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Sexta-feira, Junho 27, 2025
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Contributos de Nazis para a Ciência da Gestão

Johann Chapoutot
Par Ziko van Dijk, CC BY-SA 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=36594794

Com este artigo pretendo formular algumas observações sobre Livres de Obedecer – A gestão, do nazismo aos dias de hoje (no original Libres d’ óbéir – Le management, du nazisme à aujourd’ hui) publicado em 2020 nas Éditions Gallimard por Johann Chapoutot e devendo-se a publicação da edição portuguesa de 2023 à Antígona, Editores Refractários que confiou a tradução a Miguel Serras Pereira. O livro foi apresentado em 7 de Setembro no Público por uma extensa recensão assinada por José Marmeleira.

Interessará também ter presente a biografia do autor, professor de história e investigador Johann Chapoutot.

Impressiona tomar consciência de que, já na Idade Contemporânea, e de certa forma em articulação com o movimento das nacionalidades, tantos trabalharam para reconstituir a origem e as qualidades da “raça” com que se identificavam. Associavam-lhe qualidades que na actualidade em que viviam já não eram discerníveis, mas o mito ficava. Deste modo, e simplificando, os alemães das florestas que em Teutoburgo derrotaram as legiões romanas eram livres. E a romanização, o catolicismo, a sujeição ao modelo de Estado que se tinha desenvolvido em Itália e em França, e, ouso dizê-lo, embora não tenha reparado que Chapoutot lhe tenha dado relevo expresso nesta obra, o Direito Administrativo, eram de certo modo vistos como elementos estranhos ao espirito da raça germânica.

Deste modo podia ser discutido se para o sector público era mais adequada uma organização de base territorial, temperada ou não por autonomia política nos vários escalões, ou uma organização, digamos, por agências. Os Nazis optaram a seguir ao acesso ao poder, por intervencionar os Länder, e até por substituir burgomestres, e, chama-nos a atenção Chapoutot, por altura da II Guerra Mundial a Alemanha operava um conjunto de organizações tipo agência: Organização Todt, Plano para Quatro Anos, Comissariado do Reich para o Reforço da Raça Germânica….

Acresce que as próprias organizações integradas no Partido Nazi começaram a ter prerrogativas de autoridade pública, ou até a duplicar organizações públicas sendo esse o caso das unidades SS em relação ao Exército, como se mostra no livro História da Gestapo, de Jacques Delarue. A própria Gestapo, polícia política, ficou dependente do Partido. As personalidades do Partido asseguravam funções em diferentes organizações(i). A delimitação de competências das várias organizações – partidárias ou simples agências – tornava-se extremamente difícil.

Chapoutot chama esta situação POLICRACIA e explica que se tornava frequentemente necessário pedir a arbitragem do Führer Adolf Hitler, o que teve por efeito reforçar a influência do seu secretário particular, Martin Bormann.

Sobre a forma de recrutamento dos quadros intelectuais deste sistema escreve:

As reflexões sobre a organização do trabalho, sobre a optimização dos factores de produção e sobre a sociedade produtiva mais eficiente foram, sob o Terceiro Reich, numerosas e intensas, não só porque correspondiam a questões urgentes, se não vitais, mas também porque se encontrava na Alemanha uma elite de jovens universitários que com gosto aliavam saber e acção, reflexão científica e tecnocracia, e que encontraram, no caso de algumas dezenas, um lugar no serviço de informações (SD) da SS, enquanto os outros se repartiam pela miríade de instituições e de agências criadas ad hoc sob o governo nazi, quando não beneficiaram muito simplesmente da boa sorte que lhes proporcionara a purga política e racial da universidade, que, ao despedir um terço dos efectivos de professores, assistentes e investigadores, abriu milhares de vagas a partir de 7 de Abril de 1933.

Reinhard Höhn é, juntamente com alguns outros, como Werner Best, Wilhelm Stuckart, Otto Ohlendorf, e uns quantos mais, o arquétipo deste intelectual tecnocrata. É igualmente, pela sua radicalidade e ideias de vanguarda, bem como pelas suas reflexões sobre a extinção progressiva do Estado, a sua ponta mais avançada.

Entenda-se

Stuckart é o mais antigo nas lides: aderiu em 1922 ao Partido Nazi e mais tarde viria a actuar como advogado de membros das suas Secções de Assalto (SA), com a vitória passa a integrar a alta função pública e o Governo, sendo secretário de estado no Ministério do Interior a partir de 1935(ii), e tendo sido responsável pela elaboração das chamadas Leis de Nuremberga, que desqualificam e segregam os judeus. Seria julgado depois da guerra pelo seu papel nestas leis mas condenado a pena já cumprida. Em 1941 publica um contributo para um volume de estudos em homenagem a Heinrich Himmler (“Zentralgewalt, Dezentralisation e Verwaltungsteinheit”) em que mostra acreditar que as campanhas de leste iriam alargar muito e de forma permanente as terras sob domínio alemão e que a função pública alemã não teria efectivos para as controlar. Seria preciso fazer mais com menos, alargar a responsabilidade de cada funcionário, delegar responsabilidades.

Na mesma linha e para a mesma publicação, Werner Best escreveria “Grundfragen einer deutschen Grossraum-Verwalung”. Chapoutot afirma que Best militou “em organizações nacional-conservadoras muito críticas em relação aos nazis”, organizações que não identifica, mas que teria aderido ao Partido Nazi em 1929.

Reinhard Höhn é, passe o termo, a estrela do estudo de Chapoutot. Inicialmente, nos tempos de estudante pertence a uma organização “da direita nacional mais conservadora, anti-semita e anti-comunista – Jungdeutscher Orden” – e só em Janeiro de 1932 se desliga dela, aderindo em Maio de 1933 ao Partido Nazi e em Julho à SS. A sua antiga organização acaba por fundir-se no “Partido do Estado”, dissolvido pelos nazis em 1933. Consegue integrar-se no SD (Sicherheitsdienst – serviço de segurança) da SS e vai desenvolvendo as suas teses, contraditando outras, mas a recordação das polémicas que no passado manteve com os nazis suscita reacções: é colocado noutras funções, sendo nomeado professor da Universidade de Berlim e Director do Instituto de Investigações sobre o Estado, dirige a revista Reich, Volksordnung, Lebensraum, mas mantém-se nas SS onde, com a protecção de Himmler e sem ter de ir comandar no Leste, chega em 1944 a general.

Para além do direito público e da sociologia – que pesa na sua visão da empresa como comunidade em que patrões e empregados colaboram – cultiva a história militar, rejeitando a organização militar prussiana incutida por Frederico-Guilherme IV, o Rei-Soldado e por Frederico II, o Grande, que entende ter levado à derrota perante Napoleão em 1806, e valorizando os exércitos da Revolução Francesa resultantes das levées em masse patrióticas, bem como os exércitos prussianos forjados a partir de 1806-1813 e comandados no terreno por oficiais e sargentos com grande autonomia quanto à definição da acção – a delegação das responsabilidades, que os exércitos nazis da II Guerra Mundial não lograram reproduzir, e por isso foram derrotados.

Chapoutot indica que ao contrário dos seus colegas Mengele e Eichmann, Höhn não foge para outro continente, limita-se a usar até 1950 o nome de Rudolf Haberlein, com documentos forjados antigos colegas e passando por tio das suas filhas(iii), dedica-se à prática de medicinas alternativas até ser sancionado por se intitular Doktor (sendo Doutor, sim, mas em Direito e não em Medicina). A partir da criação da República Federal Alemã em 1949 tudo fica facilitado: antigos generais da Wehrmacht virão a ter comandos na Bundeswehr, uma série de antigos nazis conseguem postos junto do chanceler Adenauer e da sua CDU, outros tornam-se valiosos activos do Partido Liberal (FDP), alguns como, segundo o autor, o super ministro da Economia Karl Schiller, escondem junto do SPD, o seu passado nazi, antigos administradores de grupos objecto de desmantelamento encontram lugares nas novas empresas. Uma rede de 6 500 antigos SS mantém uma actividade de entreajuda.

Refere o autor que em 1953 encontramos Höhn no posto de director da Sociedade Alemã de Economia Política (DVG), “associação e think tank industrial que visa, no contexto de um crescimento elevado, favorecer os métodos de gestão mais eficazes” e que para “desenvolver e ensinar as formas de gestão de recursos humanos mais adaptadas ao nosso tempo, a DVG decide criar uma escola de comércio para os quadros da economia” sendo que “No contexto do Plano Marshall, do atlantismo triunfante, das ‘missões de produtividade’ além-Atlântico, trata-se de formar gestores à americana, leaders polivalentes” e não já especialistas.

A Academia de Quadros de Bad Harzburg é criada em 1956 sob a direcção de Höhn, que chama a colaborar consigo numerosos dos seus colegas ex-membros da SS.

Os alunos formados na Akademie são técnicos que ocupam já postos de responsabilidade e que os seus empregadores enviam para cursos de algumas semanas ou alguns meses em Bad Harzburg . Escola de formação permanente de alto nível, a Akademie é comparável … a qualquer outra escola de comércio que ofereça cursos de mestrado em administração de empresas para quadros. São ao mesmo tempo a nata e os esteios do “milagre económico alemão”…

Segundo o autor “A escola acolhe até à morte do seu fundador em 2000, cerca de 600 000 quadros provenientes das principais sociedades alemãs, não contando com os 100 000 inscritos em cursos de formação à distância”, tendo 200 000 destes quadros sido formados antes de 1972, altura em que, na sequência de uma série de denúncias públicas do passado de Höhn, o então Ministro da Defesa Helmut Schmidt (SPD) resolve pôr termo à colaboração entre a Bundeswehr e a Academia.

Refere Johann Chapoutot:

O seu método de gestão, hierárquico mas não autoritário, oferecia aos “colaboradores” o gozo de uma liberdade ordenada, em que cada um daqueles é livre de ser bem-sucedido executando da melhor forma o que não decidiu…

…Após 1949, na RFA, a hora é a da participação generalizada, da co-gestão querida por Konrad Adenauer e Ludwig Erhard para evitar a luta de classes e qualquer risco de tentação comunista. Neste contexto, a doutrina de Bad Harzburgo desempenha o papel de catecismo oficial nas empresas, nas forças armadas e depois nas administrações.

O autor não diz, mas poderia dizê-lo, que 1956 foi também o ano em que o Tribunal Constitucional alemão decidiu ilegalizar o Partido Comunista da Alemanha (KPD) em proibido por Hitler em 1933.

O estudo de casos é tão intenso na academia, que fugindo ao espírito da “delegação de responsabilidades” acabam por se criar como que regulamentos para as situações que poderão surgir nas empresas.

A partir de 1969 Höhn passa a defender que “os métodos modernos de gestão sejam transpostos para a administração”, fazendo-se, diz Chapoutot “precursor, se não profeta, da Nova Gestão Pública (New Public Management) que se tornou uma quase – religião do Estado nos países ocidentais, a começar pela Alemanha do chanceler Kohl, desde inícios da década de 1980”.

Quando li a recensão sobre este livro chamou-me a atenção o nome de Stuckart, mencionado por mim em As Secções Nacionais Portuguesas do Instituto Internacional de Ciências Administrativas (1908-2012). Este Secretário de Estado do Ministério do Interior comunicou em 1937 ao Bureau do Instituto Internacional, sediado em Bruxelas, a adesão ao Instituto de uma Secção Nacional Alemã presidida por ele e integrando um total de 20 nomes, e propôs que o VII Congresso do Instituto se realizasse em Berlim em 1939, tendo sido adiado para 1940 por entretanto ter rebentado a guerra. Em 1940 a Bélgica foi invadida e ocupada pelos alemães, e em 1941 a Gestapo retirou todos os materiais das instalações do Instituto – incluindo uma comunicação de Henri Fayol ao II Congresso em 1923 onde se defendia a aplicação de métodos de gestão privada à administração pública – talvez com a intenção de os transferir para a posse de uma nova academia internacional que veio a ser proclamada na Alemanha em 1942. Estes desenvolvimentos e o envolvimento das embaixadas alemãs em tentativas de sedução de académicos de vários países estão muito bem descritos no artigo de Stefan Fisch “Origins and History of the International Institute of Administrative Sciences: From Its Beginnings to Its Reconstruction After World War II (1910-1944/47)“, publicado em IIAS/IISA Administration & Service 1930-2005-, sendo que tenho igualmente comigo a lista de 20 nomes da Secção Nacional Alemã, publicada na Rèvue Internationale des Sciences Administratives, onde se inclui o nome de Reinhard Höhn.

Em todo o caso tenha-se em conta que as experiências de New Public Management arrancaram primeiro nos países anglo-saxónicos, com uma organização do Estado e da Administração Pública historicamente diferente, com um menor peso ou mesmo inexistência de um Direito Administrativo específico.

Também se disse que Charles Bedaux, um francês muito conhecido também nos Estados Unidos, Canadá e Reino Unido e que efectuou contributos para a Organização Científica do Trabalho inicialmente desenvolvida por Taylor teve estreitas ligações com os Nazis mas não as terá tido com o Sicherheitsdienst das SS.

Enfim, o campo destes estudos poderá ser mais vasto do que parece.

 

Notas

(i) Goering, exemplifica Chapoutot, seria ao mesmo tempo administrador do Plano de Quatro Anos, presidente do Reichstag, ministro do Ar, monteiro-mor do Reich, ministro do interior da Prússia, com o direito a interceptar comunicações telefónicas internacionais que passassem pela Prússia e chefe da Luftwaffe.

(ii) Algumas das referências de Chapoutot não se harmonizam com elementos biográficos publicados por outros autores.

(iii) Refere-se no livro o caso de um capitão que faz a sua mulher espalhar a notícia da sua morte, muda de nome, faz uma segunda tese de doutoramento e um concurso para professor, casa-se novamente com a sua “viúva” e chega a reitor da universidade técnica de Aachen, só sendo desmascarado em 1995, isto é 50 anos após o termo da Guerra.

A teoria da panspermia

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Este ensaio explora a teoria da panspermia, que propõe que a vida na Terra se originou de microrganismos extraterrestres que viajaram pelo espaço em meteoritos, cometas ou poeira interestelar. O ensaio apresenta os argumentos a favor e contra essa hipótese, bem como as implicações filosóficas, científicas e éticas que ela levanta.

Introdução

A origem da vida na Terra é um dos maiores mistérios da ciência. Como surgiu a primeira célula a partir de moléculas inorgânicas? Como se deu a transição da química para a biologia? Existem outras formas de vida no universo? Essas são algumas das questões que intrigam os pesquisadores há séculos. Uma das hipóteses mais fascinantes e controversas que tenta responder a essas questões é a teoria da panspermia, que significa “sementeira universal” em grego. Segundo essa teoria, a vida na Terra não se originou aqui, mas foi trazida de outro lugar do cosmos por agentes espaciais, como meteoritos, cometas ou poeira interestelar, que continham microrganismos vivos ou seus precursores. Esses microrganismos teriam então colonizado o planeta e evoluído para as formas de vida que conhecemos hoje. Neste ensaio, vamos examinar os argumentos a favor e contra essa teoria, bem como as implicações que ela tem para a nossa compreensão da vida, do universo e de nós mesmos.

Desenvolvimento

A teoria da panspermia não é uma ideia nova. Ela já foi sugerida por filósofos antigos, como Anaxágoras e Empédocles, e por cientistas modernos, como Svante Arrhenius e Fred Hoyle. A teoria ganhou força nas últimas décadas, com o avanço da astrobiologia, a ciência que estuda a origem, a evolução e a distribuição da vida no universo. Alguns dos argumentos a favor da panspermia são:

  • A dificuldade de explicar como a vida surgiu na Terra a partir de condições iniciais hostis, como altas temperaturas, radiação, falta de oxigênio e água. A panspermia oferece uma solução simples: a vida já existia em outro lugar e foi transportada para cá.
  • A evidência de que alguns microrganismos, como bactérias, fungos e vírus, podem sobreviver em ambientes extremos, como o vácuo, o frio e a radiação do espaço. Isso sugere que eles poderiam resistir a uma viagem interestelar e se adaptar a diferentes planetas.
  • A descoberta de moléculas orgânicas, como aminoácidos, açúcares e nucleotídeos, em meteoritos, cometas e poeira interestelar. Essas moléculas são os blocos de construção da vida e poderiam ter servido de matéria-prima para a formação de microrganismos ou ter sido incorporadas por eles.
  • A similaridade genética entre todos os seres vivos da Terra, que compartilham o mesmo código genético, baseado no DNA e no RNA. Isso poderia indicar uma origem comum extraterrestre para a vida terrestre, que teria herdado esse código de seus ancestrais espaciais.

No entanto, a teoria da panspermia também enfrenta vários desafios e críticas, como:

  • A falta de evidência direta de que microrganismos vivos ou seus precursores tenham sido encontrados em agentes espaciais. Até agora, apenas moléculas orgânicas foram detetadas, mas isso não significa que elas sejam de origem biológica ou que tenham dado origem à vida.
  • A possibilidade de que as moléculas orgânicas encontradas em agentes espaciais sejam de origem terrestre, contaminadas por material biológico durante a queda ou a coleta. Além disso, essas moléculas podem ter se formado por processos químicos naturais, sem a intervenção de microrganismos.
  • A dificuldade de explicar como os microrganismos teriam sobrevivido à entrada na atmosfera terrestre, que envolve altas temperaturas, pressão e choque. Muitos deles poderiam ter sido destruídos ou inativados pelo calor, pela fricção ou pela oxidação.
  • A necessidade de explicar como os microrganismos teriam se adaptado às condições da Terra, que são muito diferentes das de seu planeta de origem. Eles teriam de enfrentar a competição, a predação, a seleção natural e a evolução, que poderiam ter alterado suas características originais.

Conclusão

A teoria da panspermia é uma hipótese intrigante e estimulante, que abre novas possibilidades para a compreensão da origem e da diversidade da vida no universo. Ela também levanta questões filosóficas, científicas e éticas, como: Qual é o nosso lugar no cosmos? Somos únicos ou há outras formas de vida inteligente? Como devemos nos relacionar com elas? A teoria da panspermia, no entanto, não é uma teoria comprovada ou aceita pela maioria dos cientistas. Ela ainda carece de evidências conclusivas e enfrenta vários problemas e objeções. Ela também não resolve o problema da origem da vida, mas apenas o transfere para outro lugar. Por isso, ela deve ser vista como uma especulação, não como uma certeza.

