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Sexta-feira, Maio 10, 2024

O Banco Central e a esperança equilibrista

João Ricardo Costa Filho
João Ricardo Costa Filho
Professor do Mestrado Profissional em Economia da Fundação Getúlio Vargas/EESP e Professor da Faculdade de Economia da FAAP

No início de 2016, escrevi sobre as perspectivas para a economia brasileira, num artigo na Folha de São Paulo intitulado “Feliz 2020?”. Já estou preocupado em ter sido muito otimista, mas mantenho a análise. Argumentei à época que o crescimento sustentado poderia vir somente a partir de 2020, porque teríamos i) recessão em 2016, ii) baixo crescimento em 2017 (escrevi “Depois da contração, 2017 poderia ser o ano da recuperação sustentada. Voltar ao ritmo de crescimento de 2% ao ano não deveria ser tarefa hercúlea, mas, por nossa incapacidade em aumentar a produção, há muita desconfiança”), iii) incerteza eleitoral em 2018 (mal sabia eu o tamanho da incerteza) e, com sorte iv) ajuste em 2019.

O país do futuro

No final do mesmo ano, Samuel Pessôa escreveu “consolida-se o cenário de recuperação lenta”. O pesquisador foi direto ao ponto: a melhora foi fruto da mudança “da queda do pessimismo entre os empresários, em direção a uma posição mais neutra”, no que diz respeito às expectativas. Ele alertou que a sondagem sobre a ‘situação atual’ não havia acompanhado esse movimento. Somos, mais uma vez, o país do futuro.

A política monetária fora elencada como forte candidata para acelerar a recuperação. Não seria diferente, já que não há muito que fazer com o câmbio sem gerar problemas adicionais e a política fiscal está no cerne dos nossos problemas estruturais e conjunturais. O Banco Central do Brasil (BCB) se encontra em meio a um ciclo de queda na taxa de juros básica da economia, a taxa Selic, agora em 10,25% ao ano, muito acima da experiência internacional, mas já bem mais baixa do que no momento em que escrevi o artigo da Folha.

E desemprego alto

Num país com desemprego alto (e sem sinais de algum alento), PIB em contração (não se engane pelo bom desempenho da agricultura no primeiro trimestre de 2017) e investimento em queda livre, a inflação demorou muito para começar a cair. Talvez em função da inércia ou pelos choques nos preços dos alimentos. Pode ser que pelo nível que os preços de serviços operavam nos últimos cinco anos ou pelo choque de preços administrados antes da troca de governo. Ou por tudo isso junto. Mas agora o cenário para os preços é extremamente benigno, tudo mais constante.

O fato é que há desinflação. De um nível acima de 10% em 2015, para algo acima de 7% em 2016 e por volta de 3,5% em 2017, estamos falando em sete pontos percentuais em dois anos, se tudo der certo. E é aí que mora o problema. O Banco Central tem alertado sobre a importância da sustentabilidade fiscal para abrir espaço maior nos cortes na taxa Selic. Mais que isso, existe todo um balanço de riscos associados à trajetória dos preços.

Banco Central não arrisca

Tomei emprestada a música de João Bosco e Aldir Blanc para escrever o título deste artigo e vou abusar um pouco mais. A entidade monetária comunica que os dados ditarão o ritmo e a intensidade do ciclo, mas “A esperança…/Dança na corda bamba/De sombrinha”. No passado recente nós já vimos que não dá para diminuir a taxa de juros sem que existam fundamentos para isso. O Banco Central não quer arriscar. A reputação do guardião da moeda está sempre em jogo, “E em cada passo/Dessa linha/Pode se machucar…”.

A entidade monetária esperava apenas passar o período de cautela, para que o ritmo de cortes fosse intensificado. Os estímulos monetários auxiliariam a recuperação econômica. Mas o imbróglio político insiste em colocar barreiras à política macroeconômica. Se por um lado a incerteza gerada com cada delação machuca mais a atividade, o que faria com que a inflação caísse e houvesse mais espaço para cortes nos juros, por outro pode pressionar a taxa de câmbio, conter a desinflação e antecipar o final do ciclo de afrouxamento monetário.

É importante lembrar, contudo, que a política monetária só visa suavizar os ciclos econômicos. Para crescer de maneira sustentada, há a necessidade de uma agenda microeconômica, com foco em infraestrutura, educação e saúde. O ambiente macroeconômico está se reorganizando para que esses pilares sejam trabalhados.

Espero que ao menor sinal de crescimento, não nos esqueçamos dos problemas que temos no país. Senão não vai ser o só a ‘tarde que vai cair feito um viaduto’.

O Autor escreve em português do Brasil

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