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Quinta-feira, Abril 25, 2024

Entrevista com Dulce de Jesus Soares, Ministra da Educação de Timor-Leste

O Jornal Tornado tem estado a publicar Análises de políticos e de especialistas sobre educação em geral, em particular sobre a problemática das línguas em Timor-Leste para, numa segunda fase, abordarmos outros aspectos pertinentes e importantes sobre a Educação Pré-escolar e o Ensino do 1.º e 2 Ciclos do Ensino Básico.

A fim de garantirmos a participação, neste caderno especial sobre educação em Timor-Leste, para além de especialistas em educação nacionais, nomeadamente em língua portuguesa, em linguística e em formação de profissionais da educação, entendemos que é de toda a conveniência sabermos o que pensa a principal responsável pela educação em Timor-Leste, Sua Excelência, Ministra da Educação, Juventude e Desporto, Senhora Dulce Soares de Jesus.

Excelência, Ministra da Educação, Juventude e Desporto, Senhora Dulce Soares de Jesus, muito obrigado por ter aceite participar neste importante debate sobre educação em Timor-Leste.

 

  1. Segundo informações do Ministério da Educação e Cultura do VII Governo Constitucional de Timor-Leste, sobre o estado da Educação Pré-Escolar e do 1.º e 2.º Ciclos do Ensino Básico em Timor-Leste, há um conjunto vasto de constrangimentos que os educadores de infância e os professores timorenses demonstram ter no âmbito das suas práticas profissionais. Com a sua entrada neste novo governo  também se instalou a polémica sobre as línguas de ensino a utilizar na educação pré-escolar e no 1.º e 2.º Ciclos do Ensino Básico. Na sua opinião, a que se deve esta situação? Existem ou não existem constrangimentos ao nível das práticas pedagógicas e científicas dos educadores de infância e dos professores dos primeiro e segundo ciclos do ensino básico? Por que razão há polémica em relação à língua de ensino na educação pré-escolar e no ensino básico? O que determina a legislação em vigor sobre esta questão? Quer fazer o favor de elucidar-nos sobre estas matérias?

Timor-Leste é um pais muito novo, ainda não completou a maior idade. Temos de ter consciência que o nosso sistema educativo, depois de conquistada a independência ficou praticamente em cinzas. Sem escolas e sem professores. Podemos dizer que começamos praticamente do nada. Graças a Deus, houve muitas pessoas de boa vontade, muitas delas apenas com a antiga 4.ª classe, que logo nos primeiros anos se prontificaram em manter as escolas, ou o que restava delas, a funcionar, para que as nossas crianças tivessem um lugar no qual pudessem aprender.

Ora, perante um sistema educativo a iniciar-se desta maneira, claro que atualmente ainda existem muitos constrangimentos e não se conseguem resolver todos de uma só vez, pois a educação envolve milhares de professores e de alunos, centenas de inspetores, e mais de uma dezena de direções municipais. Temos que ir avançando aos poucos.

Seria ótimo se todos os nossos professores tivessem formação inicial de docentes e a mais valia de possuírem um forte domínio das duas línguas oficias, tanto escrito como oral, mas a realidade é que isso ainda não acontece. Por isso é que o VIII Governo Constitucional irá continuar a apostar na formação de professores e na cooperação bilateral, como por exemplo com Portugal, e dar continuidade a projetos, como o Projeto dos Centros de Aprendizagem e Formação Escolar e o Projeto Formar Mais. O primeiro a funcionar em todos os níveis do ensino básico (até ao 9.º ano), incluindo o pré-escolar, e que irá, no próximo ano, disponibilizar também o 10.º ano de escolaridade, e o segundo a apostar na formação de e em português no 3.º ciclo do ensino básico e no ensino secundário.