 

Citações

As citações usadas neste ensaio são as seguintes:

  • “A panspermia é uma hipótese que sugere que a vida se espalha pelo universo, distribuída por meteoroides, asteroides, planetoides, cometas, poeira espacial e, possivelmente, por naves espaciais com seres vivos, tanto deliberadamente quanto acidentalmente.” (Wikipedia, 2024)
  • “A astrobiologia é o estudo da origem, evolução, distribuição e futuro da vida no universo. Ela abrange os campos da astronomia, biologia, geologia, física, química e engenharia.” (NASA, 2024)
  • “A vida é um fenômeno complexo e multifacetado, que pode ser definido de várias maneiras. Uma definição comum é que a vida é um sistema que mantém um estado de desequilíbrio termodinâmico, que é capaz de crescer, se reproduzir, se adaptar e evoluir, e que possui um código genético que armazena e transmite informação.

 

Bibliografia

As fontes consultadas para este ensaio são as seguintes:

De Lagarde ao voto!

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A notícia da decisão do BCE de continuar a manter as taxas de juro inalteradas deveria ter merecido maior atenção que a meramente proporcionada pela constatação que a economia europeia já está paralisada, mas o BCE diz que só pode descer juros em Junho.

Todos estamos ainda bem recordados do que representaram as políticas monetaristas e neoliberais decididas pelos bancos centrais na sequência da crise sistémica de 2008 ou da crise do euro de 2012, quando a pretexto de salvar as economias se resgataram bancos e banqueiros a troco da pauperização das populações. Então, como agora, invocou-se o santo graal do crescimento e da produção de riqueza sem que a esmagadora maioria dos cidadãos tenha visto e sentido outra coisa que uma clara degradação das suas condições de vida.

Christine Lagarde
Por European Parliament from EU – New ECB Chief Lagarde to address plenary for first time, CC BY 2.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=96224562

Os anos passaram, as crises anunciaram-se debeladas, mas o paradoxo do crescimento económico a todo o custo continua a fazer estragos no dia-a-dia das populações e ainda mais quando recentemente se lhe juntou o de uma inflação que os especialistas (e em particular os dos bancos centrais) se recusam a admitir que não seja originada pelo excesso de moeda em circulação.

Recordando o que escrevi aqui no Tornado, em Setembro do ano passado, ao contrário do que sustentam os bancos centrais e os economistas neoliberais, o actual quadro inflacionista não resulta de um aumento da procura sustentado num excesso de oferta de moeda, antes de uma redução da oferta de bens e serviços originado pela redução da produção e pela quebra nos circuitos de distribuição provocados pela Covid-19 e pelas políticas de confinamento que a acompanharam, acrescento agora os malefícios resultantes do dogma do crescimento económico como medida de sucesso e bem-estar.

Como todos os outros, também o indicador do crescimento económico precisa ser avaliado à luz da realidade conjuntural, uma realidade que é a do crescente esgotamento dos recursos naturais absolutamente indispensáveis ao normal funcionamento das economias e que há muito deveria ter trazido para o topo das preocupações governamentais a mais elementar das questões: como é que as economias podem continuar a crescer num contexto de recursos limitados?

Se os decisores políticos fizessem o simples exercício de pararem para pensar, se fossem além da mera disputa partidário-eleitoral, se tivessem capacidade para perceber os interesses que movem os seus conselheiros económicos, talvez já tivessem percebido a verdadeira dimensão da afirmação «É a economia estúpido!» que se diz que levou Bill Clinton à presidência norte-americana em 1992.

Numa economia dominada pelo crédito (público e privado) o verdadeiro poder está no sistema financeiro que cria o crédito e não no sistema político que promove discursos e promessas. Pensem seriamente nisto, agora que é momento de votar!

8 de março: não há futuro para a humanidade sem a emancipação das mulheres

Como mostram as filósofas Simone de Beauvoir e Silvia Federici, a luta das mulheres por igualdade vem de longe. Por isso, é importante a cada ano destacar a importância do 8 de março – Dia Internacional das Mulheres – como uma data de reflexão e de luta.

Chegou-se a essa data após 15 mil mulheres operárias marcharem pelas ruas de Nova York em 1908 por redução da jornada de trabalho, melhores salários e de poderem votar e ser votadas, quando o Partido Socialista da América criou o Dia Nacional das Mulheres.

A data se estabeleceu no movimento feminista a partir de 1910 quando a comunista alemã Clara Zetkin propôs a criação do Dia Internacional das Mulheres na Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, em 1910.

O feminismo é tão importante para a luta de classes como mostra Silvia em seu livro “Calibã e a Bruxa – Mulheres, Corpo e Acumulação Primitiva”. Ela mostra como o capitalismo demonizou as mulheres e o seu corpo para explorar o trabalho doméstico sem remuneração e subjugá-las para a implantação da ideologia patriarcal ainda mais opressora.

Toda essa repressão para tornar a ideologia patriarcal hegemônica traz consequências até hoje, principalmente com religiões fundamentalistas pregando a submissão das mulheres. Não à toa a extrema direita adota a misoginia como forma de dominação.

O enfrentamento à violência de gênero, portanto, é parte fundamental da luta de classes para a superação do capitalismo. No Brasil essa luta não tem sido diferente. Mas como o escravismo predominou por aqui quase quatro séculos, a mentalidade escravista ainda persiste em setores da elite.

O que faz a violência ser maior e pior. As mulheres que desejam viver e amar em liberdade sofrem todo tipo de violência. Ainda se vê bem poucas mulheres em cargos de direção nas empresas, mesmo naquelas que hipocritamente, se colocam como adeptas do feminismo. Os salários são menores e as mulheres negras continuam na base da pirâmide social ganhando muito menos e tendo os piores trabalhos.

Mas as mulheres vão às ruas neste 8 de março de 2024 para mostrar que a luta por igualdade faz parte de suas vidas e não terminará enquanto a situação não mudar. Enquanto mulheres estiverem morrendo por serem mulheres, enquanto os salários não forem efetivamente iguais para mesmas funções e enquanto não houver respeito à vida e à dignidade das mulheres, estaremos nas ruas, nas redes e em todos os lugares para gritar por nossos direitos.

É a luta pela emancipação das mulheres que impulsiona a história rumo ao futuro socialista com a superação do capitalismo excludente e opressor. O feminismo levará a humanidade a patamares superiores com a construção do socialismo.

“Você não sabia?/Estão falando de uma revolução/Parece um sussurro/Os pobres vão se insurgir/E conseguir o quinhão deles/Os pobres vão se insurgir/E tomar o que é deles”, como canta Tracy Chapman em “Falando sobre uma Revolução”).

Falando sobre uma Revolução, de Tracy Chapman


Texto em português do Brasil

Sondagens: condicionam os eleitores na altura de votar?

Comentadores e jornalistas por ignorância, ou deliberadamente, têm apresentado os resultados de sondagens baseados em amostras diminutas como cientificamente rigorosos, o que não é verdade, e como os 10 milhões de eleitores portugueses irão votar condicionando desta forma a opinião pública

Neste estudo analiso a avalanche de sondagens eleitorais cujos resultados são apresentados e comentados quase diariamente sem fim em todos jornais e televisões e mostro e explico a sua reduzida credibilidade técnica e cientifica. Para tornar isso mais claro para o leitor mostro como o INE, uma entidade oficial credível, faz os seus inquéritos à população, e qual a dimensão minima da amostra que utiliza para que os os resultados sejam cientificamente credíveis e possam ser divulgados e não sejam enganadores. Tais cuidados de natureza cientifica não são respeitados nas sondagens eleitorais, não havendo quaisquer alertas sobre as suas limitações. O que se procura, objetivamente, é condicionar o voto popular.

 

Estudo

Comentadores e jornalistas por ignorância, ou deliberadamente, têm apresentado os resultados de sondagens baseados em amostras diminutas como cientificamente rigorosos, o que não é verdade, e como os 10 milhões de eleitores portugueses irão votar  condicionando desta forma a opinião pública

Nestas últimas semanas tem-se multiplicado as sondagens dando a maioria delas a vitória à direita, algumas delas feitas por entidades sem qualquer credibilidade técnica (nem estão inscritas na CNE) prevendo que o PS obtenha uma votação inferior à AD (PSD+CDS+PPM) e que alguns partidos da esquerda caminham para a quase extinção. Segundo elas a maioria de direita é quase uma certeza. A falta de credibilidade científica e técnica dessas sondagens “low cost”é evidente para quem as analise com cuidado, como vamos provar neste estudo.

Infelizmente, nesta campanha de desinformação, a maioria dos comentadores que dominam os media e muitos jornalistas participam nesse engano pois ignoram, ocultando mesmo, as limitações e deficiências dessas sondagens cujos resultados utilizam como fossem verdadeiros e rigorosas. E isto com o objetivo de condicionar o voto dos portugueses levando-os a aceitar a vitória de direita como inevitável e procurando ou os desmobilizar ou incentivar a votar naqueles que dizem que serão os “vencedores”. Ignoram ou não divulgam a “ficha técnica“ onde constam o baixo número de inquiridos e a baixa taxa de respostas dessas sondagens, e se as divulgam colocam numa letra miúda e na TV durante poucos segundos para que ninguém as possa ler. O fracasso das sondagens em eleições anteriores devia levar comentadores e jornalistas a terem mais cuidado nas suas afirmações, mas, infelizmente, a ética e a responsabilidade estão cada vez mais ausentes.

 

POR QUE RAZÃO AS SONDAGENS MENTEM, EM MUITOS CASOS FALHAM E OS SEUS RESULTADOS SÃO ENGANADORES?

As sondagens eleitorais são feitas com base num inquérito habitualmente a um número diminuto de portugueses que têm telefone ou internet (os que não têm são logo excluídos)sendo essa amostra constituída em média por 800 inquiridos ou mesmo menos. E isto porque são assim de “low cost” e rápidas. E com base nas respostas deste número diminuto de eventuais eleitores que, em média, só metade dos da amostra (800) respondem extrapola-se para todos os eleitores – 10 milhões – como estes milhões eleitores fossem, por milagre, votar da mesma forma como os que responderam à pequena amostra selecionada pelas empresas de sondagem.

Para que o leitor possa avaliar a consistência (ou a falda dela) científica das sondagens cujos resultados são utilizados pela comunicação social como fossem rigorosos manipulando, assim, a opinião pública, interessa comparar a dimensão das amostras (nº de inquiridos) que estas empresas utilizam com as amostras dos inquéritos feitos pelo INE que têm credibilidade técnica e científica elevada. Para isso vamos utilizar o inquérito feito trimestralmente pelo INE ao emprego/desemprego. Ele é também realizado com base num inquérito, mas utilizando uma amostra com uma dimensão totalmente diferente. O quadro 1, mostra a dimensão e o aumento da amostra do INE ao longo dos anos para aumentar a sua consistência técnica que se utiliza para calcular trimestralmente o emprego e o desemprego em Portugal (atualmente a amostra tem a dimensão de 30096, e não tem parado de crescer para aumentar a precisão como mostra o quadro, e é refrescada trimestralmente com a saída e entrada de vários milhares de inquiridos).

Quadro 1 – Dimensão da amostra utilizada pelo INE nos inquéritos trimestrais ao emprego/desemprego

30096 o INE e apenas 800 os inquéritos das sondagens eleitorais. É uma diferença abissal com consequências dramáticas na consistência científica dos resultados obtidos como é evidente. E mesmo assim o INE tem muito cuidado na divulgação dos resultados obtidos como mostra o quadro 2, que consta na pág. 24 do Documento Metodológico de INE de 2021, precauções que não existem na divulgação dos resultados das sondagens eleitorais

Quadro 2 – A forma como o INE os resultados do Inquérito ao emprego/desemprego calculados com base numa amostra

Portanto, só se o número de respostas válidas for igual ou superior a 11.100 é que o resultado é divulgado sem restrições e o INE considera que tem validade científica. Se o número de respostas válidas for inferior a 11.100 e superior a 4300 a estimativa é divulgada, mas com a indicação que tem menor precisão. Se o número de respostas válidas é inferior a 4300, os resultados não são divulgados porque o INE considera que não têm credibilidade técnica e científica, portanto são enganadores. Comparem com as sondagens eleitorais que estão a ser divulgadas.

O quadro 3 mostra a dimensão habitual da amostra (em média apenas 803 inquiridos) e uma taxa de resposta muito variável que reduz ainda mais a precisão e a consistência dos resultados que depois são apesentados como certezas nos media numa clara e evidente manipulação da opinião pública. Infelizmente jornalistas e comentadores prestam-se a isso não alertando os leitores e ouvintes para as limitações dos resultados. Os dados do quadro 3 são de Fichas técnicas que, à semelhança dos contratos de seguros, são apresentadas (quando o são) em letra muito pequena (o TV de uma forma muito rápida) que dificulta qualquer leitura e análise o que parece até propositado.

Quadro 3 – Sondagens eleições de 2024- Entidades, dimensão da amostra utilizada e respostas completas obtidas

Comparem a dimensão da amostra utilizada por estas empresas de sondagem (em média 800 entrevistas), com a dimensão da amostra utilizada pelo INE (30096) , e recorde-se os cuidados a ter na sua divulgação segundo o INE referidos anteriormente. Uma amostra com esta dimensão de 800 não tem qualquer precisão segundo o INE, que é um organismo oficial. Ele recusar-se-ia a publicar os seus resultados por falta de credibilidade.

Mas ainda existe um outro aspeto que enviesa a amostra que as empresas de sondagem utilizam e que reduz ainda mais a precisão dos resultados. Esse aspeto é a elevada percentagem dos que se recusam a responder (entre 23,4% e 74,7%). E isto distorce ainda mais os resultados, reduzindo muito mais a sua precisão, porque aqueles que se recusaram podem, na sua maioria, pertencer a um ou vários partidos, o que determina que aqueles que respondem e que pertencem aos outros partidos acabando por empolar os resultados atribuídos a estes partidos dando resultados que, depois, são utilizados pelos media, como verdadeiros e totais condicionando a população, mas que não correspondem à realidade eleitoral do país. E o absurdo atinge o limite impensável quando estas empresas de sondagem repartem os indecisos de acordo com as percentagens obtidas desta forma por cada um dos partidos e calculam desta forma os deputados que seriam eleitos. E depois apresentam tudo isto, calculada desta forma, como fosse o pensar e sentir de todos os portugueses. É desta forma que se procura agora condicionar o voto através de comentadores e jornalistas que matraqueiam até ao infinito os resultados que nada tem a ver com o saber científico.

 

O FRACASSO REPETIDO DAS SONDAGENS “LOW COST” ANTERIORES É IGNORADO PARA FACILITAR A MANIPULAÇÃO

O quadro 1, é apenas um reduzido número de exemplos que mostram o falhanço das sondagens eleitorais que têm enxameado os períodos anteriores a todas eleições com o objetivo de condicionar a votação, mas que depois os resultados finais das eleições revelam diferença grande entre o verificado e o previsto por estas sondagens pagas.

Quadro 4 – Resultados finais das eleições de 2022 e resultados das sondagens feitas para estas eleições

Como se conclui da observação do quadro 4 os resultados das sondagens feitas antes das eleições passadas são muito diferentes dos resultados finais. Quem ingenuamente acreditou nas sondagens certamente sentiu-se enganado. Muitos ainda se recordam da intensa campanha desenvolvida nos media de que Rui Rio iria ganhar as eleições. E o resultado foi que Costa ganhou as eleições com maioria absoluta. O mesmo com Fernando Medina/Carlos Moeda. A vitória de Medina era quase certa para muitos. Se se derem ao trabalho de estudar o passado concluirão que os fracassos das sondagens são numerosos. E não só em Portugal, também nos EUA (ex.Hillary Clint/Trump). Se existisse sentido de responsabilidade nos comentadores e jornalistas, a sua conduta seria outra.

 

É NECESSÁRIO UM GOVERNO DE ESQUERDA, COM TODOS OS PARTIDOS DE ESQUERDA PARA SE OPOR À DIREITA

Hoje o que está em jogo em Portugal, num contexto interno e externo muito inseguro e difícil (guerras, sanções, declínio da Europa, crescimento económico medíocre na U.E. e em Portugal, aumento das desigualdades e pobreza, etc.) é a ascensão da direita ao poder apoiada pela extrema-direita e pelos saudosos do fascismo, e o inevitável agravamento das condições de vida dos portugueses por mais cantos de sereia que ouçamos. O país necessita é de um governo firme na defesa dos interesses dos portugueses, não submetido ao “deus de contas certas” e que não seja submisso a uma C.E. incapaz, incompetente e desprestigiada na Europa e no mundo. E isso só é possível com um governo de esquerda forte, mas para isso é necessário que os partidos de esquerda sejam reforçados pelo voto popular nas eleições. A experiência já mostrou que o domínio total de só um partido de esquerda não é solução para o país pois ele revelou-se incapaz e fraco para se opor à chantagem interna e externa da direita cedendo continuamente a ela nos últimos 2 anos.


Não existe amor nem educação no governo de SP

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Parodiando a linda canção Não Existe Amor em SP, de Criolo, neste título, porque a cada manifestação do governador Tarcísio de Freitas e a cada projeto do nefasto empresário Renato Feder, secretário da Educação do estado, comprovamos a absoluta falta de compromisso do governo estadual com a educação pública e, por consequência, com as pessoas que mais precisam de uma educação pública voltada para a maioria da população, com qualidade e diversa como deve ser.

Recentemente o governador teve a cara de pau de dizer em um evento da Secretaria da Educação que “a gente sabe que o melhor professor ainda não tem a melhor condição. A gente sabe que eles não têm a melhor infraestrutura. A gente sabe que eles não têm o melhor salário. Mas eles têm muito amor”.

Disse isso para esconder a total incapacidade de Feder em resolver de modo sustentável e permanente os problemas deixados pela já péssima gestão anterior. Só que o ainda secretário consegue piorar o que já estava muito ruim.

