yeats refletiu em 1919:
Girando e girando no giro crescente
O falcão não consegue ouvir o falcoeiro;
As coisas desmoronam; o centro não se sustenta;
A mera anarquia é lançada sobre o mundo,
A maré tingida de sangue é liberada, e em toda parte
A cerimônia da inocência é afogada;
Os melhores não têm convicção, enquanto os piores
Estão cheios de intensidade apaixonada.
Quando Yeats escreveu esses versos, o imperialismo já havia provocado a primeira grande guerra mundial. Munch vivenciou o surgimento desse novo estágio imperialista do capitalismo quando era um jovem adulto. De forma simplificada, Lênin escreveu que o imperialismo poderia ser definido da seguinte forma:
O imperialismo é o capitalismo no estágio de desenvolvimento em que o domínio dos monopólios e do capital financeiro está estabelecido; no qual a exportação de capital adquiriu grande importância; no qual a divisão do mundo entre os trustes internacionais começou, no qual a divisão de todos os territórios do globo entre as maiores potências capitalistas foi concluída.
De acordo com Lênin, o imperialismo surgiu como uma fase específica do capitalismo entre 1873 (ainda não estabelecido) e 1900 (estabelecido):
(2) Após a crise de 1873, um longo período de desenvolvimento dos cartéis; mas eles ainda são a exceção. Eles ainda não são duradouros. Ainda são um fenômeno transitório. (3) O boom no final do século XIX e a crise de 1900-03. Os cartéis tornam-se um dos fundamentos de toda a vida econômica. O capitalismo foi transformado em imperialismo.
Com base nessas datas de esquina, pode-se presumir que a mundialmente famosa pintura de Munch de 1893 captura artisticamente essa transição para o imperialismo. Não se trata de afirmar que o próprio pintor estava ciente de tal fato, mas sim que a grande sensibilidade de Munch alcançou o que Shakespeare esperava da verdadeira arte: “mostrar … a própria idade e o corpo da época em sua forma e pressão”. Naturalmente, as sensibilidades pessoais informam uma obra de arte, mas sua importância primordial está no fato de que Munch – ao enfrentar seus próprios medos, sua própria dor – foi capaz de expressar esse grito da criatura torturada como um momento decisivo da época, de tal forma que pessoas do mundo todo ainda se emocionam hoje.
Portanto, embora o tema da pintura represente exatamente o que a maioria dos críticos de arte descrevem, ou seja, uma pessoa em pé em uma ponte perto de Oslo e ouvindo um grito que a afeta existencialmente (e gritando ela mesma), a época da criação da pintura contribui decisivamente para sua importância. O grito como parte essencial do tema, portanto, molda logicamente as cores, a composição, a estrutura e as tensões, que o intensificam e o levam ao horror e ao desespero. Na forma de sua pintura, Munch rompe com o impressionismo e descreve um mundo despedaçado, a partir da perspectiva da percepção pessoal. A arte entra na era do imperialismo.
O artista criou mais quatro versões da pintura, além de uma litografia. Desde sua criação, há 130 anos, o quadro de Munch, assim como a Mona Lisa ou Guernica, ficou gravado na memória visual da humanidade. A pintura de Munch evoca vividamente em nós uma empatia que define nossa humanidade, que sentimos quando ouvimos falar de desastres naturais e tragédias pessoais, mas, acima de tudo, do imenso sofrimento e terror de pessoas martirizadas em zonas de guerra. O rosto desesperado e gritante de Munch é capturado três vezes em Guernica (1937), de Picasso – na mãe com o bebê morto, na pessoa em chamas, no cavalo torturado, cenas que continuam a ser causadas pela violência imperialista e pelas guerras atuais. Munch deu expressão artística a esse horror. Nós nos vemos nesse quadro e, ao mesmo tempo, reconhecemos o sentimento humanista que nos une a todos na humanidade – solidariedade e compaixão. O Grito expressa uma profunda emoção e humanidade que definem sua grandeza.
Obs: Gostaria de agradecer a Friederike Riese e Erwin Ritzer por suas valiosas orientações.
A greve expressa um basta dos trabalhadores diante de problemas de conflito distributivo, de condições ou de relações de trabalho. Não é o fim de uma relação de trabalho ou atividade produtiva, porém pode marcar o início de uma nova fase, de um novo tempo ou de outro processo. Há greves defensivas, realizadas, p.ex. em decorrência de atraso no pagamento dos salários, de direitos aviltados, de nempregos destruídos e há greves propositivas, realizadas para ampliar direitos e distribuir os resultados alcançados pelo trabalho de todos.
Parar de trabalhar coletivamente é sempre uma decisão difícil. Entrar em greve é uma iniciativa coletiva complexa e arriscada, assim como encerrá-la não é nada fácil, tanto para os trabalhadores como para os empregadores privados ou públicos.
Qual é bom caminho para evitar a greve? Acontecendo, como dela sair?
O melhor remédio, genérico e de altíssima eficácia, largamente testado e com ótimos resultados em muitos países, é um sistema de relações de trabalho assentado na valorização e na promoção da negociação coletiva. A melhor terapia preventiva, sem nenhuma contraindicação ou efeito colateral, é uma política de relações de trabalho, permanente, fundada na boa-fé e sustentada pelas melhores práticas negociais.
Para uma boa administração dessa terapêutica nas relações laborais é muito relevante o país desenvolver, afirmar e promover a institucionalidade do sistema de relações de trabalho orientada para o adequado tratamento dos conflitos que são inerentes às relações produtivas. A negociação coletiva deve ser promovida no espaço e âmbito que responda aos interesses das partes; considerando as complexidades de cada unidade, setor, região ou cadeia produtiva; estabelecer mecanismos de articulação e coordenação de âmbitos e instrumentos (acordos, convenções, compromissos); definir ou indicar competências para cada âmbito e instrumento; aportar suporte às negociações coletivas com a oferta de mediação e arbitragem capazes de atender a diversidade de realidades e problemas; garantir segurança jurídica ao que foi acordado com boa fé pelas partes interessadas; apoiar a promoção da cultura na sociedade de que a solução dos conflitos por meio do diálogo social é o melhor caminho.
E quando a greve acontece, o que fazer? Manter a negociação.
E quando houver um bloqueio para o diálogo ou a interrupção da negociação? Abrir caminhos para a retomada da negociação.
Observe que a negociação tem bons resultados sobre custos econômicos, sociais e políticos na gestão dos processos produtivos. Também promove efeitos distributivos que tendem a fortalecer o incremento da produtividade, a sustentação da demanda pelo consumo ou a formação de poupança interna, instrumento essencial para o crédito e o investimento.
Atente que os conflitos são inerentes às permanentes relações de trabalho em todos os setores, no âmbito privado ou público. A derrota de um lado poderá retornar como resposta amarga no futuro. O bloqueio nas tratativas dos problemas faz acumular tensão e promove respostas indesejadas.
Nosso entorno está pleno de boas e más práticas. Como nada é definitivo e sempre se fazem escolhas, uma ótima decisão é a de renovar e fortalecer as boas práticas negociais, ou a ela retornar, ou ainda, iniciá-la.
Foi há mais de vinte anos que dei início ao grupo informal no Parlamento Europeu ‘Amigos de um Irão Livre’ que se tornou um bastião europeu na denúncia do principal regime fanático islamista que ameaça os valores humanitários que se afirmaram nas últimas décadas.