Enquanto não é possível que todos os professores tenham a formação adequada para o ensino, o Ministério da Educação, durante o V Governo Constitucional proporcionou planos de aula para facilitar o processo de ensino a esses professores sem formação ou com pouca formação. O currículo aprovado em 2015 pretende um ensino centrado no aluno, o que exige uma completa inovação metodológica da parte dos professores. Como conseguir que todos os professores seguissem metodologias centradas nos alunos, em todas as disciplinas e no ensino de todos os conteúdos? Principalmente quando muitos desses professores não tem acesso a livros ou a meios de pesquisa e quando têm, a língua na qual esses materiais estão disponíveis pode tornar-se num entrave no acesso ao conhecimento.

Uma solução que nos pareceu eficiente foi proporcionar planos de aula aos professores. Esta prática não é uma novidade. Muitos países já o fizeram no passado e outros continuam a fazê-lo. São exemplos a Noruega e Singapura, que são conhecidos por terem sistemas educativos de excelência.

Claro que a formação é essencial, e a existência de planos de aula não coloca de parte a continuidade da formação. O Ministério, através do INFORDEPE, tem de definir um plano de formação para todos os professores e não proporcionar apenas formação aos retalhos. Estamos a dar os primeiros passos neste assunto. A formação, para ser aceite e para atingir realmente os seus objetivos, não deve existir por si só, deverá ter um forte impacto para a carreira do professor. Pelo que a progressão na carreira é um dos assuntos que também iremos estudar e analisar. Como é que a frequência, o aproveitamento e uso, por parte do professor, das formações proporcionadas pelo INFORDEPE poderá refletir-se na progressão de carreira?

Outra das questões que se levanta frequentemente é a falta de materiais. Ainda não tive oportunidade de visitar muitas escolas, mas informaram-me que realmente há falta de materiais. Bem, até setembro de 2017, enquanto Vice-Ministra, houve algumas dificuldades em imprimir e distribuir materiais didáticos, planos de aula, livros de histórias, antologias, etc. Mas, em setembro de 2017, os armazéns do Ministério da Educação ficaram repletos de matérias para serem distribuídos, principalmente materiais de apoio ao Currículo do 1.º e 2.º Ciclo do Ensino Básico. O Ministério já produziu e imprimiu quase todos os materiais de apoio necessários à implementação do Currículo da Educação Pré-Escolar e do 1.º e 2.º Ciclo, sendo que possui os direitos desses materiais. Agora, como Ministra da Educação, Juventude e Desporto já dei instruções para que todo esse material fosse distribuído e sei que essa distribuição já se realizou, pelo menos, para dois municípios. Solicitei que fossem entregues diretamente nas escolas, para que chegassem mais rapidamente às mãos daqueles que lhes darão o melhor uso.

A maior parte destes materiais, os alunos não os podem levar para casa. O ensino básico é obrigatório é gratuito para todos os alunos, sendo o estado a sustentá-lo. Noutros países os pais compram os livros para os seus filhos. Assim, os livros pertencem-lhes e fazem deles aquilo que pretenderem. Agora, Timor-Leste não pode distribuir anualmente livros por todos os alunos. Não o podemos suportar economicamente. Por isso é que quase todos os livros são usados exclusivamente na sala de aula, não podendo o aluno levá-lo para casa. Já ponderamos criar um sistema de empréstimo do livro, mas depois de analisadas todas as questões, o risco era enorme.

Sei que outro constrangimento às boas práticas pedagógicas dos professores, principalmente no 1.º e 2.º ciclo, é, em alguns casos, o elevado número de alunos por turma. Mas também sabemos que existem turmas com muito poucos alunos. O rácio professor/aluno encontrava-se nos 30 alunos/professor, que ainda não é o ideal, mas é aceitável num país em que 50% da população tem menos de 18 anos. Portanto, se umas turmas têm muitos alunos, tem de haver outras que têm muito poucos. O Ministério, conforme referido no programa do VIII Governo Constitucional irá proceder à realização do Quadro de Pessoal de forma a poder verificar quais as escolas que têm excesso e quais as que têm falta de professores.