Haja visto o processo de atribuição de aulas deste ano, que conseguiu desagradar a gregos e troianos e sem amor nenhum deixou escolas sem professores e professores sem trabalho. Em total prejuízo aos estudantes, à comunidade escolar e à sociedade.

Professores chamados “temporários” ficaram sem aulas e sem salários e nas escolas faltam profissionais. A coisa já vinha degringolando há tempos, mas Feder e Tarcísio conseguiram a façanha de deixar tudo muito pior.

E sim governador, amamos o que fazemos, amamos a educação pública, amamos nossos estudantes, mas não podemos aceitar de forma nenhuma o total descaso que o governo do senhor tem pela educação pública, pelos profissionais do serviço público, pelos estudantes e pela comunidade escolar.

Não dá mais. O empresário Feder não tem a mínima condição  moral para continuar comandando a Secretaria da Educação e o senhor tem a obrigação de respeitar a lei e contratar todos as professoras e os professores aprovados no último concurso como efetivos até o número pelo qual não haja nenhuma escola com falta de professoras e de professores em nenhuma disciplina. Efetive todos os aprovados já! E antes que me esqueça Fora Feder!

Porque “Não precisa sofrer pra saber o que é melhor pra você/Encontro duas nuvens/Em cada escombro, em cada esquina/Me dê um gole de vida/Não precisa morrer pra ver Deus”, como canta Criolo.


Texto em português do Brasil

A Troika existiu?

Começo a acreditar que se quisermos descrever o que, em termos tanto políticos como económicos, se tem passado em Portugal nas últimas décadas, baseando-nos na recolha de memórias, nos encontraremos perante um esforço descomunal. E todavia dispomos de imensa documentação que foi sendo produzida dentro e fora da Administração Pública, pelo poder e pelas oposições, e de abundante material estatístico, incluindo séries longas.

Não sendo eleitor do Partido Socialista, julgo contudo imperativo dizer que vejo sempre com perplexidade referências às alegadas bancarrotas da responsabilidade daquele Partido em 1977 e em 1983.

No primeiro daqueles anos o problema era de disponibilidade de divisas, cujo nível se reduzira assinalavelmente nos três anos precedentes, em que a população passou, como se sabe, a viver melhor… O Acordo com o FMI deu origem à aprovação de “pacotes” de medidas de política em Fevereiro e em Agosto de 1977. O Governo minoritário do Partido Socialista colocou uma moção de confiança que foi recusada. O primeiro ministro Mário Soares formou em 1978 um segundo governo minoritário em que integrou ministros do CDS “despartidarizados para o efeito” e na Agricultura substituiu António Barreto por Luís Saias(i). Foi sol de pouca dura, e seguiram-se três “governos de iniciativa presidencial”(ii) liderados respectivamente por Alfredo Nobre da Costa, Carlos Mota Pinto e Maria de Lurdes Pintassilgo. Em 1979 Francisco Sá Carneiro forma Governo depois da vitória eleitoral da recém constituída Aliança Democrática, vitória essa renovada em 1980.

Depois da morte de Sá Carneiro, Francisco Pinto Balsemão forma mais dois Governos da Aliança Democrática mas em 1983, na sequência de dificuldades políticas internas e de problemas orçamentais(iii) e de balança de pagamentos são convocadas eleições, ganhas por Mário Soares que forma coligação com um PSD já liderado por Mota Pinto, conhecida por Bloco Central, e aí faz-se um Acordo mais complexo com o FMI, que inclui medidas financeiras e fiscais, e com o qual se convenciona que, para efeitos de acompanhamento do Acordo se tomará em conta um Sector Público Alargado que incluirá 53 entidades, entre as quais o Gabinete da Área de Sines. Não há aqui uma bancarrota nas contas públicas, que seria de imputar à AD, mas sim um problema de défice externo. A certa altura Mota Pinto é substituído por Rui Machete enquanto primeiro-ministro e enquanto presidente da comissão política do PSD e apesar das reservas de Cavaco Silva que entretanto vencera, contra João Salgueiro, o Congresso do PSD na Figueira da Foz, são assinados em 1985 os Acordos de Adesão às Comunidades Europeias.

No final do ciclo de Cavaco Silva o nosso país já estava lançado para ir mais longe, com a adesão à futura moeda única, estando já excluído o financiamento do défice através do Banco de Portugal. Quando o Euro foi efectivamente criado, e Portugal, decorria o ciclo de António Guterres, ficou integrado no Euro, parecia que os problemas de balança de pagamentos iriam ficar para trás e não voltaria a haver recurso ao Fundo Monetário Internacional. João Ferreira do Amaral, profundo conhecedor da economia portuguesa, foi alertando para a perda de instrumentos de política monetária, designadamente a possibilidade de desvalorização da moeda….

A ruptura, com novo pedido de apoio externo, veio a ocorrer em 2011. E todavia tanto nos ciclos de Durão Barroso(iv) como de José Sócrates se haviam adoptado medidas ditas de reforma ou modernização do Estado que eram essencialmente dirigidas contra o emprego público e as garantias dos funcionários, incluindo no domínio da formação de pensões, e até, em 2010, de cortes nas suas remunerações nominais. Que sucedera? Uma consequência da crise internacional, veio a dizer-se nos meios do Partido Socialista, com uma subida crescente nas taxas de juro suportadas pela República na contratação de novos empréstimos? Efeitos de acatamento bem intencionado de orientações europeias no sentido de subir as despesas públicas, segundo se disse nos mesmos meios? Ou simplesmente uma indicação do Banco Central Europeu aos bancos portugueses de que deixaria de os apoiar se continuassem a dar crédito ao Estado português? No início do ciclo de José Sócrates o Ministro das Finanças, Luís Campos e Cunha, afastara-se por discordar do anúncio de uma política conducente ao lançamento de grandes projectos. Tive ocasião de ouvir em 2009 no Congresso organizado pela Ordem dos Economistas no Funchal uma intervenção sua, como orador de referência, sobre os problemas da dívida(v). Quando Teixeira dos Santos, seu sucessor, fez apelo à ajuda externa, logo se disse que o Estado não iria ter dinheiro para pagar aos funcionários e aos pensionistas, portanto seria uma bancarrota. Ninguém parece ter perguntado se haveria um plano B. Enfim, na Grécia disse-se pior, que deixaria de se poder levantar dinheiro das caixas multibanco porque o país seria expulso do euro…

A constituição das chamadas troikas – FMI, Comissão Europeia, Banco Central Europeu – nos países do Euro levantou problemas originais:

  • a própria coordenação destas três entidades, embora a participação do FMI fosse vista como útil, porque por um lado traria um apport substancial ao financiamento dos empréstimos a conceder, depois porque teria já “receitas” experimentadas noutros locais, e, finalmente, ficaria com o odioso das “maldades”(vi);
  • a impossibilidade de utilizar a desvalorização da moeda como instrumento de restabelecimento da competitividade externa, obrigando a utilizar medidas sem anestesia, e tivemos uma boa experiência com a tentativa de alteração radical da repartição da Taxa Social Única (TSU) entre patrões e e empregados, que levou ás mega manifestações de 15 de Setembro de 2012.

Tenho numerosos apontamentos desse período e do imediatamente anterior no meu blogue pessoal mas para o que vou escrever a seguir, socorrer-me-ei:

  • de um relatório meu sobre a comunicação de Pedro Lains, infelizmente já desaparecido, intitulada “The rise and demise of the Troika virtues”, apresentada no Instituto de Ciências Sociais, em 12 de Fevereiro de 2013;
ulisboa.pt
  • de um artigo de Helena Rato, intitulado “A Administração Pública e a Política de Austeridade em Portugal”, publicado no nº 1 da RAEP – Revista de Administração e Emprego Público em Fevereiro de 2015, sendo esse número de lançamento da Revista dedicado ao tema “Austeridade e Reforma da Administração Pública”.

Da comunicação de Pedro Lains retenho a percepção de que as posições da Troika para a legislação laboral terão sido construídas por personalidades portuguesas. As alterações relativas a horários de trabalho, bancos de horas, contratação colectiva, terão essa marca. Possivelmente terão favorecido a competitividade externa e a facilidade em cumprir encomendas captadas. Talvez se lhe possa também creditar a dificuldade de repor salários face ao processo inflacionista que viemos a ter recentemente e a falta de referências salariais para a contratação de pessoal com habilitações literárias superiores a quem o mercado não valoriza, oferecendo-lhe o salário mínimo. As subidas de salário mínimo que os governos de António Costa foram aprovando terão beneficiado também algumas vítimas desta anomia. Mas o problema da subida dos salários médios é mais complexo. As “conquistas do patronato” no período da troika devem também ser creditadas a João Proença, secretário-geral da UGT, um quadro bem preparado, mas homem do sindicalismo da função pública.

Do artigo de Helena Rato, que situa a actuação do FMI no contexto do “Consenso de Washington” alcançado em 1989, retiro dois aspectos espantosos do processo de intervenção: a troika, e em particular o FMI teriam informação deficiente sobre os efectivos da função pública e não dispunham de informação actualizada sobre a legislação vigente, designadamente sobre a avaliação de desempenho na função pública, introduzida em 2004, e até sobre o regime de vínculos, carreiras e remunerações, aprovado em 2008. O que é que terá lido? As Actas do Compromisso Portugal que reduziam 100 ou 200 mil funcionários públicos de uma assentada? Helena Rato, que analisou detalhadamente um relatório de assistência técnica do FMI produzido em Janeiro de 2013 e intitulado Portugal Rethinking the State – Selected Expenditures, Reform Options, observa, com inteira pertinência:

Um deficiente diagnóstico prejudica todo o processo de tomada de decisões na resolução dos problemas, desde a definição de objectivos e metas até à identificação de medidas adequadas para atingi-los. Esta dificuldade está presente no relatório do FMI, sobretudo na reflexão à volta das medidas a tomar para se atingir a redução do emprego e da despesa pública com as remunerações pagas aos trabalhadores.

Pareceu-me na altura que seria simples aproveitar a legislação já produzida no ciclo de José Sócrates sobre pré-reformas e desvinculações com indemnização para suscitar logo em 2012 – com ajustamentos de forma a bonificar os valores de indemnização por exemplo tomando as remunerações antes de cortes ou reduzindo o período de impedimento de regresso à função pública – um movimento de integração de trabalhadores da função pública na actividade privada. Tais ajustamentos poderiam por exemplo ser introduzidos pelos grupos parlamentares da maioria na votação na especialidade da Lei do Orçamento do Estado para 2012.

No entanto para reformar é preciso conhecer o que se vai reformar e saber gerir:

  • o “troico” Passos Coelho tinha pouca experiência de trabalho fora da política, e nenhuma no Governo e na Administração Pública;
  • o “troico” Paulo Portas fez um power point sobre Reforma do Estado;
  • o “troico” Carlos Moedas, engenheiro civil, ficou a liderar uma estrutura de missão, a ESAME, que construiu 400 e tal leis, propostas de lei e decretos-leis.

De forma que, em vez de fazerem o que não feito, refizeram o que já estava feito, e ao PRACE juntaram o PREMAC. Para as desvinculações negociadas criaram uma Portaria, lançada quando a economia já estava estrangulada e tinha pouca capacidade de absorção de gente a sair da função pública e, como se percebe, teve pouco sucesso.

Agora andam por aí a prometer aumentos e recuperações de tempo de serviço…

Jose Silva Peneda (apdh.pt)

O FMI teve a ver com isto? Silva Peneda na altura Presidente do Conselho Económico e Social, inseriu em 2 de Março no Público um artigo intitulado “A Reposição da Verdade”, em que revela ter-se apercebido de que quem mandava na Troika era o FMI e, tendo sempre manifestado as suas preocupações, ter tido, por intermédio de Carlos Moedas, uma reunião com o Senhor Thompson, chefe da missão do FMI, a pedido deste último. Peneda sempre foi um moderado.

Se repararmos bem, Vítor Gaspar, Ministro das Finanças, foi mais radical: assumiu que iria promover UM ENORME AUMENTO DE IMPOSTOS, demitiu-se a meio da função, o que Ernâni Lopes não fez no tempo do Bloco Central, formulou umas observações sobre a inadequação dos multiplicadores utilizados no modelo utilizado pelo FMI, o que significa, julgo, que as medidas adoptadas acabaram por ser vistas por ele como excessivas. Foi trabalhar para o dito FMI e pelo menos ele não ameaça voltar para promover uma redução de impostos.

Vítor Gaspar

Por mim, mantenho a visão que publiquei no meu blogue pessoal em 2 de Outubro de 2015 em relação ao grupo de “troicos” nacionais:

Do ponto de vista interno não ensaiou um verdadeiro esforço para reduzir a dívida e desperdiçou oportunidades de rendibilizar a alienação de activos do Estado, isto quando não sucedeu pior.

Enumerando:

  • falta reforçar a centralização do recurso ao crédito público;
  • as verbas de pessoal cortadas nas empresas públicas e nas autarquias locais não foram entregues ao Estado para redução da dívida pública;
  • não foi exigida à PT e outras entidades qualquer contrapartida pela extinção das Golden Shares; o que suscitou na altura um veemente protesto de Luís Campos e Cunha;
  • não foram extintas e reintegradas no Estado as entidades – Estamo e Parque Escolar – para as quais foram transferidos activos do Estado afectos ao funcionamento dos serviços;
  • as famosas fundações continuaram, no essencial, a existirem e a ser apoiadas;
  • perderam-se oportunidades de resgate de parcerias público – privadas e criaram-se outras;
  • a privatização da EDP e mais recentemente a venda da Finangeste podem ser vistas como casos de polícia;
  • a privatização dos CTT baseou-se numa avaliação deliberadamente baixa como se o objectivo fosse dinamizar o mercado de capitais, como em 1990, e não obter receita;
  • não se tomou qualquer medida para sanear financeiramente as empresas de transportes urbanos, cuja exploração foi concessionada;
  • a subconcessão do Metro de Lisboa e Carris foi feita em condições desfavoráveis para o Estado”.

As duas últimas decisões de concessão foram revertidas pelo governo seguinte. Não incluí aqui expressamente o caso da concessão da ANA, cujos contornos só agora foram conhecidos totalmente em toda a sua extensão, e da venda da TAP.

Pior – e volto a lembrar que sou nacionalista quanto baste – foi esta gente se ter encostado aos poderes europeus e se ter deixado arregimentar na frente contra a Grécia.

 

Notas

(i) António Barreto visto como sendo inimigo da Reforma Agrária. Integraria as listas da AD como candidato do Movimento Reformador.

(ii) Sendo Presidente da República Ramalho Eanes.

(iii) Assinalados por Juan Mozzicafreddo.

(iv) Com Santana Lopes no seu efémero Governo, a propor um abrandamento do ritmo.

(v) Como orador interveio também Fernando Nobre, que haveria de concorrer a Presidente da Republica e a deputado por lista de Passos Coelho, renunciando ao mandato quando este não conseguiu fazê-lo eleger presidente do Parlamento.

(vi) Na conferência de Pedro Lains a que aludo a seguir este investigador afirmou que foi a Alemanha a sugerir o convite ao FMI.

Nova visão dos países emergentes

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Até à crise financeira de 2008 falava-se apenas de “países emergentes” que eram vistos como possíveis novos mercados dinâmicos e locais competitivos para a terceirização; isto enquanto se incentivavam as empresas ocidentais, incluindo as PME, a reorganizarem-se em torno desse novo mundo emergente, tido como a nova locomotiva da economia global.

Mas desde a crise financeira de 2008-2011, com o lançamento em 2009 dos BRICS e a sua expansão para África em 2011, e mais claramente desde a crise da Covid-19, o mundo entrou em estado em convulsão.

O “Sul Global” que, entretanto, emergiu, é mais conflituoso com o Ocidente (de que é claro exemplo a oposição do G7 aos BRICS no seio do G20), mais nacionalista e protector, é globalista (Sul “global”), mas por uma globalização económica “moderada” – no sentido soberanista, de deixar aos estados um importante papel regulador discricionário na gestão dos fluxos de bens e capitais –, como é preconizado pelo economista Dani Rodrik.

Perante os dados prospectivos para 2024, publicados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) em Janeiro deste ano, que, devido à resiliência maior do que a esperada na economia norte-americana e a vários grandes mercados emergentes e economias em desenvolvimento, bem como apoio fiscal na China, estimam um crescimento de 3,1% (0,2% acima da perspectiva apresentada três meses antes) para o ano em curso e de 3,2% para o ano seguinte, revela-se inequívoco o sentimento de recuperação do poder do Sul Global e explicam em grande parte porque é que o mundo emergente parece mais sólido e atraente que nunca, agora que o PIB – calculado com base nas taxas de paridade do poder de compra (PPC) das moedas – dos chamados países “avançados”, ou seja, o mundo ocidental mais o Japão, caiu de 61 para 37% do total, uma queda relativa de 24 pontos que corresponde exactamente ao ganho registado pelo mundo em desenvolvimento.

Esta inversão, alcançada em apenas duas gerações, representa uma redução de quase metade do peso dos países ricos e o inverso para os seus concorrentes do Sul e demonstra claramente que estes têm agora peso significativo nos principais equilíbrios económicos do mundo, mesmo que isso esteja muito longe de ser o caso em áreas tão cruciais como o da moeda e das finanças globais, o do comércio mundial ou, finalmente, o das tecnologias de ponta, que são precisamente as áreas onde agora também estão a tentar marcar posição.

Observado em termos continentais, o peso da Ásia em desenvolvimento aumentou de 9% para 36% do PIB global, um ganho de 27 pontos que ultrapassa o ganho total do mundo em desenvolvimento; só a China ganhou 17 pontos, aos quais podemos acrescentar os 6 pontos da Índia, contrabalançando a queda da América Latina, cujo peso relativo no PIB global cai de 12% para 7%. Outros perdedores foram a Europa Oriental e Mediterrânica (incluindo a Turquia), que perde 2 pontos e cai para 7% do PIB mundial e o Médio Oriente e a Ásia Central, considerados em conjunto devido ao peso dos hidrocarbonetos nas suas economias, que também diminuíram ligeiramente de 9% para 8% do PIB global.

