Abre-se a cama e Carlos Gardel, de fundo o ditongo na voz escura deste rádio de madeira onde emblemas os decoram no salubre gesto dos ouvidos distorcidos e à janela o som.
LI
Sinto papéis de cidra nos bolsos como cigarros de coentros sem maços, embrulhados de qualquer maneira na cabeça que os fuma sem regra, sim, as regras estão nos cardápios dos médicos quando se receitam medicamentos de cura e de sabor cansativo, o fumo cola-se às distâncias desta rua de cidades coladas a cada esbracejar ao jantar, na mesa de pau rústico e mal confeccionada para a reunião com ciganos de meias para negociar sapatos e malmequeres no jardim, abro devagar a porta que dá para as traseiras para que se ocultem os sofás que vão perdendo a cor sempre que os veja e sinta como saltos para a mata numa rajada mais que nos intimida ainda assim. Abre-se a cama e Carlos Gardel, de fundo o ditongo na voz escura deste rádio de madeira onde emblemas os decoram no salubre gesto dos ouvidos distorcidos e à janela o som.
Por una cabeza
De un noble potrillo
Que justo en la raya
Afloja al llegar
Y que al regresar
Parece decir:
No olvidéis, hermano
Vos sabés, no hay que jugarPor una cabeza
Metejón de un día
De aquella coquetaY risueña mujer
Que al jurar sonriendo
El amor que está mintiendo
Quema en una hoguera
Todo mi quererPor una cabeza
Todas las locuras
Su boca que besa
Borra la tristeza
Calma la amargura
Por una cabeza
Si ella me olvida
Qué importa perderme
Mil veces la vida
Para qué vivirCuantos desengaños
Por una cabeza
Yo juré mil veces
No vuelvo a insistir
Pero si un mirar
Me hiere al pasar
Su boca de fuego
Otra vez quiero besarBasta de carreras
Se acabó la timba
¡Un final reñido
Ya no vuelvo a ver!
Pero si algún pingo
Llega a ser fija el domingo
Yo me juego entero.
¡Qué le voy a hacer!
Carrego martelos de algodão para amassar o caminho que desventra nas vielas e nos postigos a água salubre dos quintais de março, este assolar quente de intempéries no rosto são marcos ocultos no tacto breve das esfinges distribuídas por prateleiras de arte antiga e ainda assim a voz no tecto decorando de branco o colorido convexo das ruas. No céu da boca um rosa esguio disfarçando palavras perdidas no azedume frio de conversas voláteis entre o diafragma dos sons que zunem calafrios e arrepios de mal estar nesta ponte aérea de tantos num mês ido de há anos na cabeça como se ainda lá estivesse o meu esqueleto de metamorfoses florescentes numa fila de mendigos que rastejam clemência ao capelão do quartel, tão baixos os homens que mais parecem anões nos bancos traseiros da vida.
Entretantos diferentes numa palmatória indiferente aos açoites de tábua na mão dorida, ecos na sala de telas pretas por trás da secretária dos meus livros antigos na colecção de sempre que havia guardado para rever a cada impulso de vertebras deslocadas na cabeça que vislumbra ideias disfarçadas na pele de monges cobertos por um manto que mais parecia o cobertor de há anos no quartel da graça. Ainda assim, a formatura dispersa pela parada longe da vontade de tantos equilibram o rosto marcado pelas vísceras do cansaço neste farto calor de sobras longe e em sentido os resignados perante a vontade de quem pode e manda. Passa-se de seguida à revista, um a um, para novo castigo de tantos.
Como aperitivo à deliciosa prosa de Vítor Burity da Silva, apresentamos novo capítulo do livro Sobre As Águas Da Vida O Silêncio Dói
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