Entre os vários colegas que se juntaram a mim, dois entre eles, o escocês Struan Stevenson e o espanhol Alejo Vidal Quadras, prolongaram comigo uma relação de trabalho em prol da liberdade iraniana e combate à expansão jihadista do regime, recentemente no quadro de um grupo informal denominado de ‘In Search of Justice’ (ISJ).
fotografia de Amir Seifi em 2019, com o Alejo à direita, o Struan à esquerda e Paulo Casaca ao centro
O Alejo, que foi vice-presidente do Parlamento Europeu, é entre nós o que mais peso político tem e foi então o presidente honorário do grupo e continuou hoje a ser o presidente do ISJ.
Ao longo destas décadas foram várias as tentativas de assassinato político que nos foram dirigidas, no meu caso, patrocinadas primeiro pelas representações diplomáticas iranianas e pela que foi a principal lobista europeia do regime iraniano, a Doutora Ana Gomes, junto da comunicação social portuguesa.
Em 2018 o regime iraniano falhou o seu maior atentado terrorista de sempre na Europa (patrocinou inúmeros outros) ao ver desmantelado o gang dirigido por um diplomata iraniano em funções com a bomba apreendida ainda em Bruxelas a caminho de Paris.
Apesar da condenação do seu operacional diplomata/terrorista, o Irão conseguiu a sua libertação pela Bélgica, através de um acordo aprovado em 2022 e posto em vigor já este ano, facto que animou o regime a recrudescer a sua actividade terrorista, com alguns avisos prévios, como a proscrição tanto dos ‘Amigos de um Irão Livre’ como do ‘In Search of Justice’.
Do assassinato político o regime passou naturalmente ao assassinato físico. No passado dia 9 de novembro, pouco depois de termos acabado a nossa videoconferência semanal – excepcionalmente apenas com nós os dois, por impossibilidade pontual de Struan – o Alejo é alvejado em Madrid, salvando-se milagrosamente de um tiro na cara que lhe fracturou o maxilar.
Em menos de duas semanas a pista iraniana é já dada como certa, com a prisão de vários suspeitos, algo que não surpreenderá ninguém que conheça a forma de actuar do regime.
O Alejo, assim que conseguiu pronunciar as primeiras palavras, agarrou no seu portátil e telefonou-nos, ao Struan e a mim, não para nos pedir o que quer que fosse, mas apenas inquieto pela nossa segurança, o que deveras me tocou.
São incontáveis as vítimas do regime iraniano e da ideologia jihadista que o anima, mas por mais pessoas que compre, por mais pessoas que intoxique, por mais pessoas que mate, enquanto existirem almas livres, a humanidade vencerá.
Para destacar o 25 de novembro – Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra a Mulher –, é importante destacar filmes recentes sobre esse tema fundamental para a humanidade; até porque a violência contra as mulheres cresce no mundo e no Brasil assustadoramente.
Como diz a juíza Valdete Souto Severo, é preciso “pensar também que tivemos um governo, do ex-presidente Jair Bolsonaro, em que a violência contra os corpos femininos ou feminilizados era cotidiana nas falas e na prática dele e de seus companheiros, digamos assim”.
Isso porque, mesmo com a épica vitória do presidente Lula e a retomada do Ministério das Mulheres, as ideias perniciosas aos direitos humanos, individuais e sociais, da extrema-direita, ainda se fazem notar e, então, as violências de gênero, raça e classe atingem uma grande parcela da sociedade, inclusive parcelas da classe trabalhadora que agem contra si mesmas na defesa de ideias introjetadas de diversas formas.
Dentro desse contexto, as artes e a cultura podem exercer papel importante para pensar em maneiras de combater a violência de todos os tipos contra as mulheres. No caso, o cinema é uma das manifestações artísticas que mais tem denunciado a violência de gênero tanto no Brasil quanto no mundo.
Foram selecionadas obras de países diferentes, na medida em que as salas de cinema são tomadas essencialmente por filmes estadunidenses, o que não é bom para ninguém.
Ângela (2023), de Hugo Prata, Brasil
O longa de Hugo Prata está em cartaz na Prime Video e conta uma parte da vida de Ângela Diniz (1944-1976), exatamente que trata do relacionamento dela com o empresário Doca Street (1934-2020), interpretado por Gabriel Braga Nunes, culminando com o assassinato de Ângela, interpretada por Isis Valverde.
A paixão foi fulminante, assim como o seu desfecho. Street não tolerou o espírito livre da socialite mineira e a matou no dia 30 de dezembro de 1976 com quatro tiros, justamente quando Ângela tinha decidido romper o relacionamento para escapar da violência doméstica.
O filme tem o mérito de trazer à tona um dos mais conhecidos casos de feminicídio do país, que envolveu uma grande batalha do movimento feminista brasileiro para que a justiça fosse feita, porque o assassino alegou ter matado “por amor” e pegou apenas dois anos de prisão.
A atuação das feministas chamou a atenção da opinião pública com o slogan “quem ama não mata”. E, em um novo julgamento, o criminoso foi condenado a quinze anos de prisão mesmo alegando “legítima defesa da honra”, tese muito usada por advogados até meados deste ano, quando o Supremo Tribunal Federal decidiu pôr fim a isso, assim como também foram criadas leis para punir o Feminicídio (Lei 13.104/2015) e a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006).
A Noite do Fogo (2021), de Tatiana Huezo, México
Quem for assinante da Netflix pode assistir a essa obra de Tatiana Huezo que mostra a perversidade machista em uma comunidade rural dominada por traficantes onde a lei da violência impera. Por causa da falta de trabalho, grande parte dos homens migra para as grandes cidades para conseguir emprego, e as casas e famílias ficam por conta das mulheres, que se veem obrigadas a esconder suas filhas quando atingem a adolescência para não serem raptadas pelos traficantes e transformadas em escravas sexuais.
Fica transparente a ausência do Estado e de políticas públicas favoráveis a essa população vulnerável, totalmente à mercê da violência, quando há uma reação que envolve o fogo e a unidade dos moradores locais contra essa situação.
A Voz do Empoderamento (2022), de Sanjay Leela Bhansali, Índia
Baseado em fatos reais, o longa retrata a trajetória de Gangubai Kothewali (Alia Bhatt), de família rica numa pequena cidade do interior da Índia, que sonha em ser atriz, mas cai no conto do namorado e foge com ele para Bombaim com a promessa de realizar o seu sonho. Acaba sozinha num bordel, vendida por seu namorado. Também na Netflix.
Ela reúne forças para enfrentar todas as adversidades vindas da prostituição e do submundo do crime e acaba se tornando uma importante ativista pelos direitos das prostitutas, conseguindo inclusive entrevista com o primeiro-ministro indiano para colocar as reivindicações pelos direitos do trabalho das mulheres que têm na venda do seu corpo o seu modo de sustento e de suas famílias.
Com uma estratégia visual voltada para o público como se estivéssemos em uma conversa, o filme põe a protagonista no centro de tudo mostrando toda a sua fúria e a promessa de que vai dar a volta por cima; o que realmente acontece.
Talvez até sem querer, A Voz do Empoderamento mostra o sofrimento das mulheres numa sociedade intrinsecamente patriarcal como a indiana, onde impera a violência de gênero e falta respeito às mulheres e aos LGBTs.
Barbie (2023), de Greta Gerwig, EUA
Desde que estreou no Brasil, o filme Barbie, de Greta Gerwig, suscitou acalorados debates. Desagradou a extrema-direita – o que já é uma qualidade – e também setores da esquerda. Certamente não se poderia esperar que uma obra patrocinada pela indústria de brinquedos Mattel defendesse o feminismo emancipacionista, mas, como disse Julieta Palmeira: só de denunciar o patriarcado já basta para valer a pena assisti-lo.
A comédia provoca ao distinguir o “mundo cor de rosa”, da boneca Barbie, do mundo real, dominado pelo patriarcado e por isso cinzento em toda a opressão de gênero e de classe. Sim o blockbuster hollywoodiano não tem uma perspectiva de superação das classes sociais, mas tem a qualidade de atrair a atenção de meninas e mulheres, principalmente as meninas, para o feminismo, um tema tão candente do século 21.
