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Sexta-feira, Abril 26, 2024

O dinheiro que reza: a banca ética islâmica

Paulo Vieira de Castro
Paulo Vieira de Castrohttp://www.paulovieiradecastro.pt
Autor na área do bem-estar nos negócios, práticas educativas e terapêuticas. Diretor do departamento de bem-estar nas organizações do I-ACT - Institute of Applied Consciousness Technologies (USA).

Paulo Vieira de CastroCapitalismo Halal

Num mundo, como o nosso, em que é frequente confundir os problemas da banca com os problemas dos banqueiros, onde o lucro foi privatizado mas o risco é nacionalizado, onde os ganhos são dos bancos mas o prejuízo é , sempre, de todos, é difícil compreender à primeira leitura o conceito Banca Ética Islâmica. Desde logo porque tem em consideração o bem comum.

Note-se que não me refiro a todos os bancos árabes ou muçulmanos, apenas aos que seguem a Mudarabah Islâmica.

O código das leis religiosas, a Charia, lida com diversos aspectos da vida quotidiana, bem como a política, economia, bancos, negócios, contratos, família, sexualidade, higiene e questões sociais . Charia significa “caminho” ou “rota para a fonte de água”. O nosso direito faz uma leitura algo diferente, considerando ser possível haver uma moral, uma regra, para as organizações, outra para a família, etc… Este é, quanto a mim, um mau serviço do direito.

O juro e a usura como simples remuneração são injustos

Para as instituições financeiras que seguem a Mudarabah o juro ou a usura estão interditos. E, é aqui que o leitor começa a considerar que há qualquer coisa que está mal explicada nestes bancos… Mas, não está! Errado será pensar que o dinheiro poderá gerar dinheiro por si só. Este é apenas um meio de transporte de valor nunca um fim em si mesmo. Pelo que também por isso, para a banca ética islâmica, está interdita a venda de expectativa. Só assim não incorremos no risco de vender, ou comprar, aquilo que ainda não existe…

Para o Capitalismo Halal o juro como simples remuneração é injusto, desonesto e antinatural. Os princípios que geraram a crise do subprime nunca seriam aceites face a tais leis islâmicas. A especulação, a alavancagem, as titularizações sintéticas, os derivados, as valorizações de mercado e o seu efeito nos balanços, são factores interditos eticamente para estas instituições financeiras.

Note-se que neste âmbito o lucro não é proibido quando halal (puro), estando – unicamente – os bancos impedidos de financiar, ou ser financiados, por negócios impuros (álcool, cigarros, indústria pornográfica, etc.). Ora, pergunto eu, não deveria ser assim em todos os tipos de banca? O que é que eu não estou a perceber no meio disto tudo…

Ao assumir solidariamente o risco do negócio o banco só faz parcerias com empresas/investidores acima de qualquer suspeita ou risco ético. A dignidade humana é central no Capitalismo Halal. O risco é dividido assim como o lucro. Só assim ele será um bom negócio para todos. Incluindo, naturalmente, toda a comunidade, não apenas os directamente envolvidos.

O fim da banca tradicional…

À banca ocidental falta uma concepção de justiça e moral económica baseada em algo mais elevado que o dinheiro, longe da especulação de um mercado que poucas vezes vai por si mesmo… E, é essa mesma obsessão pelos mercados ditos livres que nos impede de engendrar um mundo mais justo para todos.

Aliás Adam Smith, aquele que primeiro formulou e organizou a teoria económica era professor de filosofia moral, apelo que não abandonou quando em 1776 viu editada a sua obra de referência Uma Pesquisa Sobre a Natureza e as Causas das Riquezas das Nações. Smith foi o primeiro a denunciar as injustiças que a economia poderia proporcionar, bem como apelou à responsabilidade do estado e das corporações ante a mão invisível dos mercados.

DinheiroNo caso concreto do dinheiro, o problema está na forma como nos temos relacionado com ele. Então, bastará pensar que nós viemos ao mundo de mãos vazias, retornando do mundo de mãos vazias, isto para perceber o quanto temos andado errados… O que trouxemos e o que levaremos será a consciência de sermos apenas usufrutuários deste planeta. E qual será a solução imediata quando pensamos no dinheiro ou nos bancos?

Investir em bancos locais ou regionais; apoiando-os. E, por que não haveríamos nós de ter mais mutualismo, banca cooperativa, banca ética, banca islâmica ou banca cívica em Portugal? Na banca comercial faltam valores humanistas e o enraizar de crenças num mundo melhor para todos. Só assim voltaremos à economia da esperança.

Em alternativa restar-nos-á, lamentavelmente, a economia da revolta…

 

 

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