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Quinta-feira, Abril 25, 2024

Manuel Rodrigues da Silva

Helena Pato
Helena Pato
Antifascistas da Resistência

(1909 – 1968)

Destacado militante clandestino do PCP e seu dirigente, está entre as maiores vítimas da repressão fascista. Foi o preso político que sofreu mais tempo de prisão, durante a ditadura fascista: 23 anos, dos quais 10 anos no Campo de concentração do Tarrafal e os restantes entre o Aljube e Peniche.

Em condições da maior crueldade, já doente, é mantido encarcerado devido aos sucessivos «pedidos da PIDE de prorrogações das medidas de segurança». Homem de trato bondoso, afável e de enorme argúcia.

Activista sindical e militante político

Cadeia de Angra do Heroísmo

Manuel Rodrigues da Silva nasceu a 10 de Abril de 1909, em S. Luís do Maranhão, filho de um emigrante português no Brasil e de uma índia nativa. Veio com o pai para Portugal, aos quatro anos de idade e pouco depois de completada a instrução primária, com 13 anos, começou a trabalhar como aprendiz de serralheiro mecânico na Manutenção Militar de Lisboa. Ao mesmo tempo, continuou os estudos, frequentando o curso nocturno da Escola Industrial de Lisboa. As duras condições de vida e de trabalho do operariado português nesses duros anos 20 e o contacto com as estruturas sindicais fizeram de Manuel Rodrigues da Silva um activista sindical e militante político.

Em 1932 aderiu ao PCP e, pouco depois, foi eleito secretário da Comissão Regional do Centro da CIS (Comissão Inter-Sindical). A sua intensa actividade e dedicação desperta a atenção dos seus camaradas, sendo chamado a tarefas sindicais de cada vez maior responsabilidade e, em 1934, já integrava a Comissão Executiva da CIS. Entretanto, destaca-se também na militância partidária e não tarda a fazer parte do Comité Central do PCP (em 1935/36)[1]. Em 1936 integra o seu Secretariado, ficando responsável pela actividade sindical clandestina.

O trabalho desenvolvido nas difíceis condições criadas pela prisão do Secretariado do Partido Comunista, em finais de 1935, atraiu sobre si a atenção e o ódio da polícia fascista. Preso em 23 de Setembro de 1936, Manuel Rodrigues da Silva é mantido incomunicável durante 23 dias e, sem qualquer julgamento, é enviado para o campo de concentração do Tarrafal, em 17 de Outubro desse ano. Passa vários dias na tenebrosa “Poterna” do Forte de Angra do Heroísmo [2], antes de se juntar à primeira leva de presos que vai inaugurar o Campo da Morte Lenta, na Ilha de Santiago (Cabo Verde)[3].

Campo de Concentração do Tarrafal

No Tarrafal Manuel Rodrigues da Silva permanece quase dez anos. Abrangido pela amnistia que o fascismo salazarista foi obrigado a conceder em 1945, após a derrota do nazi-fascismo na guerra, regressa a Portugal a bordo do navio «Guiné», em 1 de Fevereiro de 1946. Volta a mergulhar na clandestinidade, e é eleito membro do Comité Central no IV Congresso do PCP, realizado em Julho de 1946. .

O preso político com mais tempo de prisão

Manuel Rodrigues da Silva

De novo preso em 7 de Fevereiro de 1950, foi encarcerado no Aljube, onde permaneceu três anos em péssimas condições, sem recreio e sem visitas (não tinha familiares), encarcerado na mais insalubre cela da cadeia[4], onde nunca entrou o sol. Sem cuidados médicos, teve escorbuto e problemas de coração com incidentes vasculares cerebrais. 

Entretanto, foi julgado em Abril de 1951, fazendo do tribunal fascista uma tribuna de denúncia dos métodos de repressão da PIDE, de desmascaramento do regime e de defesa do seu Partido.

O Tribunal plenário condenou-o a quatro anos de prisão maior. Mas o Ministério Público recorreu da sentença e a pena foi-lhe ampliada para oito anos e «medidas de segurança».


Manuel Rodrigues da Silva foi uma das vítimas em destaque na exposição “A voz das Vítimas”, no Museu do Aljube (2011).

Em 1954, Manuel Rodrigues da Silva foi transferido para Peniche. Com a saúde já abalada e a pena já terminada em 1959, é mantido encarcerado devido aos sucessivo pedidos da PIDE de prorrogações das «medidas de segurança».

Vítima da repressão fascista

Manuel Rodrigues da Silva sofre, em 1961, uma congestão cerebral, mas é-lhe recusado o internamento hospitalar. Temendo pela sua vida, é lançada uma grande campanha, ao nível nacional e internacional, pela sua imediata libertação. A grande pressão exercida sobre o regime fascista acaba por dar resultados e em 8 de Janeiro de 1964, quase 14 anos depois da sua prisão, Manuel Rodrigues da Silva sai em liberdade condicional.