Por último, o continente africano manteve os seus cerca de apenas 3% do PIB mundial, apesar de a sua população ter mais do que duplicado durante este período, o que ilustra claramente o drama de um continente sob forte pressão demográfica, que se traduz na multiplicação de crises políticas em quase todo o lado, da Etiópia ao Sudão, passando pelo Congo, pelo Sahel e até pelo Senegal.

Dito isto importa referir a distorção nestes resultados introduzida pelo peso excessivo dos gigantes China e Índia, que sozinhos representam quase 40% da população mundial, mesmo sabendo-se que, isoladamente, nenhum deles tem muito peso contra os países do Norte e que a sua rivalidade está em crescendo e a tornar-se sistémica, factos que os levam a procurar o apoio do resto do mundo em desenvolvimento.

Toda esta dinâmica ajuda a compreender melhor a convulsão em curso na cena económica e geopolítica internacional, onde os países emergentes ou em desenvolvimento já não querem ser simples peões no tabuleiro de xadrez de uma divisão internacional do trabalho, gizada para exclusivo benefício dos países ricos e sustentada pelas regras do jogo que eles definidas e aplicadas pela OMC (Organização Mundial do Comércio) ou o FMI.

Tradicionalmente divididos, os países em desenvolvimento parecem estar a aproveitar a oportunidade da inversão do equilíbrio de poder, avaliado em termos de peso e dinamismo económico, para se unirem (componente geopolítica) e implementarem um novo estilo de estratégias económicas mais voluntariosas.

Governo de Timor-Leste, FORGES, UNTL, UNDIL, UCT e a lusofonia

O Ministro do Ensino Superior, Ciência e Cultura (MESCC) de Timor-Leste recebeu uma Delegação composta pela Presidente da Direcção da FORGES e pelas reitorias da Universidade Nacional de Timor Lorosa´e (UNTL), da Universidade de Díli (UNDIL) e da Universidade Católica Timorense (UCT).

A visita a Timor-Leste realizada esta semana por Margarida Mano, Presidente da Direcção da FORGES, uma rede que engloba 78 universidades e quase 500 membros individuais da CPLP, na opinião generalizada dos protagonistas envolvidos, contribuirá de forma indelével para o aumento das expectativas que se colocam em relação à consolidação e ao desenvolvimento da língua portuguesa no país.

Efectivamente, tal como aconteceu no passado durante a luta de libertação nacional em que toda a resistência (Resistência Armada, Frente Clandestina e Frente Diplomática) se uniu em torno da língua portuguesa para a libertação nacional do país ocupado e anexado pela Indonésia, foi visível pelas atitudes do MESCC, da FORGES e das três universidades, o entendimento consensual sobre a importância da continuação da defesa intransigente do desenvolvimento da língua portuguesa nas Instituições de Ensino Superior (IES) e em Timor-Leste.

As três universidades, UNTL, UCT e UNDIL, assumiram na prática o raciocínio de que a língua portuguesa representa uma vantagem estratégica no contexto geográfico e político onde Timor-Leste se insere, por ser uma língua internacionalmente falada por 260 milhões de pessoas, sendo o 4º idioma mais usado em todo o mundo, depois do mandarim, inglês e espanhol.

Numa outra perspectiva, pela primeira vez na história do ensino superior em Timor-Leste, as três universidades do país que mais demonstram defender a língua portuguesa (UNTL, UNDIL e UCT) uniram-se e apresentaram à FORGES – Fórum de Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa uma proposta para que a realização da 15ª Conferência da FORGES se realize em Timor-Leste, em Novembro de 2025.

Neste sentido, a Associação FORGES, a UNTL, a UNDIL e a UCT, ao confirmarem a promessa do apoio total do MESCC à iniciativa conjunta, irão posteriormente efectuar uma campanha de socialização para envolver todas as Instituições de Ensino Superior (IES) de Timor-Leste interessadas em participar na 15ª Conferência da FORGES.

Uma outra consequência positiva desta acção conjunta resulta do facto das três universidades ficarem mais próximas para outros desafios, havendo condições objectivas para o estabelecimento de parcerias ao nível da cooperação institucional, bilateral e multilateral, no quadro da formação avançada e da investigação científica, numa perspectiva de aproveitamento de sinergias para o desenvolvimento do ensino superior nos seus três pilares fundamentais que são o ensino, a investigação e a extensão/serviços comunitários.

Realmente, um grande desafio que se coloca às IES do país passa pela criação de grupos de investigação, na optica de investigação multicêntrica, envolvendo as três universidades e/ou outros membros do Fórum de Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa.

A minha preocupação sobre esta questão assenta em observações empíricas que reflectem a ideia, segundo a qual,  na maior parte das instituições de ensino superior do país não há cultura de investigação, portanto, impõe-se a necessidade de investir na investigação científica, proporcionando um trabalho de colaboração fundamental para o desenvolvimento de estudos ao nível nacional, partilha de dados, conhecimentos e recursos e várias naturezas.

A importância da audiência concedida pelo ministro do Ensino Superior, José Honório da Costa Pereira Jerónimo, foi demonstrada pelo alto nível de participação dos representantes das três universidades e da própria equipa ministerial, mas, acima de tudo, pelo apoio declarado pelo Governo à realização da 15ª Conferência da FORGES em Timor-Leste, resultante da proposta conjunta apresentada pela UNTL, UNDIL e UCT, à FORGES, em Novembro de 2023.

Dos técnicos especialistas e académicos presentes, para além de Margarida Mano (FORGES – Fórum de Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa) e dos reitores das três universidades, João Soares Martins (UNTL), José Agostinho da Costa Belo Pereira (UNDIL) e Joel Casimiro Pinto (UCT), participaram no encontro Maria Filomena Lay (Directora-Geral do MESCC), Edmundo Viegas (Assessor do MESCC), Rita de Morais (Assessor do MESCC), João Câncio (UCT) e M. Azancot de Menezes (UNDIL e FORGES), e técnicos superiores do MESCC.

 

Presidente da FORGES visitou as três universidades

Após o encontro com o ministro do Ensino Superior, Ciência e Cultura, a Presidente da FORGES foi convidada a visitar as três universidades, primeiro a UCT, depois a UNDIL e por último a UNTL.

Margarida Mano (Presidente da FORGES) e José da Costa Belo (Reitor da UNDIL)

As reuniões foram muito úteis e, acima de tudo, fundamentais para dar a conhecer a FORGES no sentido de se perceber a estratégia desta importante rede que integra 78 universidades e cerca de 500 membros individuais da CPLP.

É importante colocar em relevo que a FORGES, em Novembro de 2023, juntou presencialmente 34 universidades da CPLP para assinarem a importante Carta da Rede de Sustentabilidade, onde se incluem da parte de Timor-Leste, a UNTL e a UNDIL.

Com a subscrição da Carta de Sustentabilidade da FORGES, assumiram-se vários princípios de acção alinhados com os Objectivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), desde logo, o compromisso institucional segundo o qual as IES subscritoras devem demonstrar através de documentos institucionais e da prática diária o compromisso com os princípios e a prática do desenvolvimento sustentável.

Sobre esta matéria não posso deixar de compartilhar que o Reitor da Universidade de Díli, imbuído deste pensamento inerente à importância da sustentabilidade, produziu um despacho reitoral e foi criado o Comité de Sustentabilidade da UNDIL, portanto, um primeiro passo concreto para consubstanciar a estratégia da FORGES.

Para o cumprimento cabal dos ODS, neste processo coordenado por Marcelo Bezerril (Universidade de Brasília), numa visão holística, foram definidos outros princípios de acção, conforme expressa a Carta, nomeadamente, a «promoção da ética para a sustentabilidade», a «actuação na formação para a sustentabilidade», a «disseminação do conhecimento», a «cooperação e parcerias» e a «transferência de tecnologia».

Por uma consciência anti-racista e democrática

Na altura em que, no início dos anos 1970, frequentava em Lisboa o então Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, tive ocasião de conhecer muitos colegas oriundos de Angola e Moçambique, que se mantinham a par do que se passava nas suas terras(i). Um deles informou-me que a candidatura aos órgãos dirigentes da associação académica da universidade da então Lourenço Marques se havia efectuado sob a palavra de ordem “Por uma consciência anti-racista e democrática”. Palavra de ordem avançada na altura e que ainda hoje, em Portugal e em muito diferentes tempos, poderia funcionar como bandeira para agrupamento de pessoas com rectas convicções.

A Constituição da República Portuguesa, aprovada em 1976 e revista em vários momentos, salvaguarda estas preocupações:

Artigo 13.º
(Princípio da igualdade)

1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.

 
Artigo 15.º
(Estrangeiros, apátridas, cidadãos europeus)

1. Os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português.
2. Exceptuam-se do disposto no número anterior os direitos políticos, o exercício das funções públicas que não tenham carácter predominantemente técnico e os direitos e deveres reservados pela Constituição e pela lei exclusivamente aos cidadãos portugueses.
3. Aos cidadãos dos Estados de língua portuguesa com residência permanente em Portugal são reconhecidos, nos termos da lei e em condições de reciprocidade, direitos não conferidos a estrangeiros, salvo o acesso aos cargos de Presidente da República, Presidente da Assembleia da República, Primeiro-Ministro, Presidentes dos tribunais supremos e o serviço nas Forças Armadas e na carreira diplomática.
4. A lei pode atribuir a estrangeiros residentes no território nacional, em condições de reciprocidade, capacidade eleitoral activa e passiva para a eleição dos titulares de órgãos de autarquias locais.
5. A lei pode ainda atribuir, em condições de reciprocidade, aos cidadãos dos Estados membros da União Europeia residentes em Portugal o direito de elegerem e serem eleitos Deputados ao Parlamento Europeu.

Artigo 33.º
(Expulsão, extradição e direito de asilo)

1. Não é admitida a expulsão de cidadãos portugueses do território nacional.
2. A expulsão de quem tenha entrado ou permaneça regularmente no território nacional, de quem tenha obtido autorização de residência, ou de quem tenha apresentado pedido de asilo não recusado só pode ser determinada por autoridade judicial, assegurando a lei formas expeditas de decisão.
3. …
4. …
5. …
6. …
7. ….
8. É garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência da sua actividade em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana.
9. A lei define o estatuto do refugiado político.

Artigo 46.º
(Liberdade de associação

1…
2. …
3. …
4. Não são consentidas associações armadas nem de tipo militar, militarizadas ou paramilitares, nem organizações racistas ou que perfilhem a ideologia fascista.

Mais recentemente a Lei da Nacionalidade foi alterada para reintroduzir um elemento de jus soli, permitindo reconhecer a nacionalidade portuguesa aos filhos de imigrantes nascidos em Portugal, antes mesmo de atingirem a maioridade. O abandono do princípio do jus soli, tradicional em Portugal, foi uma consequência do reconhecimento da independência das colónias portuguesas e da preocupação, que julgo era partilhada por todos os novos estados independentes, em não favorecer a reivindicação de estatutos de dupla nacionalidade(ii). Tanto quanto percebi, a alteração deve muito aos esforços de Rui Pena Pires, professor do ISCTE-IUL, para ultrapassar problemas de integração de jovens cujos pais tinham imigrado dos PALOPs para Portugal, o qual, se bem me lembro, dava o exemplo de o acesso ao desporto federado, via muito almejada de iniciação profissional,  só ser consentido a quem detivesse a nacionalidade portuguesa.

Rui Pena Pires (observatório da emigração)

Rui Pena Pires, para além de sociólogo, é um português que nasceu em Angola, e julgo que se pode dizer um exemplo de quem promove uma consciência anti-racista e democrática.

É claro que em diversos países que seguiram o mesmo caminho, se pensa hoje em inverter a evolução.

Temos vivido até agora com o Acordo celebrado por Marcelo Caetano com o Brasil, que permitiu a possibilidade de concessão de dupla nacionalidade com igualdade de direitos. A imigração de Cabo Verde e dos restantes países da agora comunidade dos países de língua portuguesa levantaria sempre problemas potenciais de integração. Reconheça-se entretanto que Portugal historicamente teve em muitas ocasiões, mesmo após as independências, emigrantes seus no Brasil e recentemente até em Angola. Pelo menos no caso dos países de língua portuquesa, perceber-se-á que não se pode fazer voltar os imigrantes à “terra deles”, ainda que se revelem “indesejáveis.”(iii). Pena é que os Estados Unidos façam regressar aos Açores imigrantes que nada conhecem das ilhas.

Já disse uma vez aqui que é natural que a seguir às independências / libertações, os habitantes dos países colonizados / ocupados tendam a escolher o antigo colonizador / ocupante como destino preferencial de emigração. Foi o que se verificou com os países da Comunidade Britânica e o Reino Unido, a antiga África francesa e a França, a Albânia e a África fugazmente controlada pelos italianos e a Itália, as ex-colónias holandesas e os Países Baixos, e a própria emigração turca se dirigiu para a antiga aliada Alemanha. Sucedeu o mesmo com Portugal, com a peculiariedade de como país há muito dependente, sermos simultaneamente um país de imigração e de emigração.

O estarmos colocados no extremo ocidental da Europa tem dado origem a que parte da emigração legal e clandestina para Portugal vise o progresso para outros países mais desenvolvidos da Europa. Isso foi por exemplo evidenciado pelo “desaparecimento” de alguns dos marroquinos que vieram de Mazagão até à costa do Algarve de barco, e pelas críticas à circunstância de a autorização de residência em Portugal para imigrantes da CPLP não dar acesso a outros países da Europa.

Nem na Constituição da República Portuguesa nem nas leis europeias está, julgo, consignado ser “Inegável a tendência consensual do papel histórico das migrações no desenvolvimento global da espécie humana, factor incontornável na fundação e desenvolvimento de países, nações, culturas, línguas e impérios – civilizações. Incontornável e irreversível, queiram ou não queiram os cruzados de todos os matizes e culturas.”, a que se referia um amigo que comentou o meu Revisitando Filhos da Terra, de António Manuel Hespanha (1945-2019).

A meu ver, importaria encontrar alguma regulamentação satisfatória em três aspectos:

  • desligar a aceitação do pedido de autorização de residência para trabalhar dos pedidos de concessão de asilo;
  • evitar que o influxo de mão de obra imigrante se traduza em perdas de empregos acessíveis aos nacionais ou aos imigrantes já no país, ou em criação de pressões para a manutenção de salários baixos;
  • clarificar o grau de exigência de adesão dos imigrantes aos usos e costumes do país de acolhimento.

Desligar emigração económica e procura de asilo pode parecer fácil no papel, em teoria bastaria à partida excluir pedidos formulados por nacionais de um grande número de países, mas nestas matérias existe sempre a possibilidade de se desconsiderarem casos individuais relevantes; entretanto, a reserva das decisões aos tribunais, com exclusão da possibilidade de deportação por mera decisão administrativa, tem constituído um incentivo a esquemas engenhosos de “parqueamento” de migrantes em países terceiros subsidiados (Turquia, Albânia(iv), Ruanda).

A utilização da mão de obra imigrante para manter os custos de produção baixos e os lucros altos está dentro da lógica do sistema, e terá sido essa uma das razões que levaram, não muito racionalmente, ao enraizamento da extrema direita em alguns países e zonas de imigração. Poderia ser ensaiada a incidência de uma tributação adicional sobre os empregadores de imigrantes, consignada por exemplo a um subsídio ao alojamento, mas a experiência estará a mostrar, pelo menos em Portugal, que a fiscalização no terreno nem sequer consegue garantir o pagamento do salário mínimo.

Quanto à adesão dos imigrantes aos usos e costumes do país de acolhimento, já estará a cair a “reivindicação” de que os imigrantes falem em público a língua do país de acolhimento e, em Portugal, não temos tido muita controvérsia interna sobre os trajes de cada um(v).

Constança Urbano de Sousa (Assembleia da República)

A criação de uma Agência para as Migrações e consequente transferência de competências policiais do SEF para as polícias já existentes estaria, pelo que foi recordado, dentro das orientações sufragadas pelo PS, mas durou três ministros da Administração Interna a concretizar – Constança Urbano de Sousa que tinha um perfil academicamente indicado para o efeito mas foi incapaz de desbloquear os problemas das outras polícias e acabou por ser chamuscada pelos grandes incêndios florestais de 2017, Eduardo Cabrita, estudioso de regionalizações e descentralizações, que tomou conta da Administração Interna e teve a coragem de denunciar o caso Igor, José Luís Carneiro. A incapacidade de a operacionalizar antes do fim do ciclo político é contudo uma falha que deve ser imputada a António Costa. Bem sei que não havia pressa por até ter uma maioria absoluta. Tinha uma maioria absoluta.

Tomando nota de todos os que à direita, do PSD ao Chega, desejam introduzir políticas e quotas de imigração, seleccionando os candidatos mais “convenientes”, faço notar que enquanto a Agência não estiver operacionalizada será muito difícil preparar e aplicar políticas migratórias, quaisquer que elas sejam. O sentimento de que nesta matéria estamos sem rei nem roque talvez venha a desfazer-se a curto prazo.

Diz-me entretanto a minha sensibilidade que seria preferível diversificar as origens dos migrantes, e tanto quanto possível encorajar as vindas de que tem alguma relação anterior com o País. Quando uma comunidade de imigrantes começa a crescer numericamente, logo aparece gente a falar de “ invasão”, esquecendo-se curiosamente o que se disse em tempos dos “invasores” anteriores(vi). Os inimigos agora já não devem ser procurados e abatidos no Bairro Alto, ainda que tenham cidadania portuguesa, mas no Martim Moniz e na Rua do Benformoso. Não são pretos mas castanhos. E são tomados como alvo não em função da sua nacionalidade mas em função da sua religião. E não é apenas o grupo a que me referi no artigo Por uma Polícia Preventiva, mas toda uma série de “activistas” que fui conhecendo no Facebook ligados a outros projectos e que agora alinham na denúncia da “ameaça islâmica”, isto sem falar no “grande dirigente” que perora sobre a nossa “matriz judaico-cristã” sem mencionar as nossas também raízes islâmicas, aliás Constança Urbano de Sousa referiu em entrevista recente que a opção entre conversão ou saída foi “oferecida” por D. Manuel I simultaneamente a judeus e a muçulmanos.