Por fim, a questão das línguas. Antes de mais temos de perceber que um currículo não se limita ao ensino de línguas, para além da aprendizagem das línguas oficias, pretendemos que as crianças também aprendam a fazer cálculos, que compreendam como está organizada a sociedade que as rodeia, as suas tradições e costumes, que compreendam os fenómenos da natureza, que entendam o funcionamento do seu corpo e como se podem proteger de algumas doenças e, claro, que desenvolvam um pensamento critico-construtivo, analítico, enfim, queremos que aprendam muito mais do que duas línguas oficiais. As línguas são uma parte do currículo e são um meio de comunicação para que se atinjam as outras competências.

O currículo do 1.º e 2.º ciclo aprovado em 2015, através da lei nº 4 de 2015, bem como as alterações introduzidas em 2018, através da lei nº 4 de 2018, permitem, no seu artigo 14.º, nº. 2, a utilização da primeira língua dos alunos como um meio de comunicação de apoio, quando necessário. De referir que a lei que procedeu às alterações foi recentemente apreciada no parlamento nacional, o qual aprovou uma resolução de cessação, pelo que os decretos-lei de 2015 são atualmente a legislação em vigor. Portanto, o Currículo do 1.º e 2.º ciclo não prevê o ensino de línguas maternas não oficiais.

Agora, a Lei de Bases indica no artigo 8.º que as línguas de ensino no sistema educativo timorense são o tétum e o português. Agora a forma como são usadas essas línguas deverá ser uma decisão técnica e não política. A política já foi feita para a elaboração da Lei de Bases. Tecnicamente, como atingir o que lá está consagrado, é função do Ministério da tutela. Sendo que, segundo o Decreto-Lei nº 4 de refere o artigo 11.º, nº 2. no final do segundo ciclo, os alunos possuem uma sólida base de literacia das duas línguas oficiais. Portanto, não encontro motivos lógicos para esta polémica, principalmente depois de já ter explicado tantas vezes as intenções e motivações deste currículo. Ao contrário do que muita gente pensa e diz, eu sigo aquilo que está escrito na Constituição e na Lei de Bases, que são as Bíblias da Educação, nunca as contradisse em nenhuma das minhas ações.

 

  1. Enquanto ministra, no seu modo de perspectivar, quais são as principais dificuldades dos educadores de infância e dos professores em relação à utilização das línguas oficiais de Timor-Leste? E no que diz respeito às formas de planificação das aulas e utilização dos materiais escolares?

As maiores dificuldades penso serem, essencialmente duas, falta de formação académica inicial de muitos professores e o fraco domínio da língua portuguesa. Reparem que não há, ainda, em Timor-Leste formação inicial de educares de infância. E em relação aos professores já referi os motivos pelos quais muitos deles não têm formação. Depois, a questão da língua. Se contabilizarmos todas as formações de língua portuguesa realizadas neste país desde 2000, penso que já teríamos formados todos os cidadãos para terem um domínio suficiente de língua portuguesa. Mas, segundo o estudo realizado em dezembro de 2015 pelo Gabinete de Pesquisa, Desenvolvimento, Monitorização e Avaliação, no qual se realizou um teste diagnóstico de proficiência em língua portuguesa a cerca de 14.000 professores, 77% deles mostraram ter um domínio elementar de português. Portanto, alguma coisa falhou, os resultados não foram os esperados. Também, temos de ter consciência que grande parte dos nossos professores nunca estudou a língua tétum, portanto, apesar de a dominarem oralmente, a sua escrita por vezes mostra falhas. Assim, cientes de todo este panorama, como já referi, temos de apostar numa formação estruturada e planeada a longo prazo e não em forma de retalhos. Terá de ser uma formação que abranja os conteúdos científicos de uma área disciplinar, mas também áreas como domínio oral e escrito da língua portuguesa, domínio da língua tétum, na sua forma escrita, metodologias de ensino, práticas pedagógicas, ética, educação inclusa, etc…

 

  1. Em seu entender, na medida em que existem as duas línguas oficiais Tétum e Português, qual é a língua de instrução mais adequada para a iniciação à leitura e à escrita? O Tétum ou a Língua Portuguesa? Ou as Línguas Maternas? Porquê?