Está muito claro em Barbie a distinção entre os filmes que tratam dos sonhos ou de como deveria ser a vida e os que versam sobre a realidade nua e crua, deixando claro que a vida não é cor de rosa, mas cinza, dominada pelo capitalismo e pelos homens e que isso precisa ser mudado.
Crimes de Família (2020), de Sebastián Schindel, Argentina
Patrocinado pela ONU Mulheres, essa obra argentina é bastante ousada ao debater com clareza, inteligência e sentimento a violência, além de mostrar a questão do trabalho doméstico e todo preconceito e violência a que essas trabalhadoras são submetidas, em geral sem nenhum direito trabalhista.
Mostra a força de uma mãe (Cecília Roth) para defender o filho problemático (Benjamin Amadeo), acusado de violência doméstica por sua ex-mulher (Sofía Gala Castiglione), e a vida da empregada (Yanina Ávila) que responde a um processo por assassinato de seu bebê ao nascer.
Sem fazer um dramalhão, a obra debate a situação da mulher e da mulher trabalhadora em meio a tudo isso. E principalmente quando a mãe descobre algo essencial sobre o seu filho e abandona a defesa dele, voltando-se para a defesa da nora.
Importante entender que o amor de uma mãe não passa pano para tudo que um filho faça. E a sororidade predomina ao se constatar as violências praticadas contra a própria companheira e contra a empregada.
Importante assistir a esse filme para entender o sofrimento das mulheres vítimas de diversos tipos de violência. A obra trata sem tabus de temas como aborto, abuso sexual, drogas, alcoolismo, abandono parental, escravidão, violência contra a mulher, racismo, preconceito e homicídio.
Eu Não Sou Um Homem Fácil (2018), de Eleonere Pourriat, França
A comédia francesa, disponível na Netflix, diverte com inteligência ao colocar um machista inveterado em um mundo ao contrário: Com as mulheres no lugar dos homens com as mesmas atitudes grosseiras, preconceituosas e desrespeitosas aos outros gêneros.
Quando se vê numa situação de realismo mágico, na situação com os homens em situação de vulnerabilidade perante as mulheres, dominantes do mundo, o protagonista (Vincent Elbaz) fica aturdido e não compreende esse mundo.
O protagonista se assusta ao perder seus privilégios de macho dominador, quando fica na situação das suas “presas”, às quais ele nunca deu escolha, inclusive com os homens sendo assediados sexualmente nesse mundo diferente do que ele sempre viveu. Quando acorda no “mundo real”, ele passa a ver tudo com outros olhos.
Roteirizado e dirigido por Eleonore Pourriat, o filme traz importantes reflexões sobre as questões de gênero, a luta das feministas e dos LGBTs por direitos iguais e a importância de mais mulheres nas instâncias de decisão, seja no mundo do trabalho, seja na política, seja na vida. Filme para rir e pensar.
Tudo por Ela (2021), de Ryuichi Hiroki, Japão
Também na Netflix, Tudo por Ela aborda a amizade, o amor, as questões LGBTs, o machismo e a violência de gênero. Uma das protagonistas (Kiko Mizuhara) atrai o marido agressor da amiga e amada (Honami Satô) para uma armadilha e depois foge com ela em busca de numa nova vida e escapar da prisão.
Os acontecimentos durante a fuga debatem a necessidade de mais afeto e respeito nas relações humanas para acabar com todo tipo de violência de gênero. Com sentimentos conflitantes, as duas debatem temas importantes como o amor entre pessoas do mesmo sexo e a violência impingida pelo machismo que mata.
De maneira simples, Hiroki discute as mudanças da sociedade japonesa na luta incessante entre o tradicional e o que se apresenta como novidade, mesmo que seja uma novidade ainda conservadora e capitalista.
A realidade económica que irá resultar desta nova etapa na conflituosa relação israelo-palestiniana não deverá constituir outra novidade que não a da continuação das restrições e impedimentos israelitas à actividade económica palestiniana e ao agravamento das vulnerabilidades a que aquelas populações há muito vêm a ser sujeitas, e isto é a opinião do insuspeito Banco Mundial.
Num quadro económico de grande pressão e marcado por uma profunda ameaça à sua própria viabilidade não será estranho que a Autoridade Palestiniana (entidade que pretensamente gere os chamados territórios palestinianos) não revele qualquer actividade no campo financeiro, nem disponha de mecanismos para controlar a inflação, a taxa de juros e nem de emissão ou administração de uma moeda nacional, tanto assim que este não existe, pelo que na frágil economia palestiniana têm curso legal três moedas com origens e pesos tão diferentes como o shekel israelita, o dinar jordano ou o dólar americano.
Esta realidade deixa os palestinianos incapazes de controlar a procura e a oferta de moeda ou de utilizar ferramentas monetárias básicas, como as taxas de juro, para estimular a actividade económica, ou a de realizar ajustamentos na taxa de câmbio com vista à absorção de choques económicos internos e externos, o que agrava ainda mais (se tal for possível) a sua dependência de factores monetários externos, como as decisões monetárias americanas ou israelitas sobre taxas de juro e políticas cambiais das moedas que se vê forçada a usar.
Não se estranha, por isso, que o seu incipiente sistema bancário seja fortemente dominado por bancos jordanos (não fosse este sector um dos mais importantes nesta economia vizinha), nem que o principal problema com que aquele se debate seja o do excesso de moeda israelita em circulação, em resultado do número de palestinianos que trabalhando em Israel e nos colonatos judaicos em território palestiniano recebem os salários em moeda israelita.
Com esta acumulação de moeda a ameaçar sufocar o seu sistema financeiro e perante a crescente digitalização dos bancos israelitas e da sua recusa em aceitar o seu próprio papel-moeda (sob a alegação do Banco de Israel de que as transferências em dinheiro vivo, realizadas sem controle, poderiam ser facilmente utilizadas na lavagem de dinheiro e no financiamento do terrorismo) o resultado tem sido a sua constante desvalorização e o consequente encarecimento das importações pagas em dólares norte-americanos, o que aconselharia a rápida adopção de uma moeda própria ou um uso mais intensivo do dinar jordano, tanto mais que depois deste recente reacendimento do conflito israelo-palestiniano o habitual bloqueio israelita à economia palestiniana só se poderá agravar.
Outro sinal da enorme fragilidade da economia palestiniana é a situação altamente deficitária da sua balança comercial que viu nos últimos vinte anos o volume de importações quase duplicar perante a relativa estagnação das exportações e, ainda pior que isso, é a sua extrema dependência da economia israelita.
Os palestinianos dependem da economia israelita para o comércio e até para a maior parte do seu consumo. Com um défice comercial da ordem dos 9 mil milhões de dólares e um PIB que não chega aos 19 mil milhões…
…vivem a situação insustentável para qualquer economia, que é a de ter um défice comercial equivalente a cerca de metade do volume da economia durante um longo período de tempo.
Uma forma de financiar estes défices é o recurso ao endividamento, solução praticamente vedada aos palestinianos por não disporem de fontes de rendimento que assegurem o respectivo pagamento nem serem um estado soberano capaz de garantir a confiança dos credores, outra seria o recurso ao investimento estrangeiro, mas, graças às políticas israelitas de bloqueio e de confisco, o clima de investimento nos territórios palestinianos não é atractivo, tornando difícil encontrar investidores estrangeiros.