Google

Não sei se a presença de 60 mil imigrantes do Bangla Desh (“Bengala Livre”) que se separou há 52 anos do Paquistão com a ajuda do exército da Índia cria algum incómodo em Portugal. Um articulista do Jornal Tornado publicou em tempos um texto sobre essa separação (O Bangladesh, cinquenta e dois anos depois) chamando a atenção para que no Bangla Desh a religião muçulmana é seguida com menos radicalismo que noutros países(vii). De qualquer modo sou nacionalista quanto baste, e nessa qualidade rejeito uma agenda que me apercebi há dias vir de Itália, em que Meloni e Salvini estão a procurar capitalizar politicamente os mesmos medos e a criar entraves à celebração de cerimónias de culto por parte da comunidade bengali argumentando desta vez com o respeito pelos usos e costumes da Itália católica.

 

Notas

(i) Pessoalmente, não tive muito contacto com estas realidades: em 1969, com outros alunos liceais, frequentei um Curso de Estudos Ultramarinos que me valeu a mim e a outros colegas uma viagem de Verão a Moçambique, saltando entre capitais de distrito, com regresso por Luanda capital de uma Angola que já tinha sido visitada por colegas que haviam frequentado o mesmo curso.

(ii) Não conheço a realidade brasileira. Dos restantes países da actual CPLP fiquei a conhecer Cabo Verde, Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe e Angola através de cooperação – consultoria e formação no domínio das Finanças Públicas. Não se trata de actividade que recomende para quem está na primeira parte da carreira, mas pelo menos procurei conhecer os sistemas implementados pós-independência e valorizar as soluções encontradas pelos quadros locais, competentes e empenhados. A adopção de medidas de descongestionamento da Administração Pública cabo-verdiana, copiadas de Portugal, através de aposentações antecipadas, foi dos maiores crimes que se poderiam cometer num país com falta de recursos humanos.

(iii) Não percebi ainda se a involução que neste domínio se pretendeu consagrar em França passou no controlo de constitucionalidade. É claro que quando um crime é cometido por um soit disant “radicalizado” logo se ia ver se era argelino, tunisino ou marroquino, e quando se percebeu que começavam a aparecer jovens com a nacionalidade francesa, quis-se fazer marcha atrás. Já o Reino Unido não se ensaia em retirar a nacionalidade aos indesejáveis e convertê-los em apátridas. Portugal, que tem outras opções constitucionais, lá tem vindo a julgar os que são seus nacionais.

(iv) Por muito que Georgia Meloni tenha percebido que a chave da questão seja o desenvolvimento de África, ou pelo menos que seja politicamente correcto dizê-lo.

(v) É certo que apenas tenho praticamente a experiência dos transportes públicos da área da Grande Lisboa, em que ninguém interfere com o vizinho do lado, a não ser, muitas vezes, para lhe oferecer o lugar, sendo o Metropolitano de Lisboa o exemplo mais acabado de variedade de trajes.

(vi) Há dias estava a tomar café perto da minha residência na margem sul e ouvi na mesa do lado uma senhora, mais idosa do que eu, dizer que “os africanos são mais humildes”. Isto não se diria possivelmente nas primeiras chegadas de cidadãos dos novos estados africanos após a independência mas tomei-o como reconhecimento de uma postura de maior deferência para com os idosos.

(vii) Nada me atraindo particularmente para o convívio com a comunidade bengali, não deixarei de referir que nos últimos meses tenho frequentado as bibliotecas do Ministério das Finanças no Terreiro do Paço e almoçado em restaurantes do Campo das Cebolas reconvertidos, em que um é gerido por pessoas do Bangla Desh e o outro conta com vários bengalis no seu pessoal. Trabalham, ganham honestamente a sua vida, e esforçam-se por falar português. É claro que para lidar com o turismo estão mais apetrechados que os portugueses, uma vez que dominam o inglês…

Direito à greve de polícias e animais

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O partido de André Ventura propõe no seu programa eleitoral que os polícias possam fazer greve e que devem ter o direito de se filiarem num partido político. De acordo com constitucionalistas, a Constituição não proíbe o direito à greve, mas, quanto à filiação partidária, consideram haver um claro conflito de interesses.

No que ao direito à greve diz respeito, estranha-se muito que o CHEGA copie uma proposta do PCP que já antes da famosa reivindicação de 21 de abril de 1989, que ficaria conhecida como a manifestação dos “secos e molhados” devido à carga policial de polícias contra polícias com uso de canhões de água, determinada pelo Governo do PSD de Cavaco Silva e cujas imagens correram o mundo, a defendia.

O proto-candidato presidencial, Marques Mendes, no seu espaço de comentário de domingo à noite, mostrou-se horrorizado por tal proposta, considerando-a inaceitável e totalmente despropositada, que poderia pôr em causa a segurança nacional, e o candidato a deputado e salivador por se poder unir a uma coligação pós-eleitoral com a AD e chegar ao Governo da República como ministro de um novo ministério, o Ministério da Privatização Absoluta, Rui Rocha, sem óculos e com aspecto ainda mais queque (“queque” é um termos mais usado do que “beto” na cidade do Líder da IL, Braga), sem conseguir, mesmo assim, atingir o aspecto aristocrato-lambido de Cotrim de Figueiredo (depois de tirar os óculos, RR (não confundir com Ricardo Reis, heterónimo pessoano que defendia o desprendimento total de bens materiais, ao contrário de Rui Rocha que defende a acumulação de bens materiais sobretudo para quem já muitos possui) talvez pudesse acrescentar à cara uma barba de lixa como a do seu antecessor), disse ao “Jornal de negócios” que “É uma total insensatez. É absolutamente contrário aos interesses do país e aos interesses de segurança dos portugueses” e acrescenta: “Ora eu pergunto: se as forças policiais decretarem uma greve, se isso fosse possível – eu espero que nunca seja – os criminosos fazem greve? Os criminosos deixam de praticar crimes?”. Bem, neste ponto, eu acho que o Chega poderia também propor o direito à greve dos criminosos, que deveria, obrigatoriamente, coincidir com os períodos de greve dos polícias, e quanto à filiação partidária dos criminosos não me parece necessária porque a grande maioria deles ostenta orgulhosamente a sua ligação partidária, sobretudo aos dois maiores partidos do país, PS e PSD (e não me alongo sobre exemplos para não me estender em demasia, mas deixo uma questão: quem é mais incompetente: o Ministério Público que acusa ou os juízes que removem prisões preventivas e que consideram que não há quaisquer indícios dos crimes por que são indiciados as figuras de PS e PSD, tanto em Portugal continental como na Madeira?). E acrescento ainda: assim como a IL e Rui Rocha pretendem, de acordo com o seu programa eleitoral e com as palavras por si afirmadas nas rádios e televisões, a privatização do SNS e da Escola Pública (igualzinho ao primeiro Programa eleitoral do CHEGA), porque não proporem também a privatização das Polícias? Provavelmente, acabavam-se as greves e poderíamos voltar aos saudosos dias para esta gente dos tempos anteriores ao 25 de Abril de 1974, data que, sempre que ouve disparates como estes, deve chorar de tristeza e de vergonha, apesar de estar quase a fazer 50 anos.

Depois de Ventura copiar uma iniciativa que visa o direito à greve por parte dos polícias ao PCP (algo que grande parte dos polícias, incluindo os do “Movimento Zero”, desconhecem), parece que Inês Sousa Real, líder do PAN (Pessoas, Animais, Natureza), se apresta para usar esta ideia nos próximos dias de campanha eleitoral, fazendo a Ventura o que Ventura fez ao PCP. Assim, Inês Sousa Real e o PAN, depois da ideia de criarem um SNS para gatos e cães, ainda no tempo da liderança de André Silva, querem que os animais possam também ter direito à greve, filiar-se em partidos políticos e ter direito a voto.

Segundo fontes bem colocadas dentro do partido, Inês Sousa Real considera que os cães domésticos deveriam poder fazer greve e deixar de lamber os seus donos nas mãos, nas faces e nos lábios (há gostos para tudo) se, em vez do “gourmet gold” com delicioso sabor a costeleta de borrego, não lhes puserem no prato um bife do lombo e se não lhes puserem o prato na mesa onde a família faz as suas refeições; os cães pisteiros da polícia deveriam fazer greve ao farejamento de pistas se os polícias continuassem a apoiar o CHEGA ou outros partidos que não o PAN; os gatos deveriam fazer greve ao ronronar e não se deveriam deixar ficar no colo dos seus donos nem se deixarem acariciar pelos mesmos e ameaçariam atacar, selvaticamente, cortinados e sofás; canários e periquitos deveriam deixar de cantar se não tivessem direito à liberdade e pudessem voar livremente para onde desejassem e fazer aquilo que os pássaros livres mais gostam de fazer: lançar do ar, em pleno voo livre, cagadelas ácidas que corroem pintura e chaparia de carros e pintam cabelos desprevenidos de transeuntes de olhos nos ecrãs dos telemóveis; os porquinhos-da-Índia deveriam poder fazer greve à sua fofíssima forma de ser e passarem a ameaçar roer os móveis da casa  porque, sendo da Índia, é bem provável que um Governo AD apoiado pelo Chega os considere imigrantes sem contrato de trabalho e acabem por ser repatriados para o seu país, a Índia; coelhos, porcos, salamandras, camaleões, cobras, furões, hamsters e outros que desconheço, como não fazem nada de especial, acho eu, deveriam fazer greve ao nada fazer por solidariedade com os outros animais. Eu acho é que o PAN deveria repensar a proposta de filiação partidária e de voto dos animais porque, considerando que são todos animais irracionais, o mais provável é que se viessem a filiar e a votar no mesmo partido em que alguns ditos animais racionais que agem como irracionais votam: no CHEGA.

Pode o Carnaval acabar num incidente diplomático?

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Foi no Carnaval de 2020 que, pela primeira vez, se ouviu falar do “Carnaval Brasileiro de Lisboa”. E pelos piores motivos. Basicamente, um grupo de cidadãos brasileiros, certamente pouco conhecedores dos usos e costumes, ou mesmo das leis, do país onde escolheram viver, deu largas à sua alegria carnavalesca interrompendo a circulação automóvel numa área da capital portuguesa denominada Cais do Sodré. Ou como os lisboetas dizem, “Caixodré”. Tudo acabou com uma intervenção policial que repôs a ordem pública no “Caixodré” e que resultou em duas detenções. Coisa pouca, mas há outros números mais relevantes.

Números antes do Carnaval

Residem legalmente em Portugal um pouco mais de 780.000 estrangeiros, cerca de 8% da população do país. Desses, uma percentagem a rondar os 30% são brasileiros. Para se ter uma ideia do peso da comunidade brasileira no conjunto dos estrangeiros residentes no país, no final de 2022, contavam-se cerca de 239.000 brasileiros, ficando a segunda comunidade mais numerosa, constituída por cidadãos do Reino Unido, a larga distância, com 45.000 indivíduos. Aliás temos de juntar os cidadãos de todas as nacionalidade de países europeus a viver em Portugal, para ultrapassar o número de brasileiros.

Cerca de 40% dos estrangeiros habitam no distrito de Lisboa, o que faz com que a percentagem de estrangeiros a nível distrital seja superior à verificada a nível nacional, cifrando-se nos 13% do total da população. Mas fiquemos pelo óbvio: os brasileiros constituem a maior comunidade estrangeira em Portugal, concentrando-se principalmente, e como será natural, em torno de Lisboa. E querem celebrar o Carnaval na cidade!

E os lisboetas?

Não será exagero reconhecer que os Lisboetas não são grandes adeptos do Carnaval, que aliás nem é um feriado oficial no país.

Manda a tradição que o governo conceda “telerância de ponto” nesse dia. E é assim, graças ao feriado oficioso de terça-feira de Carnaval, que muitos trabalhadores arranjam forma de beneficiar de um fim de semana alargado, altura aproveitada por muitos lisboetas para passear, descontrair na cidade ou gozar o Carnaval. Longe de Lisboa…

Tudo reunido, o Carnaval acaba por proporcionar uma espécie de turismo interno sazonal, importante para a economia para pequenas localidades não muito longe de Lisboa onde, ao contrário da capital, o Carnaval tem tradição, como Sesimbra ou Vedras, que acolhem muitos Lisboetas. Mas apesar desse movimento a verdade é só uma: assim que deixam de ter idade para a fantasia na escolinha, os lisboetas gostam mais das pequenas férias do que da efeméride carnavalesca propriamente dita.

A razão do desinteresse dos lisboetas em relação ao Carnaval, ao ponto de os que o gostam de celebrar o fazerem longe da cidade, é uma realidade para o qual não existe uma explicação evidente. Talvez porque a população de Lisboa sofra já o suficiente com o facto de o país ser, quase literalmente, um rectângulo com algumas centenas de quilómetros de comprimento por ainda menos de largura, servido por uma boa rede de estradas. Como resultado, tudo o que é protesto, manifestação, etc., concentra-se na capital do país, atazanando a vida do lisboeta que, terminado um dia de trabalho, gostaria naturalmente voltar para a paz do seu lar, levar tranquilamente as crianças ao judo ou ao curso de teatro, enfim, desfrutar do seu dia a dia sem que a manifestação do sindicato dos técnicos oficiais de contas canhotos cause transtorno às suas vidas. Na realidade, se juntarmos aos protestos por tudo e mais alguma coisa os jogos da champions League do Benfica, os concertos, festivais e outros grandes eventos (basta recordar a “fuga dos lisboetas” durante as Jornadas Mundiais da Juventude católica no ano que passou…), temos de reconhecer que o pessoal de Lisboa já tem a sua dose e talvez seja complicado juntar mais um evento… Mas isto é tudo “talvez”, pois a verdade é que nós (sim, sou um lisboeta) não somos grandes fãs do Carnaval, ao ponto de haver um nicho de negócio para locais de diversão nocturna que nesses dias/noites, para atrair cliente, ignoram completamente que o Carnaval existe…

E os brasileiros?

Os nossos amigos brasileiros referem a existência de 15 grupos ou “blocos” que, na cidade ou arredores, pretendem desfilar nesse evento a criar: O  Carnaval em Lisboa! Mas a lei do país, e do município, indica que tal não pode ser feito de forma, digamos que espontânea, o que acontece, por exemplo, para eventos de cariz político.

Depois do desastre de relações públicas ocorrido no “Caixodré”, aproveitado inclusive por forças anti-imigração para a sua publicidade xenófoba segunda a qual os imigrantes não querem cumprir a lei como qualquer organização da cidade que promova eventos festivos no espaço público, a única solução passa naturalmente por deixar de lado uma certa informalidade e realizar o evento respeitando todos os regulamentos e o pagamento de todos os serviços previstos na lei.

O município de Lisboa até isentou o evento em projeto das taxas camarárias, mas os custos inerentes ao corte de trânsito, policiamento, WCs amovíveis, seguros de responsabilidade civil, etc., etc, teriam de ser suportados pela organização, num orçamento final estimado em 20 mil €uros, que os promotores alegam não ter possibilidades de suportar.

E entra o desfile político

Em julho de 2023 o tal conjunto de blocos entregou uma petição na Assembleia Municipal de Lisboa na qual solicitava o empenho numa “política pública para o Carnaval na capital portuguesa”. O núcleo do Partido dos Trabalhadores brasileiros em Lisboa, referiu que o actual Presidente do Brasil, e o seu partido, estão solidários com a luta e que iriam intervir tendo em vista uma “resposta integrada”, admitindo mesmo a possibilidade de diálogo entre os governos dos dois países e o município de Lisboa. Já a Embaixada do Brasil em Lisboa, parece ter adiantado um apoio que convertido para Euros perfazia 5.000 Euros, um montante pouco compreensível pelo Lisboeta comum que vê os seus filhos a angariar, sem grandes dificuldades, um montante semelhante para as suas viagens de finalistas do ensino secundário…

A título de comparação, vivem pouco mais de 23 mil cidadãos chineses em Portugal, cerca de metade dos quais no distrito de Lisboa. Como fazem para pagar a “Festa da Primavera” que anualmente realizam em Lisboa por ocasião do ano novo chinês? Simples: o município de Lisboa dispensa as taxas e a Embaixada do país paga o grosso da fatura…

O mundo artístico também entrou em cena. Luca Argel, cantor e compositor luso-brasileiro há anos radicado em Portugal, cujos projetos, como refere no seu site, “conciliam pesquisa histórica, ativismo político e experiências musicais que desconhecem fronteiras”, foi a voz de ocasião, num discurso onde conceitos como ocupação simbólica do espaço público e reconciliação histórica ao estilo pós-moderno coincidem na defesa do apoio financeiro da cidade de Lisboa ao projeto, intenção que, nas redes sociais, mereceu o comentário lacônico dos lisboetas ao estilo “mais uma despesa para eu pagar…”. Entretanto, no grande desfile das escolas no Rio de Janeiro deste ano, Portugal, e um dos seus vultos culturais do país (Saramago) marcaram presença, facto usado para “exigir” uma certa reciprocidade entre os festejos de ambos os lados do Atlântico.

E porque não?

Sejamos sinceros: para o município de Lisboa, 20.000 Euros não é nada. Nem num contexto como o actual, com Lisboa transformada na “cidade na moda” da Europa, e que obriga o município a esforços extra ao nível das políticas de habitação (e que se têm revelado insuficientes), continua a ser pouco relevante. Claro que se colocam questões, como a do favorecimento. Porquê financiar o Carnaval brasileiro e não as festividades das outras comunidades? E seria exequível estar a fazê-lo para todas as comunidades? E porque não fazem os brasileiros como a comunidade chinesa? Será que quem está a promover uma “política pública para o Carnaval na capital portuguesa” não se esqueceu desse “pormaior” que é a vontade dos lisboetas, que vivendo na cidade com o PIB mais elevado do país, poderiam ter as festividades que quisessem mas, neste caso, preferem não ter?

Questões à parte, este lisboeta que é apenas mais um que não é grande adepto de “carnavais”, considera que sim. Se é importante para a maior comunidade estrangeira a residir na minha cidade e arredores poder comemorar esta ocasião ao estilo brasileiro, se isso contribui para a sua felicidade ou apenas para matar saudades, pois que o evento seja realizado!