Foi o preso político que sofreu mais tempo de prisão, durante a ditadura fascista

Gravura de Margarida Tengarrinha

Apesar da sua fraca saúde, não demora a regressar à militância política e à vida clandestina[5]. Entra para o Secretariado do Comité Central e sai de Portugal para URSS, pouco antes do VI Congresso do PCP, que iria realizar-se em Kiev, em 1965. É ele quem faz a intervenção de abertura, que marcou a sequência dos trabalhos[6].

O seu estado de saúde vai-se agravando e, em 22 de Julho de 1968, apenas com 59 anos, morre lúcido mas fisicamente muito debilitado, ficando os seus restos mortais para sempre na União Soviética, onde seria sepultado, no cemitério Monasteri Novodévitchi, em Moscovo[7].

[1] Em Dezembro de 1935, o PCP sofre um duro golpe: o seu Secretário-geral, Bento Gonçalves, é preso depois de regressar de Moscovo, onde participara no VII Congresso da Internacional Comunista; e com ele os restantes membros do Secretariado do partido, José de Sousa e Júlio Fogaça. . Cria-se então um «Secretariado provisório» para prosseguir com a actividade do Partido, que duraria até Março de 1936. Um dos seus membros é Manuel Rodrigues da Silva, que fica responsável pela área sindical. Em Abril, realiza-se uma reunião de quadros onde é constituído um Comité Central que Integra, entre outros, Manuel Rodrigues da Silva, Alberto Araújo, Francisco Paula de Oliveira (Pável), Álvaro Cunhal e Joaquim Pires Jorge. Os três primeiros passam a constituir o Secretariado.

[2] A «poterna» era uma espécie de poço com cerca de 15 metros de profundidade e cerca de 3 metros de altura no ponto mais alto da sua cobertura em forma de abóbada. No interior quase não entrava luz, e o ar respirava-se com dificuldade. O cheiro era, na maior parte das vezes, nauseabundo, dado que os presos tinham de fazer as suas necessidades no fundo do poço. As camas eram os degraus da escadaria e os presos não tinham nem enxergas nem cobertores, caindo-lhes em cima, permanentemente, pingos de água.

[3] O Campo do Tarrafal começou a funcionar a 29 de Outubro de 1936. Em 18 de Outubro de 1936 partiram de Lisboa os primeiros 152 detidos, entre os quais se contavam participantes do 18 de Janeiro de 1934 na Marinha Grande e alguns dos marinheiros que tinham participado na Revolta dos Marinheiros ocorrida a bordo de navios de guerra no Tejo em 8 de Setembro daquele ano de 1936. Ali morreram dezenas de presos e muitos outros ficaram irremediavelmente doentes, vítimas de biliose e outras doenças. . Alguns morreram já depois de libertados, mas ainda em consequência do que ali tinham passado. Famílias houve que, sem nada saberem do destino dos presos, os deram como mortos e chegaram a celebrar cerimónias fúnebres.

[4] A sala nº 3, nas traseiras, era voltada para um beco, muito húmida, onde nunca entrava o sol. Dali ele comunicava com o exterior, soprando minúsculas mensagens através de um tubo para uma jovem que as recebia e lhes dava seguimento, a Rosinha, figura conhecida dos presos de então no Aljube.

[5]

Este homem aparentemente tímido, fatigado e débil, tinha a força indestrutível de uma dedicação sem limites à sua classe e ao Partido. Toda a sua vida os serviu. Tudo lhes sacrificou: a vida pessoal, a família e os próprios últimos tempos de vida, quando, já com uma primeira trombose ocorrida em Peniche, se dispôs, uma vez libertado, a voltar à clandestinidade.»

(In José Magro, Cartas da Prisão, Edições «Avante!», Lisboa, 1975, p. 48)

[6] Manuel Rodrigues da Silva que abriu o congresso, precedendo Álvaro Cunhal nas alocuções, afirmou então que: para o seu sucesso «é necessário que se debatam francamente todos os problemas. Apontemos corajosamente as dificuldades, insuficiências e erros do nosso trabalho para os podermos superar».

[7]

Era um grande homem e um grande comunista, de uma enorme modéstia. Conheci-o, trabalhei com ele, e fiz parte de delegação do PCP, chefiada por Álvaro Cunhal, que o conduziu ao cemitério de Novodévitchi, um antigo e lindo cemitério onde estão os túmulos de grandes figuras da cultura russa, desde há séculos».


Dados biográficos


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