Resta assim o recurso à ajuda externa, situação que se tem prolongado no tempo e adaptado à realidade local que é a própria relação disfuncional entre palestinianos e judeus. A ajuda internacional tem variado ao longo do tempo em função da conjuntura local, mas deverá atingir já as largas centenas de milhares de milhões de dólares sem que dela se vejam resultados práticos na melhoria da economia palestiniana. E isso deve-se a um conjunto de fatores que vão desde as fragilidades intrínsecas próprias das economia débeis, até ao facto reconhecido de que a maior parte dessa ajuda acaba por desaguar na economia israelita (em 2010 a Monthly Review escrevia que 71% da ajuda aos palestinianos acaba na economia israelita).
Esta aparente incongruência (a economia ocupante beneficia largamente com a ajuda internacional disponibilizada à economia ocupada, seja sob a forma de tarifas sobre bens e serviços importados para os palestinianos, seja usada para comprar bens e serviços em Israel) fica ainda mais clara se lembrarmos que boa parte dessa ajuda internacional tem sido canalizada para a construção de infraestruturas regularmente destruídas em acções militares (por alegadas “razões de segurança”) sem que até agora os doadores tenham exigido qualquer compensação aos governos israelitas. Quer a construção quer as sucessivas necessidades de construção representam gastos que em nada contribuem para o fortalecimento da economia palestiniana.
Em resumo poder-se-á dizer que, de tão frágil e dependente do país ocupante (a maior parte do seu território, tal como o redefiniu a ONU em 1967, está efectivamente sob ocupação israelita), a economia palestiniana não existe. Sem moeda própria e alimentada por uma ajuda internacional que na realidade enriquece a economia do ocupante, tem um futuro incerto donde talvez pudesse emergir se beneficiasse de uma consequente e bem estruturada ajuda árabe, que culturalmente mais próxima a ajudasse e pudesse apoiar a libertar-se das limitações criadas pela ajuda ocidental.
Em 1923, com a Alemanha dominada pela hiperinflação e insurgentes de extrema direita, os Social Democratas e Comunistas formaram um governo conjunto na Saxônia. Foi um experimento pioneiro na democracia da classe trabalhadora – antes dos militares o derrubarem.
Por um século, o ano de 1923 representou uma séria crise na auto-compreensão política da Alemanha. Foi um ano conhecido por inflação galopante, a ocupação franco-belga de Rhine e Ruhr, e finalmente o assim chamado “beer hall putsch” de Adolf Hitler, em Munique. Depois desse ano de crise, assim vai a narrativa padrão, as coisas voltaram a andar para frente na Alemanha. A estabilização foi logo seguida pelos “Loucos Anos 20”, a era feliz sob o chanceler liberal Gustav Stresemann.
Ataque da Saxônia
Muito menos atenção é dada para os eventos no estado alemão da Saxônia. Mas, aqui também a opinião entre os historiadores convencionais é quase unânime. As políticas dos governos de esquerda da Saxônia sob o ministro-presidente Social Democrata (SPD), Erich Zeigner, apoiado pelo Partido Comunista (KPD), é dita ter desestabilizado a Saxônia e a República de Weimar como um todo, encorajado uma tentativa de golpe comunista, e aberto a porta para a influência de “Moscou”.
Foi necessário que o Exército Alemão, ou Reichswehr, marchasse para o estado para depor o governo. O assim chamado Sachsenschlag, ou “ataque da Saxônia”, do exército é tudo o que preservou a república. Um livro didático escolar de 2021, Edition Geschichte, Gesellschaft konkret, resume essa interpretação sucintamente: “Na Turíngia e na Saxônia, o KPD e os Social Democratas de esquerda formaram governos de trabalhadores em uma tentativa de estabelecer um estado comunista. Essas tentativas de revolução foram derrubadas pelo exército”.
Essa interpretação simplesmente não se sustenta. De fato, a ação do Reichswehr destruiu um importante baluarte democrático contra a extrema direita. Também serviu para pacificar o poderoso governo de extrema direita de Gustav von Kahr na Bavária, que aspirava estabelecer uma ditadura fascista sob sua própria liderança, ao invés de destruí-la. A Saxônia democrática, que procurava defender a constituição de Weimar, era meramente um peão.
Talvez, alguém pode argumentar, o governo de esquerda na Saxônia também é esquecido porque os comunistas pareciam preparados para apoiar, ou pelo menos trabalhar dentro, do sistema político parlamentar por um tempo. Isso obviamente não se encaixa na narrativa predominante da historiografia de Weimar, que pinta a esquerda como representando um perigo maior do que a direita. Em qualquer caso, uma coisa é clara: retratar o governo de trabalhadores da Saxônia principalmente como uma ameaça para a República de Weimar é insustentável.
Um começo difícil
A pesquisa histórica recente cada vez mais mostra que o fracasso da República de Weimar não foi apenas culpa daqueles que deliberadamente a destruíram – particularmente os comunistas, fascistas e grandes industriais – mas, indiretamente daqueles que hesitaram apoia-la sem reservas, especialmente os Social Democratas. Porque o SPD procurou desacelerar a revolução democrática ao invés de impulsiona-la para mais longe, como teria sido necessário da perspectiva de hoje. As velhas estruturas na política, sociedade e economia não mudaram fundamentalmente, o poder das velhas elites não foi restrito, e os militares não foram sujeitos ao controle democrático. Isso foi, realmente, um fardo pesado para a república.
Essas fraquezas estruturais já eram muito aparentes em 1923, não apenas no início dos anos de 1930. A Alemanha ameaçou escorregar para uma ditadura nesse estágio inicial. As aspirações das forças reacionárias se tornaram mais e mais aparentes e a ameaça da Bavária fascista cada vez mais forte. Do outro lado, as forças democráticas estavam ficando mais fracas – especialmente os sindicatos livres, que pareciam impotentes em face da crescente crise econômica e tinham perdido muitos membros como resultado.
Democracia mais “social”
Na Saxônia, do outro lado, os socialistas e comunistas tentaram implementar mudanças estruturais decisivas. O projeto de esquerda republicana foi um contra projeto para a tendência de direita na Alemanha como um todo, com o objetivo de gradualmente transformar o país em uma democracia mais “social”.
A Saxônia, a região mais economicamente desenvolvida na Europa Central na virada do século, não era apenas o berço da social democracia, mas também sua fortaleza. O SPD tinha sido consistentemente a força política mais forte no estado, mesmo quando as circunstâncias políticas e as constituições da Saxônia e do Reich alemão restringiram seu desenvolvimento. Depois da revolução, então, na Saxônia – diferente de no resto do país – um governo com legitimidade parlamentar estava pronto para seguir esse novo caminho, mesmo contra a resistência de uma poderosa minoria burguesa conservadora.
A fome e a inflação levaram os trabalhadores para as ruas
As condições caóticas de 1923, que atingiram a Saxônia particularmente forte, reforçaram esse desejo. A fome e a inflação levaram os trabalhadores para as ruas. Agora ou nunca – esse era o humor na esquerda política. Ela agora tinha a oportunidade de perceber suas ideias e levar a cabo uma revolução na política, economia, e também no sistema de educação – em uma base inteiramente legal.
Contudo, é questionável se governar contra a tendência no resto do país, contra o governo nacional, contra os muito “conservadores” Social Democratas de Berlim, e contra a burguesia econômica na própria Saxônia era possível em um estado pequeno como esse. Além disso, o SPD tinha consistentemente apenas uma maioria parlamentar muito vacilante e estreita no parlamento da Saxônia. Ela dependeu da tolerância do KPD até 10 de outubro. Apenas depois que o KPD entrou no governo ele aproveitou uma estreita maioria de dois assentos, mas mesmo assim, os padrões de votação dos comunistas da Saxônia continuaram altamente incertos. O fato de que os Social Democratas de esquerda mesmo assim fizeram uma tentativa dessas, portanto, fala a sua coragem.