Vejamos, os Censos de 2015 mostram que 80% da população afirma ter conhecimentos da língua tétum, enquanto que apenas 5% afirmam ter conhecimentos da língua portuguesa. Quando analisamos os dados relativos às crianças em idade escolar, as percentagens caiem para os 34% e 0,04% respetivamente.

Os estudos e as recomendações internacionais afirmam que as crianças aprendem melhor na língua que conhecem melhor. O que me parece bastante óbvio!

Agora, Timor-Leste tem duas línguas oficiais, o Tétum e o Português, definidas na Constituição, para além das outras línguas nacionais, e a Lei de Bases determina como línguas de ensino e Tétum e o Português.

Portanto, para mim, não tenho dúvidas, a iniciação à leitura e à escrita deverá ser feita em língua Tétum. Quando se aprende a ler e a escrever bem numa língua, facilmente poderemos ler e escrever noutra língua. Principalmente quando nos referimos a aprender a ler e escrever em tétum, passando depois para o português, uma vez que o alfabeto é praticamente o mesmo e existem muitas semelhanças fonológicas. Claro que depois, também é necessário ensinar aquelas coisas que são parecidas mas diferentes, por exemplo os sons do ‘C’ em Casa Civil, que em tétum esses sons são representados, respetivamente por K e S, e por fim aquilo que não existe em tétum, como é o caso dos ditongos ÃES, em cães, pães, mães,…

Ensinar a ler e a escrever nas línguas maternas!? Bem, poderia ser benéfico para as crianças, mas primeiro não temos materiais pedagógicos desenvolvidos para esse fim, segundo exigiria um grande esforço e controlo da colocação de professores, para assegurar que o professor teria capacidade para ensinar a ler e a escrever na língua materna dos alunos. Realmente existe um projeto-piloto em 10 escolas no qual a iniciação à leitura e à escrita é feita nas línguas maternas. Mas é isso mesmo, um projeto-piloto que, apesar dos indicadores de sucesso, não será possível replicar a todo o território num futuro próximo.

 

  1. É pacífico admitir que os manuais escolares devem ser valorizados na dinâmica do processo de ensino-aprendizagem. Os manuais escolares devem ser escritos só em Tétum? Só em Português? Em Tétum e Português? Nas línguas maternas? Porquê?

A língua usada nos manuais deve seguir a estratégia adotada para o ensino e uso das línguas. O Currículo do 1.º e 2.º Ciclo aprovado em 2015 define o ensino das línguas oficiais através de uma progressão do Tétum para o Português, então, dependendo do ano de escolaridade para o qual se destinam, deverão ser escritos em Tétum, serem bilingues, ou apenas escritos em Português.

Claro que o projeto-piloto de Ensinu Multilinge Bazeia ba Lian Inan (EMBLI) deverá seguir também a progressão linguística definida para esse projeto, que é Língua Materna –Tétum – Português.

Convêm não nos esquecermos que independentemente de tudo, o objetivo final, tanto no currículo aprovado em 2015 como no projeto-piloto EMBLI, é que as crianças tenham uma forte base de literacia, nas duas línguas oficiais, no final do 6.º ano.