Agora, por favor, lembrem-se de respeitar o direito inalienável da maioria em ignorar olimpicamente esta data, pelo que a escolha do local é relevante, e se pudessem vocês financiar a coisa também seria, digamos que, bem visto pelos lisboetas já cansados de tanto evento e manifestações.

Muito obrigado e bom Carnaval brasileiro de Lisboa em 2025!

Presidente da FORGES está em Timor-Leste

A Presidente da Direção da FORGES encontra-se em Timor-Leste. O sorriso estampado no rosto de Margarida Mano foi registado à saída do aeroporto de Díli.

De seguida descreve-se na íntegra a entrevista inédita realizada à Prof. Doutora Margarida Mano, logo no primeiro dia da sua chegada, a 25 de Fevereiro de 2024.

Senhora Presidente, qual é o objetivo desta Associação? O que representa a FORGES?

A FORGES – Fórum da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa é uma associação constituída em 2011, cuja principal missão é promover uma rede de colaboração, de estudo, investigação e de formação na área da gestão e das políticas de Ensino Superior no âmbito dos países e regiões de língua portuguesa.

Com a FORGES pretendeu-se criar e consolidar, uma rede, no espaço dos países e regiões de língua portuguesa, sensibilizando os decisores da política educativa, articulando e fazendo comunicar os membros dos órgãos de gestão das instituições de ensino superior, técnicos e responsáveis da administração ligada ao sector, e os investigadores cujo objeto de estudo fossem as políticas e a gestão do ensino superior, que contribuísse para a realização qualificada de mudanças transformadoras.

Graças à convicção, ao trabalho e ao envolvimento de muitos podemos dizer, com orgulho, que esse objectivo foi conseguido. A FORGES constitui-se como um polo de conhecimento de experiências e pessoas – académicos, dirigentes e profissionais – no que se refere aos modelos, teorias e políticas do Ensino Superior, com impacto para o desenvolvimento das instituições, países e regiões de Língua Portuguesa.

De concreto, o que é que têm realizado desde 2011?

Ao longo destes 12 anos a FORGES tem vindo a desenvolver actividades, criado espaços de reflexão e participação, nas Conferências Anuais, na Revista FORGES e na Academia FORGES, com webinars regulares, disponíveis no site www.aforges.org. Deste trabalho conjunto resultou a rede de que hoje nos orgulhamos, com mais de 60 associados institucionais, na sua maioria Instituições de Ensino Superior (IES), e 400 individuais, espalhados pelos 9 Países e Regiões de Língua Portuguesa: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Macau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

Timor-Leste está presente na FORGES. Desde quando e de que maneira se faz sentir a presença do nosso país na rede?

Timor-Leste tem tido uma presença que muito nos honra desde o início. Uma presença que se traduz pela participação regular nas Conferências anuais dos sucessivos Reitores da UNTL, de professores e investigadores que trabalham a gestão universitária e que aí apresentam os seus trabalhos, pela participação em webinars temáticos, etc. São associados institucionais da FORGES e membros da Rede de Sustentabilidade criada na 13ª Conferência FORGES, em novembro passado, a Universidade de Díli e a Universidade Nacional Timor Lorosa’e. Temos ainda tido o privilégio de contar com a presença na direção da FORGES do Prof. Doutor Manuel Azancot de Menezes, associado individual que tem ajudado nesta construção desde há muitos anos.

Encontra-se desde Domingo no nosso país onde ficará até ao próximo dia 1 de Março. Qual o motivo da visita da Presidente da FORGES a Timor-Leste?

Venho com a alegria e a satisfação de ajudar a tornar possível um sonho da FORGES e de Timor-Leste: realizar a 15ª Conferência FORGES, no próximo ano de 2025, em Díli.

A Universidade Nacional Timor Lorosa’e (UNTL); a Universidade Católica Timorense São João Paulo II (UCT) e a Universidade de Díli (UNDIL) manifestaram a sua intenção de, em conjunto com a FORGES, acolher a Conferência Anual. É um sonho de há algum tempo que agora parece ter condições de se concretizar. As três Universidades propõem-se envolver as restantes Instituições de Ensino Superior de Timor-Leste, em coordenação com o Ministério de Ensino Superior, Ciência e Cultura. Acreditamos todos que para além de contribuir para consolidar e desenvolver os laços de amizade entre os povos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, irá reforçar a cooperação da rede lusófona de ensino superior e investigação científica com as Instituições de Ensino Superior de Timor Leste.

Repare que a FORGES promoveu já 13 Conferências anuais, em diferentes Países e Regiões de Língua Portuguesa: Universidade de Lisboa e Universidade de Coimbra (Portugal, 2011), Instituto Politécnico de Macau (2012), Universidade do Recife (Brasil, 2013), Universidade Agostinho Neto – Luanda / Universidade MandumeYa Ndemufayo – Lubango (Angola, 2014), Universidade de Coimbra (Portugal, 2015), Universidade de Campinas (Brasil, 2016), Universidade de Maputo (Moçambique, 2017), Universidade de Lisboa (Portugal, 2018), Universidade de Brasília (Brasil, 2019), Universidade de Évora (Portugal, 2020), Setúbal (Portugal, 2021 em coorganização com o Instituto Politécnico de Macau), Universidade de Cabo Verde (Cabo Verde, 2022), Universidade  Católica Portuguesa (Portugal, 2023). A 14ª Conferência regressará este ano ao Instituto Politécnico de Macau.

13ª Conferência FORGES realizada na Universidade Católica Portuguesa

Nestes dias que vai estar em Díli que contactos vão ser estabelecidos? Que resultados e que projectos espera concretizar?

Será uma agenda cheia. O Senhor Ministro do Ensino Superior, Ciência e Cultura, Dr. José Honório da Costa Jerónimo, concede-nos uma audiência onde abordaremos a preparação da 15ª Conferência e outros projectos que a FORGES pode desenvolver com Timor-Leste. Teremos naturalmente contactos bilaterais com as Universidades organizadoras e procuraremos sensibilizar outros actores nacionais para se juntarem a este evento que será da maior importância no panorama do Ensino Superior da Língua Portuguesa.

Na sua perspectiva quais os principais desafios que as universidades de Timor-Leste em conjunto com a FORGES enfrentam?

A missão da FORGES assenta num tripé: Gestão; Ensino Superior e Língua Portuguesa.

A Língua Portuguesa é um activo estratégico que a FORGES elegeu como centro da sua acção. A Língua Portuguesa é hoje a língua mais utilizada no hemisfério sul, com 217 milhões de falantes, e a sexta língua mais falada em todo o mundo, por 260 milhões de pessoas espalhadas por quatro continentes.

Se olharmos para o passado e para o futuro vemos também o seu valor: foi a que teve um maior crescimento nos últimos 500 anos (a única, entre as línguas mundiais, que cresceu mais de 1% ano) e a concretizar-se o crescimento esperado a nível demográfico dos países africanos de expressão portuguesa e de Timor-Leste, praticamente duplicará o número de falantes de português no mundo. De acordo com as projecções demográficas das Nações Unidas a língua portuguesa será, a seguir à língua árabe, a língua materna que mais crescerá no século XXI. A língua portuguesa é ainda a quinta mais usada na Internet e a terceira nas redes sociais Facebook e Twitter.

Em simultâneo, o Ensino Superior tem particulares responsabilidades e compromisso na defesa da Língua Portuguesa e do seu papel na preservação da civilização e da cultura.

Portanto eu diria que a defesa da Língua Portuguesa é em simultâneo uma bandeira da FORGES e das Instituições de Ensino Superior de Timor-Leste que lutam pela sua afirmação. O principal desafio que se coloca a toda a CPLP é assumir uma Política de Língua Portuguesa que faça jus ao seu potencial.

Perda de poder de compra dos pensionistas

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Uma Lei injusta que impede a atualização das pensões não só no ano da reforma ou da aposentação, mas também no ano seguinte o que causou uma perda de poder de compra a todos os pensionistas, e ameaça os trabalhadores no ativo, mas que não mereceu qualquer atenção nos programas e debates eleitorais

Como agem os juízes?

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O Julgamento de Prometeu

Prometeu estava acorrentado a uma rocha no alto do monte Cáucaso, onde todos os dias uma águia devorava o seu fígado, que se regenerava à noite. Esse era o seu castigo por ter roubado o fogo dos deuses e dado aos homens, desafiando a vontade de Zeus, o rei do Olimpo.

Prometeu era um titã, um dos antigos deuses que governaram o mundo antes de serem derrotados pelos olimpianos, os novos deuses liderados por Zeus. Prometeu era considerado o benfeitor da humanidade, pois lhe ensinou as artes, as ciências e a civilização. Mas Zeus via os homens como seres inferiores e indignos do fogo divino, que representava o poder, a sabedoria e a criatividade.

Zeus ordenou que Prometeu fosse capturado e torturado eternamente, sem direito a defesa ou misericórdia. Mas Prometeu não se arrependia do seu ato, pois acreditava que tinha feito o bem aos homens e que Zeus era um tirano injusto e cruel.

Um dia, Hermes, o mensageiro dos deuses, foi enviado por Zeus para interrogar Prometeu. Hermes era o deus da comunicação, do comércio, dos viajantes e dos ladrões. Ele era astuto, eloquente e diplomático, capaz de persuadir e enganar com as suas palavras. Ele também era o único deus que podia transitar livremente entre o Olimpo, a Terra e o Hades, o reino dos mortos.

Hermes chegou ao monte Cáucaso e viu Prometeu acorrentado e ferido pela águia. Ele se aproximou e disse:

– Prometeu, eu vim em nome de Zeus, o senhor do Olimpo, para lhe fazer uma proposta. Zeus está disposto a perdoar o seu crime e libertá-lo das suas correntes, se você revelar o segredo que ele tanto deseja saber.

Ele também era o único deus que podia transitar livremente entre o Olimpo, a Terra e o Hades, o reino dos mortos.

– Que segredo é esse? – perguntou Prometeu, com um olhar desconfiado.

– Você sabe muito bem. Você sabe o que o destino reserva para Zeus e para os deuses. Você sabe quem será o filho de Zeus que irá destroná-lo, assim como ele destronou o seu pai Cronos, e Cronos destronou o seu pai Urano. Você sabe o nome do futuro rei do Olimpo. Diga-me, e eu lhe garanto que Zeus será magnânimo e clemente com você.

– Hermes, você é um deus inteligente e sagaz, mas também é um deus submisso e servil. Você obedece cegamente a Zeus, sem questionar a sua autoridade ou a sua justiça. Você não vê que Zeus é um déspota que oprime os homens e os deuses, que abusa do seu poder e do seu privilégio, que viola as leis e os direitos, que teme a mudança e a liberdade? Você não vê que Zeus é o verdadeiro criminoso, e que eu sou o verdadeiro inocente?

– Prometeu, você é um deus orgulhoso e rebelde, mas também é um deus tolo e imprudente. Você desafia a Zeus, sem medir as consequências ou as responsabilidades. Você não vê que Zeus é o protetor dos homens e dos deuses, que mantém a ordem e a harmonia, que respeita as tradições e os costumes, que sabe o que é melhor para todos? Você não vê que Zeus é o verdadeiro sábio, e que você é o verdadeiro culpado?

– Hermes, você é um deus que fala muito, mas que não diz nada. Você é um deus que não tem opinião própria, que apenas repete o que Zeus quer ouvir. Você é um deus que não tem consciência, que apenas segue o que Zeus manda fazer. Você é um deus que não age como juiz, mas como advogado.

Você é um deus que não me ajuda, nem me atrapalha.

– Prometeu, você é um deus que se cala muito, mas que esconde muito. Você é um deus que tem um segredo perigoso, que apenas revela o que Zeus teme saber. Você é um deus que tem uma vingança, que apenas espera o que Zeus não pode evitar. Você é um deus que não age como réu, mas como testemunha.

– Hermes, você é um deus que não me convence, nem me intimida. Você é um deus que não me oferece nada, nem me tira nada. Você é um deus que não me liberta, nem me aprisiona. Você é um deus que não me julga, mas que me condena.

– Prometeu, você é um deus que não me escuta, nem me responde. Você é um deus que não me ajuda, nem me atrapalha. Você é um deus que não me perdoa, nem me arrepende. Você é um deus que não me trai, mas que me desafia.

– Hermes, você é um deus que não sabe como agem os juízes. Você é um deus que não sabe como agem os deuses. Você é um deus que não sabe como agem os homens. Você é um deus que não sabe como age o destino.

– Prometeu, você é um deus que sabe demais, mas que não diz nada. Você é um deus que prefere sofrer em silêncio, do que se render à vontade de Zeus. Você é um deus que tem uma coragem admirável, mas que tem uma loucura incompreensível. Você é um deus que me intriga, mas que me frustra.

Hermes suspirou e se afastou de Prometeu. Ele sabia que era inútil insistir, pois Prometeu jamais revelaria o seu segredo. Ele voltou para o Olimpo e comunicou a Zeus o fracasso da sua missão. Zeus ficou furioso e jurou que Prometeu pagaria caro pela sua insolência. Ele ordenou que a águia aumentasse a sua ferocidade e que as correntes apertassem mais o seu corpo. Ele também enviou uma tempestade de raios e trovões para atormentar o seu espírito.

Prometeu, porém, não se abalou com as novas torturas. Ele continuou a resistir e a esperar pelo dia em que o seu segredo se cumpriria, e que Zeus seria destronado por um de seus filhos. Ele também continuou a confiar e a amar os homens, que ele considerava os seus verdadeiros filhos. Ele sabia que um dia eles seriam livres e felizes, graças ao fogo que ele lhes deu.

 

O Julgamento de Sísifo

Sísifo era um rei mortal que governava a cidade de Corinto, na Grécia. Ele era famoso pela sua astúcia, pela sua riqueza e pela sua beleza. Ele também era famoso pela sua arrogância, pela sua ambição e pela sua maldade. Ele enganava, roubava e matava sem escrúpulos, e desafiava os deuses com as suas artimanhas.

Um dia, Sísifo matou um viajante que passava pelo seu reino, e roubou os seus pertences. O viajante, porém, era um emissário de Zeus, que levava uma mensagem importante para o deus do rio Asopo. A mensagem era sobre o paradeiro da filha de Asopo, Egina, que havia sido raptada por Zeus e levada para a ilha de Enone.

Zeus ficou sabendo do crime de Sísifo e ficou furioso. Ele enviou Tânato, o deus da morte, para buscar a alma de Sísifo e levá-la para o Hades, o reino dos mortos. Tânato chegou ao palácio.

 

O Julgamento de Orfeu

Orfeu era um poeta e músico mortal que vivia na Trácia, na Grécia. Ele era famoso pela sua voz e pela sua lira, que encantavam todos os seres vivos, inclusive os deuses. Ele era casado com Eurídice, uma ninfa da floresta, que era a sua grande paixão e inspiração.

Um dia, Eurídice foi picada por uma serpente venenosa e morreu. Orfeu ficou inconsolável e decidiu ir até o Hades, o reino dos mortos, para tentar trazer a sua amada de volta. Ele usou o seu dom musical para persuadir Caronte, o barqueiro que transportava as almas dos mortos pelo rio Estige, a levá-lo para o outro lado. Ele também usou o seu dom musical para apaziguar Cérbero, o cão de três cabeças que guardava a entrada do Hades. Ele chegou até o trono de Hades, o deus dos mortos, e Perséfone, a sua esposa e rainha.

Orfeu implorou aos deuses que lhe devolvessem Eurídice, e tocou a sua lira com tanta beleza e emoção que comoveu os corações de Hades e Perséfone. Eles concordaram em libertar Eurídice, mas com uma condição: Orfeu deveria sair do Hades sem olhar para trás, e só poderia ver Eurídice quando chegasse à luz do sol. Caso contrário, ele a perderia para sempre.

Orfeu aceitou a condição e seguiu o caminho de volta, guiado pela voz de Eurídice, que vinha atrás dele. Ele resistiu à tentação de olhar para trás, confiando na promessa dos deuses. Mas, quando ele estava quase saindo da escuridão, ele ouviu um grito de Eurídice, que parecia estar em perigo. Ele não aguentou e virou-se para ver se ela estava bem. Ele viu o rosto de Eurídice, que lhe sorriu com amor e tristeza, antes de desaparecer nas sombras. Ele havia quebrado a condição dos deuses, e perdido Eurídice para sempre.

Elas jogaram a sua cabeça e a sua lira no rio Hebro, mas ele não morreu.

Orfeu ficou desesperado e tentou voltar para o Hades, mas a entrada estava fechada. Ele gritou o nome de Eurídice, mas ninguém respondeu. Ele chorou e lamentou a sua sorte, mas ninguém o consolou. Ele voltou para a Terra, mas não encontrou alegria. Ele vagou pelo mundo, tocando a sua lira e cantando a sua dor, mas ninguém o ouviu. Ele renunciou ao amor e à vida, mas ninguém o compreendeu.

Um dia, Orfeu foi atacado por um grupo de mulheres selvagens, chamadas de Mênades, que eram seguidoras de Dionísio, o deus do vinho e da loucura. Elas estavam furiosas com Orfeu, pois ele se recusava a participar dos seus rituais orgiásticos e a honrar o seu deus. Elas o perseguiram e o apedrejaram, mas ele não reagiu. Elas o alcançaram e o esquartejaram, mas ele não sentiu. Elas jogaram a sua cabeça e a sua lira no rio Hebro, mas ele não morreu.

A cabeça e a lira de Orfeu continuaram a cantar e a tocar, levadas pela correnteza do rio. Elas chegaram até o mar, onde foram recolhidas pelas ninfas do oceano, que as levaram para a ilha de Lesbos. Lá, elas foram enterradas em um santuário dedicado às musas, as deusas da arte e da inspiração. As musas homenagearam Orfeu, reconhecendo o seu talento e o seu sofrimento. Elas também enviaram a sua alma para o Hades, onde ele finalmente se reencontrou com Eurídice. Os dois se abraçaram e se beijaram, e viveram felizes no mundo dos mortos, sem medo de se separarem novamente.