O projeto de esquerda republicana
Apesar de enfrentar massiva resistência da burguesia, dos conservadores e da Associação de Industriais da Saxônia (VSI), o projeto de transformar gradualmente a Saxônia em uma democracia socialista começou tão cedo quanto no início dos anos de 1920. Gabinetes anteriores liderados pelo membro do SPD Wilhelm Buck, governos muitas vezes de minoria apoiados pelo KPD, iniciaram importantes reformas em áreas como política escolar. As coisas decolaram quando Zeigner assumiu as rédeas do governo, em 21 de março de 1923. Zeigner, um homem cujo histórico provou ser polarizador mesmo entre historiadores, pertencia a “jovem guarda” do SPD, que impulsionou o projeto democrático socialista na Saxônia para frente.
Contudo, Zeigner tinha apenas poucos meses para ver o seu projeto. Suas opções também estavam severamente limitadas pelo estado de emergência imposto pelo governo nacional e, acima de tudo, pela crise econômica. Medidas na direção da transformação econômica eram então dificilmente possíveis. Em outras áreas, contudo, o governo foi bem-sucedido em iniciar importantes reformas, que foram então brutalmente encurtadas pela invasão ilegal do Reichswehr.
Por exemplo, enquanto servindo como Ministro da Justiça sob Buck, Zeigner tinha impulsionado pela republicanização do judiciário. Ele promoveu o estabelecimento da Associação Republicana dos Juízes e repreendeu juízes e promotores públicos que eram abertamente opostos a República de Weimar. Além disso, ele procurou dirigir a atenção do judiciário mais para o contexto social dos crimes. Isso representou começos esperançosos.
Medidas de reestruturação comparáveis também aconteceram na polícia. Até então, a esquerda política tinha geralmente visto a polícia como bandidos a serviço das autoridades, mas agora eles estavam para ser transformados em uma importante agência para o novo estado democrático, um novo estilo de trabalho estava para ser introduzido, a ideia de que os trabalhadores eram o inimigo estava para ser desmantelada, o relacionamento com as autoridades estava para ser redefinido, e a estrutura interna da polícia estava para ser democratizada tanto quanto possível.
Treinamento da democracia
De agora em diante, a polícia estava para ser animada por uma visão de mundo democrática e uma compreensão das necessidades da população trabalhadora. “Treinamento da democracia” para todo o pessoal da polícia, assim como a introdução de comissários do governo para monitorar a conduta democrática da polícia, foram passos importantes nessa direção.
Uma reforma constitucional municipal também introduziu o princípio do autogoverno democrático nas municipalidades, com um foco em democratizar a lei eleitoral. O objetivo da reforma era quebrar a dominância dos liberais de décadas de duração que repousava sobre uma lei eleitoral não democrática. Em 1923, o projeto republicano de esquerda concedeu às municipalidades uma constituição que era mais democrática do que a de qualquer outro estado da república – e claramente à frente de seu tempo.
A reforma mais bem-sucedida do governo Zeigner, mas também a mais controversa, foi em política educacional – uma questão cara para muitos corações socialistas. O princípio da seleção social, que tinha por muito tempo definido a educação na escola primária na Alemanha, estava finalmente para ser abolido. Ele estava para ser substituído por uma escola comum para todos, livre de doutrinações políticas e religiosas, secular e acessível para toda a população, e baseada nos princípios do movimento da Nova Educação. Isso constituiu uma revolução cultural. A igreja, empresários, conservadores e até muitos liberais estavam indignados com o prospecto e implantaram todos os meios possíveis para tentar impedir a implementação da reforma.
Jovem esquerda da Saxônia
Os principais apoiadores do projeto republicano de esquerda estavam na esquerda do SPD. Não poderiam falar de unidade entre os Social Democratas da Saxônia, mesmo em 1923. A maioria dos camaradas mais velhos, que tinham sido socializados no German Reich pré-guerra, defendiam um curso de reforma mais modesto. Os sindicatos adotaram uma posição similar. A maioria dos membros do parlamento do estado do SPD também não eram proponentes convencidos do projeto republicano de esquerda.
Ao invés disso, o projeto foi essencialmente executado pela “juventude” do SPD da Saxônia, os novos membros que tinham se unido ao partido apenas após a Primeira Guerra Mundial. Não ainda firmemente integrados na disciplina do partido, eles rejeitavam o ossificado “pragmatismo” do estabelecimento e procuravam avançar um novo tipo de política socialista separada das preocupações dos mais velhos do partido. Graças a seu ativismo incansável entre os operários, eles logo foram bem-sucedidos em trazer uma mudança para a esquerda. Eles mesmo conseguiram reunir o partido como um todo atrás da ideia de cooperar com os comunistas. Muitos Social Democratas, contudo, concordaram com esse novo caminho apenas relutantemente, até por causa de suas experiências negativas com os comunistas até aquele ponto. Em março de 1923, contudo, os “jovens esquerdistas” foram bem-sucedidos em passar sua agenda. Apenas abordando o KPD, o SPD seria capaz de assegurar suas novas políticas no parlamento.
Erich Zeigner em 1948. Foto: Wikipedia
O jovem Zeigner foi uma figura chave nesse projeto. Servindo atrás da linha de frente durante a guerra, ele se uniu a Social Democracia apenas em 1919 – e não aos Social Democratas Independentes (USPD) de esquerda, mas a “maioria” mais conservadora (M)SPD. Sua decisão demonstra que ele procurou conduzir a política dentro da estrutura da constituição da república. Zeigner tinha um passado burguês e um doutorado em lei. Tais números eram mais que raros no movimento socialista. Esse fato, assim como sua filiação com a ala esquerda do partido, baseada na cidade de Chemnitz, facilitou sua rápida ascensão. Ele se tornou Ministro da Justiça já em 1921.
A falta de amigos socialistas de Zeigner foi, em um sentido, uma vantagem. Isso deu a ele uma certa liberdade política e garantiu o apoio de muitos dos “jovens”, mas por outro lado também foi uma desvantagem, enquanto ele não estava firmemente integrado ao partido e suas instituições e não exibia o mesmo “pedigree” socialista.
Ele também tinha falta de habilidades táticas, tanto em relação a seus hesitantes camaradas, quanto em relação ao governo nacional e os Social Democratas em Berlim. Isso também foi evidente em seus ataques às ações ilegais do Reichswehr, que ele repetidamente denunciou em público. Ele também interferiu na política externa alemã, o que virou o governo nacional contra ele e seu governo ainda mais. Acima de tudo, contudo, eles desaprovavam sua cooperação com o KPD.
Ainda assim, Zeigner não era de nenhum modo ingênuo em sua cooperação com os comunistas. Ele sabia que eles podiam ser confiáveis apenas dentro de um limite, porque suas decisões eram significativamente influenciadas pela política seguida em Moscou, que procurava lançar uma revolução mundial. Quando o governo foi reconstituído, ele então manteve seus ministros longe de posições em que eles podiam ter tido acesso a armas ou a polícia.
Mesmo nos esquadrões de combate conjuntos (usualmente desarmados) dos Cem Proletários, um pesadelo para o Exército Alemão, os Social Democratas sempre estavam na maioria. Todos os membros do governo juraram lealdade a constituição. Por último, mas não menos importante, os Social Democratas eram de longe a força mais firme no governo conjunto: nas eleições em 8 de novembro de 1922, o SPD tomou 41,8 por cento dos votos, enquanto o KPD ganhou apenas 10,5 por cento.