 

  1. O Jornal Tornado tem conhecimento de que V. Excelência, Ministra da Educação do VIII Governo, Senhora Dulce Soares de Jesus, está a orientar a implementação de um projecto piloto denominado Educação Multilingue Baseada na Língua Materna (EMBLM) e ao que tudo indica quer proceder à sua generalização por todo o país. É essa a sua ideia? Qual é o grande objectivo deste projecto? Este projecto não irá atrasar a aprendizagem da língua portuguesa? Ou, pelo contrário, pensa que a implementação do projecto EMBLM vai fazer a diferença no sentido de facilitar o processo de ensino-aprendizagem na educação pré-escolar e no 1º e 2º ciclos do ensino básico?

Estou um pouco confusão com essa expressão ‘ao que tudo indica quer proceder a sua generalização por todo o país’.  Eu nunca referi que queria expandir o programa EMBLI a todo o país, nem durante o meu mandato como Vice-Ministra da Educação, nem antes, durante o meu cargo na UNICEF, nem mesmo atualmente, como Ministra da Educação, Juventude e Desporto.

Este tipo de referência mostra que as pessoas não compreendem minimamente o que é o projeto-piloto EMBLI. Como já mencionei anteriormente, as crianças aprendem várias disciplinas, incluindo as línguas. Neste projeto, começam nas suas próprias línguas.

Os Censos Nacionais mostram que há muitas crianças, que quando entram para a escola, não dominam nem o Tétum, nem o Português. O Ministério da Educação tem responsabilidades para com todas as crianças, pelo que pode e deve procurar formas de assegurar que todas as crianças tenham as mesmas oportunidades de acesso a uma educação de qualidade e que lhes permita terem sucesso escolar. Esta obrigação do Ministério está consagrada na nossa Lei de Bases da Educação, sendo que é mais reforçada ainda pela Política Nacional da Educação Inclusiva.

É claro que uma criança que não compreende uma palavra do que o professor diz e que não consegue comunicar com os sues colegas, de modo a trocar ideias, a discutir e a participar ativamente na sua aprendizagem, não tem as mesmas oportunidades de sucesso escolar, nem pode participar efetivamente no processo de ensino-aprendizagem da mesma maneira que uma criança que domina as duas línguas oficiais.

Assim, a ideia do projeto EMBLI é de realizar um estudo sobre a viabilidade do uso da língua primária da criança para facilitar a sua aprendizagem, durante os seus primeiros anos de escolaridade, com o objetivo de auferir se este processo ajuda realmente a alcançar sucesso escolar ou não. E, sim, os resultados têm indicado que esta metodologia ajuda, e muito.

Mas, apesar destes resultados, não podem concluir que vamos generalizar esta pilotagem a tudo o país. Os resultados mostram que a pilotagem funciona muito bem, mas apenas com crianças das áreas rurais e que não falam outras línguas. Assim, induzir que o Ministério da Educação vai implementar este programa em todo o território é uma conclusão completamente falsa, uma vez que não é um método adequado para todos os alunos. E, como já mencionei, este projeto piloto desenvolve-se apenas em 3 municípios, com apenas 3 grupos linguísticos. O Ministério da Educação não tem, atualmente, recursos para abranger todos os grupos linguísticos do país.

Mas, se os resultados finais forem bons, ou seja, se as crianças abrangidas pelo estudo terminarem o 6.º ano de escolaridadee apresentarem resultados muito melhores, em comparação com as outras escolas não abrangidas pelo EMBLI, isso demonstrará que esta metodologia funciona, facilitando a aprendizagem das ciências e das línguas oficiais. Então, o Ministério da Educação terá, moralmente, que considerar as implicações destes resultados. Mas esta decisão, a ser tomada, seria no futuro distante e com base em muitos fatores, desde os resultados da pesquisa, os recursos financeiros e humanos necessários e aqueles que estão disponíveis, entre muitos outros fatores.

 

  1. A Senhora Ministra tem defendido publicamente a importância de se consolidar e desenvolver a língua portuguesa em Timor-Leste, a par do tétum, uma posição que tem sido defendida pelos vários líderes da Nação. O que é que o Ministério da Educação pensa fazer em concreto para garantir a implementação da língua portuguesa em Timor-Leste e impedir que a língua de Camões seja substituída pela língua inglesa?