 

O Julgamento de Antígona

Antígona era uma princesa mortal que vivia em Tebas, na Grécia. Ela era filha de Édipo, o rei que matou o seu pai e casou com a sua mãe, sem saber da sua verdadeira identidade, e de Jocasta, a rainha que se enforcou ao descobrir o seu incesto. Ela tinha dois irmãos, Etéocles e Polinices, que se mataram em uma guerra pelo trono de Tebas, e uma irmã, Ismênia, que era a sua única companheira.

Após a morte dos irmãos, Creonte, o tio de Antígona, assumiu o poder em Tebas. Ele ordenou que Etéocles fosse sepultado com honras, pois ele defendeu a cidade contra o ataque de Polinices, que ele considerava um traidor. Ele também ordenou que Polinices fosse deixado sem sepultura, exposto aos abutres e aos cães, como um exemplo para os inimigos da cidade. Ele proibiu qualquer um de enterrar Polinices, sob pena de morte.

Antígona, porém, não aceitou a ordem de Creonte. Ela amava os seus irmãos igualmente, e acreditava que eles mereciam um funeral digno, conforme os costumes e as leis dos deuses. Ela decidiu desobedecer a Creonte, e ir até o campo de batalha, onde estava o corpo de Polinices. Ela cobriu o corpo com terra e o aspergiu com água, realizando os ritos fúnebres.

Creonte ficou sabendo da ação de Antígona e ficou furioso. Ele mandou que ela fosse capturada e levada à sua presença. Ele a acusou de rebeldia e de desrespeito à sua autoridade e à sua vontade. Ele a condenou à morte, e ordenou que ela fosse enterrada viva em uma caverna, longe da cidade.

Antígona foi levada para a caverna, onde esperava pela sua morte. Ela não se arrependia do seu ato, pois acreditava que tinha feito o bem aos seus irmãos e aos deuses. Ela também não temia a morte, pois acreditava que se encontraria com os seus familiares no Hades, o reino dos mortos.

Um dia, Tirésias, o adivinho cego que revelou a Édipo o seu destino trágico, foi até Creonte e lhe trouxe uma mensagem dos deuses. Ele disse que os deuses estavam irados com Creonte, pois ele violou as leis sagradas do sepultamento, e que ele seria castigado com a morte de um dos seus filhos. Ele aconselhou Creonte a libertar Antígona e a enterrar Polinices, antes que fosse tarde demais.

Creonte, porém, não deu ouvidos a Tirésias. Ele achava que o adivinho estava mentindo ou sendo subornado. Ele desprezava os deuses e confiava na sua razão e na sua justiça. Ele manteve a sua decisão e ignorou o seu aviso.

Mas, logo depois, ele recebeu a notícia de que o seu filho Hémon, que era noivo de Antígona, havia se matado com a sua espada, ao ver Antígona enforcada na caverna. Ele também recebeu a notícia de que a sua esposa Eurídice, que era mãe de Hémon, havia se matado com uma faca, ao saber da morte do seu filho. Ele percebeu que Tirésias estava certo, e que ele havia provocado a ira dos deuses e a desgraça da sua família.

Creonte ficou desesperado e tentou se matar também, mas foi impedido pelos seus servos. Ele gritou e lamentou a sua sorte, mas ninguém o consolou. Ele pediu perdão aos deuses e aos mortos, mas ninguém o ouviu. Ele renunciou ao poder e à vida, mas ninguém o compreendeu.

 

O Julgamento de Medeia

Medeia era uma feiticeira mortal que vivia em Corinto, na Grécia. Ela era filha de Eetes, o rei da Cólquida, uma terra distante, onde ficava o velo de ouro, um tesouro sagrado dos deuses. Ela se apaixonou por Jasão, um herói grego que veio buscar o velo de ouro, e o ajudou a realizá-lo, traindo o seu pai e o seu país. Ela fugiu com Jasão e os Argonautas, os companheiros de Jasão, e viveu muitas aventuras e perigos com eles.

Um dia, Jasão decidiu abandonar Medeia e se casar com Glauce, a filha de Creonte, o rei de Corinto. Ele achava que Medeia era uma estrangeira bárbara e selvagem, que não se adaptava à cultura e à sociedade grega. Ele também achava que Glauce era uma princesa nobre e bela, que lhe daria prestígio e poder. Ele desprezou Medeia e os seus dois filhos, que ele teve com ela, e os expulsou da cidade.

Medeia, porém, não aceitou a traição de Jasão. Ela amava Jasão com toda a sua alma, e acreditava que ele era o seu destino e o seu salvador. Ela também odiava Jasão com toda a sua fúria, e acreditava que ele era o seu inimigo e o seu algoz. Ela decidiu se vingar de Jasão, e usar os seus poderes mágicos para destruí-lo.

Medeia fingiu se reconciliar com Jasão, e lhe pediu que intercedesse por ela e pelos seus filhos junto a Creonte, para que eles pudessem ficar na cidade. Jasão aceitou o pedido de Medeia, e conseguiu a permissão de Creonte, que lhe concedeu um dia de prazo para que eles se preparassem para partir.

Medeia aproveitou o dia para executar o seu plano. Ela enviou um presente para Glauce, um vestido e uma coroa de ouro, que estavam envenenados. Glauce recebeu o presente e o vestiu, pensando que era um gesto de amizade de Medeia. Mas, assim que ela tocou nas roupas, elas pegaram fogo e queimaram o seu corpo. Ela gritou de dor e correu para o seu pai, que tentou socorrê-la. Mas, ao abraçá-la, ele também foi queimado pelo veneno, e morreu junto com ela.

Medeia ainda não estava satisfeita com a sua vingança. Ela queria ferir Jasão no que ele mais amava, os seus filhos. Ela pegou uma espada e matou os seus dois filhos, que eram também os filhos de Jasão. Ela os esquartejou e os jogou no fogo, para que Jasão não pudesse enterrá-los.

Jasão ficou sabendo da morte de Glauce e de Creonte, e correu para o palácio, onde esperava encontrar Medeia e os seus filhos. Ele chegou e viu o fogo e o sangue, e ouviu o riso de Medeia, que estava em cima de um carro alado, puxado por dragões. Ela levava consigo os restos mortais dos seus filhos, e os mostrava a Jasão, que ficou horrorizado.

Jasão implorou a Medeia que lhe devolvesse os seus filhos, e a acusou de monstro e de assassina. Ele a condenou à maldição dos deuses e à infâmia dos homens. Ele ordenou que ela descesse do carro e enfrentasse a sua justiça e a sua ira.

Medeia, porém, não deu ouvidos a Jasão. Ela zombou de Jasão e o chamou de covarde e de traidor. Ela se gabou de ter cumprido a sua vingança, e de ter feito Jasão sofrer mais do que ela. Ela também se lamentou de ter perdido o seu amor, e de ter matado os seus filhos. Ela disse que ela era a única juíza e a única culpada.

Medeia se afastou de Jasão e voou para longe, levando os seus filhos mortos. Ela chegou até Atenas, onde foi acolhida pelo rei Egeu, que lhe deu proteção e asilo. Ela viveu em Atenas, mas não encontrou paz. Ela continuou a usar a sua magia, mas não encontrou felicidade. Ela continuou a amar e a odiar Jasão, mas não encontrou perdão.

 

O Julgamento de Orestes

Orestes era um príncipe mortal que vivia em Micenas, na Grécia. Ele era filho de Agamêmnon, o rei que liderou os gregos na guerra contra Troia, e de Clitemnestra, a rainha que o traiu e o matou, com a ajuda do seu amante Egisto. Ele tinha uma irmã, Electra, que era a sua única aliada e confidente.

Após a morte de Agamêmnon, Clitemnestra e Egisto assumiram o poder em Micenas. Eles ordenaram que Orestes fosse exilado, pois eles temiam que ele vingasse o seu pai e reclamasse o seu trono. Eles também maltrataram Electra, que ficou na cidade, e a obrigaram a servir como escrava.

Orestes foi levado para a Fócida, onde foi criado pelo rei Estrofio, que era amigo de Agamêmnon. Lá, ele conheceu e se tornou amigo de Pilades, o filho de Estrofio, que era da mesma idade que ele. Os dois juraram lealdade e amizade eterna, e planejaram retornar a Micenas, para vingar a morte de Agamêmnon.

Um dia, Orestes recebeu um oráculo de Apolo, o deus da profecia e da razão. O oráculo dizia que Orestes deveria matar Clitemnestra e Egisto, para cumprir o seu dever de filho e de herdeiro. O oráculo também dizia que, se Orestes não fizesse isso, ele seria castigado com a loucura e a desgraça.

Orestes aceitou o oráculo de Apolo, e partiu para Micenas, acompanhado de Pilades. Eles chegaram à cidade, e se disfarçaram de viajantes, que traziam a notícia da morte de Orestes. Eles foram recebidos por Clitemnestra e Egisto, que fingiram lamentar a morte de Orestes, mas que na verdade se alegraram. Eles convidaram os viajantes para um banquete, onde pretendiam matá-los.

Orestes, porém, se antecipou ao plano de Clitemnestra e Egisto. Ele revelou a sua identidade e atacou os dois, com a ajuda de Pilades. Ele matou Egisto com a sua espada, e Clitemnestra com o machado que ela usou para matar Agamêmnon. Ele vingou o seu pai e recuperou o seu trono.

Orestes, porém, não se sentiu aliviado ou feliz com o seu ato. Ele se sentiu culpado e angustiado por ter matado a sua mãe, que era um crime abominável aos olhos dos deuses e dos homens. Ele foi perseguido pelas Erínias, as deusas da vingança, que o atormentaram com visões de horror e de sangue. Ele enlouqueceu e fugiu de Micenas, levando consigo Pilades.

Orestes vagou pelo mundo, procurando uma forma de se livrar das Erínias e de se purificar do seu crime. Ele foi até Delfos, onde ficava o templo de Apolo, para pedir a ajuda do deus que lhe ordenou a vingança. Apolo o acolheu e o protegeu das Erínias, que não podiam entrar no seu santuário. Apolo também lhe deu um novo oráculo, que dizia que Orestes deveria ir até Atenas, onde ficava o tribunal de Atena, a deusa da justiça e da sabedoria. Apolo disse que Orestes deveria se submeter ao julgamento de Atena, que decidiria o seu destino.

Orestes aceitou o oráculo de Apolo, e partiu para Atenas, acompanhado de Pilades. Ele chegou à cidade, e se dirigiu ao Areópago, a colina onde ficava o tribunal de Atena. Lá, ele encontrou as Erínias, que o seguiram e o acusaram de matricídio, o pior dos crimes. Elas pediram a Atena que o condenasse à morte, ou à tortura eterna.

Athena apareceu e ouviu as Erínias e Orestes. Ela disse que o caso era muito complexo e delicado, pois envolvia o conflito entre o dever de filho e o respeito à mãe, entre a ordem de Apolo e a lei dos deuses, entre a vingança e a piedade. Ela disse que ela não poderia julgar sozinha, e que ela convocaria um júri de cidadãos atenienses, que ouviriam as partes e votariam pela absolvição ou pela condenação de Orestes. Ela disse que ela seria a presidente do júri, e que ela teria o voto de desempate, caso houvesse um empate.

Athena organizou o júri e iniciou o julgamento. As Erínias apresentaram as suas acusações contra Orestes, e mostraram as provas do seu crime. Elas disseram que Orestes era um assassino cruel e impiedoso, que violou o laço sagrado entre mãe e filho, que ofendeu a ordem natural e divina, que provocou a ira e a dor dos deuses. Elas disseram que Orestes merecia a morte, ou o sofrimento sem fim.

Orestes apresentou as suas defesas contra as Erínias, e contou as circunstâncias do seu crime. Ele disse que ele era um vingador justo e obediente, que cumpriu o seu dever de filho e de herdeiro, que seguiu a ordem de Apolo, que era o deus da profecia e da razão, que restaurou a ordem e a honra dos deuses. Ele disse que ele não merecia a morte, ou o sofrimento sem fim.

Athena ouviu as Erínias e Orestes, e pediu ao júri que votasse. O júri votou, e houve um empate. Seis jurados votaram pela absolvição de Orestes, e seis jurados votaram pela condenação de Orestes. Atena teve de usar o seu voto de desempate, e ela votou pela absolvição de Orestes. Ela disse que ela era a deusa da justiça e da sabedoria, e que ela preferia a razão à emoção, a misericórdia à vingança, a vida à morte. Ela disse que Orestes estava livre das Erínias e do seu crime, e que ele poderia voltar para Micenas, em paz.

As Erínias ficaram indignadas e ameaçaram se vingar de Atena e dos atenienses, por terem desrespeitado as suas leis e os seus direitos. Elas disseram que elas trariam a fome, a peste e a guerra para a cidade, e que elas não descansariam até que fossem feitas justiça.

Athena, porém, não se intimidou com as Erínias. Ela disse que elas eram deusas antigas e respeitáveis, mas que elas precisavam se adaptar aos novos tempos e às novas leis. Ela disse que elas não eram mais as deusas da vingança, mas as deusas da justiça, e que elas deveriam proteger e abençoar a cidade, em vez de amaldiçoá-la. Ela disse que elas seriam honradas e adoradas pelos atenienses, e que elas receberiam oferendas e sacrifícios. Ela disse que elas seriam chamadas de Eumênides, as Benevolentes, em vez de Erínias, as Terríveis.

As Erínias se acalmaram e aceitaram a proposta de Atena. Elas disseram que elas eram deusas flexíveis e generosas, mas que elas exigiam respeito e obediência. Elas disseram que elas protegeriam e abençoariam a cidade, se os atenienses fossem justos e piedosos. Elas disseram que elas seriam as Eumênides, as Benevolentes, se os atenienses fossem os seus amigos, mas que elas seriam as Erínias, as Terríveis, se os atenienses fossem os seus inimigos.

Athena agradeceu.

 

O Julgamento de Fedra

Fedra era uma rainha mortal que vivia em Creta, na Grécia. Ela era filha de Minos, o rei que possuía o Minotauro, um monstro metade homem e metade touro, que devorava os jovens que eram enviados como tributo de Atenas. Ela era casada com Teseu, o herói que matou o Minotauro, e libertou os atenienses do seu jugo. Ela tinha um enteado, Hipólito, o filho de Teseu e de Antíope, uma rainha das amazonas, que era um guerreiro e um caçador.

Um dia, Teseu partiu para uma viagem, e deixou Fedra e Hipólito em Creta. Fedra se apaixonou por Hipólito, e sentiu um desejo ardente por ele. Ela sabia que o seu amor era proibido e pecaminoso, pois Hipólito era o filho do seu marido, e ela era a sua madrasta. Ela também sabia que o seu amor era impossível e inútil, pois Hipólito era devoto de Ártemis, a deusa da caça e da castidade, e que ele desprezava as mulheres e o amor.

Fedra tentou resistir ao seu amor, e se manteve em silêncio e em segredo. Mas, ela sofria e se consumia com a sua paixão, e perdia a sua saúde e a sua beleza. Ela foi descoberta por sua ama, que era a sua confidente e conselheira. A ama tentou ajudar Fedra, e lhe sugeriu que ela se declarasse para Hipólito, e tentasse seduzi-lo. Ela disse que o amor era uma força poderosa e irresistível, que podia vencer qualquer obstáculo e qualquer preconceito. Ela disse que Fedra tinha o direito de ser feliz, e que Hipólito podia corresponder ao seu amor.

Fedra aceitou o conselho da sua ama, e se declarou para Hipólito. Ela lhe confessou o seu amor, e lhe pediu que ele a amasse também. Ela lhe ofereceu o seu corpo e o seu coração, e lhe prometeu o seu reino e o seu poder. Ela lhe implorou que ele fosse o seu amante, e que ele esquecesse o seu pai e a sua deusa.

Hipólito, porém, não aceitou a declaração de Fedra. Ele ficou horrorizado e enojado com o seu amor, e o rejeitou com desprezo e com raiva. Ele disse que Fedra era uma mulher louca e depravada, que violou o laço sagrado entre pai e filho, entre marido e esposa, entre deus e homem. Ele disse que Fedra era uma traidora e uma adúltera, que ofendeu a honra e a memória do seu pai, que era o seu herói e o seu modelo. Ele disse que Fedra era uma inimiga e uma blasfema, que desafiou a vontade e a lei da sua deusa, que era a sua protetora e a sua senhora. Ele disse que Fedra merecia a morte, ou o exílio eterno.

Fedra ficou desesperada e humilhada com a rejeição de Hipólito. Ela se sentiu culpada e envergonhada pelo seu amor, e perdeu a sua esperança e a sua dignidade. Ela foi dominada pelo ódio e pela vingança, e decidiu se vingar de Hipólito, e destruí-lo. Ela escreveu uma carta para Teseu, onde ela mentiu que Hipólito havia tentado violentá-la, e que ela havia se defendido. Ela se enforcou com um lenço, e deixou a carta ao lado do seu corpo.

Teseu voltou de sua viagem, e encontrou Fedra morta e a carta. Ele leu a carta, e acreditou na mentira de Fedra. Ele ficou furioso e triste com Hipólito, e o acusou de estupro e de assassinato. Ele o condenou à morte, e invocou a maldição de Posídon, o deus do mar e o seu pai, para que ele o castigasse.

Hipólito negou a acusação de Teseu, e jurou pela sua inocência e pela sua honra. Ele disse que ele era um filho fiel e um guerreiro virtuoso, que nunca tocou em Fedra, e que nunca desejou uma mulher. Ele disse que ele era um devoto de Ártemis, e que ela era testemunha da sua pureza e da sua lealdade. Ele disse que ele era vítima de uma calúnia e de uma injustiça, e que ele esperava a verdade e a justiça dos deuses.

Hipólito partiu de Creta, banido por Teseu, e seguiu para o seu refúgio, a floresta sagrada de Ártemis. Ele foi perseguido pela maldição de Posídon, que enviou um touro marinho para atacá-lo. O touro saiu do mar, e assustou os cavalos de Hipólito, que puxavam o seu carro. Os cavalos se descontrolaram, e arrastaram Hipólito pelo chão, ferindo-o gravemente. Ele foi socorrido por alguns pastores, que o levaram para o seu pai.