Portanto, não podemos deixar de nos perguntar o que os inimigos do projeto perceberam como uma ameaça, e encontrar a resposta no fato de que a maioria deles estavam mais preocupados com suas possessões materiais do que com a preservação da democracia. Eles temiam a influência dos comunistas revolucionários, desconfiavam de suas aberturas políticas amigáveis, e de bom grado aceitavam sua linguagem revolucionária, anticonstitucional e não menos violenta pelo valor de face. Isso foi suficiente para classificar a esquerda como mais perigosa que a direita – um erro grave, como a história mostraria.
Moscou – Berlim – Dresden
O comportamento dos comunistas no governo era fundamental para o sucesso do projeto. Contudo, suas ações não eram determinadas apenas pelos próprios comunistas da Saxônia, mas também pelo balanço de forças no triângulo comunista entre Dresden, Berlim e Moscou.
Foto de arquivos dos trotskistas britânicos Henry Sara e Frank Maitland, da Alemanha durante os anos tumultuados anos pós a Primeira Guerra Mundial. Dresden, outubro de 1923. Foto: Arquivo da Universidade de Warwick
Os laços próximos do partido com a Internacional Comunista, em Moscou, claramente distinguiam a situação dos comunistas da Saxônia da de outros partidos políticos. A Terceira Internacional procurou executar uma (violenta) revolução mundial via Alemanha, mas exatamente como isso era para ser feito era altamente controverso em Moscou, onde batalhas ferozes sobre a sucessão de Vladimir Lenin estavam sendo travadas na época.
Mesmo assim, Moscou exigia obediência do partido na Saxônia. Berlim exigia o mesmo. Contudo, suas respectivas ideias não eram sempre coincidência. Isso foi uma fonte considerável de tensão, mas também criou um certo espaço político no qual os comunistas da Saxônia podiam manobrar.
O Partido Comunista da Saxônia, que tinha recebido cerca de 267.000 votos nas eleições estaduais de 1922 (o SPD ganhou mais de um milhão), não era um clube para debater teoria, mas um movimento social de na maioria jovens camaradas altamente determinados socializados no meio proletário que tinham – e queriam – que fazer decisões concretas na base.
Além disso, apesar da retórica revolucionária que era comum na Saxônia, em grandes partes do estado as verdadeiras diferenças com a ala esquerda do SPD eram muito menores do que “ordenado” por Moscou e Berlim. Essa atitude “moderada” foi principalmente devido ao fato de que os líderes comunistas no movimento dos trabalhadores da Saxônia tinham mantido boas conexões com a esquerda da Social Democracia por anos.
Heinrich Brandler, por exemplo, que simultaneamente manteve posições de liderança na Saxônia, Berlim e Moscou, foi um apoiador explícito da frente unida socialista como um resultado de suas experiências em Chemnitz, em contraste com a liderança do KPD, em Berlim, ao redor de Ruth Fischer.
Protesto Antifascista em Dresden, Alemanha, outubro de 1923
Paul H. Böttcher, que tinha passado muitos anos como um sindicalista e jornalista, e em 1923 serviu como presidente do grupo parlamentar estadual do KPD, também estava entre os apoiadores do projeto republicano de esquerda. Isso também era verdade para Friedrich Heckert, que era ativo em Chemnitz, a fortaleza do KPD na Saxônia. O antigo membro líder do Grupo Spartacus também havia se transformado em um realista e apoiado a cooperação temporária com a esquerda do SPD.
De acordo com suas próprias declarações, todos os três líderes do KPD queriam destruir a República de Weimar, executar a revolução mundial em nome da Terceira Internacional, preparar a ditadura do proletariado, e mesmo “liquida-la”. O modo para conquistar esse objetivo, contudo – e isso os distinguia das lideranças em Berlim e Moscou na época – era através da cooperação temporária com o SPD. O que seguiria depois disso restava ver.
O KPD na Saxônia então exigiu autonomia, embora discretamente. Ele não estava preparado para desistir das posições de poder que ele já tinha adquirido por um golpe com um resultado muito incerto. Acima de tudo, ele entendia o balanço de forças e quem tinha a maioria no estado e que um golpe podia não ser bem-sucedido. A Saxônia não estava pronta para a revolução – pelo menos não ainda.
Em 21 de outubro, encarando uma iminente invasão pelo Exército Alemão, todas as forças importantes no movimento dos trabalhadores da Saxônia se juntaram – comunistas, social democratas, e sindicalistas. O KPD queria convocar uma greve geral – eles já tinham abandonado falar de uma revolta violenta – e assim limpar o caminho para uma revolução comunista. Mas, a assembleia rejeitou a moção de Brandler quase unanimemente, e os líderes do KPD se curvaram a votação sem reclamar. Eles provaram ser bons democratas.
Aceitando essa decisão, a liderança do KPD da Saxônia provavelmente evitou o tipo de banho de sangue que uma revolta desesperada teria significado. Na historiografia comunista, contudo, Brandler e seus camaradas em armas foram daí em diante considerados renegados. Ernst Thälmann, do outro lado, que iniciou uma revolta completamente sem sentido em Hamburgo, se tornou o herói do KPD.
O ataque da Saxônia
Olhando mais de perto as reformas implementadas na Saxônia e as ações do KPD no governo, é difícil ver o que era tão perigoso sobre o projeto que o exército tinha que esmagá-lo. O modelo concebido na Saxônia foi meramente a social democracia no sentido mais verdadeiro. Ele representou uma alternativa política dentro da estrutura da constituição republicana da Alemanha, não contra ela. Ele não contava com violência, e não era uma ameaça ao estado.
Obviamente, contudo, o governo e o exército temiam um projeto que abriu a política da Alemanha para a esquerda e tentou – não sem risco – politicamente integrar o KPD. O Reichswehr fundamentalmente rejeitava qualquer tipo de política que limitava sua influência e denunciava suas maquinações ilegais na política doméstica.
O governo nacional e o chanceler Stresemann, por sua vez, viram suas políticas de direita e conservadoras ameaçadas pela participação dos comunistas no governo. Stresemann não estava apenas sujeito a pressão dos industriais – como um advogado de longo tempo para o VSI, ele estava inteiramente do seu lado. Stresemann, ainda um imperialista e profundamente capitalista no coração, consistentemente rejeitava uma abertura da república na direção das ideias da esquerda. Melhor deixar a reacionária Bavária ter à sua maneira do que dar a progressista Saxônia uma chance era o lema do governo nacional.
A invasão do exército alemão em 21 de outubro e a demissão ilegal do ministro-presidente Zeigner frustrou a chance de implementar um contra projeto político para a crescente corrente de extrema direita na Alemanha, dentro da estrutura da constituição e apoiada por uma (embora estreita) maioria no parlamento da Saxônia. As principais figuras do projeto republicano de esquerda pagariam caro por isso. A vingança dos nazistas mais tarde os atingiu com força total. Quase todos eles terminaram em campos de concentração, ou tiveram que imigrar, já em 1933.
Longe de salvar a democracia, a intervenção do exército pavimentou o caminho para o nazismo. Ela destruiu a tentativa de quebrar as estruturas sociais entrincheiradas, fazer a república mais social, limitar o poder dos empresários, e integrar a ala esquerda do movimento dos trabalhadores no estado. A chance de criar um baluarte contra o nazismo foi derrotada.
por Karl Heinrich Poh e Loren Balhorn | Texto em português do Brasil, com tradução de Luciana Cristina Ruy
Karl Heinrich Pohl, Professor de história e suas didáticas na Christian-Albrechts Universität zu Kiel
Loren Balhorn, Editora colaboradora do Jacobin e coeditora, junto com Bhaskar Sunkara do Jacobin: Die Anthologie (Suhrkamp, 2018)
Nesta terça-feira (28), São Paulo vai parar contra o desmonte de estado pretendido pelo governador Tarcísio de Freitas. Além de cortar quase de R$ 10 bilhões da educação pública, ele quer privatizar a Sabesp, o Metrô e a CPTM, serviços essenciais para a vida da população.