Não acredito que a língua de Camões seja substituída pelo inglês. Pelo menos enquanto a geração, dita, da resistência persistir. Todos reconhecemos o português como uma língua que, de uma forma ou de outra, faz parte da nossa identidade e nos diferencia dos nossos vizinhos. No futuro as gerações mais novas falarão e tomarão decisões. Mas entretanto, cabe-nos a nós preparar o caminho para que essa troca não aconteça.

O Ministério da Educação para além de toda a aposta no reforço das competências em língua portuguesa e das quais já falei, está a pensar numa estratégia que envolverá várias identidades, mais ainda está numa fase muito embrionária e não quero que o parto aconteça antes de tempo. Temos de dar tempo ao tempo.

A implementação da língua portuguesa é um trabalho que não pode depender apenas do Ministério da Educação, Juventude e Desporto, nem é um trabalho que tem de ser feito apenas em sala de aula. As salas de aula são um bom espaço para o fazer, mas dentro das salas de aula também temos de garantir a aprendizagem da matemática, das ciências, da história, da geografia, e estas aprendizagens não podem deixar de acontecer em prestígio da aprendizagem de uma língua. Nós não somos apenas língua!

A sociedade timorense tem de conviver diariamente com a língua portuguesa, para que o português deixe de ser uma língua apenas usada por determinadas pessoas e em determinadas situações, essencialmente em atos oficiais. Vamos procurar ser inovadores e encontrar novos caminhos para que, realmente, ao fim de 18 anos a língua portuguesa passe a fazer parte e que seja necessária para o nosso dia-a-dia.

 

  1. Finalmente, uma última pergunta, o que é que a Senhora Ministra está a pensar fazer no âmbito da formação inicial e contínua dos educadores de infância e dos professores do ensino básico por forma a que estes profissionais adquiram mais conhecimentos e desenvolvam mais competências ao nível da língua portuguesa e do tétum, e mais competências científicas e pedagógicas?

Como já referi, há bastantes coisas pensadas, mas não se podem esquecer de que eu apenas tomei posse à menos de 3 meses. Eu prefiro esperar e pôr em prática ações pensadas e estruturadas. Há projetos a terminar. Projetos que nos trouxeram muitas coisas boas. Temos de repensá-los e procurar direcioná-los no sentido de atingir os objetivos. Temos de conjugar vários fatores. A formação por si só já não satisfaz os professores. A formação espera-se que tenha sempre um impacto positivo nas práticas dos professores.  Mas os professores estão cansados. Temos de definir muito bem as formações e essas têm de ter também impacto nas suas vidas profissionais, principalmente através de progressão na carreira. Mas para isso temos de ter um Quadro de Pessoal e o próprio Ministério tem de ter capacidade para fazer a gestão dessa progressão na carreira, que deverá ser automática, seguindo os critérios já definidos.

Como disse, estão muitas coisas pensadas, que estão a ser estudadas, para que a sua implementação seja eficaz. Mas tudo isso dependerá, infelizmente, de orçamentos. Esperamos poder colocar todas as ideias em prática no próximo ano de 2019, uma vez que este ano já está quase no último trimestre e o orçamento quase todo executado.

Sua Excelência, mais uma vez, agradecemos muito a sua participação que certamente irá enriquecer o nosso caderno especial sobre educação em Timor-Leste.

Também agradeço o vosso interesse em esclarecer alguns assuntos e estou disponível para outras entrevistas ou esclarecimentos, de forma a que as vossas publicações possam proporcionar aos vossos leitores informações claras, sem terem apenas por base a opinião de algumas pessoas ou informações erradas, especialmente em relação ao que diz respeito a ações do Ministério da Educação, Juventude e Desporto.

Muito Obrigada!

 

Por opção da entrevistada, este artigo respeita o AO90

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