Teseu viu Hipólito ferido e moribundo, e sentiu pena e remorso. Ele foi informado por Ártemis, que apareceu e lhe revelou a verdade. Ela disse que Fedra havia mentido, e que Hipólito era inocente. Ela disse que Fedra havia sido vítima de Afrodite, a deusa do amor e da beleza, que havia feito Fedra se apaixonar por Hipólito, para castigá-lo por desprezá-la. Ela disse que Hipólito havia sido vítima de Posídon, que havia atendido ao pedido de Teseu, sem saber da mentira de Fedra. Ela disse que Teseu havia sido vítima de si mesmo, por ter acreditado em Fedra, sem ouvir Hipólito.

Teseu pediu perdão a Hipólito, e lhe pediu que ele não morresse. Ele disse que ele era um pai infeliz e arrependido, que amava o seu filho, e que queria reparar o seu erro. Ele disse que ele era um rei injusto e culpado, que ofendeu o seu filho, e que queria restaurar a sua honra. Ele disse que ele era um homem triste e desesperado, que perdeu o seu filho, e que queria tê-lo de volta.

Hipólito perdoou Teseu, e lhe pediu que ele não sofresse. Ele disse que ele era um filho generoso e bondoso, que amava o seu pai, e que não guardava rancor. Ele disse que ele era um guerreiro valente e nobre, que honrou o seu pai, e que não temia a morte. Ele disse que ele era um devoto de Ártemis, e que ela o levaria para o seu reino, onde ele seria feliz.

Hipólito morreu nos braços de Teseu, que chorou e lamentou a sua sorte. Ele foi sepultado com honras, e recebeu o elogio de Ártemis, que o chamou de o mais casto e o mais amado dos homens. Ele também recebeu o perdão de Afrodite, que se compadeceu da sua desgraça, e de Posídon, que se arrependeu da sua ira. Ele também recebeu a memória de Fedra, que se redimiu da sua culpa, e a saudade de Teseu, que se reconciliou com o seu filho.

 

O Julgamento de Édipo

Édipo era um rei mortal que vivia em Tebas, na Grécia. Ele era filho de Laio, o rei anterior de Tebas, e de Jocasta, a sua esposa e rainha. Ele não sabia, porém, da sua verdadeira origem, pois ele foi abandonado pelos seus pais quando era um bebê, por causa de uma profecia que dizia que ele mataria o seu pai e se casaria com a sua mãe. Ele foi encontrado e criado por Pólibo, o rei de Corinto, e Mérope, a sua esposa e rainha, que lhe deram o nome de Édipo, que significa “pé inchado”, pois ele tinha os pés perfurados por um prego.

Um dia, Édipo ouviu de um oráculo que ele mataria o seu pai e se casaria com a sua mãe. Ele achou que o oráculo se referia a Pólibo e Mérope, e decidiu fugir de Corinto, para evitar o seu destino. Ele chegou a um lugar onde havia uma encruzilhada, e encontrou um homem que vinha em sentido contrário, em uma carruagem. O homem era Laio, o seu verdadeiro pai, mas ele não o reconheceu. Eles discutiram sobre quem deveria ceder a passagem, e acabaram brigando. Édipo matou Laio com a sua espada, sem saber que ele era o seu pai.

Édipo continuou a sua viagem, e chegou a Tebas, onde havia uma grande calamidade. A cidade estava sendo assolada por uma esfinge, um monstro com cabeça de mulher, corpo de leão e asas de águia, que devorava os habitantes que não respondiam ao seu enigma. O enigma era: “Qual é o animal que tem quatro patas de manhã, duas ao meio-dia e três à noite?”. Ninguém conseguia responder ao enigma, e a esfinge matava todos que tentavam.

Édipo se ofereceu para enfrentar a esfinge, e ouviu o seu enigma. Ele pensou por um momento, e respondeu: “O homem. Pois ele engatinha quando é bebê, anda sobre duas pernas quando é adulto, e usa uma bengala quando é velho.”. A esfinge ficou surpresa e furiosa com a resposta de Édipo, que era a correta. Ela se jogou do alto da montanha, e se matou.

Édipo foi aclamado como o herói e o salvador de Tebas. Ele foi recebido por Creonte, o irmão de Jocasta, que era o regente do trono, após a morte de Laio. Creonte ofereceu a Édipo o trono de Tebas, e a mão de Jocasta, a sua irmã e viúva de Laio. Édipo aceitou a oferta de Creonte, e se casou com Jocasta, sem saber que ela era a sua mãe. Ele reinou em Tebas, e teve quatro filhos com Jocasta: dois meninos, Etéocles e Polinices, e duas meninas, Antígona e Ismênia.

Édipo, porém, não se livrou do seu destino, que se cumpriu sem que ele soubesse. Ele foi descoberto por Tirésias, o adivinho cego que revelou a Laio a profecia que ele tentou evitar. Tirésias foi chamado por Édipo, que queria saber a causa de uma nova praga que assolava a cidade. Tirésias disse que a causa era o assassino de Laio, que estava em Tebas, e que era o próprio Édipo. Édipo não acreditou em Tirésias, e o acusou de mentiroso e de conspirador. Ele disse que Tirésias estava aliado a Creonte, que queria tomar o seu trono.

Édipo iniciou uma investigação para descobrir a verdade, e interrogou várias testemunhas. Ele descobriu que Laio foi morto na encruzilhada, onde ele matou um homem. Ele descobriu que ele foi abandonado pelos seus pais, e que ele foi criado por Pólibo e Mérope, que não eram os seus pais verdadeiros. Ele descobriu que Jocasta era a esposa e a mãe de Laio, e que ela era a sua esposa e a sua mãe.

Édipo ficou horrorizado e enlouquecido com a verdade, que confirmava o oráculo e a profecia. Ele se sentiu culpado e desgraçado pelo seu destino, que ele não pôde evitar. Ele foi até o quarto de Jocasta, e a encontrou morta. Ela se enforcou com um lenço, ao saber da verdade. Ele pegou um alfinete do vestido dela, e furou os seus olhos. Ele se cegou, para não ver mais a sua vergonha e a sua dor.

Édipo pediu a Creonte que o expulsasse de Tebas, e que cuidasse dos seus filhos. Ele disse que ele era um rei maldito e infeliz, que matou o seu pai e se casou com a sua mãe, que ofendeu os deuses e os homens, que provocou a peste e a morte. Ele disse que ele era um homem sem visão e sem rumo, que não sabia quem era e para onde ia. Ele disse que ele era um enigma vivo, que ninguém podia resolver.

Creonte atendeu ao pedido de Édipo, e o expulsou de Tebas. Ele o acompanhou até a saída da cidade, onde ele se despediu dos seus filhos e das suas filhas. Ele abençoou as suas filhas, Antígona e Ismênia, que choraram e o abraçaram. Ele amaldiçoou os seus filhos, Etéocles e Polinices, que brigaram e o abandonaram. Ele partiu de Tebas, guiado por Antígona, que se ofereceu para acompanhá-lo. Ele vagou pelo mundo, sem destino e sem esperança, até que morreu em Colono, uma cidade próxima a Atenas, onde foi acolhido e sepultado por Teseu, o rei de Atenas, que lhe deu honra e amizade.

 

O Julgamento de Cassandra

Cassandra era uma princesa mortal que vivia em Troia, na Ásia Menor. Ela era filha de Príamo, o rei de Troia, e de Hécuba, a sua esposa e rainha. Ela era irmã de Heitor, o herói que defendeu Troia contra os gregos, e de Páris, o príncipe que raptou Helena, a rainha de Esparta, e causou a guerra de Troia. Ela era sacerdotisa de Apolo, o deus da profecia e da razão, que lhe deu o dom de prever o futuro.

Um dia, Cassandra se apaixonou por Apolo, e prometeu se entregar a ele, se ele lhe desse o dom da profecia. Apolo aceitou a promessa de Cassandra, e lhe deu o dom de prever o futuro. Mas, Cassandra se arrependeu da sua promessa, e recusou se entregar a Apolo. Apolo ficou furioso e magoado com Cassandra, e lhe deu uma maldição. Ele disse que ela poderia prever o futuro, mas que ninguém acreditaria nela. Ele disse que ela seria uma profetisa desprezada e ignorada, e que ela sofreria com a sua visão.

Cassandra tentou resistir ao seu dom, e se calar sobre o futuro. Mas, ela não conseguia controlar as suas visões, que lhe vinham em sonhos ou em transe. Ela via o futuro de Troia, e de seus habitantes, e tentava alertá-los sobre os perigos e as desgraças que os esperavam. Ela previu a queda de Troia, e a morte de seus pais, de seus irmãos, de seus amigos, e de si mesma. Ela previu a chegada do cavalo de madeira, que escondia os soldados gregos, e a destruição da cidade, que seria incendiada e saqueada.

Cassandra, porém, não foi ouvida nem acreditada por ninguém. Eles achavam que ela era uma louca e uma mentirosa, que inventava histórias para assustar e confundir. Eles desprezavam Cassandra e a insultavam, e a chamavam de pássaro de mau agouro, de boca de cão, de língua de serpente. Eles ignoravam Cassandra e a rejeitavam, e a proibiam de falar e de profetizar. Eles riam de Cassandra e a zombavam, e a desafiavam a provar as suas profecias.

Cassandra ficou isolada e infeliz em Troia, sem amigos e sem consolo. Ela sofria com as suas visões, e com a sua solidão. Ela clamava por Apolo, e lhe pedia que lhe tirasse o dom e a maldição. Mas, Apolo não lhe respondia, e não lhe atendia. Ele a deixava sofrer, e a observava de longe.

Um dia, Cassandra viu a sua última visão, e a mais terrível. Ela viu a entrada do cavalo de madeira em Troia, e a saída dos soldados gregos de dentro dele. Ela viu o massacre dos troianos, e o incêndio da cidade. Ela viu a morte de seus pais, que foram assassinados por Neoptólemo, o filho de Aquiles, o maior dos heróis gregos. Ela viu a morte de seus irmãos, que foram mortos em combate, ou levados como escravos. Ela viu a sua própria morte, que seria causada por Agamêmnon, o rei dos gregos, que a levaria como sua concubina.

Cassandra correu para o templo de Atena, a deusa da justiça e da sabedoria, que era a protetora de Troia. Ela se agarrou à estátua da deusa, e lhe pediu que a salvasse, ou que a matasse. Ela disse que ela era uma princesa desgraçada e infeliz, que previu o futuro, mas que não pôde mudá-lo. Ela disse que ela era uma sacerdotisa ofendida e traída, que amou o deus, mas que foi amaldiçoada por ele. Ela disse que ela era uma profetisa incompreendida e ignorada, que falou a verdade, mas que não foi escutada por ninguém.

Atena ouviu Cassandra, mas não pôde ajudá-la. Ela disse que ela era uma deusa justa e sábia, mas que ela não podia interferir no destino dos homens, que era determinado pelos deuses. Ela disse que ela era uma deusa protetora e bondosa, mas que ela não podia impedir a guerra e a violência, que eram escolhas dos homens. Ela disse que ela era uma deusa testemunha e conselheira, mas que ela não podia forçar os homens a ouvirem e acreditarem, que eram responsabilidades dos homens.

Atena se afastou de Cassandra, e a deixou à mercê dos gregos, que invadiram o templo. Eles a arrancaram da estátua da deusa, e a violentaram. Eles a levaram para o navio de Agamêmnon, que a escolheu como sua presa. Eles a levaram para a Grécia, onde ela seria escrava e concubina de Agamêmnon. Eles a levaram para a morte, que seria causada por Clitemnestra, a esposa de Agamêmnon, que o mataria, e a mataria também.

 

O Julgamento de Aquiles

Aquiles era um herói mortal que vivia na Grécia. Ele era filho de Peleu, o rei de Ftia, e de Tétis, uma ninfa do mar, que era filha de Nereu, o velho do mar. Ele era o maior dos guerreiros gregos, que lutaram na guerra contra Troia, para recuperar Helena, a rainha de Esparta, que foi raptada por Páris, o príncipe de Troia. Ele era o dono da armadura e da espada de ouro, que foram feitas por Hefesto, o deus do fogo e da metalurgia. Ele era o amigo e o amante de Pátroclo, o seu primo e companheiro, que era o seu braço direito e o seu coração.

Um dia, Aquiles se desentendeu com Agamêmnon, o rei dos gregos, e o líder da expedição contra Troia. Agamêmnon tomou de Aquiles a sua escrava Briseida, que era a sua amante e a sua consolação. Aquiles ficou ofendido e furioso com Agamêmnon, e o acusou de tirano e de ladrão. Ele se recusou a lutar na guerra, e se retirou para a sua tenda, junto com os seus soldados, os mirmidões. Ele pediu a sua mãe, Tétis, que intercedesse por ele junto a Zeus, o rei dos deuses, para que ele favorecesse os troianos, e castigasse os gregos.

Tétis atendeu ao pedido de Aquiles, e foi até o Olimpo, onde ficava a morada dos deuses. Ela se ajoelhou diante de Zeus, e lhe pediu que ele desse a vitória aos troianos, e que ele fizesse os gregos sentirem a falta e a necessidade de Aquiles. Ela disse que Aquiles era o seu filho querido e sofrido, que tinha uma vida breve e dura, que era o melhor dos homens e dos heróis, que merecia a glória e a honra. Ela disse que Aquiles estava triste e magoado, e que ele precisava de justiça e de reconhecimento.

Zeus aceitou o pedido de Tétis, e deu a vitória aos troianos, que avançaram sobre os gregos, e os fizeram recuar até os seus navios. Ele deu destaque a Heitor, o filho de Príamo, o rei de Troia, e o irmão de Páris, que era o maior dos guerreiros troianos, e o rival de Aquiles. Ele fez Heitor matar muitos gregos, e incendiar muitos navios. Ele fez Heitor matar Pátroclo, que vestiu a armadura de Aquiles, e foi para a batalha, para tentar salvar os gregos, e para agradar a Aquiles.

Aquiles ficou sabendo da morte de Pátroclo, e ficou inconsolável e irado. Ele chorou e lamentou a perda do seu amigo e do seu amante, que era a sua vida e a sua alma. Ele se arrependeu e se culpou pela sua birra e pela sua vaidade, que causaram a sua desgraça e a dos gregos. Ele decidiu voltar para a guerra, e vingar a morte de Pátroclo, e matar Heitor. Ele pediu a sua mãe, Tétis, que lhe desse uma nova armadura, e uma nova espada, para que ele pudesse enfrentar Heitor, e derrotá-lo.

Tétis atendeu ao pedido de Aquiles, e foi até o Olimpo, onde ficava a forja de Hefesto, o deus do fogo e da metalurgia. Ela pediu a Hefesto que fizesse uma nova armadura e uma nova espada para Aquiles, que fossem belas e resistentes, que fossem dignas do seu filho e do seu herói. Ela disse que Aquiles era o seu filho amado e valente, que tinha uma vida curta e gloriosa, que era o pior dos inimigos e o melhor dos amigos, que merecia a vitória e a fama. Ela disse que Aquiles estava bravo e determinado, e que ele queria justiça e vingança.

Hefesto aceitou o pedido de Tétis, e fez uma nova armadura e uma nova espada para Aquiles, que eram as mais belas e as mais resistentes que ele já tinha feito. Ele fez um escudo, que tinha a imagem de todo o mundo, com o céu, o mar, a terra, os deuses, os homens, os animais, as plantas, as cidades, as guerras, as festas, as estações, as estrelas. Ele fez um elmo, que tinha a imagem de um leão, que rugia e cuspia fogo, que representava a força e a fúria de Aquiles. Ele fez uma couraça, que tinha a imagem de uma águia, que voava e agarrava uma serpente, que representava a rapidez e a astúcia de Aquiles. Ele fez uma espada, que tinha a imagem de um raio, que brilhava e cortava o ar, que representava o poder e a justiça de Aquiles.

Hefesto entregou a nova armadura e a nova espada a Tétis, que as levou para Aquiles. Aquiles vestiu a nova armadura e pegou a nova espada, e se sentiu renovado e confiante. Ele foi para a guerra, e liderou os gregos, que se animaram e se fortaleceram com a sua presença. Ele matou muitos troianos, e incendiou muitas torres. Ele matou Heitor, que o enfrentou em um duelo, e o arrastou pelo chão, amarrado ao seu carro. Ele vingou Pátroclo, e recuperou a sua armadura, que estava com Heitor. Ele vingou os gregos, e recuperou a sua honra, que estava com os troianos.

Aquiles, porém, não se sentiu satisfeito ou feliz com a sua vitória. Ele se sentiu vazio e triste pela morte de Pátroclo, e pela sua solidão. Ele se sentiu culpado e cruel pela morte de Heitor, e pela sua vingança. Ele se sentiu fadado e infeliz pelo seu destino, e pela sua morte.

Um dia, Aquiles viu a sua última visão, e a mais triste. Ele viu Príamo, o pai de Heitor, que veio até ele, disfarçado de mendigo, e lhe pediu que lhe devolvesse o corpo de Heitor, para que ele pudesse enterrá-lo com dignidade. Ele disse que Aquiles era um herói nobre e generoso, que sabia respeitar os mortos e os deuses. Ele disse que Heitor era o seu filho amado e honrado, que merecia um funeral decente e sagrado. Ele disse que ele era um pai sofrido e humilde, que só queria chorar e se despedir do seu filho.

Aquiles se comoveu com o pedido de Príamo, e lhe devolveu o corpo de Heitor, para que ele pudesse enterrá-lo com dignidade. Ele disse que Príamo era um rei sábio e bondoso, que sabia pedir e agradecer. Ele disse que Heitor era um guerreiro valente e nobre, que merecia um funeral decente e sagrado. Ele disse que ele era um filho triste e arrependido, que só queria chorar e se despedir do seu pai.

Aquiles abraçou Príamo, e chorou com ele. Ele se lembrou de Pátroclo, e de Peleu, e de Tétis. Ele se lembrou de Heitor, e de Príamo, e de Hécuba. Ele se lembrou de Troia, e de Grécia, e de si mesmo. Ele se lembrou da guerra, e da paz, e da morte.

Aquiles morreu em Troia, pouco depois, vítima de uma flecha envenenada, que foi disparada por Páris, o irmão de Heitor, e o raptor de Helena. A flecha acertou o seu calcanhar, que era o seu único ponto vulnerável, pois era o único lugar que não foi banhado pelas águas do rio Estige.