Sempre com o argumento de “melhorar os serviços” passando a responsabilidade do governo para a iniciativa privada, a primeira coisa que qualquer empresa privatizada faz é demitir mães e pais de família. A segunda coisa é elevar as tarifas cobradas pelos serviços, sem investir um centavo sequer em melhorias.
Por causa dos cortes em verbas nos serviços públicos e pela proposta de entregar à iniciativa privada o patrimônio do povo paulista, os servidores públicos do estado se uniram em torno de propostas comuns e vão parar na próxima terça-feira (28) com ato público, às 15h, em frente a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp).
As professoras e os professores da rede oficial de ensino do estado estão na linha de frente deste ato contra o projeto que pretende diminuir o orçamento da educação pública de 30% para 25%. Também queremos a revogação da Lei Complementar 1374/2022, que destrói a carreira do magistério paulista.
Lutamos sim por um plano de carreira decente, pela devolução dos valores confiscados dos aposentados e pensionistas e contra a proposta de reforma administrativa do governador, que promove o maior desmonte do estado e dos serviços públicos, entre outras propostas nefastas.
Todas e todos à Alesp nesta terça-feira para mostrar a disposição do funcionalismo público de São Paulo em lutar contra o abandono do serviço público. Queremos sim mais investimentos em educação, saúde, transportes, segurança, enfim em todas as áreas para a vida da maioria da população melhorar.
O Instituto Superior de Administração e Finanças (Angola) e a Universidade de Díli (Timor-Leste) assinaram um Protocolo de Cooperação para desenvolver sinergias no âmbito científico, académico e cultural.
Segundo os representantes das duas instituições, Carla Vilarinho Queiroz e Manuel Azancot de Menezes, o Protocolo tem como objectivo estabelecer as condições gerais de cooperação entre o Instituto Superior de Administração e Finanças de Angola (ISAF) e a Universidade de Díli (UNDIL), numa perspectiva de aproveitamento de sinergias no seio da lusofonia, desenvolvendo cooperação científica, académica e cultural no plano do ensino e da investigação.
A cooperação poderá envolver a realização de conferências, cursos de graduação e de pós-graduação, seminários, congressos e outros eventos que se revelem de interesse para as partes em regime presencial e/ou híbrido, a mobilidade académica, a criação de grupos de investigação com a participação de investigadores do ISAF e da UNDIL para proporcionar investigação multicêntrica em qualquer área do conhecimento, mas especialmente no domínio das ciências sociais, nas áreas de economia, gestão, administração e educação e outras actividades realizadas por Centros de Competência.
O Instituto Superior de Administração e Finanças (ISAF), cuja Presidente é Carla Queiroz, tem como entidade promotora a Sociedade Angolana de Ensino Superior, ligada à Academia BAI – Banco Angolano de Investimento, e forma quadros altamente qualificados no domínio da gestão, negócios, administração, finanças, banca, marketing e seguros.
A Universidade de Díli (UNDIL) forma diplomados com competências alargadas nos domínios da ciência e tecnologia, ciências sociais, artes e humanidades, tendo definido como grande prioridade promover a cooperação e a mobilidade de estudantes, docentes e investigadores, especialmente no espaço da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Noelma Viegas, Carla Queiroz e Azancot de Menezes (Luanda, 17/11/2023)
Noelma Viegas D´Abreu, Presidente da Comissão Executiva da Fundação e da Academia BAI (Banco Angolano de Investimento) também esteve presente na cerimónia e manifestou o seu grande interesse na realização e implementação célere do Protocolo.
Quadros superiores do ISAF e da Academia BAI presentes na cerimónia
Causou grande comoção na opinião pública americana a popularidade da carta de Bin Laden, datada sensivelmente de um ano depois do massacre do 11 de Setembro, promovida pela cadeia chinesa de informação ‘Tik Tok’.
Bin Laden, no estilo típico do fanatismo islâmico, fez na altura a economia dos factos – em lado nenhum diz que foi ele o responsável pelo massacre de milhares de civis – para fazer pairar a ideia de que a sociedade americana teria de espiar uma culpa colectiva resultante do que seria a existência de Israel.
Lembro-me bem como nessa altura eu ficava atónito ao ouvir no mundo árabe pessoas aparentemente racionais culpar simultaneamente a CIA pelos massacres e reverenciar Bin Laden pela sua autoria. Outras versões, pelo menos mais consequentes, faziam de Bin Laden um agente da CIA, ou do sionismo internacional, ou limitavam-se simplesmente a ignorar os factos e a expelir ódio.
Hoje, a propósito do 7 de outubro, constato que o que era algo explicável pela doutrinação fanática e total desinformação sobre a realidade existente em países sem tradição democrática se encontra totalmente espalhado entre nós, como o explica Frank Furedi no Spiked.
E, finalmente, alguém se lembrou de que a agência de informação chinesa se tornou o principal meio de informação em largas camadas da juventude e que, a República Popular da China, negando o direito dos seus cidadãos à prática do Islão (como de resto de qualquer outra religião) sem um apertado controlo estatal, propagandeia livremente toda a desinformação jihadista iraniana ou outra.
Só para algumas cabeças ingénuas ou mal informadas é que se trata aqui de religião, tudo o que se pretende é desfazer o sistema de valores com que foi construída a presente ordem internacional.
E como eu coloquei em evidência aqui há quinze dias, há também quem se lembre que é o emirato do Qatar através da Al Jazeera que é a referência para o noticiário ocidental no Médio Oriente, como de resto é também o Qatar o principal financiador das universidades de onde saltou a juventude alienada a fazer coro com o terrorismo jihadista e que, através de esquemas como o Qatargate capturou a agenda política ocidental.
Isto, claro para não falar do à vontade com que – usando sistemas de informação sem segurança especial – o Irão dá ordens a uma rede dos seus colaboradores colocados nos lugares mais importantes do aparelho de Estado norte-americano. E também por isso, os enormes absurdos de Bin Laden sobre o 11 de setembro voltaram a ganhar direito de cidadania com o 7 de outubro.
A irracionalidade colectiva e os seus mecanismos psicológicos são constantes humanas a não esquecer, sem os quais nada disto seria compreensível, mas estou em crer que o problema principal com que nos defrontamos hoje é outro: é o fanatismo do dinheiro.
É a ganância que levou os nossos dirigentes a escancarar as portas aos nossos inimigos no domínio que é o mais sensível, o da educação e informação. Enquanto não quisermos enfrentar esta realidade não creio que tenhamos solução à vista.
A realidade económica que irá resultar desta nova etapa na conflituosa relação israelo-palestiniana não deverá constituir outra novidade que não a da continuação das restrições e impedimentos israelitas à actividade económica palestiniana e ao agravamento das vulnerabilidades a que aquelas populações há muito vêm a ser sujeitas, e isto é a opinião do insuspeito Banco Mundial.
O confronto que, há pelo menos três gerações, opõe árabes e judeus continua a inviabilizar qualquer solução, incluindo a da criação de dois Estados (um judeu e outro árabe) que partilhassem o território, mas apesar desta forte limitação e dos desafios acrescidos trazidos pela situação humanitária dos seus territórios, a economia palestiniana registou, em 2022, um crescimento anual do seu PIB real de 3,9%, num sinal de clara tentativa de recuperação após a forte retracção registada em 2020, atribuível à pandemia, que os dados preliminares para o 1º trimestre de 2023, com o crescimento a desacelerar para os 3,1% já não confirmavam… e isto ainda sem os efeitos da recente destruição.
O período de crescimento do PIB poderá ser atribuído a um aumento do consumo originado numa débil e sempre frágil normalização de relações entre judeus e palestinianos que levou a uma subida no número destes que trabalham em Israel e nos assentamentos judaicos, onde os salários deverão corresponder ao dobro do salário médio diário na Cisjordânia, o outro território palestiniano, maior e mais populoso, que permanece sob ocupação militar directa de Israel. A presumida situação de suavização das sistemáticas restrições impostas por Israel terá contribuído para que na Cisjordânia, a economia crescesse mais de 4% no primeiro trimestre do ano, graças ao aumento do comércio a retalho e dos serviços, situação que não se estendeu à Faixa de Gaza, onde uma decisão do governo israelita de restringir a venda de peixe de Gaza na Cisjordânia deverá ter tido um forte impacto na economia daquele território levando-a a contrair mais de 2,5% no primeiro trimestre deste ano.
O emprego, ou sua falta, é outro sinal da grande disparidade entre os territórios da Cisjordânia e de Gaza. Ambos sofrem de condições de trabalho altamente desfavoráveis, apresentando em conjunto uma taxa de desemprego acima dos 25%, que não reflecte as grandes divergências entre os dois territórios que se devem, fundamentalmente, às maiores restrições ao acesso e livre circulação impostas por Israel na Faixa de Gaza.
This Is Us começa bem. O capítulo 1 é cativante. A primeira temporada não decepciona. Olhando em retrospectiva, entretanto, vemos que o encanto inicial se deve muito ao encontro de Randall (Sterling K. Brown) e William (Ron Cephas Jones), criando um contraponto à típica família pequeno-burguesa que a série apresenta. Com a saída de William, os problemas sobressaem.
Vista por muitos como “comovente”, This Is Us (produzida pela NBC entre 2016 e 2022 e transmitida pela Amazon Prime e pelo Star +) é uma série de muito sucesso. Mas vi com outros olhos. Outras séries famosas são muito mais críticas, inteligentes e até sensíveis. House MD, Breaking Bad, Mad Men, Lista Negra e Sopranos, por exemplo, sustentam uma ideia disruptiva e questionadora da sociedade. This Is Us, porém, é pró-sistema.
Succession
Ela quer soar como Anos Incríveis (1988), mas, em diversos momentos de suas seis temporadas, lembra Succession (2018), aquela da odiosa família bilionária.
This Is Us lembra Succession não só pela concepção egoísta e autocentrada de família. Lembra pela centralidade do patriarca, pela simbiose entre os irmãos, pelas conversas onde quem não é da família tem que se retirar, pela noção de que vale tudo em nome da família e pela alienação quanto a todo o resto. Só que há uma diferença fundamental: em Succession somos convidados a odiar os Roys e em This Is Us somos incitados a amar os Pearsons.
A série aborda temas sociais, como a questão racial, a homossexualidade, a obesidade, a adoção, traumas de guerra e o Alzheimer. Mas, ao mesmo tempo em que a família de Randall lida com situações sensíveis como a adoção de uma moça já criada, e ao mesmo tempo em que fala em “microagressões”, ele e a esposa Beth rejeitam o relacionamento da filha com um rapaz que mora no bairro pobre porque “não é gente do nível dela”.
Como os animais são tratados
Também não condiz com a imagem que a série quer passar, a maneira como os animais são tratados. A ideia de que salvar o cachorro da família de um incêndio é apenas um capricho que se desdobra em um erro, por exemplo, é uma grosseria. Ou a ideia de que a morte dos peixinhos das crianças foi uma “bobagem”. Ou, que esmagar o mini lagarto de estimação da filha deveria ser “engraçado”. Os criadores da série foram descuidados ou foi intencional reforçar a mensagem de que os animais são como objetos descartáveis?
Engraçado que até em séries mais violentas, como Sopranos e Lista Negra, ou mais cínicas, como House, os animais são tratados com mais dignidade.
American way of life
A série flui bem, é bem amarrada e os personagens são bem construídos. E isso é um problema porque envolve o espectador em um grande fetichismo do American way of life, com todos os vícios que a expressão possui, inclusive o papel do homem como provedor e “pai de família” e da mulher como cuidadora e “procriadora”.
O final, pensado para ser grandioso e catártico, é entediante e conservador como um especial de fim de ano da Rede Globo. A série exalta momentos de união familiar como se isso fosse uma verdade universal. Como se da porta pra dentro, a família americana – o pai, que é o esteio, a mãe, idealista, e os três filhos, a menina, o bonito e o inteligente – fosse a força capaz de irradiar ondas de felicidade até atingir a paz mundial.
Sabemos, contudo, que não só esse não é um modelo realista, como ele pode ser muito opressor, dada a complexidade da natureza humana, da relação com a sociedade e com o mundo natural.
This Is Us está mais para uma novela com um roteiro batido, do tipo que gira em torno da expectativa de quem vai casar com quem. É bem produzida, mas sua essência passa longe da qualidade criativa e intelectual das grandes séries.
Até 2050, as mortes resultantes do calor extremos podem crescer quase cinco vezes em todo o mundo, um reflexo direto das severas mudanças climáticas pelas quais o planeta vem passando. O alerta foi feito em um relatório que reuniu mais de 52 instituições de pesquisa e agências da ONU.
Para chegar nesse cenário, o documento, publicado na revista médica The Lancet, considera a possibilidade de um aumento médio da temperatura de dois graus Celsius na comparação com o período pré-industrial.
O calor extremo expõe especialmente as populações de idade mais avançada, bem como os bebês. Essas faixas estão ainda mais vulneráveis por terem de enfrentar o dobro de dias de ondas de calor do que havia entre 1986 e 2005. No caso dos idosos, desde a década de 1990, o número de pessoas acima dos 65 anos que perderam a vida devido às altas temperaturas já aumentou 85%.
“Perdemos anos muito preciosos de ação climática e isso teve um custo enorme para a saúde”, disse Marina Romanello, diretora-executiva do relatório, conhecido como The Lancet Countdown.
Outro dado alarmante diz respeito à relação entre a crise climática e a fome. Somente em 2021, estima-se que 127 milhões de pessoas a mais tenham vivido graus de insegurança alimentar de moderada a grave, quadro que pode piorar muito com o aumento da temperatura.
Em meio a tantas constatações trágicas, ao menos uma é positiva: de acordo com o estudo, mortes por poluição do ar relacionada a combustíveis fósseis diminuíram 15% desde 2005.
Relatório ONU
Outra análise sobre as mudanças climáticas, contida em relatório da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC), divulgado em função da realização da COP28 — a ser realizada entre 30/11 e 12/12 em Dubai —, aponta que os planos nacionais de ação climática continuam insuficientes para limitar o aumento da temperatura global a 1,5 grau Celsius.
Mesmo com o aumento dos esforços de alguns países, o documento mostra que ações contundentes são necessárias agora para reduzir a trajetória das emissões mundiais e evitar os piores impactos da mudança climática.
De acordo com a ONU, as evidências científicas mais recentes compiladas pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) indicam que as emissões de gases de efeito estufa precisam ser reduzidas em 43% até 2030, em comparação com os níveis de 2019. Isso é fundamental para limitar o aumento da temperatura a 1,5 grau Celsius até o final deste século e evitar os piores impactos da mudança climática, inclusive secas, ondas de calor e chuvas mais frequentes e severas.
“O relatório mostra que os governos, juntos, estão dando passos tímidos para evitar a crise climática. E revela por que os governos precisam dar passos decisivos na COP28 em Dubai, para entrar no caminho certo. Isso significa que a COP28 deve ser um ponto de virada claro. Os governos não só devem concordar sobre quais ações climáticas mais robustas serão tomadas, mas também começar a mostrar exatamente como implementá-las”, salientou Simon Stiell, secretário-executivo da UNFCCC.
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